PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho

Transcrição

1 ACÓRDÃO PODER JUDICIÁRIO APELAÇÃO CRIMINAL N /1 CATOLÉ DO ROCHA Relator Joás de Brito Pereira Filho Apelante Representante do Ministério Público Apelados 1. Ronaldo Veras de Freitas, vulgo "Ronaldo de Fiinho Veras", e José Ananias de Souza Júnior, vulgo "Junior de Na zaré" (Adv. Arnaldo Escorei Júnior); e Marinaldo Guedes de Oliveira, vulgo "Mosquito" (Adv. Roberto Júlio da Silva) JÚRI. Tentativa de homicídio qualificado. Concurso de agentes. Morte de um deles. Legítima defesa. Tese sustentada por um dos réus. Negativa de autoria quanto ao outro. Decisão dos jurados, afastando a participação dos envolvidos no evento. Manifesta contrariedade à prova. Ocorrência. Novo julgamento ordenado. I - Extinta a punibilidade de um dos agentes, na origem, eis que atestada a sua morte, prejudicado resta o recurso, relativamente a este. II - Acolhendo os jurados a tese da negativa de autoria, inclusive quanto ao réu que, assumindo a autoria dos disparos efetuados contra a vítima, embora que sob o pálio da legítima defesa, com respaldo apenas na pálida negativa de dois dos envolvidos, é a decisão manifestamente contrária à prova colhida, a impor a determinação de novo julgamento popular. II Apelo prejudicado quanto ao réu falecido e provido quanto aos demais. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal, acima identificados: ACORDA a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça da Paraíba, por votação unânime, em julgar prejudicado o recurso quanto ao réu falecido e dar provimento ao apelo, quanto aos demais.

2 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAíBA RELATÓRIO Na comarca de Catolé do Rocha, Ronaldo Veras de Freitas, o "Ronaldo de Fiinho Veras", José Ananias de Souza Júnior, conhecido por "Júnior de Nazaré", e Marinaldo Guedes de Oliveira, de epíteto "Mosquito", foram denunciados como incursos nas sanções do art. 121, 2, 1 e IV, c/c arts. 14, II, e 29, todos do CP. Segundo a denúncia, no dia 15 de setembro de 2008, os três acusados investiram contra Francisco Guedes de Oliveira, contra ele efetuando diversos disparos de armas de fogo, com o claro intuito de matá-lo, não consumando o intento por circunstâncias alheias às suas vontades, pois, a vítima conseguiu reagir, atirando contra os seus agressores, ferindo dois deles. Na ação, ainda conforme a denúncia, os agentes acima nominados teriam contado com o apoio logístico de Francisco Guedes de Oliveira, vulgo "Mornõ Veras", o qual teria cedido a moto utilizada por dois dos imputados, porém, esse acusado restou impronunciado, fls. 259/262, vol. II. Os pronunciados foram submetidos a julgamento, oportunidade em que Ronaldo Veras assumiu a autoria dos disparos contra a vítima, fazendo-o em sua própria defesa e do seu companheiro, Marinaldo.Guedes; este e José Ananias negaram qualquer envolvimento no fato, fls. 305/311. Os jurados, questionados se cada um dos réus houvera disparado contra a vítima, deram resposta negativa, inclusive em relação a Ronaldo Veras, não obstante a sua alegação de ter atirado para se defender, fls. 312/317. Daí a sentença absolutória que se vê às fls. 319/320. Não se resignando, recorreu o representante do Ministério Público, com espeque no art. 593, III, d, do CPP, protestando por um novo julgamento a pretexto de que a decisão dos jurados afrontou manifestamente a prova apurada, fls. 329 e 331/335. A defesa de Ronaldo Veras e José Ananias contraminutou o recurso, propugnando pela manutenção do veredicto absolutório, fls. 338/339. 2

3 .Alçados os autos, a Dra. Josélia Alves de Freitas, digna Procuradora de Justiça, lançou parecer pelo desprovimento do recurso, fls. 346/349. Ausentes as contrarrazões de Marinaldo Guedes de Oliveira, os autos baixaram à origem, onde, constatada a morte deste, fls. 390, o douto Juiz declarou extinta a punibilidade, nos moldes do art. 107, 1, do CP. Em nova manifestação, a douta Procuradoria de Justiça, agora por meio do Dr. José Rosem Neto, ratificou o parecer antes firmado, fls. 399/400. É o relatório. VOTO Des. Joás de Brito Pereira Filho - Relator: Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Atribui-se aos três apelados, Ronaldo Veras, José Ananias e Marinaldo Guedes, a pecha de haverem atirado várias vezes contra Francisco Guedes de Oliveira, não o matando porque este reagiu, também disparando contra os referidos agressores, dois dos quais (Ronaldo e Marinaldo) também saíram lesionados. Relativamente a Marinaldo Guedes de Oliveira, o recurso perdeu o objeto. É que, conforme se vê dos autos, o douto Juizo primevo declarou extinta a punibilidade do mesmo, provado que foi o seu perecimento, conforme certidão de óbito anexada às fls dois apelados. Examino, pois, o recurso ministerial apenas em relação aos outros Observa-se dos autos que, sempre que ouvida, a vitima afirmou,. sem tergiversar, que conversava com duas moças (Margarida Pereira da Silva e Carla Patricia Veras da Silva). Ao se despedir e dobrar à esquina, teria se defrontado com Ronaldo pilotando uma moto, trazendo Marinaldo como garupa, sendo que este último passou a disparar contra ele ofendido. 3

4 Conta, ainda, João Gomes da Silva, que, atingido no braço direito, pulou da moto e correu, sendo perseguido por Marinaldo, que descarregou a arma. Ao atingir a "esquina da casa de Margarida, de repente, aparece José Ananias, também atirando contra o declarante, sendo que um dos disparos atingiu a coxa da vitima; (...) que a vitima ficou deitado no chão sem movimento, ocasião em que viu quando Ronaldo Veras, conduzindo sua moto, deu a volta por trás da casa de Margarida e se juntou com José Ananias, também efetuando disparos contra a vitima, sendo que um (atingiu) a mesma coxa e o outro o abdômen da vitima; (...) Que depois de ser atingido na perna, pela primeira vez, caiu emborcado e conseguiu pegar sua arma com a mão esquerda, para se defender e efetuou vários disparos contra Marinaldo; que atingiu Marinaldo, mas não sabe quantos; que se virou e avistou Ronaldo Veras já atirando pelas costas do declarante; que atirou contra Ronaldo também para se defender (...)", ft O acusado Ronaldo Veras de Freitas assumiu a autoria dos disparos, dizendo que, ao cruzar com João Gomes da Silva, o "João Guarda", este disparou contra ele imputado e Marinaldo, obrigando-o a também atirar contra o referido adversário, para defender a própria vida e a do seu companheiro, o qual, assim como José Ananias, não teve participação alguma no tiroteio, fls. 245/247. José Ananias de Sousa Júnior e Marinaldo Guedes de Oliveira tentaram adequar as suas versões à de Ronaldo Veras, negando envolvimento nos fatos. Mas, caíram em sérias contradições, conforme veremos a seguir. Disse José Ananias que, no exato momento do fato, ao giro das 17h3Omin, estava dormindo em casa, no sitio Pé de Serra, tendo viajado para Brejo dos Santos por volta das 18h0Omin, onde chegou meia hora depois, retornando mais ou menos às 22h0Omin. E, conforme afirmou, "no dia do fato, pela manhã, esteve bebendo com Ronaldo e Marinaldo no sitio Pombinhos; que por volta das 13hs:00min foi para casa sozinho à pé, no sitio pé de serra..." (sic), fl i/iL 4

5 Já Marinaldo revelou que, na manhã do dia do fato, "...foi com Momô Veras para a casa de seu primo, de nome Chico, em Bom Sucesso", retornando "...por volta das 16:00 horas, e no bar do sitio Pombinho, trocou a moto que estava com Momo, e este veio para a casa dele com a esposa do interrogado; que o interrogando ficou no bar; que se encontrou com Ronaldo Veras no bar de Pombinhos; que estava muito bêbado, e por volta das 17:30 horas Ronaldo veio deixar o interrogado em casa...", fl Nos seus interrogatórios, Ronaldo e Marinaldo não fizeram qualquer alusão ao encontro com "Júnior de Nazaré.", no dia do fato, pela manhã. Aliás, o último deles disse sequer se lembrar de "...ter dito na delegacia (fls. 46) que deixou a sua esposa na casa de Momo, bem como!sac., nem que voltou com Momo e foram para a casa de Júnior de Nazaré, nem chegando na casa de Júnior de Nazaré lá encontraram Ronaldo de Fiinho Veras...", fl Interessante destacar que, mesmo não se podendo confrontar provas em matéria de Júri, no caso dos autos, além das contradições havidas entre as declarações dos acusados, há o testemunho do policial Cleides Teixeira da Silva, que em tudo se coaduna com as declarações da vítima, sobretudo no que diz respeito aos inúmeros envolvimentos dos apelados em crimes da mesma estirpe, fls. 239/240. Aliás, segundo se extrai da prova, o móvel do crime seria justamente o fato de a vítima, como vigia noturno, haver dedurado alguns dos crimes praticados pelos imputados, que, por isso, arquitetaram o fato e só não lograram êxito em virtude da pronta e eficaz reação do agredido. Bem se vê, portanto, que as provas são uníssonas em atribuir aos acusados a autoria dos disparos que atingiram a vítima e, por pouco, não a ultimaram. E o Júri, até mesmo em relação ao correu Ronaldo, que assumiu a autoria dos disparos e alegou legítima defesa, decidiu, de forma absurda e em total discrepância com todo o acervo probatório, que nenhum deles prestou qualquer contributo para o desfecho criminoso. 5

6 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAFBA Em suma, um cotejo entre os elementos colhidos nas duas esferas de apuração de culpa evidencia que a isolada negativa de participação no crime, por parte dos apelados, acolhida pelos jurados, inclusive em relação ao imputado que assumiu ter atirado na vítima, porém, em legítima defesa, não encontra apoio nos autos. Diante disso, é de se concluir que o Conselho de Sentença laborou em grosseira discrepância com a verdade da prova, impondo-se a determinação de novo julgamento. Nessa linha de raciocínio se posiciona os Tribunais Superiores: "A soberania dos veredictos do Tribunal do Júri, não exclui a recorribilidade de suas decisões quando manifestamente contrária à prova dos autos (CPP., art. 597, III "d"). Provido o recurso do réu será submetido a outro julgamento pelo Júri" (STF, JSFF 261/241). "Não há ofensa ao Art. 5 XXXVIII da CF/88, a aplicação do Art III "d", do Código de Processo Penal, quando o tribunal ad quem determina, em caso de decisão contrária à prova dos autos, que o réu se submeta a novo julgamento. Inexistência de ferimento à soberania do Júri em casos que tais" (STJ, JSTJ 71211). Em suma, acolhendo os jurados a tese da negativa de autoria, inclusive em relação ao acusado que, assumindo a autoria dos disparos efetuados contra a vítima, embora que sob o pálio da legítima defesa, com respaldo na pálida negativa dos outros dois envolvidos, é a decisão manifestamente contrária à prova colhida, a impor a determinação de novo julgamento popular. Com essas considerações, dou provimento ao apelo ministerial. É como voto. 6

7 Presidiu o julgamento o Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Sílvio Ramalho Júnior. Participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Joás de Brito Pereira Filho, Relator, Arábio Alves Teodásio e Jose Guedes Cavalcanti Neto (Juiz de Direito convocado para substituir o Excelentíssimo Senhor Desembargador João Benedito da Silva). SALA DE SESSÕES "DES. M. TAIGY DE QUEIROZ MELO FILHO" DA CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA PARAÍBA, em João Pessoa, Capital, aos 29 (vinte e nove) dias do mês de novembro_clo ano de Desembargador Joás e_prito -Pereira Filho - RELATIOR - I 7

8 TRIEWNAL re Diretoria L: J udiciári Registrado a eri?2 1:14./ikie'