Departamento de Zoologia da Universidade de Coimbra
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- Rafael Filipe Peixoto
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1 Departamento de Zoologia da Universidade de Coimbra MICROBIOLOGIA António Verissimo Paula Morais Indução e repressão catabólica de b-galactosidase em E. coli As bactérias possuem mecanismos diversificados capazes de controlar a sua actividade celular procurando responder eficazmente às transformações operadas no meio em que se encontram, de tal modo que, a sua taxa de crescimento seja máxima em cada uma das condições ambientais. Um dos níveis mais importantes a que esse controlo é exercido é, sem dúvida, ao nível da expressão dos seus genes. De facto, quando pensamos num animal ou numa planta superior, não será difícil conceber o seu crescimento e diferenciação como uma intrincada cadeia de acontecimentos, em que alguns genes são sempre transcritos, enquanto que outros, se encontram ora "silenciosos", ora activos, obedecendo a modificações do meio intracelular e extracelular. Este conceito pode, no entanto, parecer menos óbvio para um organismo como Escherichia coli, cujo cromossoma aparenta estar num constante estado de replicação, cujo ciclo de vida pode demorar apenas 20 minutos e cuja capacidade de diferenciação "no sentido eucariota" parece ser negligenciável. Contudo, de facto, os genes de uma bactéria encontramse sob o controlo de sofisticados sistemas de regulação. Genes constitutivos e genes regulados Podemos fazer uma distinção básica entre genes cuja expressão é regulada e genes em que a expressão não o é. Aos últimos podemos apelidar de genes constitutivos. Um gene constitutivo é expresso continuamente, assim, o seu produto (uma enzima, por exemplo) é encontrado invariavelmente na célula e sempre, mais ou menos, na mesma concentração; independentemente das condições de cultivo e independentemente do seu substrato (se se tratar de uma enzima) estar ou não presente. Pelo contrário, a expressão de um gene regulado está sujeita a alterações provocadas por estímulo químico que "aparece" e "desaparece" do ambiente em que o gene se encontra. 1
2 Esta distinção não representa que a expressão de um gene constitutivo se processe de modo perfeitamente "desregulado". Existem muitos níveis de controlo para a expressão de todos os genes, inclusive os genes constitutivos. Estes podem, por exemplo, ser regulados por: a) A estrutura do promotor pode influenciar a frequência de transcrição do gene pela RNA polimerase. b) A estrutura do gene na forma de RNA mensageiro pode determinar a rapidez com que "mensagem" é digerida pelas ribonuclases celulares. c) A sequência de bases associada ao sinal AUG de início, na "mensagem" transcrita, pode influenciar a velocidade de início da tradução. Podemos no entanto, distinguir facilmente os genes constitutivos de genes regulados pois nos primeiros os controlos são invariáveis, enquanto que os controlos que modulam a expressão dos genes regulados estão sujeitos a modificações. Assim, as enzimas constitutivas (codificadas por genes constitutivos) são geralmente, aquelas que são necessárias em qualquer altura do ciclo de vida do microrganismo, como as enzimas envolvidas no metabolismo da glucose (enzimas da glicólise e da via da hexose monofosfato), uma vez que será fácil de admitir que o metabolismo da glucose é absolutamente central para a maioria das bactérias heterotróficas e portanto estas vias devem estar continuamente funcionais. Por outro lado, o metabolismo de hidratos de carbono raros, como por exemplo a lactose, arabinose ou galactose é efectuado por enzimas reguladas; sintetizar estas enzimas só quando o seu substrato se encontra presente é, do ponto de vista energético, muito mais económico. Genes regulados também codificam enzimas de grande parte das vias biossintéticas (de amino ácidos, purinas e pirimidinas, por exemplo); novamente parece "ter lógica" que estas enzimas só sejam sintetizadas quando existe carência dos seus produtos biossintéticos. Propriedades dos genes regulados É possível conceber dois mecanismos gerais que, em ocasiões específicas, limitem a expressão de genes regulados. A acção reguladora pode ser exercida ao nível da transcrição e neste caso, um gene regulado só será transcrito quando se reunirem um conjunto de condições apropriadas. Em alternativa, a acção reguladora pode ser exercida ao nível da tradução e neste caso o RNA mensageiro de um gene regulado, só será traduzido quando se reunirem as condições apropriadas. Nas bactérias existem poucos exemplos de controlo na tradução (algumas proteínas 2
3 ribossomais), na sua grande maioria os genes regulados das bactérias são controlados ao nível da transcrição. Para que a transcrição de um gene seja regulada, é necessário que alguns elementos genéticos, associados ao gene, respondam a sinais ambientais permitindo, ou não, a síntese de RNA mensageiro, a partir do gene em causa. Nas bactérias é possível encontrar duas classes fundamentais desses elementos controladores. Ambos são porções do cromossoma e situam-se sempre muito próximo do gene (ou genes) que controlam. Um designa-se por promotor e o outro designa-se por operador. Um promotor é uma sequência de nucleótidos que é reconhecida pela RNA polimerase (DNA dependente), a ligação promotor - polimerase inicia a transcrição do gene estrutural vizinho. Em muitos sentidos a função do promotor de um gene regulado é semelhante à do promotor do gene constitutivo. Provavelmente, a maior diferença entre os dois tipos de promotores é que os promotores de genes constitutivos têm propriedades de iniciação relativamente invariáveis, enquanto que, os promotores de genes regulados encontram-se mais ou menos activos a promover a transcrição dependendo da presença, ou da ausência de proteínas específicas, conhecidas por proteínas reguladoras. Um operador é também uma sequência de nucleótidos que interage com uma proteína. Esta proteína também se designa por reguladora; a interacção operador - proteína reguladora impede, ou promove, dependendo do operador em questão, a transcrição do(s) gene(s) regulado(s). A distinção fundamental entre operador e promotor é que o operador, contrariamente ao promotor, não é um local de ligação da RNA polimerase. Inicialmente, o termo operador foi introduzido por F. Jacob e J. Monod como sendo o elemento regulador de um operão. Um operão é um conjunto de genes associados (quer fisicamente, quer na função das proteínas codificadas) que são transcritos numa só molécula de RNA mensageiro, sendo portanto, todos eles regulados pelos mesmos elementos de controlo. Recentemente, foram encontrados genes isolados que possuem operador com a mesma função dos seus congéneres nos operões. Por isso, por vezes, esses genes isolados são também designados por operão (com um só gene estrutural). De qualquer modo podemos dizer que um operador interage com uma molécula reguladora e situa-se sempre entre o promotor e o(s) gene(s) controlado(s). 3
4 Moléculas envolvidas na regulação As proteínas reguladoras (também chamadas por reguladores, proteínas afectoras, ou simplesmente por afectores) têm um papel central nos processos de regulação da transcrição. Elas têm a capacidade de se ligar especificamente aos elementos de controlo; a especificidade reside na sua conformação tridimensional. Se a transcrição de um gene depende da ligação ou dissociação da proteína reguladora ao, ou do, elemento genético de controlo, temos obviamente que considerar um outro tipo de moléculas que "governam" quando tal ligação ou dissociação deve ocorrer. Este novo tipo de molécula designa-se por molécula efectora. As moléculas efectoras são sempre moléculas pequenas; geralmente são um açúcar, um amino ácido ou um nucleótido. Estas moléculas têm a capacidade de se ligar às proteínas reguladoras, alterandolhes a capacidade de interacção com o elemento de controlo. Uma vez que a molécula reguladora é uma proteína, ela tem que ser codificada por um gene. Os genes que codificam proteínas reguladoras tomam o nome de genes reguladores. Podemos então, definir quatro elementos básicos essenciais para a regulação da expressão genética a nível da transcrição nas bactérias: 1. O gene estrutural regulado (ou um conjunto de genes - operão). 2. Os elementos genéticos de controlo (incluem o promotor e o operador). 3. A proteína reguladora (e o seu gene estrutural - o gene regulador). 4. O efector. De facto, todos os mecanismos de regulação genética ao nível considerado, mesmo os aparentemente mais complexos, podem ser explicados pelas interacções entre estes quatro tipos de moléculas ou regiões do DNA. Operões induzíveis e operões repressíveis Operões, tais como o operão lac (lactose), o operão gal (galactose) e o operão ara (arabinose) são designados por operões induzíveis; as taxas máximas de transcrição só ocorrem se os seus açúcares efectores estiverem presentes. Neste caso, os efectores podem denominar-se indutores. Operões tais como o operão trp (triptofano), o operão his (histidina) e o operão arg (arginina) são denominados operões repressíveis; nestes casos, as taxas máximas de transcrição ocorrem até que os seus aminoácidos efectores atingem uma concentração crítica, nesse ponto, a transcrição é inibida. Neste caso os efectores podem denominar-se correpressores. Ambos os mecanismos de regulação cumprem, claramente, o mesmo objectivo, embora de 4
5 forma recíproca. Tipicamente, os operões induzíveis das bactérias codificam enzimas "não necessárias" (não requeridas para sobrevivência directa); usualmente são enzimas envolvidas no catabolismo de um substrato nem sempre presente no meio. Assim, "tem lógica" que, por exemplo, as enzimas necessárias para a utilização da arabinose sejam induzíveis pela própria arabinose; este açúcar só raramente é "encontrado" pelas bactérias portanto, do ponto de vista energético, é mais eficiente produzir as enzimas para a degradação da arabinose só "por pedido". Pelo contrário, os operões repressíveis codificam enzimas "necessárias", as enzimas que participam em processos biossintéticos. Por exemplo, a histidina é constantemente requerida por uma célula em crescimento e assim, o operão his é transcrito, mas por vezes, os níveis de histidina podem ser muito altos (como por exemplo, quando o crescimento cessa ou, se o meio de cultivo contém este aminoácido), nestas condições a expressão do operão é reprimida. O operão lac e a utilização da lactose A utilização de lactose por células de E. coli depende da expressão genética do conjunto de genes que constituem o operão lac. Este operão é constituido por três genes estruturais : a) o gene lac Z; que codifica a ß-galactosidase, a enzima que cliva a lactose em glucose e galactose. b) o gene lac Y; que codifica a proteína M, uma proteína membranar que aumenta a permeabilidade da célula à lactose. c) o gene lac A; que codifica uma transacetilase, uma enzima de função desconhecida. Este operão é hoje um dos mais bem conhecidos, por isso podemos apontar as suas características principais. 1. O operão lac é regulado por controlo negativo; quer isto dizer que, quando a proteína reguladora, conhecida por repressor lac, interage com o operão a transcrição é inibida. O repressor é codificado pelo gene regulador lac I, que se situa no cromossoma, imediatamente antes do operão. 2. O repressor lac liga-se ao operador lac inibindo a transcrição, a menos que, o efector (lactose ou um análogo) esteja presente. Assim, na presença do efector, o repressor deixa o operador, permitindo a transcrição, por isso, o operão lac é induzível. 3. O operão lac é também regulado por controlo positivo o que quer dizer que, quando interage com uma proteína reguladora conhecida por CAP (catabolite activator protein), a 5
6 transcrição é activada e só então ocorre à sua taxa máxima. O gene regulador que codifica CAP é crp e encontra-se distante do operão lac. 4. A proteína reguladora CAP liga-se a uma zona do promotor lac, activando a transcrição só quando glucose está ausente ou se encontra em níveis muito baixos. A glucose causa a dissociação de CAP do elemento de controlo e nestas condições a taxa de transcrição é baixa. Este efeito é designado por repressão catabólica. A ligação de CAP ao promotor só ocorre quando os níveis de AMP cíclico intracelular são altos, o que acontece só quando a glucose está ausente do meio. Assim, podemos dizer que a principal função do controlo do operão lac é, como parece ser a "lógica" da regulação genética, uma boa gestão dos recursos que são apresentados à bactéria. No caso deste operão, ele só será expresso eficazmente se houver uma boa razão, isto é, a lactose ser a única fonte de carbono e energia à disposição da bactéria. Em termos evolutivos, a origem de um sistema como este é difícil de visualizar. Se assumirmos que, em organismos primitivos, os diferentes genes do operão se encontravam dispersos pelo cromossoma, não é na verdade fácil antever como estes diversos fragmentos se associaram e se apresentam hoje próximos uns dos outros e sob o mesmo controlo. No entanto, parece lógico supor que, quando surgiu um arranjo do tipo operão, ele terá conferido uma tão grande vantagem adaptativa que, sem dúvida alguma, terá sido "imediatamente" conservada. Influência da natureza da fonte de carbono na síntese de ß galactosidase Fundamento A detecção da enzima, em células provenientes de meios de cultura com diferentes hidratos de carbono, será feita com o auxílio de um substrato análogo à lactose: o ortonitrofenil-ß-galactosídeo (onpg) (Fig.6) Este composto, apesar de análogo de lactose, não induz a síntese de ß-galactosidase, mas serve de substrato; quando ocorre hidrólise, a enzima liberta orto-nitrofenol (onp) que é um composto de cor amarela. Assim, a concentração de onp formado pela actividade da enzima, pode ser facilmente quantificada por colorimetria. Uma vez que a ß-galactosidase é uma enzima intracelular, as células serão tratadas com tolueno (substância que provoca ruptura na membrana celular), para que o substrato fique acessível à enzima. 6
7 Equipamento, culturas e soluções Incubadora orbital com temperatura e agitação reguláveis Centrífuga refrigerada; rotor médio Tubos de centrífuga de 45 ml Balança de pratos Espectrofotómetro; "cuvettes" Pipetas 5 frascos tipo "Erlenmeyer", de 50 ml Tubos de ensaio Relógio "Vortex" 1 cultura de E. coli em MB+glucose 0.4%, com 7h de idade; D.O.= cultura de E. coli em MB+lactose 0.5%, com 7h de idade; D.O.= cultura de E. coli em MB+glucose 0.4%+lactose 0.5%, com 7h de idade;d.o.=0.2 Soro fisiológico (NaCl 0.9%) frio Água fria Tolueno Tampão fosfato; ph 7,2 Solução de onpg 0,05 M Solução de Na 2 CO 3 1M Banho de gelo Procedimento A. Obtenção de extractos celulares de E. coli cultivada com os diferentes hidratos de carbono Cerca de 40 ml de cada uma das culturas são colocados em respectivos tubos de centrífuga 1. Os seus pesos devem ser equilibrados com auxílio de uma balança; centrifuga- 1 Os tubos devem ser cuidadosamente rotulados, para que se possa distinguir a origem de cada uma das suspensões celulares. 7
8 se a 9000 g, durante 10 min., à temperatura de 4-6 C. O sobrenadante obtido é constituido pelo meio onde se procedeu ao cultivo das bactérias; o sedimento é constituido, essencialmente, por células intactas de E. coli. Despreza-se o sobrenadante de cada um dos tubos e ressuspende-se cada um dos sedimentos em 40 ml de soro fisiológico 2. Os diferentes tubos, depois de novamente equilibrados, são centrifugados nas mesmas condições da centrifugação anterior. Esta ressuspensão em soro fisiológico funciona como lavagem, na tentativa de remover a maior parte dos compostos que adsorvem à superfície das células. A operação pode ser repetida por mais de uma vez. Os sobrenadantes são de novo desprezados e cada um dos sedimentos celulares é ressuspenso em 10 ml de água fria. 3 A suspensão constituída por células de E. coli cultivadas em lactose é dividida em duas partes iguais. A cada uma das suspensões, com excepção de uma das porções de 5 ml de células cultivadas em lactose, é adicionado 1 ml de tolueno e são agitadas vigorosamente. O tolueno provoca a ruptura celular, com o consequente esvaziamento dos conteúdos celulares. Assim obtemos 4 suspensões de extractos celulares de E. coli: 1. Extracto celular de E.coli cultivada com glucose 0,4%. 2. Extracto celular de E.coli cultivada com glucose 0,4% e com lactose 0,5%. 3. Extracto celular de E.coli cultivada com lactose 0,5%. 4. Suspensão de células "intactas" de E. coli cultivadas em lactose 0,5%. E. coli B. Detecção da actividade da ß-galactosidase nos diferentes extractos celulares de 1- Em cada um de 5 "Erlenmeyers" de 50 ml, colocar 12 ml de tampão fosfato e 1.5 ml de onpg 0,05 M. 2- Incubar durante 15 min. a 37 C com agitação de100 rot./min.. 2 Deve ter-se a precaução de não contaminar os diferentes sedimentos, uns com os outros. Assim devem usarse diferentes pipetas para diferentes sedimentos. 3 Os tubos contendo as diferentes suspensões celulares devem ser mantidos num banho de gelo até à sua utilização. 8
9 3- Adicionar 2 ml de cada uma das suspensões celulares aos "Erlenmeyers" respectivos 4. Agitar. Iniciar a contagem do tempo. Imediatamente após cada uma das adições retirar 1 ml de amostra para tubos de ensaio que contêm 1 ml de Na 2 CO 3 1 M e agitar. 4- Continuar a incubação. 5- De 10 em 10 min., durante 50 min., retirar amostras de 1 ml de cada um dos "Erlenmeyers" para tubos de ensaio 5 que contêm 1 ml de Na 2 CO 3 1M. Agitar. 6- Adicionar 8ml de H 2 O a cada um dos tubos de ensaio. Agitar. 7- Determinar a absorvência das soluções dos diferentes tubos a 420 nm, utilizando água como referência, para acertar o zero do espectrofotómetro. 8- Relacionar a absorvência determinada com a concentração de onp através de uma curva padrão para onp. Realização de uma curva padrão para onp. 1- Preparar a seguinte série de tubos: Tubo onp 1 mm H 2 O Na 2 CO 3 1 M (ml) (ml) (ml) 1 0,25 8,75 1,0 2 0,50 8,50 " 3 0,75 8,25 " 4 1,00 8,00 " 5 1,50 7,50 " 6 2,00 7,00 " 7 2,50 6,50 " 8 0,00 9,00 " 2- Misturar bem o conteúdo de cada tubo e medir a absorvência a 420 nm, usando a solução do tubo 8 como referência, para ajustar o zero do espectrofotómetro. 3- Construir uma curva padrão para onp, relacionando a absorvência determinada, com a respectiva concentração de onp. 4 Os "Erlenmeyers" devem ser rotulados, indicando a natureza do extracto celular que cada um contem. 5 Os tubos devem ser rotulados, indicando a proveniência da amostra e o tempo de recolha. 9
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