Entrevista. Luiz Narciso Baratieri

Transcrição

1 Luiz Narciso Baratieri Quem, em Odontologia no Brasil, nunca ouviu falar sobre ele? Este catarinense de Capinzal (com muito orgulho) que tem sua carreira pautada pelo sucesso. Inteligente e polêmico, forte em seu caráter é oito ou oitenta, amado ou odiado... Sem meios termos. Independente, amigos e inimigos apontam: graças ao seu entusiasmo, sua oratória impecável e sua forma apaixonada de defender suas opiniões, a Odontologia brasileira tomou novos rumos a partir dele, abrindo-se para franca discussão científica, efervescendo ânimos e estimulando o debate entusiasmado de idéias e pontos de vista, fazendo brotar em todos os cantos do Brasil a coragem da livre expressão. Mesmo atarefado entre suas várias atividades e intermináveis viagens para cursos e congressos, da linda Florianópolis o Prof. Dr. Luiz Narciso Baratieri nos brinda com esta entrevista. Você, de uma forma incisiva, mudou a forma de pensar e discutir a Odontologia restauradora, através de seus livros, artigos e centenas de cursos ministrados. Por exemplo, o livro Dentística: procedimentos preventivos e restauradores é um best-seller da Odontologia mundial e foi seguido de outros sucessos. A partir daí, você tem noção da grandeza do impacto de sua obra para a Odontologia mundial? Em primeiro lugar quero agradecer por essa oportunidade. É um privilégio poder usar esse espaço para compartir algumas das minhas idéias e um pouco da minha história. Também gostaria de cumprimentar todos os leitores da revista Dental Press de Estética e lhes desejar uma ótima leitura. Na verdade, quando escrevemos o nosso primeiro livro, o fizemos por sugestão e incentivo do professor Jorge Seara Polidoro que, na época, era o responsável pelas disciplinas de Dentística da Universidade Federal de Santa Catarina em Florianópolis. Naquela ocasião mal acreditava que seríamos capazes de fazê-lo, quanto mais pensar em fazer sucesso e influenciar pessoas. O incentivo do professor Polidoro foi fundamental para concluirmos o livro. Sinceramente, mesmo após todo o sucesso do nosso primeiro livro, só fui ter noção de que tínhamos feito algo marcante quando fui morar na Inglaterra, quatro anos atrás, para fazer pós-doutoramento e encontrei na biblioteca da Universidade de Sheffield oito exemplares do nosso livro sobre estética. Um livro que até então não tinha feito tanto sucesso no Brasil. Nesse dia quase morri de alegria e chorei como 14 R Dental Press Estét, Maringá, v. 2, n. 4, p , out./nov./dez. 2005

2 Luiz Narciso Baratieri Não acredito que alguém precise ser famoso, mais velho ou mais experiente para ser responsável (ou mais responsável). R Dental Press Estét, Maringá, v. 2, n. 4, p , out./nov./dez

3 uma criança. Na mesma época fomos conhecer Londres e encontramos o mesmo livro em uma das livrarias mais famosas da Inglaterra, uma dessas livrarias que vendem todos os tipos de livro e que tem uma pequena área destinada a livros de Odontologia. Estávamos eu, minha mulher e um dos meus irmãos que é médico. Quase morremos os três de alegria e, depois, das boas cervejas que tomamos para comemorar. Ainda quando estávamos morando na Inglaterra conheci no nosso curso de inglês um professor da Coréia que me disse que o nosso livro, aquele de Estética, era adotado como livro texto na universidade onde ele lecionava. Além disso, com freqüência eu recebia s de dentistas de todas as partes do mundo falando sobre os nossos livros, geralmente nos dando os parabéns por eles. Isso tudo, associado ao fato de termos esgotado algumas edições em inglês (tanto do primeiro como do livro de Estética) e espanhol, me fez acreditar que, realmente, havíamos feito algo que estava ajudando pessoas em vários lugares do mundo. Outro fato que nos chamava a atenção é que esses livros passaram a ser referenciados pelos professores mais conhecidos, tanto nas suas apresentações como nos seus próprios livros. Por exemplo, o professor Pascal Magne. Mas mesmo assim eu não diria que eles tenham promovido um impacto na Odontologia mundial. Talvez na maneira de se fotografar. E a responsabilidade em cada aula ou palestra vem aumentando com o tempo? Desde menino sempre procurei ser o mais responsável possível. Sempre procurei preparar as minhas aulas com antecedência. Renovar o meu material. Conferir as informações várias vezes, antes de passá-las adiante. Naturalmente, isso não quer dizer que eu não possa ter cometido ou cometer alguns equívocos. Porém, não acredito que alguém precise ser famoso, mais velho ou mais experiente para ser responsável (ou mais responsável). Todos os professores, novos ou velhos, mestres ou doutores, adjuntos ou titulares, todos devem ser responsáveis. Por outro lado, isso não significa que não possam pensar diferente uns dos outros e, nem tão pouco que não possam mudar, de tempo em tempo, a maneira de pensar. Quem acha que não pode mudar, nunca deveria, em minha opinião, ser professor, muito menos ser escritor. Em sua opinião, quais as grandes descobertas e avanços tecnológicos que modificaram substancialmente a Odontologia nas últimas décadas? A maior de todas as descobertas é o reconhecimento do fato de que a cárie dental é uma doença infecto-contagiosa passível de ser prevenida, detida ou revertida, na qual as lesões (cavitadas ou não) são apenas sinais da presença da doença em um determinado período da vida do indivíduo. Com relação específica à Odontologia restauradora, em 2005 fez 50 anos que o professor Buonocore, com o seu celebre artigo, mudou definitivamente os rumos da nossa profissão. A técnica do condicionamento ácido do esmalte e, subseqüentemente, da dentina, em associação com os sistemas adesivos e os compósitos (ou cerâmicas) atuais, criaram a possibilidade de restaurar dentes sem a necessidade de anestesia e desgastes da estrutura dental. Algo que muitos profissionais, por todo o mundo, julgam, ainda, não ser possível ou adequado. Se alguém é capaz de construir restaurações assim, é porque é possível. Se for possível, então temos que ver os benefícios disso e tentar ajudar mais pessoas a fazerem o mesmo. Estou seguro disso e espero que, com o tempo, vocês também venham a estar e então possamos todos finalmente desfrutar do grande objetivo do professor Buonocore: salvar a estrutura dental sadia. Novos materiais restauradores têm surgido numa profusão quase insana no mercado odontológico. Quando falamos de resinas compostas, por exemplo, uma diversidade de modificações e combinações surgem a todo momento, combinadas com uma diversidade de opiniões em artigos publicados sobre eles. Dentre algumas polêmicas, poderia nos dar sua opinião sobre os adesivos self-etch? Eu não sou um grande estudioso desse assunto, mas tenho um amigo que é um grande pesquisador de adesão dental, o professor Dr. Jorge Perdigão, que eu procuro seguir. Ele tem publicado vários trabalhos sobre adesão e alguns sobre esse tipo de adesivo. Os trabalhos dele, clínicos e laboratoriais, ao contrário de outros, têm demonstrado que esses adesivos autocondicionantes se comportam, tanto em esmalte como em dentina, de forma diferente e inferior aos sistemas 16 R Dental Press Estét, Maringá, v. 2, n. 4, p , out./nov./dez. 2005

4 Luiz Narciso Baratieri adesivos que utilizam a técnica do condicionamento ácido total. Não o sigo pelo fato de ser meu amigo e sim por ser um cientista sério e que tem gerado inúmeras informações científicas sobre esses sistemas adesivos que colocam em cheque algumas supostas vantagens que eles poderiam apresentar. Por outro lado acredito que não se pode fazer disso uma nova guerra. Os contra e os a favor dos adesivos self-etch. Isso, além de ser ridículo do ponto de vista científico, em nada iria contribuir para o progresso da ciência. Em minha opinião, apesar dos 50 anos do célebre artigo do professor Buonocore e dos subseqüentes avanços com os materiais adesivos e com a adesão aos substratos dentais, ela irá passar, ainda, por muitas transformações até que os estudiosos dessa área se dêem por satisfeitos. Particularmente, nesse momento continuo a preferir a técnica do condicionamento ácido total, o que não significa que não possa vir, no futuro, a optar por outra alternativa. E sobre as resinas compostas nanoparticuladas? Sobre essa pergunta, e especialmente sobre essas resinas, gostaria de convidar os leitores da revista Dental Press de Estética a lerem a coluna que o professor Jorge Perdigão escreve para a revista Clínica. A coluna está disponível, gratuitamente, na página da revista Clínica ( e, além de tratar de uma forma científica esse assunto, dá ao clínico uma visão crítica sobre o mesmo. Hoje se discute muito sobre as qualidades ópticas das resinas compostas. Dentre estas propriedades, se discute muito a questão da importância da fluorescência. Qual sua opinião sobre isto? Acredito que devo a maior parte do meu sucesso às restaurações de amálgama que fiz durante muitos anos. Se quisermos fazer restaurações que se pareçam com dentes naturais é natural que devamos utilizar materiais que sejam capazes de copiar as propriedades ópticas deles e reproduzi-las em todas as condições de iluminação. Durante muitos anos esses materiais não estiveram disponíveis e nós também não tínhamos o conhecimento que temos hoje sobre a relação dos tecidos duros dos dentes naturais com a luz. Naturalmente, isso não significa que não éramos capazes de fazer restaurações adequadas sob vários aspectos, mas com relação à cor sempre houve uma insatisfação por parte dos profissionais. Chegávamos a dizer na época do famoso Adaptic, que alguns compósitos apresentavam efeito camaleão (santa ignorância). Será que algum de nós seria capaz de usar, ainda hoje, aqueles compósitos (mesmo com o tão alardeado efeito camaleão). A verdade é que à medida que mais sabemos vamos nos tornando mais exigentes e mais críticos. Passamos a enxergar detalhes que antes nos passavam despercebidos (é assim em tudo). Muitos dentistas, no mundo inteiro, não têm a menor noção do que seja fluorescência, opalescência e contra-opalescência. Não os estou criticando, pois há bem poucos anos atrás eu, que sou professor e dedico a minha vida a isso, também não sabia. Inúmeros colegas professores também não sabiam. Então, as perguntas que faço são: como podem as pessoas dar o devido valor a essa importante propriedade óptica dos dentes naturais se não sabem do que se trata? Como os dentistas podem usar essa importante propriedade óptica para elegerem ou eliminarem o uso de determinados compósitos? Mas não há dúvidas que a fluorescência (propriedade que apresentam determinados corpos de transformar luz invisível (UV) em luz visível (branca/azul)), é uma propriedade óptica importante. Nos dentes naturais a fluorescência é especialmente determinada pela dentina, que apresenta cerca de três vezes mais fluorescência que o esmalte. Todavia, se formos aplicar essa mesma regra ao construirmos restaurações com compósitos, de acordo com as nossas observações e um trabalho do grupo do professor João Carlos Gomes de Ponta Grossa-PR, teremos problemas. Isto porque se a camada de esmalte artificial não apresentar fluorescência, esta irá matar a fluorescência da camada de dentina artificial. Ou seja, nas restaurações de compósito, ao contrário dos dentes naturais, é importante que o material colocado na superfície da restauração apresente maior fluorescência que aquele utilizado para a reprodução da R Dental Press Estét, Maringá, v. 2, n. 4, p , out./nov./dez

5 dentina artificial. Nesse aspecto é importante destacar que a maioria dos compósitos micro-particulados, geralmente indicados para serem usados como a última camada vestibular em função da lisura superficial e polimento que possibilitam, não apresentam fluorescência. Um desses compósitos é extremamente popular no Brasil. Também é importante destacarmos que o fato de um determinado material apresentar fluorescência não significa que ele é superior aos demais. Alguns compósitos têm fluorescência muito alta fazendo com que em determinadas condições de iluminação, por exemplo sob a luz negra de uma casa de dança, as restaurações feitas com eles se tornem excessivamente luminosas e também contrastem com os dentes naturais. Outros apresentam fluorescência menor que a dos dentes naturais. Por outro lado há compósitos que são fluorescentes, mas que não são opalescentes e que, além disso, apresentam propriedades físicas inferiores aos demais. Portanto, ao escolher o(s) compósito(s) com o(s) qual(is) irá trabalhar, o clínico deverá levar em conta vários aspectos, sendo a fluorescência apenas um deles. Parece-nos que o amálgama é um material do passado, coexistindo, por enquanto, por questões sociais. Isto é verdade ou ainda há espaço para este material? Acredito que devo a maior parte do meu sucesso às restaurações de amálgama que fiz durante muitos anos. Lembro com saudade de quando mostrava aos dentistas durante os meus cursos, por todo o Brasil e América Latina, os meus amálgamas e eles ficavam impressionados com o tamanho e beleza dos mesmos. A pergunta mais freqüente que me faziam era mais ou menos assim: Como é possível se fazer uma reconstrução envolvendo quatro ou cinco cúspides sem nenhum tipo de pino de retenção e nenhum tipo de base protetora? Agora, cerca de 30 anos após, estou revendo muitas daquelas restaurações e comprovando aquilo que havia apreendido com os meus professores no curso de mestrado e doutorado. O amálgama, quando adequadamente indicado, é ainda um excepcional material restaurador. Não obstante, infelizmente, a maioria das pessoas não quer e não aceita mais ter os dentes naturais restaurados por materiais que não apresentem a mesma cor que eles (mesmo em áreas não visíveis, como é o caso dos dentes posteriores superiores). Todavia, em que pese isso ser verdade, 18 R Dental Press Estét, Maringá, v. 2, n. 4, p , out./nov./dez. 2005

6 Luiz Narciso Baratieri também é verdade que inúmeros dentistas, em todo o mundo, continuam, ao usá-lo dentro das indicações, a se beneficiar desse fantástico material restaurador. E os materiais à base de ionômero de vidro, vão pelo mesmo caminho do amálgama ou ainda há espaço para este material? Não tenho conhecimento suficiente para dar a minha opinião sobre esse assunto, apenas gostaria de registrar que não gosto de usar esses materiais em função do alto preço, baixa estética, alta susceptibilidade ao ganho e perda de umidade e grandes dificuldades de manipulação. Além, naturalmente, da péssima experiência que tive com eles em um passado recente. Todavia sei e respeito o fato de que muitos profissionais, em várias partes do mundo, gostam e usam esses materiais. Falando sobre ensino, como a tendência de mudanças na formação acadêmica, norteada pelas diretrizes curriculares dos cursos de graduação em saúde, poderá afetar o ensino da dentística restauradora? Não saberia dizer. Não obstante, acredito que várias mudanças são necessárias, não há a menor dúvida. Precisamos, juntos, deixar as vaidades de lado e encontrar caminhos para tornar o ensino da Odontologia cada vez mais eficiente. Para tal, acredito que seja imprescindível a discussão ampla do assunto por todos os interessados. Se a reforma vier a ser, mais uma vez, imposta, teremos, com certeza, sérios problemas. Ah! Se eu soubesse!... Existe algo, do ponto de vista profissional ou pessoal que você deixou de realizar e que aconselharia os profissionais mais jovens a fazerem? Sim. Várias coisas. Por exemplo, do ponto vista profissional, gostaria de ter estudado inglês e espanhol desde muito cedo. Gostaria de ter estudado mais periodontia e oclusão. Do ponto de vista pessoal, gostaria de ter estado com os meus filhos e a minha mulher por mais Precisamos juntos, deixar as vaidades de lado e encontrar caminhos para tornar o ensino da odontologia cada vez mais eficiente. tempo. Gostaria de ter ido ver os meus pais com maior freqüência. Gostaria de ter ficado mais tempo sem fazer nada, ou quem sabe só escutando música. Ter ido mais ao cinema. Ter ido mais jogar bola com os amigos. Ter saído mais para jantar fora com a minha mulher, filhos e alguns amigos. Ter ido, com maior freqüência, andar pela cidade, sem nada para fazer. Não ter me distanciado dos meus amigos de infância. São tantas as coisas que eu gostaria de ter feito e que aos poucos procuro fazer. Por exemplo, ultimamente tenho lido alguns livros por pura distração (um melhor que o outro), e como é bom. Para aqueles que são professores ou pais aproveito para sugerir um livro que julgo indispensável. Chama-se: POR UMA EDUCAÇÃO ROMÂNTICA. O autor é um educador da UNICAMP chamado Rubem Alves. Quais profissionais realmente causaram impacto em sua carreira, levando-o a reavaliar seus conceitos e sonhos? Vários profissionais marcaram a minha carreira. Quando eu era estudante de graduação tive um professor de Patologia Bucal, o Dr. Adércio Miguel Domingues, que era o exemplo de como eu gostaria de, um dia, dar aulas. Um professor extremamente didático e responsável ao extremo. Depois, quando fui fazer mestrado, recebi forte influência de um professor de Endodontia, o Dr. Clóvis Monteiro Bramante, também um professor de uma didática fantástica. O professor José Mondelli marcou toda a minha geração pelo seu desprendimento e pelos seus livros. Ele é o professor que mudou a história da Odontologia do Brasil (para muito melhor, naturalmente). Outros professores que me marcaram de forma fantástica, especialmente no início da minha carreira, foram os professores J. A. Gwinnet, Mario Algodoal, Lincon Steagel e os Garones (Narciso e Wilson). Mas há uma professora que me fez ver a importância de aceitar os outros como eles são e não querer que eles sejam como a gente é. Talvez ela tenha sido a pessoa que mais me influenciou de uma forma positiva e, por via de conseqüência, que mais me ajudou a montar uma excelente equipe de tra- R Dental Press Estét, Maringá, v. 2, n. 4, p , out./nov./dez

7 balho na Universidade Federal de Santa Catarina, onde coordeno as disciplinas de Dentística. Foi a Professora Maria Fidela de Lima Navarro da FOB-USP. Na verdade foram tantos os professores que me influenciaram para o bem que ao nomear apenas esses, certamente, estarei sendo injusto, mas por outro lado, não nomeá-los seria imperdoável. Nos últimos anos, três profissionais e grandes amigos contribuíram para que eu me tornasse um melhor dentista e um melhor professor. Um é o Dr. Limirio de Oliveira Jr. de Goiânia, o outro é o Dr. Paulo Kano de São Paulo e o professor Perdigão, um português que enche de orgulho todos aqueles que falam essa maravilhosa língua (a portuguesa, naturalmente). Você conseguiria apontar seus defeitos e suas maiores qualidades? Sempre procuro ver com a maior clareza possível os meus defeitos. Ainda assim é provável que não consiga enxergar alguns deles, mas consigo, com certeza, ver outros. Eles são vários. Também sempre me esforço para superá-los e assim me tornar uma pessoa melhor. Um dos meus maiores defeitos, em minha opinião, é ter dificuldades para perdoar as pessoas que me aprontam algumas (mesmo sendo pequenas bobagens). Já perdi, infelizmente, amigos por isso. Depois de um tempo percebo que tudo era apenas uma bobagem (mas aí a m... Já estava feita). Outro grande defeito é que, às vezes, por ter uma maneira muito forte de dizer as coisas, parece que quero ser o dono da verdade. Isso me irrita e me deixa triste. Faz anos que tento corrigir isso. Outro defeito que não consigo corrigir é o fato de chamar a atenção da Terezinha (minha atende há 18 anos) na frente dos meus pacientes. Claro que sempre peço desculpas, mas fico triste por não conseguir me controlar. As pessoas que tratam comigo há muitos anos já sabem que é assim e riem de nós o tempo todo. Os que não nos conhecem bem às vezes ficam assustados. São tantos os meus defeitos que eu teria que ficar escrevendo só sobre isso. Mas gostaria de aproveitar essa oportunidade para discordar da forma como você me apresentou no início da entrevista, na verdade eu já tinha visto você fazer isso uma vez quando foi ministrar um curso em Florianópolis. Eu discordo inteiramente. Não sou 8 ou 80 como você diz. Isso é o mesmo que dizer que sou radical. E esse é um defeito que não tenho. Já fui convencido a mudar de opinião e mudei tantas vezes que não consigo aceitar essa colocação (ou seria isso ser 8 ou 80?). É verdade que, geralmente, defendo as minhas opiniões com veemência. Sei que ao ser veemente acabo, muitas vezes, sendo antipático, mas daí a ser radical é muito diferente. É claro que eu também acredito que tenho qualidades. Por exemplo, sou amigo dos meus amigos, gosto de estimular as pessoas para que acreditem que o sonho é possível e que vale a pena sonharmos. Sempre digo aos meus estudantes que todos nós temos defeitos e virtudes, mas se ficarmos só olhando para os defeitos dos outros a vida vai se tornar um fardo. Digo sempre que se procurarmos ver as virtudes dos outros, com certeza, a vida será mais prazerosa (mesmo sabendo que todos têm defeitos). Como um excelente orador você já pensou em ser pastor? E eu que sempre pensei que fosse um bom professor, um bom dentista, um bom pai, um bom filho, um bom marido, um bom amigo e acima de tudo uma boa pessoa (falsa ilusão). Na verdade, para ser um bom professor e um bom dentista venho me preparando por quase trinta anos (uma vida toda). Fiz mestrado, doutorado, pósdoutorado, orientei e oriento estudantes de mestrado e doutorado e, ainda assim, há dias (vários dias) que penso que ainda me falta muito preparo. Há dias que leio algum artigo científico e fico pensando porque eu ainda não sabia aquilo, porque que eu ainda não havia lido sobre aquele assunto. Outras vezes quando vou assistir uma apresentação de um estudante de mestrado ou doutorado vejo o quanto tenho que continuar estudando para continuar lecionando. Para falar em público também me preparei e continuo me preparando. Antes de cada apresentação apresento para mim e para a minha mulher, que também é professora e dentista, várias vezes, a mesma apresentação. Portanto não acredito que o fato de alguém ser um bom orador o qualifique para ser um pastor. Isso seria o mesmo que pensar que um técnico em prótese, só por esculpir dentes maravilhosamente bem, mesmo sem estudar para tal, pudesse ser um dentista. Seria o mesmo que pensar que uma técnica em enfermagem, só por saber aplicar bem uma vacina, pudesse ser uma médica. Só se eu fosse louco e não tivesse respeito por essa maravilhosa profissão e pelas pessoas 20 R Dental Press Estét, Maringá, v. 2, n. 4, p , out./nov./dez. 2005

8 Luiz Narciso Baratieri que se preparam, a vida toda, para exercê-la, eu pensaria que pudesse ser, de uma hora para outra um pastor. Eu sempre me preparei para ser um bom professor e fui preparado pelos meus pais para ser uma boa pessoa. Na verdade não me considero um excelente orador, uma vez que não tenho um bom português, cometo vários erros de concordância com relativa freqüência (embora me cuide muito para não os cometer), além de não saber falar de improviso. Imagine então ser um pastor. Por último, você atualmente é editor chefe da Revista Clínica International Journal of Brazilian Dentistry, uma das melhores publicações gráficas com rigor científico publicadas no Brasil. Qual sua opinião sobre as publicações científicas nacionais, e que mensagem você poderia deixar para os leitores da Revista Dental Press de Estética. Quando iniciamos o projeto da revista Clínica tínhamos muito medo de fracassarmos (não que o fracasso seja algo abominável). Até que um dia, lembro como se fosse hoje, o professor Kina, lá no hotel Maksud Plaza em São Paulo, me entregou uma carta convite para fazer parte do corpo editorial da revista Dental Press de Estética. De pronto, antes de dizer que aceitava ajudálo, correu um frio na minha espinha. E agora, pensei eu. Se já pensávamos que seria difícil acertarmos, imagine concorrendo com uma revista coordenada pelo Kina, que nós já conhecíamos de longa data e sabíamos da sua determinação e competência. Quando em setembro de 2004, durante o Congresso Estética na APCD, finalmente vi a revista Dental Press de Estética levei um choque, tamanha a beleza. Quase morri de inveja (da Não sou 8 ou 80 como você diz. Isso é o mesmo que dizer que sou radical. E esse é um defeito que não tenho. boa, naturalmente) e logo pensei que iríamos nos dar mal. Para piorar um pouco descobri que a revista Dental Press de Estética seria a revista oficial de um dos melhores grupos de profissionais do mundo, a SBOE. Todavia, apesar de todos os nossos medos e angústias, felizmente, já se passou mais de um ano e tanto a revista Clínica, da qual tenho a honra de ser o editor chefe, como a revista Dental Press de Estética vem conquistando, dia a dia, mais e mais assinantes. Inúmeros dos nossos assinantes também são assinantes da revista Dental Press de Estética e vice e versa, naturalmente. Desde o início procuramos ajudar o Kina, remetendo vários trabalhos para publicação e ele também tem nos ajudado muito. Isso tudo apenas nos mostra, mais uma vez, que o Brasil e a Odontologia brasileira, apesar de todos os problemas sociais e econômicos que tem enfrentado, são fantásticos, uma vez que no mesmo ano possibilitaram o surgimento de duas novas e excelentes revistas. Além dessas duas publicações há várias outras de excelente qualidade científica. Além disso, no Brasil, cada vez mais podemos encontrar excelentes livros didáticos e, nesse sentido, temos que reconhecer a importância do Sr. Rui Santos que vem promovendo, ao longo dos anos, uma revolução nessa área. Fico feliz e orgulhoso cada vez que recebo o novo número da revista Dental Press de Estética (é verdade, juro) da mesma forma que fico quando recebo a Clínica. Para concluir quero parabenizar a todos os assinantes da revista Dental Press de Estética pela excelente escolha ao mesmo tempo em que gostaria de desejar a todos, assinantes, anunciantes, colaboradores e responsáveis pela revista Dental Press de Estética, muito sucesso, paz, felicidades e vida longa. R Dental Press Estét, Maringá, v. 2, n. 4, p , out./nov./dez

9 Entrevistadores Raquel Terada Graduada em Odontologia pela FOB/USP; Professora adjunta do Departamento de Odontologia da UEM; Editora Assistente da Revista Dental Press de Estética. Oswaldo Scopin de Andrade Mestre e Doutor em Prótese pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba-UNICAMP; Pós-Graduação em Prótese e Oclusão pela New York University - EUA; Professor Assistente do Curso de Atualização em Clínica Odontológica da Faculdade de Odontologia de Piracicaba UNICAMP; Clinical Fellow Straumann Clinic Universidade de Berna - Suíça; Coordenador dos Cursos de Implantodontia (Lato Sensu) e Odontologia Estética (Lato Sensu) das Faculdades SENAC de Ciência da Saúde. Editor Assistente da Revista Dental Press de Estética. Dickson Martins da Fonseca Cirurgião-dentista formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Mestrado em Reabilitação Oral-Prótese pela Faculdade de Odontologia de Bauru Universidade de São Paulo; Diretor Sociedade Brasileira de Odontologia Estética; Membro da Academia Brasileira de Odontologia Militar; Consultor científico da Revista Dental Press de Estética e do Corpo Editorial da Revista Clínica International Journal of Brazilian Dentistry; Exercício em Clínica privada direcionada à Odontologia estética e funcional na cidade de Natal-RN. Sidney Kina Professor de Prótese Dentária e Odontogeriatria da Universidade Estadual de Maringá - UEM; Consultor científico da Revista Clínica International Journal of Brazilian Dentistry; Editor da Revista Dental Press de Estética. Ronaldo Hirata Mestre em materiais dentários PUC-RS; Doutorando em dentística restauradora UERJ; Coordenador do curso de resinas compostas no Instituto Latino Americano de Odontologia Curitiba-PR; Professor do curso de pós-graduação lato-sensu em Odontologia estética SENAC-SP; Membro da Sociedade Brasileira de Odontologia Estética. Consultor científico da Revista Clínica International Journal of Brazilian Dentistry; Editor Assistente da Revista Dental Press de Estética. Prof. Dr. Luiz Narciso Baratieri Professor Titular da Faculdade de Odontologia da UFSC; Mestre e Doutor em Dentística; Coordenador do curso de especialização em Dentística da Faculdade de Odontologia da UFSC; Editor chefe da Revista Clínica International Journal of Brazilian Dentistry. 22 R Dental Press Estét, Maringá, v. 2, n. 4, p , out./nov./dez. 2005