AS AUTARQUIAS ESTADUAIS

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1 AS AUTARQUIAS ESTADUAIS BYRON TÕRRES DE FREITAS Diretor do "Boletim do Serviço Público", do D. S. P. do Estado do Rio de Janeiro SUMÁRIO: Teoria das autarquias federais - Caracteristicos da autarquia - Fundamentos jurídicos da autarquia - Autarquias existentes no Estado do Rio de Janeiro - Conclusão. A criação das autarquias estaduais é relativamente recente e ainda há, mesmo em certos CÍrculos dirigentes, muitas dúvidas sôbre a sua verdadeira conceituação. Antes de entrar em seu estudo, passemos uma rápida vista de olhos sôbre a Teoria das AutarquiM Federais A Administração Pública compreende as seguintes modalidades: a) Administração Direta (Ministérios, Conselhos); b) Administração Delegada ou Indireta (Autarquia); c) Administração Concedida (Concessões de Serviços Públicos). Erimá Carneiro apresenta o seguinte esquema, excluindo a administração concedida: Administração Pública: 1 - Administração Direta (Repartições estatais): a) Ministérios; b) Órgãos autônomos. II - Administração Indireta (Repartições paraestatais); a) Autarquias; b) Sociedades de economia mista. Os órgãos ou repartições paraestatais abrangem, pois, as duas categorias - 1.a - autarquias; 2. a - sociedades de economia mista. - Tratemos destas últimas resumidamente, a fim de distinguí-las das autarquias. As sociedades de economia mista são organizações em que o Estado participa financeira e administrativamente. Correspondem, nos Estados Unidos da América do Norte, às "business corporation" ou "corporações governamentais". Pertencem no Brasil a êsse tipo: 1 - O Banco do Brasil; 2 - O Banco de Crédito da Borracha; 3 - A Cia. Siderúrgica Nacional; 4 - A Cia. Vale do Rio Doce; 5 - O Instituto de Resseguros do Brasil.

2 o Banco do Brasil, o da Borracha e o I. R. B., são do tipo financeiro; a Cia. Siderúrgica Nacional e a do Vale do Rio Doce, são do tipo industrial. Autarquias - A função do Estado moderno é prestar serviços à coletividade. Para realizar seus fins essenciais, o Estado necessita adotar certas formas de administração. Assim o Estado tem de descentralizar certos serviços, delegar suas atribuições a órgãos dotados de certa autonomia e de personalidade jurídica própria, que lhes assegura relativa liberdade de ação. A criação dêsses órgãos - ou autarquias - obedece aos seguintes objetivos: Descentralização dos encargos da Administração; diferenciação dos diversos serviços descentralizados; 3. - libertação dos rigores de fiscalização financeira comum. Contrôle - O Estado delega certas funções às autarquias, mas, por isso mesmo, tem o direito de fiscalizá-las. - O ato que lhes dá existência delimita a autonomia de que gozam, quanto à arrecadação de tributos e taxas, à autodeterminação de sua vida interna. - Os administradores das autarquias - diretores, presidente, superintendentes - estão subordinados hieràrquicamente aos ministros de Estado. O contrôle da autoridade central sôbre a autarquia reveste as seguintes formas: a) Intervenção (nomeação do pessoal dirigente); b) fiscalização (verificação das contas); c) tutela (exame) da legitimidade dos atos. Para efeito de vigilância eficaz e permanente, o govêrno institui junto a cada. autarquia uma Delegação de Contrôle, com atribuições especificadas em lei. Característicos da Autarquia: A autarquia: é criada pelo Estado; 2. é personalidade de Direito Público; dispõe de base patrimonial e financeira auto-administrada; tem finalidades políticas, econômicas e sociais; 5. 0 goza de grande flexibilidade de ação; permite a adoção fácil de novos métodos e normas de trabalho. Fundamentos Jurídicos da Autarquia: a) a prestação de serviço público; b) a delegação de competência por parte do Estado; c) o vínculo técnico-administrativo da tutela; d) a base patrimonial autônoma. Não se acha excluída do patrimônio federal, que é um só e indivisível. Escreve o mestre Francisco Campos: "A personalidade e a patrimonialização de um serviço público não têm por fim desnaturar a sua administração, transformando-a de pública em privada; é

3 521 apenas um método ou processo de organização do serviço público, uma técnica mediante a qual, por motivos políticos, econômicos, sociais ou administrativos de conveniência, de utilidade ou de oportunidade, o Estado destaca da massa da administração central certos interêsses, um determinado patrimônio e uma porção de sua própria competência, atribuindo-os com o fim de realizar de modo eficaz a sua função em uma ou outra esfera da sua finalidade política, econômica ou moral, a um ente dotado de órgãos próprios de deliberação e de ação". Por sua vez, Erymá Carneiro ressalta: "Normalmente, porém, a tutela administrativa se positiva pela tomada de contas em determinadas épocas, pela nomeação e demissão de seus dirigentes por parte do Presidente da República e na faculdade de utilização dos recursos administrativos para um dos ministros a que esteja relacionada a instituição". Vimos, pois, que a personalidade jurídica é uma das mais importantes características da autarquia. Pode, no entanto, o legislador estadual (Assembléia Legislativa) criar autarquia "com personalidade jurídica"? Não. A matéria é disciplinada pelo Código Civil Brasileiro, em virtude do art. 5., XV, a, da Constituição federal de 1946, que atribui à União a competência de legislar sôbre direito civil. Com efeito, dispõe o Código Civil, no art. 13, que as pessoas jurídicas são de direito público, interno ou externo, e de direito privado. E o art. 14, do mesmo Código: "São pessoas jurídicas de direito público interno: I - A União; II - cada um dos seus Estados e o Distrito Federal; III - cada um dos municípios legalmente constituídos. O art. 16, do Código, enumera quais as pessoas jurídicas de direito privado: I - As sociedades civis, religiosas, pias, morais, científicas ou literárias,. associações de utilidade pública e as fundações; II - as sociedades mercantis. O Govêrno federal pode instituir autarquias com personalidade jurídica, mediante lei especial, como tem acontecido. Mas, o Estado do Rio, não, pois lhe falta competência para legislar sôhre direito civil. - Nem o Estado do Rio, nem qualquer outro Estado. Para que as autarquias estaduais, em todo o território nacional tenham personalidade jurídica própria, independentemente da do Estado que as criar, será necessário que a União legisle a respeito, considerando-as dotadas de personalidade jurídica. Sob o ponto de vista constitucional, as leis que criaram, respectivamente, o Departamento de Estradas de Rodagem e o Instituto de Previdência Social, devem ser modificadas e ajustadas aos mandamentos da Constituição federal e do Código Civil. Embora lhes falte personalidade jurídica própria, nem por isso, sob o ponto de vista da técnica de organização, deixam as autarquias estaduais de possuir autonomia administrativa e financeira, característica que as diferencia dos órgãos da Administração Direta e acentua o elemento descentralização de encargos. Examinemos, agora, a situação das entidades que, neste Estado do Rio de Janeiro, são comumente consideradas ou tratadas como autarquias. - Todavia. o

4 522 - que temos observado é que órgãos sem o caráter autárquioo dispõem de maiol" liberdade de ação do que as verdadeiras autarquias. Além disso, não há uniformidade de tratamento e tudo depende, em certa medida, do prestígio pessoal do dirigente da entidade. Departamento de Assistência Econômica à Lavoura Criado pela lei n. o 1.396, de 19 de dezembro de 1951, que dispõe: "Art Fica criado, com autonomia administrativa e financeira, o Departamento de Assistência Econômica à Lavoura (D.A.E.L.), subordinado ao Secretário da Agricultura, Indústria e Comércio". Instituto de Previdência Social Criado pela Lei n. O 1.449, de 26 de março de 1952, conforme o seu "Art E' criado o Instituto de.previdência Social (IPS), com personalidade jurídica, autonomia administrativa e financeira, sede e fôro na capital do Estado". Embora o I. P. S. seja uma entidade "sôlta no espaço", sem a menor subordinação a qualquer autoridade, o 3. 0 do art da Lei n.o 1.449, manda que o seu Diretor-Presidente, o Diretor-Tesoureiro e os demais membros do Conselho Diretor, tomem posse perante o Secretário das Finanças, o que, à falta de melhor esclarecimento, deixa supor tratar-se de um órgão pelo menos ligado à Secretaria das Finanças. Comissão da Central de Macabú o decreto-lei n.d 66, de 29 de dezembro de 1939, dispjõe em seu "Art E' criada, sob o nome de "Comissão de Fiscalização das Obras da Central de Macabú", uma Comissão que existirá enquanto durarem essas obras, subordinada diretamente ao Secretário de Viação e Obras Públicas". O art. 3., do citado decreto-lei, determina: "À Comissão incumbe a fiscalização do contrato lavrado a 19 de março de 1939, entre o Estado e a Casa Bratac". Mais tarde, tornado sem efeito, em virtude da guerra, o aludido contrato, o decreto-lei n.o 446, de 10 de março de 1942, em seu art. 1.0, modificou a sua denominação para "Comissão da Central de Macabú", mas sem lhe atribuir o característico de autarquia. Departamento de Estradas de Rodagem O decreto-lei n.o 1.675, de 17 de junho de 1946, dispõe: "Art O Departamento de Estradas de Rodagem do Estado do Rio de Janeiro, su},lordinado diretamente ao Secretário de Viação e Obras Públicas, é erigido em pessoa jurídica, com autonomia administrativa e financeira e passa a reger-se pelas disposições do presente decreto-lei".

5 Comissão de Águas e E8gotos A Comissão de Águas e Esgotos foi criada pela Lei n. O , de 5 de setembro de 1951, que estabelece em seu "Art Fica criada, diretamente subordinada ao Secretário de Viacão e Obras Públicas, com autonomia administrativa e financeira, a Comissão de -Águas e Esgotos (C. A. E. ), que se regerá pelas disposições desta lei". Comissão Estadual de Energia Elétrica Criada pela Lei n.o , de 17 de setembro de 1952, que dispõem em seu "Art Fica criada, diretamente subordinada ao Secretário de Viação e Obras Públicas, com autonomia administrativa e financeira, a Comissão Estadual de Energia Elétrica (C. E. E. E. ), que se regerá pelas disposições desta lei". Serviços Industriais do Norte do Estado O decreto-lei n.o 73, de 31 de janeiro de 1940, determina: "Art Os Serviços de Portos, Água, Esgotos, Viação, Energia Elétrica e outros, subordinados à Secretaria de Viação e Obras Públicas, através do Departamento dos Serviços Públicos e Industriais, constituem Serviços Industriais do Estado, organizados na forma e condições da presente lei, não se lhe aplicando legislação diversa do Estado, senão quando se lhes referir expressamente". "Art Os Serviços Industriais deverão funcionar por conta de suas receitas, não sendo permitido auxílio ou subvenção do Estado, senão: a) para ampliação ou aumento do patrimônio; b) nos dez primeiros anos de funcionamento; c) quando o superior interêsse público o exigir; d) a título de "fundo de rolamento", durante o exercício financeiro; e) para os serviços de juros e amortização dos empréstimos realizados pelo Estado para criação e ampliação dos serviços". "Art Os Serviços Industriais ficam sujeitos às normas de regulampntação federal respectiva". Mais tarde, o art. 5. da Lei n.o 1.297, de 5 de setembro de 1951 (criação da C. A. E.), dispôs que os Serviços Industriais do Norte do Estado (atual nome dos Serviços Industriais do Estado), na parte concernente à água e esgôto, passem a fazer parte da C. A. E. Conclui-se, da citação dêsses textos legais, que os Serviços Industriais do Norte do Estado não apresentam o caráter de órgão autárquico. Recentemente, houve uma proposta no sentido de subordinar os Serviços de Viação de Campos ao SERVE, sediado em Niterói. Tal medida prejudicaria Campos, pois serviços de natureza industrial não podem ser administraàos de longe. Serviços de Viação de Nite1'ói e São Gonçalo ra Lei n.o 1.241, de 20 de julho de 1951, em seu art. 1.0, autorizou o Govêrno do Estado a rescindir o contrato celebrado com a Cia. Cantareira e Viação Fluminense, para exploração dos serviços públicos de transporte de passageiros, bagagens e cargas, por meio de carris elétricos, nos municípios de Niterói e São Gonçalo.

6 - 524 o art. 3. da citada lei dispôs, ainda, que, lavrado o têrmo de resclsao daquele contrato, o Govêrno organizaria os aludidos serviços "com autonomia administrativa e financeira, e a denominação de "Serviços de Viação de Niterói e São Gonçalo", diretamente subordinados ao Secretário de Viação e Obras PÚblicas e regidos, no que couber, pelo decreto-lei n.o 73, de 31 de janeiro de 1940". O Executivo valeu-se da autorização e, pelo decreto n.o 4.104, de 12 de fe Tereiro de 1952, aprovou o regulamento dos Serviços de Viação de Niterói e São Gonçalo (SERVE). O SERVE constitui, pois, uma autarquia estadual, dirigida por um Superintendente. CONCLUSÃO Baseados na exposição acima podemos apresentar as seguintes conclusões: La - São auta1 quias estaduais: - O Departamento de Estradas de Rodagem (D.E.R.) - a Comissão de Águas e Esgotos (C.A.E.) - os Serviços de Viação de Niterói e São Gonçalo (SERVE) - o Instituto de PrE'vidência Social (I. P. S.) - a Comissão Estadual de Energia Elétrica (C. E. E. E.) - o Departamento de Assistência Econômica à Lavoura (D.A.E.L.). 2.s - As leis de criação do D. E. R. e do I. P. S. devem ser modificadas por imperativo constitucional. 3.a - As autarquias estaduais devem ter a necessária auto-determinação em iua vida interna, sem o que se tornarão ineficientes. 4.s _ E' conveniente a solicitação, junto ao Govêrno federal, para que seja aprovada uma lei atribuindo personalidade jurídica às autarquias criadas pelos Estados.