«E SE EU FOSSE CEGO?» Narrativas silenciadas da deficiência

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1 Bruno Sena Martins «E SE EU FOSSE CEGO?» Narrativas silenciadas da deficiência Edições Afrontamento

2 Autor: Bruno Sena Martins Título: «E se eu fosse cego?»: Narrativas silenciadas da deficiência 2006, Bruno Sena Martins e Edições Afrontamento Imagem da capa: Eduardo Basto Edição: Edições Afrontamento/ Rua de Costa Cabral, 859/ Porto Colecção: Saber Imaginar o Social/ 22 N.º de edição: 1009 ISBN 10: ISBN 13: Depósito legal: /06 Impressão e Acabamento: Rainho & Neves, Lda./ Santa Maria da Feira Maio de 2006

3 ÍNDICE Prefácio... Introdução I Naufrágios de um Sentido 1. «Perfume de Mulher»: Fragrâncias situadas A Bíblia: Luz, Trevas e o Evangelho nos Corpos O Legado Grego: Homero, Tirésias e Édipo A Idade Média: A cegueira num mundo encantado II O Des-encantamento da Cegueira 1. A Promessa Iluminista: De Diderot a Luís Braille O Visualismo Moderno: A sacralização da visão na «doutrina da imaculada percepção» 3. A Invenção da Deficiência: O «biopoder» e a «hegemonia da normalidade» Corpos Tangíveis: A cegueira feita materialidade Capitalismo Industrial e Individualismo: Contributos para um ancoramento incapacitante da «deficiência» A Industrialização O Individualismo A Politização da Deficiência: Reabilitar quem? O Modelo Social da Deficiência Direitos Humanos: Cumplicidades transnacionais III «Pelos Teus Lindos Olhos» 1. A ACAPO como uma Estranha Forma de «Campo»

4 IV Nas Costas do Elefante: as vidas da Cegueira 1. Os Caminhos de uma Bengala Branca: Ao encontro de narrativas silenciadas Educação Emprego Tacteando os Obstáculos O «tic-tac»: estigma e poder A Barqueira Indecisa: ACAPO e as travessias do querer ao poder Deficiência e Política Associativa no Contexto Português V O Corpo Transgressor: Construções Sensoriais do Mundo, Leituras do Sofrimento 1. A Experiência Incorporada e os Limites da linguagem Tragédia, Sofrimento e Liminaridades «E Se Eu Fosse Cego?»: A cegueira como projecção nos acolhedores corpos que a pensam VI Conclusão: «Vamos tomar café lá longe» 261 Lista de Acrónimos... Referências Bibliográficas

5 Para a minha mãe

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7 Disse para comigo: já que perdi o querido mundo das aparências, tenho de criar outra coisa: tenho de criar o futuro, o que sucede ao mundo visível que, de facto, perdi. Jorge Luis Borges

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9 PREFÁCIO Este livro resulta de um longo texto que irrompeu na minha vida. Certamente que o busquei quando me lancei no encalço das «vidas da cegueira», mas, como quase sempre acontece, fi-lo então em termos bem distantes daqueles que aqui chegam à «solenidade do papel». Essa inevitável «perda de controlo» poderá resultar do caminho errante que a escrita e as ideias tantas vezes tomam, surpreendendo o seu próprio autor. No entanto, este caso é sobretudo a expressão de como podemos ser desconcertados por «segredos sociais» e por desconhecidos contadores de histórias. Segredos estes que mais não são do que realidades sistematicamente relegadas para esconderijos da nossa cultura. Romper esses segredos equivale a romper com preconceitos longamente estabelecidos, implica dar atenção a existências pouco consideradas, e instiga a reconhecer vozes que raramente podem assumir uma autoria na vida social. É o sistemático silenciamento dessas vozes que explica largamente porque é que as perspectivas «informadas» das pessoas cegas vieram, também para mim, tomar o lugar antes ocupado pelo desconhecimento e pelos preconceitos acerca da cegueira. Na verdade, constituiu uma enorme aprendizagem poder partilhar algo do «mundo novo» trazido por aqueles que de facto conhecem a cegueira «na carne». Um conhecimento incrustado num duplo sentido: pelo facto das pessoas cegas viverem numa realidade em que a visão está ausente enquanto instrumento de realização e conhecimento, mas também, e isto é fulcral, por experimentarem de modo incontornável o estigma e a vivência da opressão. A decisão de me dedicar à cegueira, enquanto tema de investigação, nada deveu a alguma aparição mais significativa dessa condição na minha história pessoal. Foi assim como um daqueles deliciosos mistérios que as contingências da vida nos ofertam. Por isso, quando lá tinha que ir contando o que andava a «fazer da vida» era frequente os meus interlocutores ensaiarem algo do género: «interessante..., mas como foste aí parar? Mas a cegueira..., em que sentido?». Primeiro. Como vim aqui parar? Realmente é uma questão de resposta pouco óbvia. Apenas poderei aventar que a vontade de escolher uma área de estudo social, pouco desbravada, com possibilidade de trabalho empírico, me levou ao encontro 11

10 «E Se Eu Fosse Cego?»: Narrativas Silenciadas da Deficiência de experiências que até então só conhecia de passagem; literalmente: pela passagem na rua de pessoas «tacteando» o caminho com as suas bengalas. No fundo, à boleia de um propósito académico, acabei por descobrir todo um universo de vivências desconhecidas que cedo se enlaçaram na minha vida: pela extensiva convivência e prática de trabalho de campo/voluntariado junto das pessoas cegas, pelos amigos e relações que perduram no tempo, e pelo forte impacto advindo do confronto com uma gritante situação de marginalização social. A cegueira em que sentido? Responder à segunda parte do eco suscitado pela minha ideia de pesquisa não me é difícil. Por ora direi, tão-só, que procurei compreender como é que as representações culturais da cegueira se relacionam com as reflexões e histórias de vida das pessoas cegas. E, nesse sentido, há duas grandes linhas de abordagem que se entretecem tanto no texto deste livro como nas vidas com que estabeleci proximidade. Por um lado, temos que mergulhar num tempo longo, pois é nele que achamos os múltiplos significados que historicamente foram sendo associados à experiência de quem se encontra privado do sentido da visão. Esta linha de abordagem coloca- -nos desde Tirésias, Édipo, Sansão, Jesus, etc. perante curiosas heranças históricas da cultura ocidental, duradouras pérolas simbólicas associadas à cegueira. Mas tal empresa obriga-nos também a considerar a experiência cegueira por relação com alguns dos traços mais marcantes da cultura ocidental, e é só nessa relação contingente entre cegueira e cultura que ganha sentido a genealogia de uma invenção, a invenção da moderna de ideia de deficiência e, no seio desta, da ideia de deficiência visual. Por outro lado, importa atender a um curto tempo onde adquirem inequívoca centralidade as histórias de vida e as experiências quotidianas das pessoas cegas. Só assim é possível aferir do efectivo lugar ocupado pelas ideias que estão mais fortemente associadas à experiência da cegueira: sofrimento, incapacidade e infortúnio. É também nesta inquirição, próxima das vivências dos sujeitos, que se desenha o quadro das condições sócio-culturais e sócio-políticas que, no contexto português, condicionam as realizações e os ensejos das pessoas cegas. Devo este aprendizado sobre a cegueira e aquilo que dele resulta à generosidade daqueles que, emprestando as suas vidas, o seu afecto, e a sua sagacidade, me ajudaram a calcorrear os caminhos que aqui me trouxeram. Em primeiro lugar, gostaria de agradecer ao meu orientador, Prof. Dr. Boaventura de Sousa Santos, pelo fundamental suporte que sempre me dedicou, pelo seu cuidado, pela sua confiança e incentivo, e pelo modo como sempre me desafiou com a inefável sapiência das suas sugestões e questionamentos. Quero também agradecer aos demais professores do Mestrado, ao Prof. Dr. Arriscado Nunes, ao Prof. Dr. José Pureza e à Prof. Dra. Ioannes Baganha, pelos seus ensinos enriquecedores, e pela atenção amiga com que sempre acorreram aos meus ensejos e preocupações. Pelo seu insuperável esmero em tantas horas importantes, queria agradecer também à La Salette. 12

11 Prefácio Junto da ACAPO (Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal) e das pessoas com deficiência visual, conheci vidas que muito me ensinaram, estabeleci também fortes amizades que os anos fracassarão em apagar. Quero agradecer às pessoas cegas e amblíopes pelo seu acolhimento ao meu projecto. Agradeço a todos que se ofereceram às minhas perguntas, entrevistas, ou que, simplesmente, acederam a partilhar comigo conversas e momentos das suas vidas. Devo salientar os nomes daqueles que incansavelmente me apoiaram: o Dr. José Caseiro, o Dr. José Guerra, a Dra. Elisabete Domingos, o Micael Lopes, a Graça Lopes, o Dr. Joaquim Cardoso e o Dr. Fernando Correia. Não poderia deixar de me dirigir para as pessoas que constroem a tessitura dos nossos quotidianos, infundindo-os de partilhas várias. Gostaria de agradecer primeiramente aos que tiveram uma intervenção mais directa na feitura deste trabalho. Assim, quero agradecer ao Telmo Clamote, ao Jorge Rocha, ao Francisco Curate, à Marta Pinto, ao João Nogueira, ao Lennard Davis, ao Rui Branco e ao Bernardo Jardim. Nomes a que necessariamente acrescento alguns daqueles que, com o seu afecto e presença amiga, teceram as linhas que fatalmente compõem aquilo que escrevo e digo. Queria agradecer à Cristina Gomes, ao David Morgado, à Palmira Natal, à Jamira Sousa, ao Carlos Barradas, ao António Farinhas, ao Sérgio Oliveira. A minha gratidão também àqueles que sem delongas se fizeram antigos companheiros dos dias que passam: o João Paulo Dias, a Cristina Santos, a Marisa Matias, a Teresa Maneca, o Fernando Fontes, a Paula Fernando e o Jorge Almeida. Não poderia deixar de mencionar as turmas dos mestrados da globalização, onde descobri tantos viajantes bonitos com vontade de acreditar noutros mundos feitos possíveis. À Madalena Duarte, agradeço, enfim, por essoutro segredo em forma de vaga. Gostaria de agradecer à Fundação para a Ciência e Tecnologia pelo importantíssimo apoio que conferiu a este projecto por via da bolsa que me foi atribuída. Não poderia deixar de expressar o conforto e alento que sempre encontro nas palavras que me falam da vida de Jesus. 13

12

13 INTRODUÇÃO Há algo de profundamente instigante no modo como a nossa ocidental cultura apreende a experiência da cegueira. A cegueira constitui uma experiência que povoa os nossos imaginários, ancorados que estão a uma história, como outrora os mendigos cegos povoavam as ruas das cidades. Ela está profundamente presente nessa paisagem imaginária, a que, querendo, podemos chamar de cultura. Ora vem sob a forma de figuras históricas e mitológicas, ora preenche devaneios filosóficos, questionando as profundezas da existência, ora, ainda, aparece como metáfora polivalente, daquelas que nos permitem falar ou que, generosas, nos enriquecem as glândulas do pensar. Mas, coisa curiosa, essa presença aparece-nos quase sempre como um lastro de quem passa, como uma posição no mundo que é sempre pensada de alhures, em termos que lhe são exteriores. Nesse sentido, creio que o modo como a experiência cultural da cegueira é evocada na matriz ocidental revela, antes de mais, uma presença assombrada pelo desvanecimento. A condição de alguém que está privado do uso da visão é uma presença cultural espectral, em que ideias várias sobrevêm ao reconhecimento da densidade dessas existências as das pessoas cegas para as quais a cegueira não representa uma metáfora itinerante, ou sequer uma figura da paisagem, mas sim uma duradoura marca da experiência de «ser-no-mundo». A grande ironia será, creio, podermos perceber em que medida as vidas das pessoas cegas se encontram ensombradas, não pela impossibilidade de ver, mas pelos valores e representações dominantes que se erigem sobre a cegueira. Inscreve-se aí uma perniciosa cumplicidade entre a exclusão social e o silenciamento de leituras singularmente informadas. Leituras em que os matizes vivenciais dessa privação sensorial a que chamamos cegueira, as suas implicações, obstáculos e desafios, são conhecidos nos territórios de uma biografia. São pulsados «na carne». O desafio que para mim constitui a realização deste trabalho parte de uma perplexidade que é também o reconhecimento de um enlace tão nefasto como duradouro. A perplexidade que me traz prende-se com a inequívoca situação de exclusão e marginalização social vivida pelas pessoas cegas na nossa sociedade, uma constatação não difícil, que de ponta a ponta se liga com a negação da autoria 15

14 «E Se Eu Fosse Cego?»: Narrativas Silenciadas da Deficiência social advir da subjectividade das pessoas cegas. É com esse nexo que as vivências da cegueira se debatem, desde os estigmas que quotidianamente se lhes apõem, até às estruturas e valores que consentem na exclusão de áreas tão fundamentais como o ensino e o emprego. Temos, pois, uma situação estruturante que é largamente partilhada com a realidade de outras deficiências, num parentesco que iremos tentar decifrar. De facto, é fulcral o reconhecimento da diferença das pessoas cegas o mesmo é dizer, o reconhecimento das reflexividades que emanam da experiência da cegueira para que se opere uma urgente transformação ao nível das políticas sociais, educativas e laborais, ao encontro de uma sociedade inclusiva. No entanto, creio que o encontro com as vivências da cegueira induz, primordialmente, ao reconhecimento dos constrangimentos que são colocados, a montante, por uma gramática cultural que permeia as suas vidas, fazendo com que a sua situação social seja naturalizada com base na assinalada magnitude da limitação que se lhes adscreve. Refiro-me, portanto, à persistência de uma avaliação redutora das pessoas cegas por referência à ideia de um dilacerante défice sensorial. Esta é uma propensão que nos envia, creio, para a portentosa vitalidade, ao nível das representações culturais da cegueira, de uma «narrativa da tragédia pessoal» (Oliver, 1990). Identifico aqui como central uma gramática hegemónica sobre a cegueira, uma construção infundida das noções de infortúnio e incapacidade, onde se enfatiza a magnitude da limitação que decorre da cegueira. Alego que essa construção transporta uma violência na medida em que estabelece uma clara disparidade, quer com a reflexividade produzida pelas pessoas cegas onde releva uma capacidade de ajustamento às circunstâncias de existência, quer com as suas mais triviais capacidades de realização. A assunção dessa leitura dominante da cegueira enquanto uma elaboração sociocultural que, embora não sendo informada pelas experiências da cegueira, as informa como um sério constrangimento às suas possibilidades e expectativas, levar-nos-á a pulsar as familiaridades entre a cegueira e os seus referentes: a tragédia, a incapacidade e o infortúnio. Porque o fatalismo sobre as aspirações das pessoas cegas opera, não raras vezes, como uma profecia que funda as condições para a sua auto-realização, proponho uma abordagem construtivista. No coração desta deverá militar o reconhecimento do quão imperiosa e pertinente é a evocação dos quadros culturais mais amplos, assim como uma persuasão acerca da contingência que lhes assiste, e dos constrangimentos que eles inscrevem na experiência das pessoas cegas. No fundo, quero afirmar que estamos perante um contexto de pensamento que potencia a prevalência de construções das pessoas, construções que, num mesmo momento, afirmam a centralidade das limitações físicas associadas à cegueira, e engendram a invisibilização das barreiras socialmente produzidas. As representações disseminadas acerca da cegueira constituem um referente cultural que, manhã após manhã, se levanta para um duelo com os intentos e quereres das pessoas cegas, cujas vidas se encontram sobretudo marcadas pela ausência de 16

15 Introdução estruturas para o desenvolvimento e realização das suas capacidades, pela esmagadora realidade do desemprego, e pelos preconceitos e estereótipos que em todo o lugar as esperam. Nesse sentido, importará evocar uma rica e cativante etno-história ocidental acerca dos significados que foram sendo ligados à cegueira e à vida das pessoas cegas, legados que permanecem connosco, e cuja presença podemos ainda perceber na vida social, ou reconhecer nos ecos e usos metafóricos da linguagem. São significados que, no entanto, ficaram grandemente «fora do tempo» com os quadros de pensamento modernos, de onde se nutriram, igualmente, inflamadas promessas para um horizonte de integração social. Não obstante, a constituição de uma leitura contextual da apreensão social das mulheres e homens cegos nos nossos dias, permanece com irrefutável centralidade nessa mesma novidade prenunciada pelo pensamento iluminista. Particularmente, pela compreensão de como o advento da modernidade reinventou o significado da cegueira, descrevendo-a por apelo ao idioma da deficiência. É perseguindo de que modo a «narrativa de tragédia pessoal» se aloja nas entranhas da modernidade que poderemos ler como as promessas de integração social, concretizadas no surgimento do Braille, resultam desse movimento pelo qual se operou uma persuasiva reinvenção da exclusão social. Será, pois, por referência a uma profundidade histórica que nos fala do conforto que as concepções incapacitantes da cegueira encontram no nosso quadro de valores, que procuraremos entender como tais leituras convivem com as perspectivas de quem é cego. O lugar destas perspectivas, sobejamente conhecedoras da cegueira, será articulado com a realidade da ACAPO (a instituição representativa das pessoas cegas no contexto português) enquanto um espaço criativo e catalisador de perspectivas contra-hegemónicas acerca da cegueira. A acção da ACAPO será explorada por relação aos ensejos de transformação social alimentados pelas pessoas cegas, numa incursão que nos permite questionar em que medida são ali suficientemente desafiados os limites daquilo a que designaremos por «abordagem reabilitacional». Mas, igualmente, e por contraponto com as lutas políticas de outros contextos nacionais, procuraremos perceber de que modo a acção da ACAPO se articula com as especificidades da sociedade portuguesa. Interessará aceder às condições, estruturais e conjunturais, que vêm marcando a interiorização de uma linguagem de direitos, a fim de que a integração social possa articular-se com intensificação democrática a advir da participação reivindicativa das pessoas cegas. Pensar a cegueira também nos insta, fatalmente, a pensar no lugar do corpo numa pluralidade de dimensões. Para a temática da cegueira o corpo é feito presente, antes de mais, pela diferença suscitada no reconhecimento de um importante défice sensorial. Curiosamente, há como que uma corporalidade excessiva ditada por uma ausência, a do sentido da visão. Importa «chegar aos corpos» por via de duas linhas distintas. Na primeira, procurarei perceber como é que o significado do corpo é constituído, questionando para isso os itinerários por via dos quais o corpo 17

16 «E Se Eu Fosse Cego?»: Narrativas Silenciadas da Deficiência é socialmente feito objecto. Por aí se sondam os valores e as relações de poder que lutam pela definição do sentido dos corpos, mas também se inquire a relação que as construções acerca do corpo e suas diferenças estabelecem com as formas de realização pessoal que a sociedade elege. Num segundo momento iremos confrontar-nos com o corpo vivido enquanto condição fenomenológica, ou seja, o corpo como forma de «ser-no-mundo». Para tal mergulharemos tanto nas experiências de quem nasceu ou ficou cego como nas «adivinhações» que se nutrem a partir dos «corpos que vêm». Portanto, ainda que reconhecendo a incontornável riqueza de sentidos e divagações que a cegueira permite elaborar, procurarei ater-me neste texto às realidades que marcam as vidas das pessoas cegas. Por muito nobres e instigantes que nos apareçam alguns questionamentos existenciais e filosóficos, aceder às experiências das pessoas cegas implica, de modo flagrante, uma atenção a percursos onde a aspereza dos mundos da vida se revela sempre mais premente que as leituras que tendem a fazer da cegueira «boa para pensar». Falo de um enfoque nos «mundos da vida» que é interessantemente defendido a partir de uma deliciosa história que Clifford Geertz nos conta: Há uma história Indiana pelo menos ouvi-a como sendo uma história indiana sobre um homem inglês que, tendo-lhe sido dito que o mundo repousava sobre uma plataforma que por sua vez repousava nas costas de uma tartaruga, perguntou: e a tartaruga repousava sobre o quê? Outra tartaruga. E essa tartaruga? Ah, Sahib, a partir daí são tartarugas sempre até ao fim. (Geertz, 1993: 29, minha tradução) Com a evocação deste diálogo, que é também um diálogo entre cosmovisões culturais, Geertz queria apontar para o perigo da análise cultural perder contacto com as duras superfícies da vida em busca de tartarugas demasiado profundas. Ou seja, o perigo de se descurarem, atrás da última tartaruga, as realidades políticas, económicas em que as mulheres e homens estão em todo o lado imersos, assim como as necessidades biológicas em que essas superfícies assentam. Tendo presente este privilégio de análise, pretendo compor um itinerário em que as leituras da cegueira não fiquem reféns de discussões filosóficas em torno da última tartaruga. E será a partir da minha experiência etnográfica, desenvolvida tomando como ponto de partida a Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO), que procurarei inquirir acerca das vivências das pessoas cegas e do lugar que nelas ocupa uma «narrativa da tragédia pessoal». Nas costas do elefante, pois. Abordar o tema das deficiências implica contemplar as linhas que definem as desigualdades nas sociedades contemporâneas. Isto o atesta, sonante, uma declaração do secretário-geral da ONU, Koffi Annan, datada de 1997: Tanto nos países desenvolvidos como nos países em desenvolvimento, [as pessoas com deficiência] enfrentam a discriminação e estão desproporcionalmente represen- 18

17 Introdução tados entre as mais pobres da sociedade: esta é uma «crise silenciosa» que afecta não só as pessoas com deficiência e suas famílias mas também o desenvolvimento económico e social de sociedades inteiras (apud Guimarães, 2002: 65, 66). Portanto, além da prevalência de deficiências reflectir já as injustiças sociais que marcam a distribuição da riqueza no mundo, confrontamo-nos com uma sobrerrepresentação das pessoas com deficiência entre «os mais pobres dos pobres» nas diversas sociedades, constituindo, para a realidade ocidental, uma importante parte daquilo que se costuma designar por «terceiro mundo interior». O facto da situação das pessoas com deficiência ter o estatuto de uma «crise silenciosa», investe de relevância a exploração que aqui pretendo realizar em torno das pessoas cegas. De facto, perante a afamada vocação da análise sociológica para as questões relacionadas com a desigualdade social, é deveras instigante a reduzida atenção que as pessoas com deficiência têm merecido ao nível das ciências sociais em relação a outros grupos minoritários. Falamos de pessoas que se encontram entre as mais sistematicamente marginalizadas das nossas sociedades, e que constituem uma minoria numericamente bem mais significativa do que aquilo que a sua situação de invisibilidade estrutural frequentemente faz supor. Ademais, reconhecido que é o lugar que os corpos e as suas diferenças ocupam nos discursos legitimadores das relações de opressão, como locus de algumas das mais fundamentais centrais formas de desigualdade e de controlo social na sociedade contemporânea (Turner, 1994: 28), mais surpreendente se torna o parco investimento da crítica social em torno das experiências «marcadas» pelas diferenças corporais a que chamamos deficiências. Assim, creio que ganha solidez a ideia de que o reduzido investimento crítico em torno das deficiências é também um indicativo de uma «vocação» social mais ampla para a naturalização/somatização 1 da situação de exclusão das pessoas com deficiência. A questão prende-se, creio, com o facto de que o elemento biológico na opressão social das pessoas com deficiência torna bem mais difícil desnaturalizar a inferioridade do que, por exemplo, os elementos que estão na base das construções de raça ou diferença sexual. Precisamente porque os corpos das pessoas com deficiência são tomados como explicação suficiente para a sua situação de marginalidade social entendida como fatal é que esta problemática vem mostrando ser particularmente fugaz à crítica e à mobilização social. Impõe-se, portanto, o apelo a uma sensibilidade crítica em prol de uma perspectiva que, reconhecendo as diferenças adstritas às deficiências como elementos deveras tangíveis diferenças que de modo algum se esgotam nos discursos, vingue em superar as noções redutoras da deficiência. Ousando, conse- 1 Do grego soma: corpo. Uso a noção de somatização para restringir o significado de naturalização conceito mais amplo àquilo que é naturalizado pela afirmação do carácter auto-evidente do corpo- -natural. 19

18 «E Se Eu Fosse Cego?»: Narrativas Silenciadas da Deficiência quentemente, seguir o encalço dos processos que saturam de valores e demarcam como tal marginalizando as pessoas com deficiência. A nossa hipótese de partida é que a situação de marginalização social vivida pelas pessoas cegas em Portugal está profundamente ligada à singular vigência de uma «narrativa da tragédia pessoal» ao nível das representações da experiência da cegueira. Denuncia-se nesta hipótese uma gramática hegemónica na apreensão da cegueira que condiciona as experiências, possibilidades e expectativas das pessoas cegas enquanto um pernicioso «regime de verdade». Investidos desta questão perseguiremos três linhas de abordagem. A primeira sustenta que os quadros culturais modernos por via dos quais se objectificou a experiência da cegueira são, em larga medida, inconciliáveis com a transformação da situação de marginalidade vivida pelas mulheres e homens cegos. Tentamos assim desvelar como é que na modernidade se operou uma «reinvenção da exclusão social» em relação às pessoas com deficiência, através de elementos que viriam a naturalizar a sua inferioridade à luz de uma «monocultura da naturalização das diferenças» (Santos, 2002: 247). Emerge dessa transição histórica uma perspectiva em que a cegueira e as suas implicações se apreendem por uma somatocracia (hierarquia com base nos corpos) assente nas limitações funcionais e défices associados à impossibilidade de ver. A segunda linha procura perceber que lugar é que as reflexões, experiências e formas de mobilização política das pessoas cegas assumem na construção de perspectivas contra-hegemónicas da cegueira, onde a incapacidade e o infortúnio são negados enquanto referentes centrais. Neste sentido, procuraremos conferir centralidade às narrativas pessoais das pessoas invisuais, à relação que elas têm com o associativismo da deficiência, e ao modo como esse associativismo desafia as condições que estruturam a opressão das pessoas cegas. Finalmente, a terceira linha de abordagem procura aferir como é que o corpo e a experiência incorporada participa nos significados produzidos e reproduzidos acerca da cegueira, enquanto condição vivida pelas pessoas que nascem ou ficam cegas, e enquanto projecção corporalmente informada por «corpos que vêem». No primeiro capítulo, evidenciamos a contingência que assiste à apreensão ocidental das diferenças que culturalmente aprendemos a pensar como deficiências. Contrapomos a singularidade da historicidade ocidental com uma análise trans-cultural, a partir de dados etnográficos onde os «sentidos que as deficiências fazem» nos surgem vinculados às mundividências particulares que as pensam. É também neste momento do trabalho que se prefiguram afinidades entre o sociocultural e o sociopolitico como forma de «aprender com o Sul» (Santos, 2000). Segue-se uma análise em que procuramos perseguir o lastro histórico da cegueira na cultura ocidental, numa exploração que atenta particularmente ao contexto bíblico, à antiguidade grega e à Idade Média. No segundo capítulo, analisamos o «des-encantamento da cegueira». Dirigimos a nossa atenção para os novos valores e construções que iriam libertar as pessoas 20

19 Introdução cegas da pletora de interpretações nutridas durante a Idade Média para, nesse mesmo movimento, inscreverem as suas experiências em quadros de significado caracteristicamente modernos. Articulamos uma leitura das promessas trazidas pela modernidade à cegueira com a materialização desta condição à luz de vários eixos. É dado particular destaque ao modo como a apreensão da cegueira nos aparece enquanto um produto subsidiário de um discurso biomédico, que se estabeleceu na modernidade ocidental, numa leitura que nos coloca na esteira do nexo de conhecimentos e saberes que Michel Foucault designou de bio-poder. São também considerados os termos em que o visualismo, o individualismo e o capitalismo industrial viriam a participar na tessitura que veio a condicionar os entendimentos e abordagens da cegueira. Finalmente, mostramos como as consequências da objectificação moderna das deficiências foram politicamente debatidas noutros contextos (com particular atenção ao britânico) a partir dos anos (19)60, num ensejo que nos coloca perante o surgimento de uma fractura epistemológica na cultura ocidental no que ao significado da deficiência diz respeito. No terceiro capítulo, são abordadas algumas das questões pessoais e metodológicas centrais no trabalho etnográfico que foi levado a cabo junto de pessoas cegas, tomando a ACAPO, quer como ponto de partida central, quer como objecto de análise. Passeamos assim pela entrada em cena da investigação, pelos seus contornos na articulação com a prática de voluntariado, pelas formas de interacção pessoal, pelos métodos de recolha de informação, e pelas reflexões biográficas e pessoais que essa experiência promoveu em mim. No quarto capítulo, vamos ao encontro das histórias de vida e narrativas pessoais das experiências da cegueira, resgatando as reflexões, obstáculos, dificuldades, relatos de superação, que emergem das vozes das pessoas cegas. Procuramos perceber como é que as concepções dominantes acerca da cegueira se atravessam nos percursos biográficos e quotidianos de quem não vê. Nesse sentido, tentaremos perceber o lugar que a ACAPO desempenha na capacitação identitária das pessoas cegas, na criação de condições para a concretização dos seus objectivos, mas também ao nível de uma acção sociopolítica investida na desmobilização dos elementos estruturais promotores da sua exclusão social. Intentamos uma caracterização da ACAPO, da sua história, da sua relação com outras organizações de deficiência, e um olhar para o modo como a natureza desta instituição se apreende por algumas das características da sociedade portuguesa. No quinto capítulo, exploramos os limites das leituras discursivas do corpo. Procurando superar as costumeiras abordagens do corpo na Sociologia e na Antropologia, visamos aferir da pertinência que o carácter incorporado da experiência assume para a temática em causa neste trabalho. Primeiro, como forma de pulsar o que há de efectivo nas experiências de sofrimento e privação mais directamente associadas à cegueira; um intento que também implica contemplar as reconfigurações vivenciais e narrativas de quem, de facto, conheceu a cegueira como 21

20 «E Se Eu Fosse Cego?»: Narrativas Silenciadas da Deficiência uma tragédia pessoal. Em segundo lugar, como forma de perceber como é que as imaginações empáticas corpóreas de quem vive um mundo eminentemente visual laboram sobre o silêncio das experiências de cegueira, participando na (re)produção de um imaginário incapacitante e de uma lógica compassiva com a desgraça. 22

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