BRISA MARíTIMA UTILIZANDO PROCESSOS ÚMIDOS. Lígia Ribeiro Bernardet Maria Assunção Faus da Silva Dias
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1 566 MODELAGEM DE BRISA MARíTIMA UTILIZANDO PROCESSOS ÚMIDOS Lígia Ribeiro Bernardet Maria Assunção Faus da Silva Dias Departamento de Ciências Atmosféricas Instituto Astronômico e Geofísico Universidade de São Paulo ABSTRACT A numerical study of subtropical sea breeze is presented. The Colorado State University Regional Atmospheric Modeling System (CSU/RAMS) is used to model breeze development and inland penetration. Results show that, when moist processes are present, coupling between topographically forced circulations and breeze triggers a gravity wave that propagates inland, causing upward motion 400 km away from the coast, and leading to a lag between precipitation on the coast and inland. In flat terrain the gravity wave causes upward motion inland but does not couple with convection that has a maximum all over the domain before sunset. 1. INTRODUÇÃO Neste trabalho será apresentada uma simulação de brisa marítima na latitude da cidade de São Paulo (23,S S), realizada com um modelo numérico de mesoescala. O modelo possui topografia detalhada e processos úmidos, cuja influência foi analisada através de experimentos de sensibilidade, nos quais esta física foi retirada. A importância da circulação de brisa marítima foi apontada por diversos autores (Kousky, 1980; Pielke, 1974), que mostraram seu papel em organizar a precipitação, formando regiões de convergência de massa e umidade em superfície, que podem propagar-se continente adentro. A interação entre a brisa marítima e as circulações forçadas pela topografia foi abordada por Mahrer e Pielke (1977) e Franchito e Yamazachi (1984), que identificaram uma intensificação da circulação diurna e noturna quando os dois fenômenos se superpõem. 2. O MODELO UTILIZADO O modelo utilizado neste estudo foi o RAMS (Regional Atmospheric Modeling System), desenvolvido na Colorado State University - CSU/EUA (Tripoli, 1986; Bernardet, 1992). A versão utilizada é não-hidrostática, elástica, com topografia real, modelo de solo úmido com balanço de radiação em superfície, parametrização da turbulência tipo K de deformação e parametrização da convecção tipo Kuo modificado. Foi utilizada uma grade (G1) com espaçamento de 40 km na direção leste-oeste e espaçamento vertical variável de 300 m, próximo à superfície, a 7 SO m no topo do modelo, que está a m de altura. Aninhada em G1 foi inserida uma segunda grade (G2) com espaçamento de 20 km, cobrindo a parte do domínio onde os gradientes de altura topográfica são mais intensos, como nas Serras do Mar e Cantareira. As figuras apresentadas referem-se a G1, onde os 17 pontos a esquerda (oeste) representam o continente e os 10 a direita (leste), o oceano. O modelo foi inicializado às 08 HL (hora local) com uma única sondagem, das 09 HL de 22 de fevereiro de 1989, obtida no aeroporto de Congonhas, SP, com vento nulo em todos os níveis. A
2 567 sondagem foi modificada próximo à superficie, para que os dados se estendessem até o nivel do mar e no topo, para acentuar a tropopausa, condição necessária para a aplicação da condição de fronteira superior. 3. RESULTADOS Serão apresentados os resultados do experimento controle (3.1) e de dois experimentos de sensibilidade, envolvendo ausência de processos úmidos (3.2) e topografia plana (3.3). 3.1 EXPERIMENTO CONTROLE Observou-se que no início da simulação o solo se aquece e transfere calor ao ar sobre o continente, causando a formação de camada de mistura e de gradiente de temperatura entre o ar sobre o continente e sobre o mar. A camada de mistura pode ser vista sobre o planalto paulistano às 10 HL na Fig. 1. Às 10 HL, a brisa maritima começa a se desenvolver na costa e superpõe-se à circulação de brisa de montanha existente na encosta leste da Serra do Mar. Regiões de convergência de massa em superfície são geradas, causando movimento ascendente (w = 5 cm/s) com máximo em z = 4700m, em x = +80 km, x = -80 km e x = -200 km. Estas posições têm parte de sua origem na orografia. Em x = +80 km, atuam as duas brisas citadas acima. Em x = -80 km, existe a brisa vale montanha que ainda desce a Serra da Cantareira, mas já está sofrendo desaceleração, pela formação da brisa de montanha que é de leste. Em x = -200 km, há a influência da fraca brisa de montanha que desce a encosta oeste da Serra da Cantareira nas primeiras horas da manhã, e que encontra também o início da formação da brisa de vale-montanha, que se opõe. Estas perturbações nos níveis médios da atmosfera desorganizam a circulação de retorno, que é pouco desenvolvida durante toda a integração.. Estes máximos de movimento ascendente ativam a convecção, que se manifesta através da liberação de calor latente na média troposfera. Às 10 HL este efeito pode ser visto na Fig. 2, que mostra a circulação de brisa maritima e de montanha superpostas em x = +80 km, com divergência em niveis superiores. No decorrer do dia, a camada de mistura sobre o continente aumenta de profundidade, atingindo 2500 m às 16 HL. Ar marítimo é advectado continente adentro, causando o avanço da frente de brisa. Neste horário o máximo de movimento horizontal de leste encontra-se ainda na costa, mas observa-se a existência de movimento vertical ascendente no interior do continente (x = -200 km) com intensidade de 9,0 cm/s; a convecção está ativa sobre o continente até x = -320 km, e as taxas de aquecimento chegam a 44,2 K/dia na média troposfera (z = 4104 m). Às 20 HL, em x = -40 km, a circulação zonal atinge sua máxima intensidade (-8,4 m/s) e O movimento vertical apresenta correntes ascendentes significativas (w = 9,6 cm/s em x = -360 km). A Fig. 3 mostra sequência temporal da taxa de precipitação convectiva em superfície, apontando a existência de valores de até 7,9 mm/h no interior do continente. Mostra ainda que existe um lag, isto é, um atraso de fase entre a precipitação que ocorre a leste e a oeste do domínio. Após o por-do-sol, a temperatura do solo começa a cair e a atmosfera se estabiliza. A convecção cessa às 00 HL, com registro de máximos acumulados de 79,9 mm e 52,9 mm em x = +80 km e x = -200 km, respectivamente. A brisa terrestre se instala às 04 HL e é bastante sensível à diferença de inclinação entre as duas partes da Serra do Mar, que é mais acentuada na sua parte superior, gerando duas células de brisa independentes. Às 06 HL é
3 568 bastante significativo o escoamento encosta abaixo a leste e a oeste da Serra da Cantareira, gerando convergência nos vales das duas laterais. 3.2 SECO: AUSÊNCIA DE PROCESSOS ÚMIDOS O Caso Seco foi rodado sem a parametrização da convecção e sem a condensação. Diferenças marcantes em relação ao contra] e aparecem nos altos níveis: acima de z = 4 km. Enquanto no controle observam-se regiões de movimento ascendente forte em z = 4700 m acompanhadas de divergência nos níveis superiores, no caso seco a energia cinética fica confinada aos baixos níveis. Com isso, a magnitude da circulação de brisa é maior e a circulação de retorno é nítida em z 3200 m. Em seu horário de máximo desenvolvimento, 20 HL, atinge 4,5 m/s. Neste caso notou-se que não existem perturbações no campo de movimento vertical no interior do continente em posições destacadas do máximo de velocidade zonal. 3.3 PLANO: TOPOGRAFIA PLANA Neste experimento foram mantidas todas as opções do experimento controle, exceto quanto à topografia, que foi tomada plana em todos os pontos. Foi marcante a tendência de um deslocamento continente adentro mais lento do que no caso controle. Por exemplo, às 14 HL quando o máximo de movimento zonal de leste no controle já está em x = +160 km, no caso plano ainda está em +120 km. A magnitude da circulação, tanto em movimento zonal como em vertical, também foi inferior ao controle. A diferença no comportamento do movimento vertical reflete-se na convecção, que apresenta precipitação próxima à costa, o que não ocorria no controle. A precipitação no caso plano é bastante homogênea no domínio. Somando-se o acumulado em todos os pontos de grade, obtém-se total superior ao controle, mas puntualmente o acumulado de 24 horas a partir do início da simulação não excede 44,1 mm. Ocorre precipitação significativa no interior do continente (x = -400 km), mas como se vê na Fig. 4, a taxa de precipitação em superfície não apresenta atraso de fase do oeste do domínio em relação ao leste. 4. CONCLUSÕES Foram apresentados três experimentos de simulação de brisa marítima. Na presença de topografia complexa e processos úmidos, observou-se a penetração da brisa da costa até o planalto paulistano e o aparecimento de perturbações no interior do continente. Estas foram atribuídas ao desenvolvimento e propagação de uma onda de gravidade, que tem sua origem no movimento vertical oriundo da convecção organizada pela topografia. No caso em que os processos úmidos foram retirados, não houve formação da onda de gravidade. A energia cinética ficou confinada a 200 km de distância da costa e à superfície, possibilitando o desenvolvimento de circulação de retorno. Foi apontada a importância da topografia em organizar e intensificar as regiões de convergência em superfície. Sem esta forçante, ocorre a formação de onda de gravidade, que provoca movimento ascendente no interior; no entanto, a inexistência do atraso de fase da precipitação a oeste em relação à leste indica que a onda de gravidade não se acopla à convecção.
4 569 AGRADECIMENTOS Ao Dr. William Cotton, da Colorado State University, cedido o RAMS, desenvolvido com suporte da National Foundation (NSF) e do Army Research Office (ARO) dos EUA. por ter Science REFER~NCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERNARDET, L. R., Simulaç~o numérica da brisa maritima e de sua interaç~o com a topografia na presença de processos úmidos. Tese apresentada ao Departamento de Ciências Atmosféricas do IAG/USP para obtenç~o do grau de mestrado. FRANCHITO, S. H. e YAMAZAKI, Y., 1984a. Efeitos da topografia e escoamento médio sobre as circulações locais na regi~o N e NE do Brasil. Anais do 111 Congresso Brasileiro de Meteorologia, Belo Horizonte - MG. KOUSKY, V., Diurnal rainfall variation in northeast Brazil. Mon. Wea. Rev., 108, pp MAHRER, Y. e PIELKE, R., The effects of topography on sea and land breezes in a two-dimensional numerical modelo Mon. Wea. Rev., 105, pp PIELKE, R. A., A three-dimensiona1 numerica1 mode1 of the sea breezes over south Florida. Mon. Wea. Rev., 102, TRIPOLI, G. J., A numerical investigation of an orogenic mesosca1e convective system. Dissertaç~o de Ph.D., Colorado State University, Dept. of Atmospheric Science, Fort Collins, CO, EUA, 290 pp, Atmospheric Science Paper N b.-31b r "~( ~ ' ~ Fig 1 Temperatura potencial às 10 HL, controle Espac;:amento de 1.0 K. Máx: 318 Ki mín: 300 K
5 570 Fig 2 Vento zonal às 10 HL, controle de 0,9 m/s. Máx: 0,45 m/s, mín: -0,99 m/s ~ Fi9 3 - Sequência temporal de taxa de precipitação eonvectiva em superfície, controle. -4 de 0,5><10 em/s. Máx: -3 O,9x10 cm/s (;;;; 32,4 mm/h) lo 6 Fi9 4 - Sequência temporal de taxa de precipitação convectiva em superfí'cie, Caso plano. entre isolirihas -4 de 0,4x10 em/s -8 Máx: 0,68xl0 em/s (= 24,5 mm/h)
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