Da Declaração Conjunta de 1987 à Parceria Estratégica de 2005
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- Isabel da Rocha Almeida
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1 Mestrado em Estudos Chineses 2010/2011 Relações Históricas Luso-Chinesas Universidade de Aveiro Relações luso-chinesas: Da Declaração Conjunta de 1987 à Parceria Estratégica de 2005 Rui Igreja (nº de aluno: 31471) 17 de Janeiro de 2011
2 Fotografias da página de rosto:! Assinatura da Declaração Conjunta luso-chinesa sobre a questão de Macau, Pequim, 13 de Abril de (site do Gabinete de Coordenação da Cerimónia de Transferência, Cerimónia de transferência de soberania de Macau de Portugal para a República Popular da China, Macau, de Dezembro de (site do Gabinete de Coordenação da Cerimónia de Transferência, Visita do Primeiro Ministro da RPC, Wen Jiabao ( ), a Portugal, Queluz, 09 de Dezembro de (portal do Governo de Portugal, edia.aspx?t=image&lid=acad7a73-e0de-46e1-9b2d-82fbdc0fc473&rid=e c55d-4f85-8d3f-7a6b9c4fdec7&an=pmegovernadoresestrangeiros)
3 Acontecimentos anteriores a 1987 Após a revolução do 25 de Abril de 1974, Portugal reconheceu a Republica Popular da China (RPC) em 06 de Janeiro de 1975 [Chang1998]. A nova Lei Orgânica de Macau foi promulgada e integrada na constituição portuguesa de 1976, estabelecendo que Macau era território sob administração portuguesa [Leandro2008]. Em Janeiro e em Setembro de 1976 faleceram dois dos lideres históricos da RPC, Zhou Enlai ( ) e o 'Grande Timoneiro' Mao Zedong ( ). A partir de 1978 Deng Xiaoping ( ) assume o papel de líder de facto e torna-se no arquitecto da nova China. Após alguns anos de negociações, Portugal e a RPC estabeleceram relações diplomáticas em 08 de Fevereiro de 1979 [Chang1998], tendo Portugal prometido dar início às negociações sobre o futuro de Macau quando a RPC assim o entendesse [Fernandes2008]. A Declaração Conjunta sino-britânica sobre Hong Kong foi assinada em 19 de Dezembro de 1984 [Ramos1997]. Cinco meses mais tarde, na visita do Presidente Português Ramalho Eanes à China, em Maio de 1985, a RPC levantou a questão de Macau, e foi emitido um comunicado conjunto declarando que a questão de Macau seria negociada num futuro breve através de via diplomática [Chang1998, Ramos1997]. Numa visita do Vice-Ministro dos Negócios Estrangeiros chinês Zhou Nan ( ) a Portugal em Março de 1986, ambos os lados concordaram em iniciar as negociações em Maio. Quatro rondas de negociações tiveram lugar em Pequim entre 30 de Junho desse ano e 23 de Março do ano seguinte [Chan2003]. Da assinatura da Declaração Conjunta à transferência de soberania A Declaração Conjunta luso-chinesa sobre a questão de Macau 1 foi assinada em Pequim em 13 de Abril de 1987 pelos então Primeiro Ministros Aníbal Cavaco Silva e Zhao Ziyang ( ) [DCMacau1987], e ratificada pela Assembleia da Republica Portuguesa em Dezembro de A Declaração Conjunta estabelece que a RPC voltará a assumir o exercício da soberania sobre Macau a partir de 20 de Dezembro de 1999, em conformidade com o princípio um país, dois sistemas 2. Sendo que, no momento de transferência de poderes para a RPC, será criada a Região Administrativa Especial de Macau 1 Nome oficial completo: Declaração Conjunta do Governo da República Portuguesa e do Governo da República Popular da China sobre a Questão de Macau [DCMacau1987]. 2 A Constituição da RPC de 1982 dera enquadramento legal ao conceito um país, dois sistemas (inicialmente idealizado para a reunificação de Taiwan [Chung2009]) ao permitir ao estado a criação de regiões administrativas especiais. 1
4 (RAEM), gozando de um elevado grau de autonomia (excepto no que se refere às relações exteriores e à defesa) e permanecendo nessas condições durante 50 anos. A Declaração Conjunta determina, também, que o Português, a par do Chinês, será uma das línguas oficiais da RAEM, podendo ser usado nos organismos do Governo [DCMacau1987]. Ficaram, assim, estabelecidos três períodos na vida de Macau: o primeiro, de transição, sob administração Portuguesa, de 15 de Janeiro de 1988, data em que foram trocadas os documentos de ratificação [Chan2003], até à data da transferência de poderes para a RPC; o segundo, desde a transferência e criação da RAEM até 50 após e; um terceiro período depois de Foi criado o Grupo de Ligação Conjunto Luso-Chinês, de acordo com o estipulado na Declaração Conjunta, e também o Grupo de Terras Luso-Chinês. O primeiro, composto por 5 representantes de cada país, funcionava como corpo consultivo e de troca de informação entre os dois governos; o segundo, composto por 3 membros de cada país, lidava com as questões de concessões de terras [Sousa2009]. Em 1988 o Grupo de Ligação criou a Comissão de Redacção da Lei Básica da RAEM 3 [Sousa2009], que seria aprovada em 31 de Março de 1993 pela Assembleia Popular Nacional da RPC para entrar em vigor no momento da transferência de soberania [SAFP2011]. A Lei Básica reitera, de acordo com o que ficara estabelecido na Declaração Conjunta, o alto grau de autonomia, define que os orgãos executivos, legislativos e judiciários são independentes da RPC, mas que o Chefe do Executivo e os principais cargos do Governo são nomeados pelo Governo Popular Central [SAFP2011]. Durante o período de transição, a administração portuguesa de Macau enveredou por fortes investimentos em grandes empreendimentos, destacando-se o Aeroporto Internacional de Macau, que começou a ser construído em 1991 [Chan2003], e cuja inauguração estava prevista para Janeiro de 1996, mas foi oficialmente aberto em Novembro de 1995 [Leandro2008], o porto de águas fundas de Coloane, a nova ponte ligando a Taipa à península e os aterros entre as ilhas de Coloane e Taipa (Cotai) [Fernandes2008]. Apesar de a Declaração Conjunta e a Lei Básica da RAEM conferirem à RPC a responsabilidade da defesa de Macau, nenhum dos documentos fazia qualquer referência ao estacionamento de tropas do Exército de Libertação Popular no território após a transferência. Assim, na recta final do período de transição, e marcado pela discórdia, o que para Deng Xiaoping era um modo de a RPC demonstrar a sua soberania sob Macau, foi contestado pelo governo português, com os argumentos do fácil acesso das tropas chinesas de Zhuhai ( ) a Macau que 3 O texto integral da Lei Básica da RAEM da RPC está disponível no site do Governo de Macau em: (versão portuguesa). 2
5 era demasiado pequeno para hospedar uma guarnição militar, e do facto de que Portugal não tinha presença militar no território desde Isto não demoveu os chineses, que promulgaram a Lei da Guarnição de RAEM em Junho de 1999, não permitindo o governo português, no entanto, a entrada de tropas chinesas antes da data de transferência. Contudo, a questão só ficou resolvida durante a visita do President Jiang Zemin ( ) a Portugal em Outubro de 1999, dois meses antes da data marcada para a transferência, e depois de ter havido a ameaça do Presidente Jorge Sampaio não se deslocar a Macau para assistir às cerimónias [Catarino2010, Chan2003]. Então, finalmente, na passagem de 19 para 20 de Dezembro de 1999 deu-se a transferência da soberania de Macau de Portugal para a RPC, numa cerimónia com a presença dos Presidentes Jorge Sampaio e Jiang Zemin e dos Primeiro Ministros António Guterres e Zhu Rongji ( ) [EmbRPC2010], em que a bandeira de Portugal foi substituída pela da RPC, pondo termo a quatro séculos e meio de presença portuguesa em Macau, e de países ocidentais na China. O território passava agora a constituir a Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China ( ). Após 1999 Edmund Ho (, Ho Hau Wah) tornou-se no primeiro Chefe Executivo da RAEM, com um papel semelhante ao do Governador [Saraiva2004], cargo que manteve até 2009, quando, após ter cumprido os dois mandatos, foi substituído por Fernando Chui (, Chui Sai On). Macau sofreu grandes alterações após 1999, muito devido à liberalização parcial do sector do jogo e fim do monopólio da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau (de Stanley Ho) em 2001, e a consequente entrada em jogo de investidores norte-americanos 4. Em Julho de 2005, num evidente avanço para a preservação da cultura portuguesa no território, o centro histórico de Macau passou a fazer parte da lista do Património Mundial da Humanidade da UNESCO, o 31º em toda a RPC. A partir de Abril de 2001, a RAEM e os países do espaço Schengen passaram a conceder reciprocamente isenção de vistos de entrada aos portadores dos respectivos passaportes [Cunha2003]. A RPC aderiu à Organização Mundial do Comércio (OMC) em Dezembro de 2001, data a partir da qual as relações directas, quer de Portugal, quer da União Europeia (UE), com a China aumentaram significativamente [Ilhéu2010]. E, após o alargamento (a 25 países) da UE em 2004, esta tornou-se no maior parceiro comercial da RPC, e a RPC no segundo maior parceiro comercial da UE, a seguir 4 Macau ultrapassou Las Vegas em 2006 em termos de receitas directas do jogo [BBC2006]. 3
6 aos E.U.A. [Cunha2006]. Em Outubro de 2003, a China criou em Macau o Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa 5 [Cunha2003]. Por ocasião da visita oficial de uma semana do Presidente da República Jorge Sampaio, acompanhado por 120 empresários [Cunha2006] (a maior missão empresarial de Portugal à China), a Pequim, Xangai e Macau [Público2005] em Janeiro de 2005, os dois países emitiram um Comunicado de Imprensa Conjunto dispondo-se a incrementar o relacionamento bilateral em várias áreas. Como seria expectável pela pendor comercial da visita, das intenções do comunicado destacase o plano económico. Havendo, também, referências a cooperações nas áreas da cultura, ciência e tecnologia, turismo, justiça e ensino. Após o encontro entre os dois chefes de Estado, foram assinados vários acordos, nomeadamente um Memorando de Cooperação entre os Supremos Tribunais, um Acordo de Cooperação Económica [Freire2008] e um Acordo de Reconhecimento de Graus Académicos. Ficou, igualmente, expressa a intenção de Portugal abrir um Consulado Geral em Xangai ainda no decorrer de No âmbito das relações UE-RPC, Portugal exprimiu o seu empenho para o levantamento do embargo de armas da UE à RPC 7, e salientou a importância da concessão pela UE à RPC do Estatuto de Economia de Mercado [CIC2005]. Ainda no mesmo ano de 2005, em Dezembro, o Primeiro Ministro da RPC Wen Jiabao ( ) efectuou uma visita oficial a Portugal, da qual resultou uma Declaração Conjunta elevando as relações bilaterais entre os dois países para o estatuto de 'Parceria Estratégica Global' [DC2005]. De entre os países membros da UE, esse estatuto só havia sido concedido à Alemanha, França, Reino Unido e Espanha [Cunha2006, Freire2008] (as três maiores e quinta maior economias da UE). Nesta Declaração Conjunta, salienta-se, tal como tinha acontecido com o Comunicado aquando da visita de Jorge Sampaio à China 10 meses antes, as intenções de cooperação na área económica e comercial, sendo mencionada a importância dada pelos dois países ao papel do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa. São feitas referências à dinamização da cooperação cientifica e tecnológica, no domínio da justiça, na área da saúde e no ensino das respectivas línguas e culturas [DC2005]. Durante esta visita foi, aliás, assinada a Declaração de Intenções para a instalação 5 O único país lusófono que não integra o Fórum é São Tomé e Príncipe [Fórum2011], pois mantém relações diplomáticas com Taiwan [Cunha2006]. 6 O Consulado Geral de Portugal em Xangai viria a abrir em Setembro de 2006 [Macauhub2006]. 7 A UE impôs o embargo de armas à RPC a seguir aos acontecimentos de Tiananmen de 1989, que se mantém desde então. 4
7 do Instituto Confúcio na Universidade do Minho, que viria a abrir no ano seguinte [ICUM2011]. Portugal voltou a exprimir na Declaração o seu empenho no seio da UE para o levantamento do embargo de armas à RPC, assim como para a concessão do Estatuto de Economia de Mercado. Posteriormente a 2005, serão de salientar a visita do José Sócrates, com uma comitiva de cerca de 100 empresários, a Pequim, Xangai e Macau em Janeiro de 2007 [Freire2008], durante a qual o Primeiro Ministro português referiu a Parceria Estratégica assinada em 2005, Macau e as relações no quadro da UE como os três pilares das relações entre Portugal e a China [Expresso2010]; e a visita do Presidente Hu Jintao ( ) a Portugal em Novembro de 2010 [Público2010], ambas focadas em questões económicas e comerciais. Notas conclusivas Desde a visita do Presidente Ramalho Eanes à China em 1985 até à transferência de soberania de Macau para a RPC em 1999, a questão de Macau praticamente monopolizou as relações luso-chinesas. Depois de 1999, Macau continua a ser um elo importante entre Portugal e a China [Catarino2010], desempenhando agora um papel multi-polar no relacionamento entre os países lusófonos e a RPC, sem o qual possivelmente cessaria o seu estatuto especial da RAEM dentro da China [Bastos2008]. As relações de Portugal com a RPC parecem agora dominadas pela agenda económica e comercial, situação que, dado o crescente peso da China na economia mundial, certamente se manterá. 5
8 Referências [Bastos2008] L. Bastos, Macau em continuidade (entrevista a Moisés S. Fernandes), Tai Chung Pou (suplemento em Português), Macau, ( acedido em ) [BBC2006] -----, Tiny Macau overtakes Vegas Strip, BBC News, , acedido em [Catarino2010] P. Catarino, Cinco Anos e Meio na Embaixada em Pequim: Abril de 1997 Setembro de 2002, Mesa-redonda com os antigos Embaixadores de Portugal em Pequim, Negócios Estrangeiros, Nº 16, Fevereiro 2010, pp ( acedido em [Chan2003] M. K. Chan, Different Roads to Home: The retrocession of Hong Kong and Macau to Chinese sovereignty, Journal of Contemporary China, Vol.12, Nº 36, 2003, pp ( acedido em [Chang1998] J.-L. J. Chang, Settlement of the Macao Issue: Distinctive Features of Beijing's Negotiating Behavior, Maryland Series in Contemporary Asian Studies, Vol. 1988, Nº 4, 1998, pp ( acedido em [Chung2009] T. Chung e H. Tieban, Macau: Ten Years after the Handover, Journal of Current Chinese Affairs, Vol. 38, Nº 1, 2009, pp ( acedido em [CIC2005] -----, Comunicado de Imprensa Conjunto entre a República Popular da China e a República Portuguesa por Ocasião da Visita do Presidente da República Portuguesa à China, Janeiro (Relações Internacionais, Nº 10, Junho 2006, pp , acedido em
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