Parece precipitado apostar em uma recuperação da economia chinesa
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- Vergílio Sequeira Alcântara
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1 INFORMATIVO Nº. 54. MARÇO de 2016 Parece precipitado apostar em uma recuperação da economia chinesa Fabiana D Atri - Economista Coordenadora do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco e Diretora de Economia do CEBC. As preocupações com a economia chinesa, aparentemente, se reduziram nas últimas semanas. Há a expectativa de que estímulos fiscais sejam intensificados neste ano, a saída de capital foi bem menor em fevereiro e o mercado imobiliário mostrou alguma retomada no começo deste ano. De fato, os preços das commodities em especial do minério de ferro subiram mais recentemente, em resposta a essa melhora de percepção. No entanto, parece-nos precipitado tomar esses sinais e essas expectativas como garantia de recuperação sustentável da economia. Até porque o desempenho da indústria e das exportações segue fraco e os estímulos monetários e fiscais adotados desde o ano passado não têm sido suficientes para trazer de volta o dinamismo da economia chinesa. Da mesma forma, os ajustes estruturais em curso com o lento avanço da reformas, a elevada alavancagem e o fechamento da capacidade produtiva trarão consequências para a economia, com destaque para o aumento do desemprego e a necessidade da reestruturação de empresas, que limitam um crescimento mais intenso à frente. Assim, mantemos nossa visão de que a expansão do PIB neste ano será menor do que o intervalo de 6,5% a 7,0% estabelecido pelo governo. A volatilidade e a incerteza continuarão presentes, ainda que a interrupção da saída de capitais não deva ser descartada como fator importante para a estabilização da economia. Cabem então algumas considerações sobre essas mudanças recentes de expectativa: 1. Menor saída de capital e interrupção da depreciação do câmbio podem ancorar expectativas Após a forte saída de capital em dezembro do ano passado e janeiro deste ano, refletindo em queda das reservas de US$ 207,4 bilhões somente nesses dois meses, parece que o governo conseguiu controlar esse fluxo. Em fevereiro, a redução das reservas estrangeiras chegou a US$
2 28,57 bilhões já considerando os efeitos cambiais. Como alternativa, monitorando a posição líquida em moeda estrangeira dos bancos, notamos também que a saída de recursos no mês passado perdeu força, o que fica evidenciado no gráfico a seguir. Ao mesmo tempo, após rápida e forte depreciação da moeda observada no início do ano, o yuan retornou praticamente ao seu nível do início do ano. Vale lembrar que quando as pressões para uma depreciação mais acentuada ganharam força, o governo fez intervenções para reduzir a diferença entre a moeda negociada em Hong Kong e na China e aumentou o controle do fluxo. Além disso, o tom da comunicação de oficiais tem reforçado a visão de que a moeda chinesa não precisa passar por uma perda de valor tão intensa (até porque o país tem superávit em conta corrente e grande parte da saída de capitais se explica por um ajuste do caixa das empresas, que tem buscado deixar seus recursos em moeda estrangeira). Assim, parece, por enquanto, que o governo conseguiu ancorar as expectativas acerca da depreciação da sua moeda, reduzindo o ímpeto da saída de recursos. Acreditamos que o yuan encerrará este ano em patamar mais depreciado, mantendo a tendência já observada desde o ano passado, mas esse movimento deverá ser gradual, com aumento da volatilidade do câmbio nas duas direções, com base na premissa de que a moeda seguirá estável em relação à cesta de moedas 1. Vale ainda dizer que não acreditamos que uma depreciação do yuan seria usada como estímulo às exportações. Lembrando que mesmo com a queda em curso dos embarques chineses, notamos aumento da participação do país no mercado mundial. 1 Neste ano, o yuan perdeu 2,1% em relação à cesta de moedas.
3 2. Sinais de melhora do setor imobiliário e recuperação dos preços das commodities não devem se sustentar Nos dois primeiros meses deste ano, tivemos diversos indicadores apontando uma melhora da atividade do setor imobiliário. De fato, comparando os dois primeiros meses deste ano com o mesmo período do ano passado, as vendas de imóveis residenciais subiram 30,4%, os lançamentos cresceram 9,7% e os investimentos no setor avançaram 3,0%, revertendo a tendência do ano passado. Os preços nas cidades maiores também têm mostrado elevação 2, o que poderia sugerir uma recuperação do setor. Por outro lado, (i) as vendas de terras seguem em tendência de retração o que aponta para investimentos ainda fracos, (ii) a melhora tem se concentrado nas cidades grandes 3 e (iii) os estoques continuam elevados nas cidades menores. Levando em conta que os estímulos adotados desde o ano passado eram voltados ao ajuste de estoques e não ao incentivo à retomada dos lançamentos 4, entendemos que ainda não teremos uma recuperação sustentada da atividade do setor. Somado a isso, a demanda de cimento e o consumo aparente de aço bruto recuaram 8,2% e 6,6%, nessa ordem, no primeiro bimestre deste ano em relação ao mesmo período de Esses dados, por sua vez, sustentam que a atividade da construção, incluindo infraestrutura, continua fraca ditando o ciclo de desaceleração da economia. Também não devemos nos esquecer da volatilidade comum no início de ano na China, por conta do feriado do ano novo. E, diferentemente do observado no ano passado, as exportações de aço devem perder força neste ano, uma vez que diversos países têm lançado mão de medidas antidumping, como os EUA. 2 Da amostra de 100 cidades monitoradas, 61 delas mostraram alta de preços na passagem de janeiro para fevereiro. 3 Lembrando que mesmo em Shanghai, as vendas de imóveis cresceram 45% no ano passado, mas os lançamentos registraram queda de 6,4%. 4 Com a melhora da oferta de crédito imobiliário.
4 Com isso, acreditamos que o rally recente dos preços das commodities, em especial do minério de ferro e do aço, não parece sustentável. Além dessa leitura mais positiva do setor imobiliário, a injeção de liquidez acentuada recentemente e a recomposição de estoques podem ter motivado a elevação das cotações das matérias primas. 3. Dados mais recentes da indústria e das exportações seguem fracos Em oposição aos sinais mais favoráveis vindos dos investimentos, o desempenho da indústria e do varejo em janeiro e fevereiro apontou ritmo de crescimento muito fraco. A produção industrial cresceu 5,4% no primeiro bimestre deste ano, chegando ao nível mais fraco desde 2009 e desacelerando ante dezembro (5,9%). As vendas nominais no varejo avançaram 10,2% nos dois primeiros meses deste ano, abaixo da alta de 11,1% registrada em dezembro. Da mesma forma, as exportações acumularam retração de 18% nos dois primeiros meses deste ano, com as importações recuando 17%, parcialmente influenciadas pelos menores preços das matérias primas.
5 4. Sinalização de mais afrouxamento fiscal e nova meta de crescimento de 6,5 a 7,0% Na abertura do Congresso Nacional do Povo 5, o primeiro ministro Li Keqiang anunciou as principais diretrizes para a política econômica deste ano. Entre os destaques, temos as metas para as variáveis econômicas, com o objetivo para o crescimento do PIB passando de algo ao redor de 7% no ano passado, para um intervalo entre 6,5% e 7%. De fato, crescer 6,5% ao ano até 2020 é compatível com a meta de dobrar o PIB per capita nesse período. Além disso, foi mantida a meta de alta da inflação ao consumidor de 3%; foi ajustada a expansão do agregado monetário M2 para 13% (ante 12% no ano passado) e pela primeira vez foi estabelecido um objetivo para a medida agregada de crédito, também contemplando uma alta de 13%. O déficit primário como proporção do PIB deverá chegar a 3%, lembrando que em 2015 atingiu 2,3%. Dessa forma, a sinalização a nosso ver para a política monetária é de estabilidade em relação ao que temos neste momento (prudente com flexibilidade), o que implica continuidade do afrouxamento através de instrumentos tradicionais e não convencionais e da recente aceleração do crédito observada nos dois primeiros meses de Nesse sentido, destaca-se a preocupação com a liquidez financeira e o estímulo da troca de dívidas por ativos para as corporações, dividindo o risco com os bancos. Ao mesmo tempo, podemos esperar mais estímulos fiscais, porém direcionados e com participação importante dos bancos de fomento. Não houve o estabelecimento de uma meta para o comércio externo e a sinalização para reformas e para a política cambial não divergiram do que vem sendo comunicado. 5 Concluído no último dia 16 de março.
6 5. Fechamento de capacidade produtiva acontecerá lentamente, condicionado ao aumento do desemprego, à intensidade da desaceleração e da efetividade dos estímulos Diante desse cenário, acreditamos que o PIB do primeiro trimestre deste ano segue desacelerando em relação ao final do ano passado. Importante dizer que parte do mercado tem destacado sinais de melhora da economia, especialmente dos segmentos ligados à cadeia de construção e infraestrutura, em decorrência dos estímulos adotados mais recentemente e porque há expectativa de que os impulsos fiscais vão ganhar força. Por outro lado, entendemos que a alta recente dos preços das commodities é mais um efeito do afrouxamento da liquidez, da recomposição de estoques e deverá ser temporário, tendo em vista que a redução do lado da oferta deverá ser muito gradual e insuficiente diante do nível da demanda 6 mais fraco. Assim, no melhor cenário, podemos observar uma discreta melhora da atividade e, principalmente, das expectativas na passagem do primeiro para o segundo trimestre. Entretanto, para que a meta deste ano seja cumprida, a economia precisa acelerar muito mais do que estamos vendo neste momento. Isso implica dizer que além de uma recuperação das exportações e da sustentação da retomada do setor imobiliário, o afrouxamento da política econômica deverá ser intensificado. Por fim, temos duas preocupações finais. A primeira delas refere-se ao mercado de trabalho, uma vez que o fechamento de capacidade produtiva especialmente no setor siderúrgico e de mineração e da desaceleração do segmento de construção certamente têm levado a um aumento do número de desempregados. Por ora, parece que parte tem retornado ao campo, mas uma outra parte deve buscar recolocação e poderá não encontrar. A outra preocupação concentra-se no destino do excesso de liquidez hoje presente na economia. Sabe-se que a demanda por crédito para a economia real continua muito fraca. Assim, entendemos que parte dessa liquidez tem se dirigido a diversos ativos, saindo do mercado acionário e migrando recentemente para os mercados de commodities e de imóveis das grandes cidades. Especula-se que as cidades menores e o mercado de bonds poderiam ser outros candidatos à forte apreciação. 6 Fechamento da capacidade produtiva deve ficar entre 10 e 15% nos próximos cinco anos.
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