e Apneia na Reabilitação Oral - parte I
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- Vítor Castilhos Canela
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1 A Oclusão e a Postura, a patologia do Ronco e Apneia na Reabilitação Oral - parte I 0 Dr. Raul Vaz de Carvalho introduz o tema, chamando a atenção para a intervenção do médico dentista face a pacientes com eventuais problemas cervicais e/ou de sono. Introdução - Parte I A harmonia craniofacial é estruturada na simetria do paciente, nas três regiões da face, nas linhas bipupilares e na linha entre os tragus e a fenda labial paralela e horizontal. As três regiões faciais devem estar harmoniosas entre si, sem recuos ou projecções. A mandíbula deve estar equilibrada e simétrica nos três planos do espaço, além dos seus músculos apresentarem tensões similares bilateralmente e, idealmente, não haver perdas de elementos dentários, bem como presença de contactos oclusais deflectivos (Figura 1). A compreensão do mecanismo postural, que se expressa nas próprias posições, obtém-se quando se tem a ideia do corpo humano como uma unidade funcional, na qual os músculos e os ligamentos, inseridos nas superfícies ósseas ou cartilaginosas, actuam sobre as articulações, gerando nestas estados de tensão muscular que operam com igual potência, em ambos os extremos das fibras musculares, para produzirem, como consequência, uma imobilidade momentânea do corpo ou de uma das suas partes, definindo a postura ou posição. Na postura, as tensões presentes nos extremos dos músculos envolvidos (segmentos) neutralizam-se mutuamente. As tensões segmentarias equilibram-se - cedem num dos segmentos musculares actuando imediatamente no outro. Este equilíbrio muscular estático, ligado à contracção muscular tónica, corresponde ao conceito de "postura". O controlo postural elege uma variável relacionada com a posição do corpo humano e a monitorização desta variável obtém-se através de informações sensoriais corporais. Entre as possíveis variáveis relacionadas com a postura erecta do ser humano, destaca-se o eixo postural do corpo. A linha vertical que passa por este eixo, denominada Linha da Gravidade, a posição da cabeça, o alinhamento vertical do corpo humano ou do tronco e o centro de pressão são resultantes das forças aplicadas no apoio - componentes estes que formam o equilíbrio postural estática e dinamicamente (Figura 2). Segundo Rocabado (1979), quando existe um desequilíbrio no sistema muscular responsável pela manutenção da postura, da mandíbula, do crânio e coluna cervical provocam-se as respectivas alterações posturais, aparece a dor e a disfunção na articulação temporomandibular. Weber & Preston (1981) relatam a existência de uma relação entre o modo de respirar, a postura da cabeça e a morfologia crânio-facial. Esta relação foi tema de muitos artigos estudados nos últimos anos. Os autores afirmam ainda que os respiradores bucais rectificam a coluna cervical na tentativa de desobstruir as vias aéreas superiores. Exame clínico extra-oral Alinhamento da região cervical A coluna vertebral é dividida em quatro regiões: Cervical, Torácica, Dorsal e Lombar, cada uma com as suas curvaturas definidas. Normalmente, devido à acção da gravidade, somada às posturas erradas por tempo prolongado, o corpo pode perder o seu eixo de equilíbrio e, como tal, resultar em alterações posturais com respectivo enrijecimento das articulações vertebrais e na diminuição do comprimento dos músculos. Tais alterações estruturais acentuam as curvaturas da coluna vertebral, tornando-a mais vulnerável às tensões mecânicas e aos traumas. Caracteriza-se e definem-se então os desvios posturais, tais como a hiperlordose cervical, hipercifose dorsal, hiperlordose lombar e escoliose e, consequentemente, o desequilíbrio de várias outras articulações, como as dos ombros, dos braços, dos quadris, dos joelhos e dos pés (Figura 3). Desvios ascendentes Aqui observa-se a postura do paciente e a sua relação com as curvas da coluna vertebral. No plano sagital, o aumento ou a redução das curvas sagitais, podem ser identificadas. Essas alterações podem estar relacionadas com doenças primárias localizadas no segmento específico da coluna vertebral (deformidades congénitas, tumores, infecção, espondilite anquilosante, estenose do canal vertebral, sequela de traumatismos ou cirurgias) ou doenças secundárias à deformidade presente
2 na articulação coxo-femural (quadril) ou segmentos adjacentes da coluna vertebral. No plano frontal, o alinhamento vertical da coluna vertebral pode demonstrar inclinação da cabeça na qual o músculo esternocleidomastoídeo está comprometido, e a cabeça como tal, inclina para o lado do músculo acometido e gira para o lado oposto. O alinhamento da cintura escapular, das cristas ilíacas, a simetria da linha do trapézio na região cervical, do contorno lateral do tronco e da cintura, bem como o triângulo formado pelos membros superiores e face lateral do tronco fornecem os parâmetros necessários para a avaliação do alinhamento no plano frontal. O desvio da coluna no plano frontal (escoliose) pode estar relacionado com a diferença no comprimento dos membros inferiores, com contracturas em adução ou abdução ao nível da articulação coxo-femural, com escoliose idiopática, com escoliose neuromuscular ou congénita, e relacionado também com processos álgicos da coluna lombar (hérnia do disco vertebral, infecções, tumores), nos quais a escoliose é provocada por uma contractura reflexa da musculatura paravertebral. Esse tipo de contractura reflexa, geralmente, provoca um aplainamento da lordose lombar, acompanhada de escoliose (Figuras 4 e 5). Desvios descendentes Os desvios posturais também podem ser descendentes a partir das relações craniofaciais - podem estar associados a alterações na Dimensão Vertical Oclusal, nas mordidas abertas e/ou cruzadas, nas prematuridades, próteses com insuficiência oclusal e outras deformidades estruturais no complexo craniomandibular. Em todas as condições, os componentes do sistema são submetidos a adaptações estruturais e funcionais. Geralmente, as adaptações do sistema músculo-esquelético, derivadas destes desvios, caracterizam-se por alterações posturais e funcionais onde estão incluídos os lábios, a língua, a musculatura mastigatória, a mandíbula, palato mole e a musculatura ocular, provocando no paciente uma modificação da posição da cabeça e do pescoço e consequentemente, uma alteração postural e do equilíbrio de todo o corpo (tórax, ombros, coluna, pelve, ventre, pernas e a posição dos pés) (Figura 6). Exame clínico intra-oral A função respiratória é vital para os seres humanos mas, uma vez comprometida, pode resultar em alterações não só nas estruturas orofaciais relacionadas directamente com a cavidade oral e nasal, mas também relacionada com a postura dos ombros e da cabeça (postura corporal) do indivíduo. A síndrome das apneias/hipopneias do sono tem-se revelado ser a síndrome mais importante e frequente no distúrbio respiratório do sono. O distúrbio é comum e pode acometer todas as faixas etárias e em ambos os sexos, independentemente do peso, embora seja mais frequente nos obesos ou em pessoas com sobrepeso. Diversos factores relacionados com a anatomia craniofacial, com a hipertrofia muscular ou com o aumento dos tecidos moles podem predispor ao colapso das vias aéreas durante o sono. No exame clínico, as características mais significativas que devem ser observadas nos pacientes são: a base do crânio e o comprimento diminuído da maxila relacionada com a altura normal; a retrognatia maxilomandibular; o tamanho reduzido da faringe e o osso hióide posicionado mais inferiormente, com o ângulo craniocervical aumentado. Existem diversos factores anatómicos capazes de contribuir para a obstrução do espaço aéreo faringeano durante o sono, como as micrognatias ou as grandes retrognatias. as hipertrofias adenoideanas, as hipertrofias amigdalianas, os tumores do espaço aéreo superior, as macroglossias e as obstruções nasais. Do ponto de vista dentário, convém serem analisadas as relações antero-posteriores : a dimensão vertical, as perdas de dentes, a presença de próteses, a flacidez do palato mole, etc. Quadro clínico A causa mais relatada pelos pacientes que procuram a consulta médico-dentária está relacionada com a sonolência diurna. A sonolência acarreta um baixo desempenho intelectual e físico e provoca embaraços sociais, pela desatenção, falta de memória e indiferença geradas, expondo o paciente e os circunstantes a riscos de acidentes, porque gera-se a sensação progressiva de cansaço. Já foi demonstrado que alguns pacientes, mesmo após tratamento e já sem sonolência excessiva, mantêm
3 anormalidades cognitivas associadas a alterações permanentes da memória. As alterações de humor, tais como a irritabilidade e a depressão, são também frequentemente encontradas neste tipo de pacientes. Outro sintoma comum é o ronco. Este é produzido pela vibração das estruturas moles da faringe, decorrente do baixo fluxo de ar na via aérea que é estreita e/ou obstruída. O som do ronco pode ser tão alto, que frequentemente expulsa (por incómodo) o parceiro do quarto e até de outros compartimentos da casa. Observações A lista de Referências Bibliográficas serão publicadas na parte 111 do artigo
4 1 Resumo O sistema mastigatório humano normal, no seu todo, engloba não só os maxilares, o processo alveolar, os arcos dentários, os dentes e a membrana periodontal, mas também os músculos dos lábios, das bochechas, da língua e da boca, vias nasais, assim como o palato e a oro faringe. Para que este sistema desempenhe as suas funções adequadamente, é necessário que haja harmonia entre todos aqueles componentes, o que lhes proporcionará o equilíbrio das pressões, relacionadas com as respectivas estruturas ósseas e musculares, permitindo um bom desempenho na sucção, na deglutição, na mastigação, na respiração e na fala, assim como na postura da cabeça e na posição habitual da língua e dos lábios durante o repouso. O conhecimento destas estruturas, assim como as suas relações funcionais e a compreensão de que alterações no seu equilíbrio afectam a saúde sistémica do indivíduo, têm levado à realização de estudos cada vez mais abrangentes na tentativa de preservar ou restaurar a sua harmonia. Contudo, reconhece-se que, em geral, existe pouca dedicação e qualificação profissional para com estas necessidades. O paciente que procura a consulta do médico com uma queixa de dor localizada na região da cabeça, do pescoço e/ou dos ombros, pode apresentar, ao mesmo tempo, uma severa disfunção respiratória, postural, auditiva, etc, ou, ao contrário, pode queixar-se, por exemplo, do ronco e da apneia do sono e apresentar concomitantemente problemas de oclusão e perda da estabilidade da mandíbula, condições que, frequentemente, desenvolvem problemas e interferem na harmonia de todo o sistema, o que, com o tempo, pode afectar a sua qualidade de vida. Estas interacções quase sempre não são correctamente identificadas ou mesmo compreendidas pelo profissional de saúde. Desta forma, torna-se cada vez mais necessário que o médico dentista possa identificar na consulta inicial, tanto as relações dos sintomas envolvidos, como a extensão das desordens e disfunções relatadas e obtidas ao paciente. De acordo com estas orientações e necessidades, foi elaborada na Clínica CDI* uma metodologia clínica de diagnóstico e plano terapêutico, cuja base é a queixa ou relato principal do paciente, mas também a pesquisa de todas as possíveis disfunções e sintomas clínicos e sub-clínicos associados. As áreas envolvidas neste protocolo incluem o Médico, o Dentista e o Fisioterapeuta. Além dos exames clínicos específicos (Parte I), os recursos complementares de suporte que envolvem o protocolo incluem: a polissonografia, a cefalometria, registos electromiográficos dos músculos mastigatórios e posturais, estudos da arquitectura postural e a trajectória do centro de gravidade em relação à base de apoio e ao equilíbrio do corpo humano (Parte II). A terapêutica (Parte III) segue a linha multidisciplinar integrada, cuja interface de ligação e hierarquia de procedimentos é primária e a imediata prioridade ao paciente. * Departamento de Oclusão e Distúrbios do Sono
5 Figura 2: Postura do corpo e oclusão dentária. Desenho ilustrativo da linha vertical que passa pelo eixo central do corpo, chamada "Linha da Gravidade", a posição da cabeça, o alinhamento vertical do corpo humano ou do tronco e o centro de gravidade aplicado no meio do quadrilátero de sustentação Figura 3: A coluna quando vista de lado mostra curvaturas que lembram a forma de um "S". Estas curvaturas são normais e chamadas de Cifose e Lordose. Existe uma lordose cervical, uma cifose torácica e uma lordose lombar. Figura 6: Distúrbios descendentes: labirintite ou distúrbios auditivos, estrabismo ocular e disfunções craniomandibulares. A fotografia em plano frontal do paciente demonstra assimetria da face e ombros, normalmente indicativas de alterações oclusais, posturais e esqueletais Figura 1: A linha vermelha refere-se à linha bipupilar paralela ao solo e a linha preta à linha mediana, referente ao plano sagital perpendicular ao plano do solo
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