ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GAB. DESEMB - DAIR JOSÉ BREGUNCE DE OLIVEIRA 19 de fevereiro de 2013

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1 ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GAB. DESEMB - DAIR JOSÉ BREGUNCE DE OLIVEIRA 19 de fevereiro de 2013 APELAÇÃO Nº ( ) - VITÓRIA - 7ª VARA CÍVEL APELANTE :NOVA CIDADE SHOPPING CENTERS SA APELADO : PIZZARIA REAL EXPRESS LTDA RELATOR DES. DAIR JOSÉ BREGUNCE DE OLIVEIRA R E L A T Ó R I O NOVA CIDADE SHOPPING CENTER S. A. interpôs recurso de apelação cível em razão da respeitável sentença de fls , proferida pelo MM. Juiz de Direito da Sétima Vara Cível de Vitória, Comarca da Capital, que na ação de despejo proposta por ela em face da PIZZARIA REAL EXPRESS LTDA., julgou improcedente o pedido de rescisão contratual com o consequente despejo do imóvel ocupado pela apelada por considerar potestativas as cláusulas contratuais que embasam a norma imposta pela autora, notadamente a limitação do número de garçons por loja, levando-se em consideração a metragem de cada estabelecimento, uma vez que tal imposição não consta no contrato firmado pelas partes. A relação processual desenvolveu-se em autos restaurados consoante respeitável sentença homologatória de fls Razões recursais apresentadas pela apelante às fls , alegando, em síntese, que 1) a norma que limita a quantidade de garçons, qual seja, a Circular n , é complementar ao Regimento Interno do shopping center e este, por sua vez, compõe a Escritura Declaratória de Normas Gerais Regedoras do Funcionamento e das Locações do estabelecimento comercial; 2) tais normas devem ser

2 observadas por todos os locatários e descumprir a Circular nº 97/03 significa descumprir o contrato de locação, justificando a rescisão e o despejo pretendidos; 3) a cláusula que impõe a limitação do número de garçons não se mostra como potestiva, mas sim como indispensável ao bom funcionamento do shopping center, em especial de sua praça de alimentação, na medida em que a prosperidade dos negócios dos lojistas representa lucro a todos os empreendedores. Requereu, assim, que seja dado provimento ao recurso para que se promova a rescisão do contrato locatício outrora celebrado entre as partes e o despejo da apelada (sic), com a consequente inversão dos ônus sucumbenciais. A apelada apresentou contrarrazões às fls , pugnando pelo desprovimento do recurso em resumo porque a restrição do número de garçons reveste-se de contornos potestativos já que não estava expressamente prevista no contrato de locação, além de sustentar a ocorrência de ofensa à boa-fé objetiva, à função social do contrato e ao princípio do adimplemento substancial da mencionada avença. É o relatório. Sem revisão ex vi do artigo 551, 3º, do Código de Processo Civil. Peço dia para julgamento. Vitória-ES., 18 de janeiro de Desembargador DAIR JOSÉ BREGUNCE DE OLIVEIRA Relator

3 V O T O S O SR. DESEMBARGADOR DAIR JOSÉ BREGUNCE DE OLIVEIRA (RELATOR):- Trata-se de recurso de apelação interposto por NOVA CIDADE SHOPPING CENTER S. A. em face da respeitável sentença que, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, julgou improcedente pedido por ele formulado para rescindir contrato de locação celebrado com a PIZZARIA REAL EXPRESS LTDA. com o consequente despejo do imóvel locado à apelada, por considerar potestativas as cláusulas contratuais que impunham à observância pela locatária da limitação de 01 (um) garçom para as lojas com dimensões de até 80m2 (oitenta metros quadrados), localizados na praça de alimentação do Shopping Vitória, nome fantasia do ora apelante, uma vez que tais determinações não constam no referido contrato locatício. A apelante aduz que a Circular n é parte integrante do contrato de locação, na medida em que é norma complementar ao Regimento Interno do Shoppping Vitória. Aduz, ainda, que este, por sua vez, integra a Escritura Declaratória de Normas Gerais Regedoras do Funcionamento e das Locações e assim de observância obrigatória por todos os locatários do shopping, sob pena de rescisão unilateral dos seus contratos. Já a apelada embasa seus argumentos, precipuamente, na potestividade das ditas determinações, em especial porque elas não estariam contidas no contrato de locação celebrado entre as partes, o que concederia ao apelante poderes ilimitados para, unilateralmente, instituir e alterar regras durante a execução contratual. Relembra, ainda, que como o contrato teve início no ano de 2008, ou seja, em data posterior à expedição da Circular n. 097/03, nunca lhe foi imposta qualquer limitação no que tange à quantidade de garçons que deveria utilizar em seu estabelecimento. Assim, tal fato, qual seja, a obrigatoriedade em cumprir os termos da dita Circular, evidenciaria uma quebra injustificada da confiança e da expectativa com relação ao contrato firmado entre as partes. Por fim, afirma também que a apelante pretende rescindir a avença, justificando-se em hipótese cujo inadimplemento é insignificante comparado à totalidade do contrato, na medida em que pelo simples fato de um garçom não ter sido retirado da praça de alimentação no prazo previsto, diversas implicações de ordem financeira, fiscal e social advirão com o implemento da rescisão e despejo pretendidos. Neste ponto, qual seja, o adimplemento substancial do contrato em cotejo com um mero descumprimento de norma cuja índole é induvidosamente administrativa, reside a fundamentação para que a respeitável sentença seja mantida em sua totalidade. Explico. Não obstante ser claro que a Circular n. 097/03 está incluída nos documentos que integram o contrato de locação celebrado entre as partes, posto que faz parte do Regimento Interno do Shopping Vitória, bem como da Escritura Declaratória de

4 Normas Gerais Regedoras do Funcionamento e das Locações do dito shopping center, sua obediência não pode revestir-se de contornos unilaterais, promovendo, inclusive, medidas extremas tais qual o despejo pleiteado pela apelante. Como bem assentado pelo douto Juízo a quo, a limitação do número de garçons imposta aos lojistas atuantes na praça de alimentação, deixa a exclusivo arbítrio da administração do shopping ditar as regras que entende necessárias. Não obstante a adoção das disposições do art. 54 da Lei n , de 18 de outubro de Lei do Inquilinato - diferentemente do que alega a apelante, mesmo em contratos onde uma parte adquire uma posição de vantagem, como o contrato de shopping center e o de franquia, o produtor é quem traça as diretrizes contratuais, é ele quem determina o rumo negocial. (...) essa posição vantajosa do produtor, todavia, não desqualifica a natureza civil do contrato, em especial a obediência à boa-fé objetiva e à sua função social, como forma de ser promovida a harmonização das bases negociais inicialmente acordadas. Como forma de evidenciar tal conclusão, impõe-se destacar que o pagamento do aluguel avençado entre as partes está diretamente ligado ao faturamento mensal da apelada. Desta forma, parece-me ser contraditório o comportamento da apelante em pretender a rescisão da locação com o posterior despejo do imóvel, no momento em que a apelada descumpriu, e isso é fato, norma relativa à utilização de apenas 01 (um) garçom em uma pizzaria localizada na praça de alimentação do Shopping Vitória. Ora. Seria a medida extrema do despejo a única solução encontrada pelo apelante para resolver um descumprimento relativo ao número de garçons utilizados pela apelada? Não se trata de discutir o conhecimento prévio pela apelada das normas restritivas estabelecidas, ou não, pelo Shopping Vitória no contrato de locação celebrado entre as partes ou a necessidade dos lojistas obedecerem a tais ditames como forma de prover um bom funcionamento e organização do shopping center. O que se discute é a repercussão do descumprimento de uma norma de natureza exclusivamente administrativa, qual seja, limitação do número de garçons, em oposição ao desemprego dos funcionários da apelada, além das demais questões fiscais e sociais que o despejo ora pretendido, se decretado, certamente irá impor. A teoria do adimplemento substancial que visa a impedir o uso desequilibrado do direito de resolução por parte do credor, em prol da preservação da avença, com vistas à realização dos princípios da boa-fé e da função social do contrato, ensina que tal como na hipótese dos autos, o credor ficará impedido de promover a resolução contratual e, também, de argüir a exceptio non adimpleti contractus, quando a prestação descumprida pelo devedor for insignificante em relação à totalidade da avença, sob pena de quebra do equilíbrio contratual. A jurisprudência também ampara este entendimento: [...]. 3. Ademais, incide a teoria do adimplemento substancial, que visa a impedir o uso desequilibrado do direito de resolução por parte do credor, em prol da preservação da

5 avença, com vistas à realização dos princípios da boa-fé e da função social do contrato. 4. No caso, embora houvesse mora de 90 (noventa) dias no pagamento da mensalidade do plano, antes da ocorrência do fato gerador (morte do contratante) tentou-se a purgação, ocasião em que os valores em atraso foram pagos pelo de cujus, mas a ele devolvidos pela entidade de previdência privada, com fundamento no cancelamento administrativo do contrato ocorrido 6 (seis) dias antes. 5. Com efeito, depreende-se que o inadimplemento do contrato - a par de ser desimportante em face do substancial adimplemento verificado durante todo o período anterior - não pode ser imputado exclusivamente ao consumidor. Na verdade, o evitável inadimplemento decorreu essencialmente do arbítrio injustificável da recorrida - entidade de previdência e seguros - em não receber as parcelas em atraso, antes mesmo da ocorrência do sinistro, não agindo assim com a boa-fé e cooperação recíproca que são essenciais à harmonização das relações civis. 6. A entidade de previdência obstou a purgação da mora por motivo injustificado, antes mesmo da ocorrência do fato gerador, somando-se a isso a inequívoca conduta pautada na boa-fé do consumidor, por isso incabível a negativa de pagamento do pecúlio depois de verificada morte do contratante. Incidência do art. 21, 3º, da Lei n / Recurso especial provido. (REsp /SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/11/2011, DJe 01/02/2012). (Meu, o destaque em negrito). [...}. 2. A adoção da teoria do adimplemento substancial, balizada nos princípios da função social do contrato e da boa-fé objetiva, possibilita o afastamento da resolução contratual quando diminuto o descumprimento do que fora avençado entre as partes. Inaplicabilidade no caso concreto. 3. Recurso improvido. (TJES, Classe: Apelação Civel, , Relator: TELEMACO ANTUNES DE ABREU FILHO, Órgão julgador: QUARTA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 08/10/2012, Data da Publicação no Diário: 17/10/2012). (Meu, o destaque em negrito). Desta forma, tenho como desarrazoada a pretensão de rescisão da locação com o posterior despejo do imóvel ocupado pela apelada sem que haja sinais de, pelo menos, a ocorrência de inadimplemento financeiro. Somente o mero descumprimento de uma norma interna, de caráter nitidamente administrativo, sem nenhuma implicação na relação locatícia propriamente dita e com evidentes contornos potestativos, não pode gerar as consequências extremas pretendidas na ação. Posto isso, conheço do recurso, mas a ele nego provimento. É como voto.

6 * O SR. DESEMBARGADOR LUIZ GUILHERME RISSO :- Voto no mesmo sentido * O SR. DESEMBARGADOR WILLIAN SILVA :- Voto no mesmo sentido * D E C I S Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos, APELAÇÃO Nº ( ), em que são as partes as acima indicadas, ACORDA o Egrégio Tribunal de Justiça do Espírito Santo (Terceira Câmara Cível), na conformidade da ata e notas taquigráficas da sessão, que integram este julgado, em, à unanimidade, negar provimento ao recurso * * *