USO FERTILIZANTE DE CINZA VEGETAL E LODO DE ESGOTO PARA A PRODUÇÃO DO ALGODOEIRO 'cv. RUBI'. PARTE 1. VARIÁVEIS DE CRESCIMENTO

Transcrição

1 USO FERTILIZANTE DE CINZA VEGETAL E LODO DE ESGOTO PARA A PRODUÇÃO DO ALGODOEIRO 'cv. RUBI'. PARTE 1. VARIÁVEIS DE CRESCIMENTO Fernanda Fernandes de Melo Lopes (UFCG), Rosiane de Lourdes Silva de Lima (UNESP), Robson César Albuquerque (UEPB), Maria Isabel de Lima Silva (UEPB), Napoleão Esberardo de Macedo Beltrão (Embrapa Algodão) RESUMO - O uso fertilizante de produtos orgânicos tais como cinza vegetal e lodo de esgoto podem contribuir para a otimização do crescimento da planta e reduzir os custos de produção. A pesquisa objetivou avaliar os efeitos da aplicação de cinza vegetal e lodo de esgoto no crescimento de plantas do algodoeiro. O experimento foi conduzido na Embrapa Algodão. Adotou-se o delineamento em blocos casualizados com 3 repetições. Os tratamentos foram dispostos em esquema fatorial 5 x 5, tendo no primeiro fator os efeitos das doses de lodo de esgoto (0; 1,5; 3,0; 4,5 e 6,0 t/ha) e no segundo as doses de cinza vegetal (0; 1,5; 3,0; 4,5 e 6,0 t/ha). O crescimento da planta em altura, número de folhas, diâmetro caulinar e área foliar foram significativamente influenciados pela adição de lodo de esgoto e cinza vegetal a composição do solo. A aplicação de 6,0 t/há de lodo de esgoto e cinza vegetal foram adequadas para o crescimento do algodoeiro. A recomendação de doses de lodo de esgoto e cinza vegetal baseada nas necessidades da cultura poderá ocasionar perdas de nutrientes, principalmente aqueles em quantidades superiores a exemplo do Ca, Mg e K para a cinza e do N para o lodo. Palavras-chave: Gossypium hirsutum, adubação orgânica, crescimento de plantas. FERTILIZING USAGE OF VEGETAL ASHES AND DRAIN MUD FOR BRS RUBI COTTON PRODUCTION. PART 1. GROWING VARIABLES. ABSTRACT - The fertilizing usage of organic products such as vegetal ashes and drain mud may contribute to plant growing optimization and reduce production costs. This research has evaluated the effects of vegetal ashes and drain mud application on cotton plants growing. The experiment was carried out at Embrapa Algodão and set on casual block design with three repetitions. Treatments consisted on factorial scheme 5 x 5, having as first factor the effects of the drain mud doses, (0; 1,5; 3,0; 4,5 e 6,0 t/ha) and the second, the vegetal ashes doses (0; 1,5; 3,0; 4,5 e 6,0 t/ha). The application of 6 tons per hectare of drain mud and vegetal ashes were adequate to cotton growing. High amounts of organic resources such as Ca, Mg and K for ashes and N for mud, may intoxicate Key words: Gossypium hirsutum, organic fertilization, plant growing. INTRODUÇÃO A viabilidade do uso de resíduos orgânicos tais como lodo de esgoto e cinza vegetal na agricultura estão relacionados com a origem do resíduo e o tratamento que este é submetido, bem como, do conhecimento a priori das características químicas como disponibilidade de nutrientes, presença ou ausência de metais pesados dentre outras. Em conseqüência de sua riqueza nutricional, principalmente N e P, a utilização de biossólidos em terras agriculturáveis pode ser uma alternativa de fertilizante. No entanto são poucas

2 as informações disponíveis na literatura que relacionam o crescimento da planta com a aplicação deste resíduo (VIEIRA e CARDOSO, 2003). No Brasil, embora as pesquisas ainda se encontrem em fase incipiente, diversos trabalhos já demonstram os benefícios da aplicação do lodo de esgoto no aumento do teor de nutrientes (SILVA et al., 2002), carbono orgânico e da CTC (SILVA et al., 2001). A esse respeito Vieira e Cardoso, (2003), mencionam que as quantidades de lodo de esgoto a serem aplicadas ao solo devem ser diferenciadas tanto no período de estiagem, como nos períodos das águas, por ser o lodo um resíduo rico em N, que pode ser rapidamente lixiviado nos períodos de intensa precipitação. Quanto a cinza vegetal este é um resíduo proveniente da queima da madeira que dependendo de sua origem pode apresentar elevados teores de K, P, Ca e Mg, que podem ser utilizado como suplemento nutricional dependendo do balanço nutricional apresentado pelo solo e das exigências da cultura (VOUNDINKANA e VERLOO, 1998). A aplicação de cinza vegetal em plantios agrícolas apresenta-se como uma importante oportunidade de restituição de parte dos nutrientes removidos pelas culturas. A reciclagem das cinzas reduz a necessidade do uso de fertilizantes comerciais, contribuindo com a redução da acidificação do solo e aumento do suprimento de cálcio (ZIMMERMANN e FREY, 2002). A cinza vegetal tipicamente apresenta valores elevados de ph, concentração de nutrientes tais como P, K Ca e Mg e micronutrientes essenciais para o crescimento das plantas (ZHANG e NANZYO, 2002; MATERECHERA e MKHABELA, 2002). Pesquisas realizadas, incluindo experimentos em casa de vegetação e em condições de campo, têm demonstrado que a reciclagem dos nutrientes contidos na cinza vegetal através da exploração agrícola apresenta grande praticidade, contudo é necessário conhecer a priori a composição química deste resíduo e a dose adequada para cada cultura, evitando-se toxidez nutricional ou carência pelo excesso de alguns nutrientes como Ca e Mg que competem significativamente com outros pelos sítios ativos de absorção. A flexibilidade da utilização da cinza vegetal como fonte de nutrientes para as culturas depende da fertilidade do solo, das exigências nutricionais e da origem da cinza. A cinza vegetal apresenta grande potencial para ser usada como neutralizador da acidez do solo e como suplemento de nutrientes, principalmente para solos tropicais de baixa fertilidade. Neste sentido esta pesquisa objetivou avaliar os efeitos da aplicação de lodo de esgoto e cinza vegetal no crescimento do algodoeiro, cultivar Rubi. MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi conduzido em casa de vegetação, na Embrapa Algodão, Campina Grande, PB, no período de novembro a fevereiro de 2005, utilizando sementes da cultivar Rubi. Adotou-se delineamento em blocos ao acaso, com 3 repetições e 10 tratamentos em distribuição fatorial 5 x 5, sendo os fatores 5 doses de lodo de esgoto (0, 1,5, 3,0, 4,5 e 6,0 t/ha) e 5 doses de cinza vegetal (0, 1,5, 3,0, 4,5 e 6,0 t/ha). A parcela experimental foi constituída por 1 vaso, contendo uma planta cada. A análise química dos materiais utilizados como fertilizantes orgânicos encontra-se na Tabela 1.

3 Tabela 1. Composição química das fontes de matéria orgânica utilizada na formulação dos substratos avaliados. Campina Grande, PB, 2004 Material N P K Ca Mg Matéria orgânica Cinzas % Lodo de esgoto 4,38 2,76 0,21 1,61 2,40 42,38 75,18 Cinza vegetal 0,52 3,37 4,85 26,47 2,73 1,94 97,68 Análises feitas no Laboratório de Solos da Embrapa Algodão, A adubação orgânica das plantas foi realizada 48 horas antes do plantio incorporando a cinza vegetal e o lodo de esgoto ao solo. Para o cultivo das plantas utilizaram-se vasos com capacidade para 20 litros. Foram utilizadas sementes de algodão da cultivar Rubi. Aos 110 dias após a germinação foram determinadas as seguintes variáveis de produção: altura da planta (cm), número de folhas, diâmetro caulinar (mm), e área foliar (cm 2 ). Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância e análise de regressão polinomial para comparar os efeitos das doses de lodo de esgoto e cinza vegetal, segundo recomendações de Santos et al. (2003). RESULTADOS E DISCUSSÃO A aplicação de ambas as fontes de matéria orgânica, lodo de esgoto e cinza vegetal, a composição do solo incrementaram significativamente o crescimento da planta em altura, número de folhas, diâmetro caulinar e área foliar (Fig. 1). A altura da planta foi influenciada pela aplicação de ambas as fontes de matéria orgânica, observando-se diferenças significativas entre a maior e a menor dose utilizada. Este resultado sugere que a elevada disponibilidade de N presente no lodo de esgoto (Quadro 1) podem ter favorecido o crescimento da planta em altura uma vez que o N participa diretamente na construção de novos tecidos e expansão celular. Em geral os lodos de esgoto são ricos em N, o que significa que possuem alto potencial para serem utilizados como fertilizantes nitrogenados; este N está presente em várias formas orgânicas e inorgânicas e nem todas são disponíveis para a nutrição da planta. Neste sentido, a recomendação de adubação, com lodo de esgoto, a ser aplicada depende dos teores de N em sua composição e das necessidades da cultura (MELO et al., 2001). Por outro lado, o crescimento em produção de folhas não apresentou grandes diferenças entre as doses aplicadas tanto de cinza vegetal como de lodo de esgoto, observando-se também tendência de estabilidade entre os valores obtidos com a adição das doses ao solo. O número médio de folhas por planta não foi influenciado pela aplicação das fontes de matéria orgânica ao solo, obtendo-se valores médios em torno de 30 folhas por planta. Apesar de ambas as fontes de matéria orgânica apresentarem quantidades expressivas de nutrientes em sua composição química (Quadro 1), a absorção e incorporação destes nutrientes em moléculas de carbono, aminoácidos, proteínas, enzimas e co-fatores estrutural e funcional da planta, não depende apenas da disponibilidade de nutrientes na solução do solo, mas da carga genética da espécie, clima, taxa respiratória e transpiratória da planta, dentre outros processos. Quanto ao diâmetro caulinar observando-se a Figura 1, verifica-se comportamento similar ao observado para a variável de crescimento número de folhas/planta. Entre a menor e maior dose de lodo de esgoto e de cinza vegetal adicionadas ao solo, a variação média foi de aproximadamente 2

4 mm. Isto significa dizer que a resposta a aplicação destas duas fontes de matéria orgânica não influenciaram o crescimento da planta quanto a esta variável. A adição de lodo de esgoto e cinza vegetal ao solo promoveu resposta significativa para o crescimento da planta em área foliar (Fig. 1). Era esperado que a adição de quantidades expressivas de nutrientes resultassem em melhor desempenho quanto ao crescimento da planta. Embora a cinza vegetal apresente deficiência de N e S, os resultados obtidos para área foliar indicam que a adubação nitrogenada deve ser uma prática simbiótica quando se desejar efetuar adubações com cinza vegetal. Por outro lado, por ser o lodo de esgoto uma fonte de matéria orgânica rica em N, era esperado que sua adição ao solo propiciasse o fornecimento adequado de nutrientes, principalmente o N que é um elemento de alta mobilidade no floema que participa da estrutura da molécula de clorofila e conseqüentemente dos processos fotossintéticos, o que resultaria em crescimento da área foliar e demais estruturas da planta. Altura de planta (cm) LE = -0,69x 2 + 7,96x + 93,99 R 2 = 0,98 CV = 0,79x 2 + 3,64x + 67,76 R 2 = 0,89 Número de folhas LE CV = -0,52x 2 + 5,53x + 33,27 R 2 = 0,91 = -0,42x 2 + 5,69x + 15,69 R 2 = 0,99 Diâmetro caulinar (mm) 3 25,0 2 15,0 1 5,0 LE = -49x 2 + 0,76x + 8,26 R 2 = 0,99 CV = -06x 2 + 0,75x + 6,59 R 2 = 0,97 Área foliar (cm 2 ) LE = 4,17x ,28x ,5 R 2 = 0,98 CV = -5,48x ,48x + 774,24 R 2 = 0,97 Figura 1. Altura de planta (cm), número de folhas, diâmetro caulinar (mm) e área foliar (cm 2 ) do algodoeiro, cv. Rubi em função da adição de doses de cinza vegetal (CV) e lodo de esgoto (LE) ao solo. Campina Grande, 2005 Existem alguns trabalhos demonstrando vantagens na utilização do lodo de esgoto como fertilizante nitrogenado para as culturas, dentre os quais os de Alcântara et al. (2003) para a cultura do algodoeiro; Silva et al., (2001) para a cana-de-açúcar; Vieira & Cardoso (2003) quanto à reciclagem de nutrientes, dentre outros. Contudo há necessidades de se estabelecer a priori as quantidades que devem ser utilizadas, bem como as necessidades da cultura. Este conhecimento poderá determinar os benefícios potenciais da adubação orgânica com lodo de esgoto em programas de restituição de nutrientes para a cultura do algodoeiro.

5 Quanto ao uso da cinza vegetal, neste trabalho ficaram evidente seus efeitos no crescimento da planta. Por outro lado à recomendação de adubação com esta fonte deve ser criteriosamente estudada a priori, pois quantidades excessivas deste resíduo poderá provocar desbalanços nutricionais na fertilidade do solo bem como toxidez nutricional ou carência em face das relações de antagonismo existentes pela elevada concentração de alguns nutrientes na solução do solo. CONCLUSÕES 1. O crescimento da planta em altura, número de folhas, diâmetro caulinar e área foliar foram significativamente influenciados pela adição de lodo de esgoto e cinza vegetal a composição do solo; 2.A aplicação de 6,0 t/ha de lodo de esgoto e cinza vegetal foram adequadas para o crescimento do algodoeiro; 3. A recomendação de doses de lodo de esgoto e cinza vegetal baseada nas necessidades da cultura poderá ocasionar perdas de nutrientes, principalmente aqueles em quantidades superiores a exemplo do Ca, Mg e K para a cinza e do N para o lodo, para o ecossistema, principalmente no inicio do ciclo vegetativo da cultura, com conseqüências danosas para o ambiente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALCÂNTARA, R. L.; KONIG, A.; BELTRÃO, N. E. M. Aplicação do lodo de esgoto na cultura do algodoeiro herbáceo. I Fitomassa aérea. In: CONGRESSO BRASILEIRO DO ALGODÃO, 4, 2003, Goiânia. Anais... Campina Grande: Embrapa CNPA, CD-ROM. MATERECHERA, S. A.; MKHABELA, T. S. The effectiveness of lime, chicken manure and leaf litter ash in ameliorating acidity in a soil previously under black wattle (Acacia mearnsii) plantation. Bioresource Technology, v. 85, p. 9-16, MELO, W. J.; MARQUES, M. O.; MELO, V. P. O uso agrícola do biossólido e as propriedades do solo. In: TSUTIYA, M. T.; COMPARINI, J. B.; ALÉM SOBRINHO, P.; HESPANHOL, I.; CARVALHO, P. C. T.; MELFI, A. J.; MELO, W. J.; MARQUES, M. O. (Ed). Biossólido na agricultura. São Paulo: Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, p SANTOS, J. W.; GHEY, H. R. (Eds). Estatística experimental aplicada. Campina Grande: Embrapa Algodão/UFPB, p. SILVA, F. C.; BOARETTO, A. E.; BERTON, R. S.; ZOTELLI, H. B.; PEXE, C. A.; BERNARDES, E. M.. Efeito de lodo de esgoto na fertilidade de um argissolo vermelho-amarelo cultivado com cana-deaçúcar. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 36, p , 2001.

6 SILVA, J. E.; RESCK, D. V. S.; SHARMA, R. D. Alternativa agronômica para o biossólido produzido no Distrito Federal. I Efeito na produção de milho e na adição de metais pesados em latossolo no cerrado. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 26, p , VIEIRA, R. F.; CARDOSO, A. A. Variações nos teores de nitrogênio mineral em solo suplementado com lodo de esgoto. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 38, p , VOUNDINKANA, J. C.; DEMEYER, A.; VERLOO, M. G. Availability of nutrients in wood ash amended tropical acid soils. Environmental Technology, v. 19, p , ZIMMERMANN, S.; FREY, B. Soil respiration and microbial properties in an acid forest soil: effects of wood ash. Soil Biology & Biochermistry, p. 1-11, ZHANG, F. S.; YAMASAKI, S.; NANZYO, M. Waste ashes for use in agricultural production: I. Liming effect, contents of plants nutrients and chemical characteristics of some metals. Science Total Environment, v. 284, p , 2002.