Construir uma alternativa à austeridade: Não há nada a temer, senão o próprio medo, Franklin Delano Roosevelt, 1933
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1 Os Desafios da Denúncia do Memorando Lisboa, 22 de Setembro de 2012 Construir uma alternativa à austeridade: Não há nada a temer, senão o próprio medo, Franklin Delano Roosevelt, 1933 Ricardo Cabral Universidade da Madeira Versão de 24 de Setembro de 2012 (com revisões) rcabral@uma.pt Image source: Nations Online Project
2 Objectivos Explicar porque devemos colocar em causa a estratégia definida pelas instituições de governo da União Europeia, denunciando o memorando Compreender a cronologia, natureza e causas da crise Demonstrar que a estratégia definida pela troika não responde às causas da crise Explicar como é possível denunciar o memorando sabendo que a sua denúncia implica a suspensão de tranches do empréstimo da UE e do FMI a Portugal e o acesso à liquidez regular do Eurosistema Seria possível a Portugal: permanecer no euro passar a gerar poupança externa e a registar excedentes orçamentais deixar de necessitar de empréstimos ou de ajuda externa
3 Cronologia de uma crise anunciada A estrutura de governo da UE apresenta sérias deficiências Recursos insuficientes na preparação e implementação da política macroeconómica da UE e da zona euro Política macroeconómica definida por pequenos grupos de indivíduos, com extrema concentração de poder executivo em instituições e técnicos não eleitos Inexistência de mecanismos de avaliação e de correcção das medidas adoptadas O resultado é política económica de fraca qualidade Erros sistemáticos na definição da política económica Política (macro)económica improvisada, reactiva e insuficientemente fundamentada Recusa em reconhecer erros e em corrigir estratégia
4 Natureza e causas da crise Foi essa estrutura de governo da UE que preparou a arquitectura da zona euro e que definiu as suas duas principais estratégias de política macroeconómica Pacto de Estabilidade e Crescimento (1997) Política monetária do BCE (1998) Essa política macroeconómica das instituições de governo da UE conduziu a zona euro à maior crise de balança de pagamentos (em tempos de paz) da história da humanidade Países periféricos da zona euro acumularam elevados desequilíbrios externos Défices orçamentais elevados são sintoma desses desequilíbrios externos Em Portugal, contribuiu para uma década perdida entre 2001 e 2010
5 Resposta das instituições de governo da UE à crise A resposta baseia-se essencialmente num reforço e endurecimento da estratégia adoptada em É preparada e implementada pelas mesmas instituições e, em alguns casos, pelos mesmos indivíduos que definiram a política macroeconómica da zona euro FMI é o parceiro mais moderado (e menos radical) Se não resultou nos últimos 13 anos, não irá resultar, mas antes agravar a situação Resultados dessa política macroeconómica da UE em Portugal: com os PECs e com a troika, em 2 anos de austeridade em dose reforçada (2011 e 2012) A procura interna irá regredir mais de 13 anos, para níveis próximos dos registados em 1998 (em termos reais) Níveis de emprego já caíram para valores anteriores a 1999 Embora o ajustamento externo que é necessário esteja a ser feito, faz-se de forma contraproducente e ineficaz: Destroem-se 10 euros de actividade económica doméstica por cada euro de redução das importações
6 Dilema do país Encontrar com os parceiros da UE uma solução para a crise O país tem adoptado as políticas exigidas pelas instituições de governo da UE Não se pretende romper com os parceiros da UE Pretende-se manter o país na zona euro Assume-se que os parceiros do país estão a procurar ajudá-lo Só que a estratégia que as instituições de governo da UE impuseram ao país não está a funcionar, porque não pode funcionar está errada
7 Dilema do país Como convencer os parceiros da UE que a política económica que nos está a ser imposta é incorrecta e que o problema reside nessa política económica? Os nossos parceiros interpretam qualquer recusa em adoptar essas políticas como má vontade e indisciplina Ameaçam punir o país cortando o financiamento ao estado e o financiamento do BCE à banca Pensam que o corte de financiamento obrigaria o país a sair do euro É como que se um bom amigo nosso, que nos procura ajudar à sua maneira, insistisse que nos atiremos da janela porque acredita piamente que conseguimos voar
8 Como reagir? Negociar, com outros países periféricos, com as instituições de governo da UE, tendo em vista modificar, no curto prazo, as políticas económicas que têm vindo a ser adoptadas Procurar demonstrar aos nossos parceiros que essas políticas são incorrectas e que têm de ser abandonadas Porque a actual estratégia macroeconómica ( Austeridade ) é tão prejudicial ao país e porque a passagem do tempo agrava profundamente a situação e perspectivas do país: Preparar-se para denunciar, se necessário, o memorando mesmo contra a vontade dos nossos parceiros Preparar medidas para poder reagir se os nossos parceiros não aceitarem negociar com o país punindo-o, por essa tentativa de negociação, por exemplo com a suspensão do financiamento ao Estado ou à banca Preparar as medidas necessárias para responder às causas da crise de balança de pagamentos e de dívida externa que o país enfrenta
9 Os Desafios da Denúncia do Memorando Tendo em consideração o enquadramento vigente, a denúncia do memorando implicaria: Suspensão do financiamento da UE e do FMI Provável exigência pela UE e pelo FMI da reposição de montantes emprestados e juros vencidos até à data Dívida pública (e provavelmente também a dívida bancária) deixaria de ser aceite pelo BCE como colateral nas operações de cedência de liquidez do Eurosistema Ou seja, se não forem definidas medidas, a denúncia do memorando causaria, em simultâneo, uma crise orçamental e uma crise bancária Ou seja, uma crise de liquidez no Estado e na banca
10 A ajuda externa só é necessária para evitar o incumprimento O país só necessita dos empréstimos externos para amortizar a dívida que vence e pagar os juros sobre essa dívida As necessidades líquidas de financiamento da economia em 2011 foram de 5,3% do PIB, i.e., a poupança que o país pediu emprestado ao exterior Mas o défice da balança de rendimentos foi de 5% do PIB Se o país entrasse em incumprimento, reduzindo o défice da balança de rendimentos para 1,0%-1,5% do PIB, teria reservas suficientes para se autofinanciar por cerca de 5 anos Com ligeiros ajustes macroeconómicos seria possível ao país passar a registar poupança suficiente para financiar o Estado e o investimento Nessas condições, deixaria de depender do exterior e poderia utilizar essa poupança externa para estimular a procura interna, para amortizar uma pequena parte dívida externa e para pagar parte dos juros sobre essa dívida externa
11 Estratégia a adoptar na denúncia do memorando Como referido acima, se o país denunciar o memorando, o financiamento externo será interrompido Por outro lado, mesmo que isso não ocorra, é necessário responder directamente à crise de balança de pagamentos Elevado défice da balança de rendimentos Acresce a incapacidade de refinanciar nos mercados dívida que chega a maturidade (fuga de capital) A solução lógica é, pois: A reestruturação de dívida do país (maturidades e juros), que permitiria reduzir o défice da balança de rendimentos e as necessidades líquidas de financiamento do país para níveis que asseguram que o país seria capaz de se auto-financiar Implica resolução bancária, que permitira restaurar robustez ao sistema financeiro
12 Estratégia a adoptar na denúncia do memorando O país não pode ser expulso da zona euro e interessa ao país manter-se na zona euro Moratória sobre juros e amortização de dívida Poderia vir a ser necessário introduzir restrições aos movimentos de capital Alteração da estrutura fiscal Pós-reestruturação e pós-resolução, se de dimensão suficiente: Economia passaria a gerar níveis de poupança externa ligeiramente positivos Banca com capacidade para financiar economia Pressão sobre a actividade económica doméstica diminuiria Estado passaria a registar excedentes orçamentais Dada a melhoria de rácios bancários e dos resultados orçamentais seria possível procurar obter ratings para novas emissões de dívida recorrendo a novos instrumentos - que permitissem o acesso às operações de mercado aberto do Eurosistema
13 Estratégia a adoptar na denúncia do memorando Ou seja, durante e após este processo de denúncia do memorando seria possível assegurar: Que o país é capaz de se auto-financiar durante, pelo menos, cerca de 5 anos Que, no curto prazo, poderia procurar obter ratings para novas emissões dívida pública e dívida bancária que lhe garantissem o acesso regular às operações de política monetária do Eurosistema Isto é, poderia continuar na zona euro
14 Conclusões Há um ditado que diz que o progresso, na ciência, ocorre funeral a funeral Os defensores da teoria dominante recusam-se a reconhecer a força dos factos e a realidade No governo económico da UE passa-se o mesmo Mantêm-se no poder os defensores do pacto de estabilidade e crescimento e da estratégia de estabilidade na política monetária que nos conduziu até à presente crise. A sua solução para a crise é mais do mesmo mais política de austeridade É necessário negociar com as instituições da UE alterações a essa estratégia (memorando) no curto prazo Se isso não for possível, deve-se denunciar o memorando O país tem ao seu dispor instrumentos que lhe permitem autofinanciarse durante esse processo e assim assegurar o regular funcionamento das Administrações Públicas, banca e outras instituições bem como empreender medidas para: Promover crescimento económico Promover crescimento do emprego
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