Biologia Estrutural. Solução do Problema da Fase. Prof. Dr. Walter Filgueira de Azevedo Jr. wfdaj.sites.uol.com.br Dr. Walter F. de Azevedo Jr.
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1 Biologia Estrutural Solução do Problema da Fase Prof. Dr. Walter Filgueira de Azevedo Jr.
2 Resumo Introdução Problema da fase Função de Patterson Aplicação da função de Patterson Método da Substituição Isomórfica Múltipla (MIR) Substituição molecular Outros métodos Referências
3 Cristalização Coleta de dados LNLS Difração de raios X Análise Resolução da estrutura cristalográfica
4 Problema da Fase Vimos que ao realizarmos a coleta de dados difração de raios X, obtemos informações sobre as intensidades difratadas para cada reflexão I(hkl), sendo que a intensidade é proporcional ao módulo do fator de estrutura, como segue: I(hkl) α F(hkl) 2
5 Problema da Fase Mas a informação sobre a fase de cada reflexão é perdida no processo de registro da informação. Para o cálculo da função densidade eletrônica é necessário o termo de fase. A obtenção da fase para os fatores de estrutura é chamada solução do problema da fase. ρ(xyz) = (1/V)Σ Σ Σ F(hkl) exp {-2πi [(hx + ky+ lz) - α (hkl)]} h k l Os dois principais métodos para a solução do problema da fase para cristais de macromoléculas biológicas serão discutidos na presente aula.
6 Função de Patterson A função de Patterson é dada pela somatória de Fourier dos módulos dos fatores de estrutura, como indicado na equação abaixo: P(uvw) = Σ Σ Σ F(hkl) 2 cos {2π[(hu + kv+ lw)} h k l A função de Patterson é calculada para cada coordenada fracionária uvw. Fisicamente esta função é um mapa de vetores entre átomos, há um pico na função de Patterson para cada vetor interatômico. A grande vantagem da função de Patterson, é que a mesma não necessita de informação sobre a fase dos fatores de estrutura, e fornece alguma informação estrutural, visto que a partir da interpretação do mapa de Patterson (a representação gráfica da função de Patterson) podemos obter informação sobre posição dos átomos.
7 Função de Patterson Consideremos uma cela unitária bidimensional, com apenas 2 átomos, como representado na figura da esquerda. A função de Patterson é uma representação dos vetores interatômicos, ou seja, apresentará valores diferentes de zero somente para valores de uvw que indiquem distâncias interatômicas, assim a representação gráfica da função de Patterson, da cela unitária bidimensional é representada à direita. u u u u u u u u u
8 Função de Patterson Vamos considerar agora um exemplo numérico. Seja uma cela unitária tridimensional com dois átomos, com as seguintes coordenadas fracionárias: Átomo 1: 0,20, 0,31, 0,33 e Átomo 2: 0,15, 0,18, 0,22. Haverá um máximo da função de Patterson para o vetor interatômico, como segue: Átomo 1: 0,20, 0,31, 0,33 Átomo 2: 0,15, 0,18, 0,22 Pico do mapa de Patterson: u = x 1 x 2 = 0,20 0,15 = 0,05 v = y 1 y 2 = 0,31 0,18 = 0,13 w = z 1 z 2 = 0,33 0,22 = 0,11
9 Aplicação da Função de Patterson A função de Patterson permite a localização de átomos pesados em estrutura de cristais. Consideremos como exemplo um cristal de organometálico, onde temos um átomo de platina, como na estrutura do composto trans-dicloro[(trietilfosfina)(2- metilsulfinil)piridina)] platina (II), onde o átomo de platina está ligado a dois átomos de cloro e dois enxofres. O pico mais alto do mapa de Patterson dará indicação do vetor interatômico Pt-Pt, como só temos um átomo de platina, a distância será entre duas platinas relacionadas por simetria. Esta estrutura foi relatada por De Azevedo et al. 1995, o cristal é do grupo espacial P2 1 /c, onde temos átomos nas seguinte posições: H 3 C CH 2 CH 2 CH 2 CH 2 CH 2 S S O Pt O CH 2 CH 3 1) x, y, z 2) -x, -y, -z 3) -x, y+1/2, -z+1/2 4) x, -y+1/2, z+1/2 Cl Cl
10 Aplicação da Função de Patterson As distâncias entre os átomos, relacionados por simetria será dada por: Relação Diferença Coordenadas interatômicas A 1-2 ou 3-4 ±2x ±2y ±2z B 1-4 ou ±2y± ½ ± ½ C 1-3 ou 2-4 ±2x ½ ±2z± ½ CH 2 CH 2 H 3 C CH 2 CH 2 CH 2 S S CH 2 CH 3 O Pt O Cl Cl Fonte: De Azevedo, W. F., Mascarenhas, Y. P., Sousa, G. F. and Filgueiras, C. A. L. Acta Crystallogr. Sect.C - Cryst. Struct. Commun., 51, , 1995.
11 Aplicação da Função de Patterson A partir dos dados de difração de raios X calculamos os picos do mapa de Patterson, que estão listados a seguir: Número do pico x y z 1 0,000 0,100 0, ,238 0,500 0, ,239 0,400 0, CH 2 CH 2 H 3 C CH 2 CH 2 CH 2 S S CH 2 CH 3 O Pt O Cl Cl Fonte: De Azevedo, W. F., Mascarenhas, Y. P., Sousa, G. F. and Filgueiras, C. A. L. Acta Crystallogr. Sect.C - Cryst. Struct. Commun., 51, , 1995.
12 Aplicação da Função de Patterson Considerando-se o pico 2, localizamos as coordenadas fracionárias x e z a partir da relação C, como segue: 2 x = 0,238 x = 0,119-2 z + 0,500 = 0,706 z = 0,603 Número do pico x y z 1 0,000 0,100 0, ,238 0,500 0, ,239 0,400 0, H 3 C CH 2 Cl CH 2 CH 2 CH 2 CH 2 O S Pt S Cl O CH 2 CH 3 Fonte: De Azevedo, W. F., Mascarenhas, Y. P., Sousa, G. F. and Filgueiras, C. A. L. Acta Crystallogr. Sect.C - Cryst. Struct. Commun., 51, , 1995.
13 Aplicação da Função de Patterson Considerando-se agora o pico 1, localizamos a coordenada fracionária y partir da relação B, como segue: -2 y + 0,500 = 0,100 y = 0,200 Número do pico x y z 1 0,000 0,100 0, ,238 0,500 0, ,239 0,400 0, CH 2 CH 2 H 3 C CH 2 CH 2 CH 2 S S CH 2 CH 3 O Pt O Cl Cl Fonte: De Azevedo, W. F., Mascarenhas, Y. P., Sousa, G. F. and Filgueiras, C. A. L. Acta Crystallogr. Sect.C - Cryst. Struct. Commun., 51, , 1995.
14 Aplicação da Função de Patterson A função de Patterson permite a localização de átomos pesados em estrutura de cristais de pequenas moléculas. Para macromoléculas biológicas sua aplicação restringe-se à determinação da posição de átomos pesados inseridos em cristais de proteínas, como será discutido no método de substituição isomórfica.
15 Método da Substituição Isomórfica Múltipla (MIR) A primeira estrutura de proteína resolvida foi a mioglobina em Essa estrutura foi resolvida por Kendrew e Perutz. Para a resolução da estrutura cristalográfica da mioglobina foi usado o método de substituição isomórfica múltipla. Este método usa uma abordagem reducionista para a solução do problema da fase. Podemos pensar no cristal de proteína como um mar, quase homogêneo, de densidade eletrônica. Num mapa como este, a inclusão de densidades eletrônicas maiores destacariam-se, no mar de densidade eletrônica. Tal efeito é obtido com a inclusão de metais pesados no cristal. Tal inclusão, permite a obtenção de informações iniciais sobre a fase, que permitem a solução do problema da fase. Num experimento típico de substituição isomórfica, coletamos dados de difração de raios X de um cristal nativo, sem metal pesado adicionado ao retículo cristalino, e outros conjuntos de dados com metais pesados adicionados ao retículo cristalino, chamados derivados isomorfos. Assim, temos pelo menos dois conjuntos de dados de difração de raios X: um nativo e outro com metal pesado.
16 Método da Substituição Isomórfica Múltipla (MIR) Chamaremos de F P o fator de estrutura do cristal nativo, sendo que este fator de estrutura apresenta fase α P. O fator de estrutura F PH é o fator de estrutura do derivado com metal pesado, que apresenta fase α PH. Vetorialmente temos que o fator de estrutura F PH é dado por: Eixo imaginário F PH = F P + F H Como ilustrado no diagrama. A F H B F P F PH Eixo real O
17 Método da Substituição Isomórfica Múltipla (MIR) Analisando-se o triângulo OAB temos: α P - α PH + [180 o ( α P - α H )] + γ = 180 o γ = α PH - α H. Pela lei dos cossenos temos: F PH 2 = F P 2 + F H 2-2 F P F H cos[180 o (α P - α H )] F PH 2 = F P 2 + F H F P F H cos[(α P - α H )] α PH - α H F H cos[(α P - α H )] = ( F PH 2 - F P 2 - F H 2 ) 2 F P F H F P A α P - α H γ α H F PH B α P - α H = arcos ( F PH 2 - F P 2 - F H 2 ) [ ] 2 F P F H O α P α PH Eixo real
18 Método da Substituição Isomórfica Múltipla (MIR) Assumindo-se que medimos F PH e F P e que sabemos a posição dos átomos pesados na cela unitária do cristal, ou seja, podemos determinar F H e α H, temos que as fases dos fatores de estrutura da proteína α P são dados por: α P = α H + arcos Ou seja: [ ] ( F PH 2 - F P 2 - F H 2 ) 2 F P F H A F H α P - α H B γ α H α PH - α H α P = α H ± α F P F PH Há dois valores possíveis para α P O α P α PH Eixo real
19 Método da Substituição Isomórfica Múltipla (MIR) A ambiguidade na determinação da fase α P pode ser ilustrada graficamente seguindose um diagrama proposto por Harker em Como mostrado na figura abaixo. A construção de Harker é obtida da seguinte forma. Inicialmente traçamos o vetor F H a partir da origem O. O final do vetor F H determina a origem de A, de onde traçamos uma circunferência de raio F PH, desenhamos uma segunda circunferência de raio F P com centro em O. Há geralmente dois pontos de intersecção entre as duas circunferências, indicando a ambiguidade na determinação da fase α P. D F P O -F H A Eixo imaginário C F PH Eixo real
20 Método da Substituição Isomórfica Múltipla (MIR) Os vetores OB e OC indicam dois valores possíveis para o fator de estrutura da proteína nativa (F P ). Destacamos, que inicialmente só sabemos os módulos F P, F PH e a fase (α H ) e o módulo do fator de estrutura para o átomo pesado. Vimos anteriormente que: F PH = F P + F H (soma vetorial), como o objetivo é a determinação do vetor F P, assim isolando-se F P, temos: F P = F PH F H, esta é a razão de representarmos graficamente o F H na construção de Harker. D F P O -F H A Eixo imaginário C Eixo real F PH
21 Método da Substituição Isomórfica Múltipla (MIR) A informação do átomo pesado é obtida pelo método de Patterson. Para acabarmos a ambiguidade necessitamos de informação adicional, que pode ser obtida com a coleta de dados de raios X de um terceiro conjunto, com átomos pesados inseridos no retículo cristalino. Eixo imaginário F P = F PH F H F P C D O -F H A Eixo real F PH
22 Método da Substituição Isomórfica Múltipla (MIR) -F H2 A inclusão da informação, de um segundo derivado de átomo pesado, acaba com a ambiguidade na determinação do termo de fase. A circunferência referente ao F PH2 cruza a circunferência do F P em dois pontos (E e F), sendo que E coincide com C. Contudo, vale destacar, que o diagrama de Harker ilustra uma situação idealizada. Conjuntos de dados de difração de raios X reais F P Eixo imaginário C E apresentam erros, e tais erros podem ser interpretados como um D O circunferência com o traço espesso, que gera uma certa -F H Eixo real indeterminação no valor exato da A FPH2 fase, muitas vezes faz-se F PH necessário a coleta de vários derivados isomorfos, para a determinação da fase. F
23 Substituição Molecular O crescimento do número de estruturas de proteínas resolvidas gerou uma vasta base de dados estruturais, armazenadas no PDB (protein data bank) ( Partindo-se do pressuposto que proteínas que compartilham alta identidade na estrutura primária, apresentam o mesmo enovelamento, Rossmann propôs em 1962 um método onde as informações sobre a fase de uma proteína, com estrutura 3D desconhecida, mas que apresentasse estrutura primária similar com outra resolvida, poderia usar as informações estruturais da proteína resolvida como informação inicial. Tal método é chamado de substituição molecular.
24 Substituição Molecular O fluxograma a seguir ilustra o principais passos na resolução de uma estrutura de proteína a partir do método de substituição molecular. Para o uso do método da substituição molecular, recomenda-se realizar uma procura no PDB usando-se a sequência de aminoácidos da estrutura a ser determinada e selecionar, entras as estruturas resolvidas, a que apresentar mais alta identidade. Há outros fatores a serem considerados tais como: Resolução dos dados de difração do modelo, presença ou não de ligantes e estado oligomérico.
25 Substituição Molecular Arquivo PDB de proteína similar. Dados de difração de raios X da nova proteína (F obs ) Rotação e translação do modelo Cálculo do fator de Estrutura (F calc ) Cálculo do Coeficiente de Correlção Listagem da rotação, translação e CC
26 Substituição Molecular A procura de rotação e translação é uma busca com 6 graus de liberdades, se realizarmos as duas buscas concomitantemente teremos um alto custo computacional. Consideremos que temos 10 posições para cada ângulo e 10 posições para cada eixo de translação. Teremos neste caso 10 6 cálculos, dividindo-se em busca de rotação primeiro e em seguida a busca de translação teremos 10 3 cálculos para rotação e 10 3 cálculos para translação, ou seja, 2000 cálculos, uma redução considerável. Suponha que cada cálculo demore 1 s de CPU, para o cálculo dividindo-se a busca em rotação e translação teremos 2000 s, pouco mais de meia hora, para a procura concomitante teremos de segundos 277,77 horas (mais de 11 dias!!!).
27 Substituição Molecular A partir das coordenadas atômicas podemos determinar os fatores de estrutura, usando-se a equação ao lado. F calc (hkl) = { [Σ f j cos (2π (hx j + ky j + lz j ) ] 2 { j=1 + N [Σ f j sen (2π (hx j + ky j + lz j ) ] 2 } 1/2 j=1 REMARK Written by O version REMARK Sun Feb 25 14:05: REMARK Walter F. de Azevedo Jr. CRYST ORIGX ORIGX ORIGX SCALE SCALE SCALE ATOM 1 CB MET ATOM 2 CG MET ATOM 3 SD MET ATOM 4 CE MET ATOM 5 C MET ATOM 6 O MET ATOM 7 HT1 MET ATOM 8 HT2 MET ATOM 9 N MET ATOM 10 HT3 MET ATOM 11 CA MET ATOM 12 N GLU ATOM 13 H GLU ATOM 14 CA GLU ATOM 15 CB GLU ATOM 16 CG GLU N X j + Y j + Z j
28 Substituição Molecular O coeficiente de correlação é um indicador estatístico, que assume valores próximos a 1 quando há correlação, e valores próximos a 0 quando não há correlação. Para seu uso em cristalografia, este é calculado usando-se os fatores de estrutura calculados (F calc ) e os fatores de estrutura observados (F obs ). Os F calc são obtidos diretamente das coordenadas atômicas do modelo de busca, e os F obs do experimento de difração de raios X. As coordenadas atômicas do modelo de busca são submetidas a rotações e translações. Para cada nova posição é calculado o F calc e um novo coeficiente de correlação. Esta informação é armazenada, assim no final temos uma listagem com as seguintes informações. Modelo alfa( o ) beta( o ) gama( o ) Tx Ty Tz CC , ,05...
29 Substituição Molecular O coeficiente de correlação é dado pela seguinte equação: CC = Σ ab (Σ a Σ b)/n { [ Σ a 2 (Σ a) 2 /N ] 1/2 } { [ Σ b 2 (Σ b) 2 /N ] 1/2 } Onde a = F obs e b = F calc
30 Substituição Molecular Para solução da estrutura, usando-se o método da substituição molecular, faz-se necessário somente um conjunto de dados de difração de raios X. Tal vantagem possibilita que a estrutura seja obtida de forma mais rápida que quando aplicamos o método de substituição isomórfica, contudo, nem sempre é possível aplicar-se o método de substituição molecular, mesmo quando há alta identidade entre a estrutura e o modelo de busca, as principais causas de insucesso do método de subsituição molecular são as seguintes: 3) Diferenças devido ao empacotamento cristalino 4) Diferenças devido ao estado oligomérico 5) Baixa qualidade estrutural do modelo de busca 6) Baixa qualidade dos dados de difração de raios X
31 Outros Métodos Há ainda dois outros método usados na solução do problema da fase: 3) Métodos diretos 4) Dispersão anômala
32 Referências Drenth, J. (1994). Principles of Protein X-ray Crystallography. New York: Springer- Verlag. Rhodes, G. (2000). Crystallography Made Crystal Clear. 2 nd ed.san Diego: Academic Press. Stout, G. H. & Jensen, L. H. (1989). X-Ray Structure Determination. A Practical Guide. 2nd ed. New York: John Wiley & Sons.
2018 Dr. Walter F. de Azevedo Jr. Problema da Fase
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