Fundamentos da pesquisa epidemiológica e Causalidade
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- Martim Benevides Bento
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1 Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciências da Saúde Faculdade de Medicina / Instituto de Estudos em Saúde Coletiva - IESC Departamento Medicina Preventiva Disciplina de Epidemiologia Fundamentos da pesquisa epidemiológica e Causalidade 2007
2 Epidemiologia É o estudo da distribuição do estado ou eventos de saúdedoença e de seus determinantes em populações específicas e a aplicação desse estudo para o controle dos problemas de saúde. (Last, JM. A Dictionary of Epidemiology, 2 nd ed. New York, Oxford University Press, 1988). Pressupostos básicos da epidemiologia A ocorrência e distribuição dos eventos relacionados à saúde não se dão por acaso. Existem fatores determinantes das doenças e agravos da saúde que, uma vez identificados, precisam ser eliminados, reduzidos ou neutralizados.
3 O experimento natural de John Snow Mortalidade por Cólera (por 10,000 domicílios), segundo fonte de abastecimento de água, Londres,1854 Fonte de abastecimento N o de domicílios Óbitos por cólera Mortalidade por domicílios Southwark & Vauxhall Co Lambeth Co Outras Szklo, 2004
4 Mortalidade por Febre Puerperal em uma maternidade em Viena, 1842 a 1846 (Ignaz Semmemweiss) ANO 1 A CLÍNICA Partos % 2 A CLÍNICA Partos % Média a Clínica - obstetras e estudantes 2 a Clínica - parteiras
5 Hábito de lavar as mãos e ocorrência de febre puerperal (Oliver Wendell Holmes, 1843): Foram observadas 1000 parturientes atendidas por obstetras: ocorreram casos de febre puerperal mesmo tendo o obstetra lavado as mãos (doentes entre os não expostos); e entre as parturientes que não desenvolveram febre puerperal, não foram todos os obstetras que haviam lavado as mãos (não doentes entre os expostos) Para falar sobre causa e efeito: É necessário observar a freqüência de exposição entre aqueles que não adoeceram? Todos os doentes tem que ser expostos e os não doentes, não expostos? Vetter & Matthews (1999)
6 Hábito de lavar as mãos e ocorrência de febre puerperal (Oliver Wendell Holmes, 1843): Prática obstétrica Não lava as mãos Lava as mãos Febre Sim Puerperal Não Conclusão do autor: A doença conhecida como Febre Puerperal está longe de ser contagiosa e transmitida para as parturientes pelos obstetras. Não lavar as mãos não é causa de febre puerperal Você concorda? Ainda não se conhecia a causa mas existia uma forte associação entre a prática de lavar as mãos e a febre puerperal. Vetter & Matthews (1999)
7 Causa x Associação A existência de uma associação não implica em relação causal Associações Causais Tabagismo e câncer de pulmão (CP); Vibrião do cólera e cólera Não causais Consumo de café ou mancha amarela nos dedos e CP Altitude e cólera Quais são os critérios para julgar causalidade?
8 Postulados de Henle-Koch Fruto da revolução microbiológica: Anos 1880 s : predomínio de doenças infecciosas e da explicação unicausal para as doenças) O agente deve estar presente em todos os casos da doença em questão (causa necessária) O agente não deve ocorrer de forma casual em outra doença (especificidade do efeito) Isolado do corpo e crescido em cultura, o agente inoculado em susceptíveis deve causar doença (causa suficiente) Nada sobre a especificidade da causa... Bacilo de Koch (Micobacterium tuberculosis) Tuberculose
9 Postulados de Henle-Koch Críticas: Existe o estado de portador Certos fatores podem ter múltiplos efeitos Difícil crescer em cultura certos agentes Evidências empíricas da multicausalidade Impróprio para doenças crônicas Mesmo com as críticas, os postulados de Henle-Koch ainda são úteis. Ex: Em 1977, com base nos postulados, foi possível concluir que uma bactéria gram-negativa era a causa da Doença dos Legionários. Vetter & Matthews (1999)
10 Século XX: Com a Transição Epidemiológica (predomínio das doenças crônico-degenerativas) Modelo unicausal? Postulados de Henle-Koch são adequados para os estudos sobre causalidade? Doença pulmonar obstrutiva crônica Tabagismo úlcera péptica doença coronariana Tabagismo Sedentarismo Genético d.coronariana Alta ingestão de sal Hipertensão arterial Hipercolesteremia
11 Critérios de causalidade (Critérios de Hill) Como exemplo: Estudos caso-controle e de coorte de Doll e Hill sobre Tabagismo e Câncer de Pulmão (CP) Força da associação: quanto mais forte uma associação, maior será a possibilidade de se tratar de uma relação causal; ex: Estudo Caso-Controle: OR= 9,1 e no Estudo de Coorte: Risco Relativo = 18,1 Consistência ou replicação: se o mesmo resultado é obtido em diferentes circunstâncias, a hipótese causal seria fortalecida associações não causais podem ser consistentes e depende do contexto do estudo (população, métodos etc) ex: diferentes desenhos de estudo e populações: estudo caso-controle de base hospitalar e de coorte população = médicos do Reino Unido)
12 Critérios de causalidade (Critérios de Hill) Como exemplo: Estudos de Doll e Hill sobre Tabagismo e Câncer de Pulmão (CP) Gradiente biológico: curva de dose-resposta pode decorrer somente de outras variáveis e nem sempre ela de fato existe Razão de taxas de Mortalidade por CP e Tabagismo RR a a ou + número de cigarros/dia Temporalidade: a causa deve sempre preceder o efeito consensual!
13 Critérios de causalidade (Critérios de Hill) Especificidade: causa levando a um só efeito e o efeito ter apenas uma causa quase inútil... Coerência: ausência de conflitos entre os achados e o conhecimento sobre a história natural da doença conservador... Evidência experimental: estudos experimentais são de difícil realização em populações humanas... Analogia: efeitos de exposições análogas existem? serve mais para quebrar a resistência a um novo conhecimento... Plausibilidade: existe plausibilidade biológica para o efeito existir? depende do conhecimento acumulado até o momento...
14 Modelos de Causalidade Modelos são maneiras de pensar a realidade e expressam nossa imaginação sobre como o mundo deve funcionar Foram diversos os modelos de causalidade: Ex1: Modelo de História Natural das Doenças Fase pré-patogênica (Tríade Ecológica) Estrutura Epidemiológica Host Ações de prevenção Vector Agent Environment The epidemiology triad of a disease Gordis,L Epidemiology
15 Modelos de Causalidade Modelo de causas suficiente e componente (Rothman) D E G H I J C B A F B A F C A causa suficiente causa componente causa necessária
16 Modelo de causas suficientes e componentes Implicações: Multicausalidade: cada mecanismo causal envolve a ação conjunta de várias causas componentes Força da associação: depende da prevalência das causas componentes Períodos de indução: para cada causa componente e não é específico para a doença Controle de doenças: pode se basear em causas componentes isoladas Outros Modelos Multicausais: Modelo Ecológico, Modelo Sistêmico, Rede de causas etc
17 O método científico como fundamento O fundamento de toda pesquisa é o método científico, que se baseia na elaboração de conjecturas e a busca de evidências empíricas que possam contribuir para refutá-las (negá-las) ou corroborá-las (confirmá-las). Assim, o uso de regras ou receitas para inferir causalidade deve ser visto como uma estratégia subjetiva para facilitar a abordagem de um problema altamente complexo
18 O MÉTODO CIENTÍFICO Teoria Inferências HC Conclusões Interpretações Inferências -HO Achados Empíricos Análise dos dados Conhecimento Problemas Observações Dados Síntese Hipótese Conceitual Desenhos de estudo Hipótese Operacional Coleta de dados
19 RACIOCÍNIO EPIDEMIOLÓGICO I. Suspeita em relação a uma possível influência de um fator na ocorrência de uma doença (prática clínica, a análise de padrões da doença, observações de pesquisa laboratorial ou especulação teórica) II. Formulação de uma hipótese específica III. Teste da hipótese através de estudos epidemiológicos que incluem grupos adequados de comparação. Determinar da existência de uma associação estatística Avaliar a validade de qualquer associação estatística (acaso, viés, confundimento) Julgar se a associação estatística encontrada representa uma relação de causa-efeito
20 Desenhos de Estudos Epidemiológicos (I) O pesquisador manipula o fator de exposição? O pesquisador escolhe a que grupo de exposição o participante pertencerá? NÃO Estudos Observacionais Coorte Caso-controle Seccionais Ecológicos Série de casos
21 Desenhos de Estudos Epidemiológicos (II) O pesquisador manipula o fator de exposição? O pesquisador escolhe a que grupo de exposição o paciente pertencerá? SIM Estudos de Intervenção (experimentais) Ensaios Clínicos Ensaios de Campo Ensaios Comunitários
22 Desenhos de Estudos Epidemiológicos (III) O pesquisador manipula o fator de exposição? O pesquisador escolhe a que grupo de exposição o participante pertencerá? SIM NÃO Estudos de Intervenção (quasi-experimentais) Estudos antes e depois Ensaios não randomizados
23 Características Relevantes dos Estudos Epidemiológicos Quanto à manipulação da exposição: Intervenção Observação Quanto à estratégia de observação: Seccional uma única observação para cada indivíduo Longitudinal pelo menos duas observações Quanto à unidade de análise Indivíduo Grupamentos (cidades, municípios)
24 Quanto ao momento (timing) da mensuração da exposição e do desfecho em relação a ocorrência dos eventos relação cronológica entre a medida da exposição e da doença e a ocorrência real dos fenômenos Prospectivos ou concorrentes tanto a exposição quanto o desfecho são medidos quando ocorrem, durante a investigação (casos incidentes) Retrospectivos, históricos ou não concorrentes tanto a exposição quanto o desfecho ocorrem antes da investigação (casos prevalentes) Mistos
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