AS BEM-AVENTURANÇAS. Introdução. Trem de mineiro...

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1 AS BEM-AVENTURANÇAS Introdução Trem de mineiro... Nós, mineiros, gostamos muito de trem. Eu me lembro das várias vezes que embarquei no trem que vai de Belo Horizonte a Vitória e desembarquei em Aimorés, cidade da avó da minha esposa. De trem, seguimos por um trilho. De trem, viajamos mais seguros. De trem, passamos por lugares diferentes. De trem, paramos de estação em estação. De trem, contemplamos melhor a paisagem. Certamente, viajar de trem tem as suas vantagens. Logo, o que faremos a partir de agora é uma gostosa viagem de trem. Trem de mineiro... Nesta viagem, seguiremos pelo trilho do chamado Sermão do Monte ; mais especificamente, pelos doze primeiros versos do capítulo cinco do Evangelho de Mateus. Viajaremos seguros porque a nossa reflexão estará fundamentada nas Escrituras Sagradas. Passaremos por lugares diferentes porque a mensagem de Jesus, em si mesma, é diferente. Como ele mesmo diz em Lucas 16:15: 15 ( ) aquilo que é elevado entre homens é abominação diante de Deus. O oposto também pode ser tomado como verdadeiro: aquilo que é elevado diante de Deus é abominação entre os homens. Assim, não é sem razão que John Stott refere-se à mensagem do Sermão do Monte como a contracultura cristã. Em nossa viagem, pararemos em cada bem-aventurança. Nestas paradas, buscaremos compreender o texto para aplicá-lo à nossa vida. Por fim, contemplaremos os detalhes do ensino do Mestre e nos surpreenderemos com a sua beleza. Vamos viajar juntos? Luiz Felipe Xavier REFLEXÕES BÍBLICAS III 61

2 LUIZ FELIPE XAVIER ESTUDO 12 INÍCIO DA VIAGEM Começando pelo fim... O real motivo da nossa viagem é compreender a autoridade da ordem de Jesus de fazer discípulos, desenvolver as características das Bem-aventuranças. Assim buscaremos compreender o texto de Mateus 28:16-20 em que o autor narra o fim da jornada terrena de Jesus quando, prestes a voltar ao céu dá aos discípulos uma missão que seria o início da igreja cristã na terra: a Grande Comissão. 16 Seguiram os onze discípulos para a Galiléia, para o monte que Jesus lhes designara. 17 E, quando o viram, o adoraram; mas alguns duvidaram. 18 Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. 19 Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; 20 ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século (Mt. 28:16-20). LEITURAS DIÁRIAS Segunda Mt. 5:1-5 Terça Mt Quarta Lc. 6: Quinta Mt.1:22-23 Sexta Mt. 9:9-13 Sábado Mc Domingo Mt. 28:16-20 Este texto, que encerra o Evangelho de Mateus, é conhecido como a Grande Comissão. Tendo ressuscitado, Jesus aparece a seus discípulos na Galileia. Diante de Jesus ressurreto, os discípulos têm duas reações: alguns adoram; outros duvidam. Assim, Jesus se aproxima e faz uma importante declaração: Toda autoridade me foi dada no céu e na terra. Uma vez que tem toda autoridade, ele pode dar uma ordem. Essa ordem é fazei discípulos de todas as nações. Dos quatro verbos presentes nos versos 19 e 20, apenas um está no imperativo, como uma ordem: fazei discípulos. Então, aqui surge uma pergunta: Como os discípulos deveriam fazer outros discípulos de Jesus? A resposta é: indo, batizando-os e ensinando-os. O indo tem o sentido de prosseguindo na viagem. Ou seja, por onde estivessem passando, deveriam cumprir a ordem de fazer discípulos. Deveriam proclamar o Evangelho e esperar a 62 REFLEXÕES BÍBLICAS III

3 AS BEM-AVENTURANÇAS resposta a ele: arrependimento e fé. Consequentemente, quem ouve o Evangelho e responde com arrependimento e fé torna- -se discípulo de Jesus. Quem se torna discípulo de Jesus, por sua vez, deve ser batizado e ensinado. Deve ser batizado em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, batizado em nome do Deus que é Trindade. Mais do que isso, quem se torna discípulo de Jesus deve ser ensinado. Aplicação a sua vida: Temos conhecimento de que para aprender é necessário um coração ensinável. Você tem desejado aprender mais de Cristo? Como tem buscado esse coração ensinável? Aqui, no fim, se encontra a chave de leitura de todo o livro. Jesus diz: (...) ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. A grande questão é: Que coisas são essas? Para responder a esta pergunta, precisamos conhecer melhor o Evangelho de Mateus. Compreendendo o livro Sempre que nos deparamos com qualquer livro da Bíblia, é bom que façamos cinco perguntas: Primeira: Quem escreveu este livro? Essa é a pergunta pelo autor. Segunda: Quando escreveu este livro? Essa é a pergunta pela data. Terceira: De onde escreveu este livro? Esta é a pergunta pelo local de origem. Quarta: A quem escreveu este livro? Esta é a pergunta pelo destinatário. Quinta: O que gerou e por que escreveu este livro? Esta é pergunta pela ocasião e pelo propósito. As respostas a estas perguntas facilitam a leitura e compreensão de todo e qualquer livro da Bíblia. Vamos a elas! Observação: Você pode usar essas perguntas todas as vezes que ler um texto. O Evangelho de Mateus Autor Como o próprio nome indica, o livro é escrito por Mateus (ou Levi), um dos doze apóstolos. Antes de ser alcançado pela maravilhosa graça de Jesus, Mateus é um publicano. Os publicanos são cobradores de impostos. Por trabalharem para o governo romano e por oprimirem seu próprio povo, eles são odiados e marginalizados. O chamado de Mateus acontece da seguinte maneira: 9 Partindo Jesus dali, viu um homem chamado Mateus sentado na coletoria e disse-lhe: Segue-me! Ele se levantou e o seguiu. 10 E sucedeu que, estando ele em casa, à mesa, muitos publicanos e pecadores vieram e tomaram lugares com Jesus e seus discípulos. 11 Ora, vendo isto, os fariseus perguntavam aos discípulos: Por que REFLEXÕES BÍBLICAS III 63

4 LUIZ FELIPE XAVIER come o vosso Mestre com os publicanos e pecadores? 12 Mas Jesus, ouvindo, disse: Os sãos não precisam de médico, e sim os doentes. 13 Ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia quero e não holocaustos; pois não vim chamar justos, e sim pecadores ao arrependimento (Mt. 9:9-13). Que texto maravilhoso! Data - Mateus escreve seu Evangelho entre os anos 60 e 64 d.c.. Para tal, ele conta com o Evangelho de Marcos, escrito entre os anos 55 e 60, e com suas próprias lembranças, como uma testemunha ocular. Local e destinatários - Mesmo que não seja possível afirmar com certeza, ao que tudo indica, Mateus escreve de Antioquia da Síria. Ali há uma grande comunidade de judeus convertidos à fé cristã, oriundos principalmente de Jerusalém. Propósito - Mateus escreve a esses judeus convertidos à fé cristã. Provavelmente, eles estão passando por uma crise de fé, em que a identidade de Jesus como Messias está sendo questionada. Portanto, Mateus escreve o seu Evangelho para fortalecer a fé desses irmãos e para deixar claro que Jesus é, de fato, o Messias que os judeus tanto esperaram. Curiosidades: Como os destinatários de Mateus são de origem judaica, ele contextualiza seu Evangelho de modo a alcançá-los. Por exemplo: 1) Uma vez que os judeus têm dificuldades em citar o nome de Deus, Mateus utiliza a expressão Reino dos céus em vez de Reino de Deus, como Marcos e Lucas o fazem. A primeira vez que isso acontece é em 3:2. 2) Uma vez que os judeus pensam com as categorias de promessa-cumprimento, Mateus utiliza 18 vezes a expressão para que se cumprisse (ou expressões semelhantes). A primeira delas é em1:22-23: 22 Ora, tudo isto aconteceu para que se cumprisse o que fora dito pelo Senhor por intermédio do profeta: 23 Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, e ele será chamado pelo nome de Emanuel (que quer dizer: Deus conosco.). Aplicação a sua vida: Mateus contextualizou a expressão reino de Deus para Reino dos céus por causa do temor dos judeus de banalizar o nome Deus. Como podemos contextualizar adequadamente os ensinos de Jesus? Conhecendo os cinco grandes discursos de Mateus... Uma das principais evidências da contextualização de Mateus é a estrutura literária do seu 64 REFLEXÕES BÍBLICAS III

5 AS BEM-AVENTURANÇAS Evangelho. Ele o elabora em cinco grandes discursos. Quando falamos cinco, de que um judeu se lembra? Ele se lembra do Pentateuco, os cinco livros da Lei. Logo, Mateus estrutura seu Evangelho em cinco grandes discursos. Isso porque Jesus é aquele que traz a nova Lei ao seu povo. Esses cinco grandes discursos são: Mateus 5 a 7 trata da ética no Reino; Mateus 10 trata da missão no Reino; Mateus 13 trata das parábolas do Reino; Mateus 18 trata da comunidade do Reino; e Mateus 24 e 25 trata da escatologia do Reino. O Sermão do Monte... O primeiro desses cinco grandes discursos, Mateus de 5 a 7, é chamado de Sermão do Monte. Como foi dito, ele trata da ética no Reino de Deus. Quando usamos esta palavra, ética, estamos nos referindo ao agir humano no mundo. Isto é, o Sermão do Monte descreve como devem ser as atitudes dos discípulos de Jesus em um ambiente contra os valores do Reino de Deus. A aplicação sistemática dos princípios éticos do Reino de Deus proporciona a felicidade. Assim, a felicidade não depende das circunstâncias, mas de como reagimos a elas. Uma reação natural gerará tristeza, ao passo que uma reação espiritual, seguramente, gerará satisfação profunda. Assim, concluímos que o êxito na vida do discípulo de Jesus não vai ser um acidente ou bênção destinada a alguns que tiveram experiências especiais, porém, o resultado direto da aplicação dos princípios éticos do Reino de Deus. Aplicação a sua vida: O modo como reagimos às circunstâncias da vida demonstra a aplicação ou não dos princípios éticos do Reino de Deus. Estamos demonstrando, diante de circunstâncias adversas, reação espiritual ou natural? Conclusão - As bem-aventuranças... A primeira parte do Sermão do Monte é chamada de bem- -aventuranças. Como também já foi dito, elas são apresentadas entre os versos 1 e 12 do capítulo 5 do Evangelho de Mateus. Embora a Bíblia não apresente um conceito de felicidade, ela demonstra, com clareza, as características daqueles que são felizes. Jesus os chama de bem-aventurados (makarios). A palavra grega makarios significa abençoados ou felizes. Assim, para Jesus, são felizes aqueles que possuem as seguintes características: 1 Vendo Jesus as multidões, subiu ao REFLEXÕES BÍBLICAS III 65

6 LUIZ FELIPE XAVIER monte, e, como se assentasse, aproximaram-se os seus discípulos; 2 e ele passou a ensiná- -los, dizendo: 3 Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus. 4 Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados. 5 Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra. 6 Bem- -aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos. 7 Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. 8 Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus. 9 Bem- -aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. 10 Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. 11 Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos injuriarem, e vos perseguirem, e, mentindo, disserem todo mal contra vós. 12 Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós (Mt. 5:1-12). Em cada estação da nossa viagem, refletiremos sobre uma das bem-aventuranças. A primeira será: 3 Bem-aventurados os humildes de espírito (...). 66 REFLEXÕES BÍBLICAS III