Guimarães, a cidade que adotou uma orquestra
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- Alfredo Marroquim Rijo
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1 Guimarães, a cidade que adotou uma orquestra 2012 é o ano de Guimarães. Nasceu uma nova cidade, uma nova cultura, uma nova Orquestra. É a Orquestra Estúdio e está recheada de culturas, sinfonias, juventude e muito amor à música. Mateo Giacosa nasceu em Itália, mas acredita que Guimarães o adotou. Resta saber por quanto tempo. O sonho do músico é que a Orquestra tenha vindo para ficar. Mais de 300 músicos concorreram por um lugar na Orquestra Estúdio. Como foi o dia que soube que entrava? O dia da audição? Bem, o dia anterior foi de viagem. Vim da Itália. Eu sou italiano. Quando cheguei, vim para um hotel, até aí tudo bem Depois lá vim fazer as provas. Não estava muita gente, porque a concorrer para as violas estavam 3 pessoas, penso eu. Cheguei lá, tive que fazer aquecimento e finalmente chamaram-me. Era o meu momento. Quando cheguei, estava toda a comissão É assim que se diz, não é? E pronto, tive que tocar. Mas teve medo? Não foi bem medo. Foi um nervoso miudinho. É que em cinco minutos tínhamos que tocar e nestes 5 minutos o júri decidia como iria ser a nossa vida daí em diante. Bem, se calhar senti algum medo. Foi um pequeno concerto com piano forte e eu toco viola. Toquei três ou quatro linhas. Umas mais lentas e com outras mais mexidas. Tive que pensar: vamos lá, é agora. Tivemos também uma prova em que nos deram uma partitura nova e tens que a tocar à primeira, sem a estudar, em 30 segundos. Uma espécie de improviso. E antes de vires para cá viver, o que é que lhe causava mais medo? Quando cheguei de Itália, não sabia bem o que era o projeto. Era tudo muito vago. Mas nunca tive medo. A primeira questão foi encontrar um sítio onde viver. E isso foi resolvido sem muito stress. Depois, claro, não sabes que pessoas vais encontrar. Não sabes o idioma. E não sabes como vai ser a vida de Orquestra. Mas não foi muito complicado. A verdade é que parti sozinho da Itália. Aliás, sozinho não, vinha eu e a minha viola. (risos)
2 Aqui teve oportunidade de conhecer jovens músicos de toda a europa. E com eles passaram já quase um ano. As relações ultrapassam os limites dos palcos/auditórios? Claro! Eu fui muito sortudo. Encontrei aqui a minha namorada. Encontrei aqui muita gente, muitos amigos Sei que alguns deles são para a vida. Mas agora está a ser um pouco difícil, porque isto está a acabar. Algumas pessoas encontraram outro trabalho, noutros sítios, portanto muita gente foi embora da Orquestra. Mas enfim E gostei muito dos portugueses. Nunca fui muito problemático nas relações com os outros. E também, quando acabamos os ensaios, normalmente vamos beber qualquer coisa, todos juntos Juntos tiveram a oportunidade de conhecer uma cidade nova Sim, porque nesta Orquestra só duas pessoas são de Guimarães, portanto descobrimos a cidades juntos, apesar de a maior parte serem portugueses. Mas somos de muitos sítios. Somos italianos, ingleses, polacos E, por exemplo, a minha namorada é italiana, toca harpa e encontrou um trabalho no Porto. Vai ser professora. Mas toda a gente espera que a Orquestra continue. Vai ser muito complicado. Esperamos que sim porque está muita gente junta, aqui, não só pelo trabalho. Acha que isto lhe vai abrir portas no futuro? Sim. Espero que sim. Mas o ideal seria que a Orquestra continuasse. Eu tenho esperança. E tem planos para 2013? Não. Agora tenho provas. Há uns dias fiz uma mas não correu muito bem. Ainda tenho duas marcadas em Itália. E pode ser que consiga um trabalho aqui em Portugal, que não neste Orquestra. Nunca se sabe. A minha namorada encontrou Agora pronto, temos que ver isso. Qual foi a melhor lição que o Maestro Rui Massena lhe ensinou durante este ano? Hum Acho que é percetível que ele gosta muito de dirigir a Orquestra. A maneira como a dirige é diferente da dos típicos maestros. Há qualquer coisa nele que nos diverte imenso. Apesar de trabalharmos muito, e às vezes é muito pesado, o Maestro torna tudo mais fácil. Se há coisa que o maestro Massena sabe fazer é tirar a energia da Orquestra. Quando ele percebe que estamos com muita energia, ele aproveita isso como nenhum outro maestro. Isto é o mais importante. E, claro, a relação que ele tem connosco é, obviamente, formal, mas também nos leva a beber um copo, por exemplo. (risos) Desta forma todos temos mais liberdade de expressão. Claro que toda a gente tem a sua opinião, mas estou a falar da minha experiência Foi muito diferente. Eu e o maestro temos uma relação muito amigável. Quando acordo, não penso Oh, não, vou ter que ir trabalhar Nada disso. É mais Vamos lá ensaiar, está lá o Maestro. Há muito entusiasmo e toda a gente se sente envolvida nesse espírito. É muito mais fácil trabalhar
3 com ele do que com qualquer outro maestro. Temos um ambiente informal, percebes? É muito mais fácil para nós. Agora com as gravações, é muito pesado, há muito trabalho Os ensaios acabam sempre muito mais tarde. E com o Maestro Ele motiva-vos Exatamente. Ele sabe bem com fazer isto. Ele é, claramente, diferente de todos os outros maestros. Ele é o maestro principal desta Orquestra. A Orquestra nasceu com ele. Isso leva a que eu goste muito deste tipo de trabalho. Como é a rotina diária de um músico da Orquestra Estúdio? De manhã até à noite? (risos) Ou não há rotina? Não, não há. Ou depende muito do momento. Ultimamente temos os ensaios que começam às 9h30 da manhã e que supostamente acabavam às 14h, mas normalmente acabam muito mais tarde. Na realidade, é a vida perfeita para um músico: Acordar, ensaiar, comer e nos tempos livres é, pelo menos para mim, para estudar para o quarteto. Porque temos formação de música com a Câmara. Mas claro que também há tempo para ser livre. E à noite vamos, claro, para o Largo da Oliveira, todos juntos Vamos beber qualquer coisa, ou comer uns hambúrgueres, normalmente. Lá com o meu amigo Luís que tem um bar, o Salado bar. Mas agora também está a acabar temos menos coisas para fazer. Só temos quatro concertos agendados com toda a Orquestra. Temos dias que podem ser livres ou dias que podemos ter ensaios o dia todo. Não temos uma rotina bem definida. E a experiência em parte torna-se boa por isso mesmo. Acha que se pode chamar a este projeto uma Aldeia Erasmus para músicos? Ou é mais do que isso? Não. É muito mais do que isso. Isto não é uma Orquestra de Verão, se é que posso dizer isto assim. Todo o ano trabalhamos muito e temos responsabilidades que, normalmente, os Erasmus não têm. Isto é mesmo um trabalho, não são férias. Contudo, em certos pontos aproxima-se um pouco disso. Ou seja, há um bocadinho de Erasmus na Orquestra Estúdio. Há um lado divertido, leve. Mas para mim isto é um trabalho muito sério, talvez complicado, mas que eu adoro. Não, não é nada um Erasmus. E claro que não quero falar mal do programa Erasmus. É só que isto é mesmo um trabalho. Se calhar para alguns estudantes integrar a Orquestra foi, então, uma forma de se profissionalizarem Sim, também há casos desses. Mas a maior parte da Orquestra já tem o seu Mestrado. É uma Orquestra profissional. Mas destaco que há duas vertentes: temos a profissional, mas também nos podemos divertir.
4 É uma experiência única Sim, estou a gostar muito. A minha esperança e a de toda a gente é que isto continue. Neste momento é muito difícil fazer o nosso trabalho, exercê-lo. E além disso é difícil haver uma continuidade destas, um ano. Normalmente trabalhos cinco dias num sítio, três dias noutro, um mês, se tiveres sorte. Aqui divertes-te imenso, podes conhecer pessoas e fazer aquilo que gostas. Mas viver longe de casa é sempre desafiante. Em Guimarães, o que é que te faz sentir em casa? A Orquestra, a namorada, os vimaranenses. São muito acolhedores. Na rua reconhecemnos e dizem Ah! É da Orquestra Estúdio!. Quando cheguei, as primeiras duas semanas foram para me ambientar. Depois o idioma foi melhorando. Agora, às vezes vou, sei lá, ao talho, e recebo sempre um Olá! Tudo bem?. É uma grande família. Claro que é um desafio sair de casa, mas quando chegas a um sítio em que todas pessoas são como família, é muito fácil. E todas as pessoas que eu encontrei são muito disponíveis. Acho que é essa a melhor palavra. Durante este ano vários concertos mostraram-nos que as Orquestras podem integrar outros tipos de música. Um exemplo foi o concerto com os Expensive Soul. Foi fácil entrar num mundo um pouco mais comercial? Sim, foi fácil, por dois motivos. O primeiro é que estamos a falar de uma Orquestra muito jovem, ou seja, o pop tem uma linguagem muita próxima da nossa. O segundo é o maestro Massena, ele sabe realmente fazer as coisas. Alguns maestros poderiam não saber o que fazer naquela situação. O mundo do maestro é a música clássica, claro, mas também há um pouco de pop, jazz Os Expensive Soul e os Jaguar Band também foram muito acessíveis. Porém, no palco foi um pouco complicado. O som era muito alto para nós. Mas o concerto foi maravilhoso. Estava muita gente. Até o grupo dos Nicolinos. Além disso, foi um tipo de público diferente Claro, sem dúvida. O público estava lá pelos Expensive, mas todos gostaram da Orquestra. Depois deste concerto muita gente na rua nos dizia Ah! Tu foste tocar com os Expensive Soul! Very Good! Não foi um concerto de música clássica, e a música clássica suscita outro tipo de coisas. Depois tivemos o concerto com o Carreras e muitos outros, mas este foi o melhor. Estavam seis mil e tal pessoas. Muita gente ficou a conhecer bem a Orquestra. Sim, mas os nossos concertos estão quase sempre cheios. Estamos a trabalhar muito bem. Os vimaranenses, aliás, todos os portugueses estão gostar de nós. É claro que o concerto com os Expensive Soul foi o mais mediático Estava a RTP, algumas rádios.
5 Para nós os Expensive foram uma novidade, mas para os músicos portugueses da Orquestra que já os conheciam era muito entusiasmante, até pediram autógrafos. E os Expensive deram-se bem com a Orquestra? Sim, depois do concerto fui à discoteca com os Expensive Soul, com o Demo e o New Max. Eles ficaram muito contentes com o concerto e adoraram a Orquestra. Até vão lançar um DVD com o concerto Sim, para breve. Isso tem que sair. Estamos todos à espera do DVD. Em relação a outros concertos Teve a oportunidade de tocar com grandes nomes da música como, por exemplo, José Carreras, Elisabete Matos... O que é que isso te ensinou? O concerto com a Elisabete Matos foi muito complicado. Foi o primeiro da Orquestra, em Dezembro de O problema é que quando se toca com cantores, são muitas músicas. Tocamos músicas italianas, alemãs, francesas A Orquestra só tocava junta há 15 dias, era pouco tempo. Foram peças muito complicadas para nós, naquele momento. Com o José Carreras foi outro caso difícil. Tocamos com um dos deuses da música erudita dos últimos 40 anos e foi, portanto, uma experiência muito positiva. Não só pelo José Carreras, mas também pela Sofia Escobar e pela Dora Rodrigues. Foram maravilhosas. Trabalhar com este tipo de pessoas é importante. Não é qualquer músico que pode ter isso no Curriculum. O nome dos artistas não coloca também alguma pressão sobre os músicos? Não. Agora a Orquestra já tem a sua personalidade e sabemos tocar juntos. Claro que, quando o José Carreras chega, temos efetivamente que tocar bem. Mas a Orquestra já tem uma boa preparação para fazer estas coisas, sem medo. O primeiro concerto com a Elisabete Matos foi muito mais complicado porque a Orquestra era nova, um bebé. Agora temos experiência. A Orquestra já é adulta? (risos) Não é adulta, mas tem uma base forma própria. Cada músico que chega tem a sua força e juntos sabemos adaptarmo-nos a ela. Claro que podemos fazer sempre melhor.se a Orquestra continuar. Já tocamos muito bem, já fizemos muitas coisas. A Orquestra tem uma personalidade própria muito forte, digo eu.
6 Guimarães tem um estilo muito único. As pessoas são muito apaixonadas pela sua terra. Diz-se que é vimaranense quem aqui nasce ou quem aqui acha lar. Já sentiste isso? Não sei Eu nasci em Itália. Só que na verdade sinto em mim uma presença muito forte de Guimarães. O público vimaranense sempre foi maravilhoso. Por exemplo, no final do primeiro concerto, tocamos o hino do Vitória. Acho que nesse momento os vimaranenses enamoraram-se pela Orquestra. Quando vou comprar fruta, perguntam-me Então? Como está a correr?. Não sei explicar bem isto, mas acho que Guimarães me adotou. E adotou a Orquestra. Nos bares, nos restaurantes, todos que sabem que faço parte da Orquestra perguntam-me como está correr, se isto vai continuar Dizem que Guimarães não pode viver sem a Orquestra. Eu digo que sim, claro, que vamos ver. Mais do que como músico, como vimaranense sentes que fazes parte? Sim, sim. Eu vou a muitos concertos. Apesar de termos muito trabalho, tento arranjar tempo para desfrutar. Gostei muito da Feira Medieval, da noite do Pinheiro (que está quase a regressar). Sim, claro, eu faço parte. Mais do que como músico, como se fosse da cidade. Sinto-me envolvido em qualquer coisa que fervilha. Um espírito muito forte. O escritor português, José Saramago, Nobel da Literatura, escreveu uma vez que Guimarães é o sítio perfeito para iniciar um namoro. De que forma encontraste o amor em Guimarães? Sim. Em primeiro lugar, com a minha namorada, claro. Mas quando se tem a minha vida, e eu já tenho 30 anos, é difícil. Passei os últimos 8 anos com outra Orquestra, com projetos que duravam 5 dias, por exemplo. Em Guimarães, nasceu outra vez o amor pelo meu trabalho. Nem é bem trabalho. Nasceu outra vez o amor pela minha vida. Quando se faz este tipo de trabalho, 5 dias num sítio, 3 dias noutro, a paixão cessa um pouco. Mas agora resta-me agradecer à Orquestra, ao maestro, a toda a gente Aqui nasceu outra vez o meu amor. Não tinha acabado, mas em Guimarães amplificou-se. Tenho esta Orquestra que é, também, a minha Orquestra. Nasceu comigo. Nasceu com toda a gente. E sim, o meu amor pela música nasceu outra vez. Mafalda Oliveira, turma 5
INQ E depois a viagem, tem algum pormenor assim que se lembre que seja importante contar?
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