Abortamento. Bioética e Deontologia Profissional. 4º Ano da Licenciatura em Medicina

Transcrição

1 Abortamento Bioética e Deontologia Profissional 4º Ano da Licenciatura em Medicina 1

2 Abortamento Interrupção da gravidez, antes de atingida a viabilidade fetal. Nunes, 2000 O aborto é o resultado do abortamento. A interrupção voluntária da gravidez é uma questão controversa. 2

3 Estatuto moral do embrião humano Período embrionário Decorre desde a formação do zigoto até ao final da oitava semana de gestação. A atribuição de um estatuto moral ao embrião humano tem como argumento principal uma perspectiva biológica do desenvolvimento humano nas suas primeiras fases de divisão. Nunes,

4 Estatuto moral do embrião humano Referências de relevo no desenvolvimento humano: A importância da singamia; O processo de implantação do embrião no útero; O surgimento do sulco primitivo; As primeiras manifestações de actividade cortical; A viabilidade do feto; O momento do nascimento; A aquisição de faculdades mentais superiores. Nunes,

5 Estatuto moral do embrião humano Perspectiva clássica: Assenta no surgimento, após a junção do material genético dos pais, de uma nova entidade humana que deve merecer o respeito devido a qualquer outro membro da nossa espécie. 5

6 Estatuto moral do embrião humano Perspectiva ontológica: Compreende o surgimento do sulco primitivo como forma da individualização humana. É a perspectiva adoptada na maioria dos países de expressão anglo-saxónica. ACOG, 1994 cit. in Nunes,

7 Estatuto moral do embrião humano Perspectiva obstétrica : Atribui ao organismo materno grande importância, como suporte físico indispensável, e também como uma entidade que possui uma capacidade geneticamente determinada para influenciar positivamente o desenvolvimento do embrião. Abel, 1992, cit. in Nunes,

8 Estatuto moral do embrião humano Perante o embrião humano, os seguintes aspectos devem ser tomados em consideração: Respeito pela dignidade humana; O argumento da rampa deslizante; Autonomia do paciente; Beneficência. Fasouliotis & Schenker,

9 Estatuto moral do embrião humano Até existir uma iniludível confirmação de que o embrião humano durante as suas primeiras divisões, não tem as características suficientes e necessárias para ser considerado uma pessoa humana deve ( ) ser considerado como se as tivesse. Nunes, 2000, p.119 9

10 Interrupção voluntária da gravidez Situação em que a mulher deseja pôr termo à sua gravidez. É uma questão ética e legalmente controversa. 10

11 IVG Enquadramento legal Em Portugal, a prática da IVG encontra-se legislada por: Lei n.º6/84 de 11 de Maio sobre exclusão de ilicitude em alguns casos de IVG; Decreto-Lei n.º48/95 de 15 de Março que aprova o Código Penal; Lei n.º90/97 de 30 de Julho que altera os prazos de exclusão de ilicitude nos casos de IVG. 11

12 IVG Enquadramento legal Decreto-Lei n.º48/95 de 15 de Março À luz da lei Portuguesa o aborto é considerado crime. A lei Portuguesa prevê ainda a exclusão de ilicitude em alguns casos específicos de interrupção da gravidez. 12

13 IVG Enquadramento legal Não é punível a IVG quando: Constituir a única forma de remover perigo de morte ou de grave e irreversível lesão para a saúde física e psíquica da mulher grávida; Se mostrar indicada para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura lesão para a saúde física e psíquica da mulher grávida; 13

14 IVG Enquadramento legal Não é punível a IVG quando: Houver seguros motivos de que o nascituro virá a sofrer, de forma incurável, de grave doença ou malformação; Houver sérios indícios de que a gravidez resultou de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual. 14

15 IVG Enquadramento legal O consentimento para a prática de IVG é prestado: Pela mulher ou representante, em documento assinado, 3 dias antes da intervenção; Sendo menor de 16 anos ou psiquicamente incapaz o consentimento é dado pelo seu representante legal; Não sendo possível obter consentimento, o médico decide em consciência face à situação. 15

16 IVG Enquadramento legal A vida de quem está para nascer é um bem jurídico indisponível Informação-Parecer da PGR, n.º31/82 O nascituro, enquanto concebido, é já um ser vivo humano e, portanto, digno de protecção T.C., Acórdão 25/84 A vida humana é inviolável CRP, art. 24º, n.º1 16

17 Interrupção voluntária da gravidez Perante a IVG podem considerar-se as seguintes situações: Abortamento electivo; Abortamento terapêutico; Abortamento de fetos inviáveis; Abortamento eugénico; Abortamento criminológico; Redução selectiva; Transplantação de tecidos fetais. 17

18 Abortamento electivo O abortamento como a anulação de uma gravidez normal, por decisão de uma mulher normal e em decisão a um feto normal. Serrão, 2006, p.73 Será lícito despenalizar esta prática? Valor da vida humana vs autonomia. 18

19 Abortamento electivo É de rejeitar a exclusão de ilicitude para o abortamento solicitado pela grávida relativamente a feto normal. A vida humana é um bem e a grávida não pode dispor desse bem, que não é seu. Profilaxia do aborto clandestino. 17/CNECV/97 19

20 Abortamento terapêutico Conflito entre a vida da mãe e a vida do feto. Direito à vida e à saúde da progenitora. Direito a uma escolha informada por parte da paciente. Teoria do duplo-efeito. 17/CNECV/97 20

21 IVG Enquadramento deontológico O médico deve guardar respeito pela vida humana desde o seu início. A prática do aborto constitui falta deontológica. Não é considerado aborto a terapêutica que tenha por objectivo salvaguardar a vida da doente e que possa ter como consequência a IVG. Código Deontológico da Ordem dos Médicos Artigo 47º 21

22 IVG Enquadramento deontológico Objecção de consciência. Código Deontológico da Ordem dos Médicos Artigo 30º Providências organizativas e regulamentares necessárias à boa execução da legislação atinente à IVG. Lei n.º90/97 de 30 de Julho 22

23 Abortamento de fetos inviáveis Fetos cujo desenvolvimento se encontra gravemente comprometido pela falta ou insuficiência grave de um órgão vital. Abortamento como eutanásia involuntária prénatal. Não se afigura eticamente correcto defender uma vida sem projecto. 17/CNECV/97 23

24 Abortamento eugénico Suscita variadas dúvidas de natureza ética. Não se invoca o conflito entre a mãe e o feto, mas antes entre a sociedade e o feto. Constatação da malformação ou previsão de doença grave como justificação para a supressão de uma vida. Avaliação de argumentos do ponto de vista ético. 24

25 Abortamento eugénico Argumento da rampa deslizante. Doenças de manifestação tardia. Viabilidade fetal. Que procedimento adoptar em caso de fetos vivos resultantes de abortamento? 25

26 Abortamento eugénico Pressupõe, assim como o abortamento terapêutico, o consentimento informado livre e esclarecido dos pais. Direito dos pais a uma escolha informada. 26

27 Abortamento criminológico Crime contra a liberdade e a autodeterminação sexual. Argumento no plano da ética personalista. Solução de adopção (17/CNECV/97). 27

28 Redução selectiva Gestação múltipla decorrente das técnicas de procriação medicamente assistida. Numa gravidez múltipla (quádrupla, quíntupla ou superior) a possibilidade de nascimento de todos os fetos é muito reduzida. Redução selectiva embrionária ou fetal. 28

29 Redução selectiva Decisão médica, devendo a selecção ser feita por critérios clínicos e de acessibilidade anatómica. Doutrina do proporcionalismo. Redução selectiva difere de abortamento. A realização deste procedimento minimiza o risco de nascimento prematuro, assim como a morbilidade e a mortalidade pré-natal. 29

30 Transplantação de tecidos fetais A transplantação de tecidos fetais é possível: Entre as 8 e as 11 semanas para o tecido neural; Entre as 8 e as 14 semanas para o tecido hepático; Entre as 10 e as 20 semanas para o tecido pancreático. Irving, 1994 cit. in Nunes,

31 Transplantação de tecidos fetais Questões éticas decorrentes da transplantação de tecidos fetais comparativamente à utilização de tecidos de seres humanos adultos: A estreita relação existente com a prática do abortamento; A impossibilidade de obtenção de consentimento informado. 31