ALTERNATIVAS DE APROVEITAMENTO DE PELE CAPRINA E SEU IMPACTO NA RENTABILIDADE DA CAPRINOCULTURA DE CORTE.

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1 ALTERNATIVAS DE APROVEITAMENTO DE PELE CAPRINA E SEU IMPACTO NA RENTABILIDADE DA CAPRINOCULTURA DE CORTE. Manuel Antonio Chagas Jacinto Pesquisador do IPT/CTCC Professor da Universidade de Franca Observa-se em publicações sobre caprinocultura de corte que são discutidos dados importantes: efetivo, desfrute, consumo per capta, raças potenciais, mercado e até objetivos e expectativas inerentes à criação, porém, não é dada atenção à pele. O valor da pele não é considerado, apesar de representar um ganho adicional para o criador entre 7,3 a 8,7% em relação ao preço de venda da carcaça. O cálculo é simples: animais abatidos com 20 a 24 kg de peso vivo resultam em uma carcaça de aproximadamente 10 a 12 kg (RIBEIRO, 1998; MEDEIROS, 1999). O preço por quilo da carcaça é equivalente a aproximadamente R$ 6,87 1, preço da carne bovina de primeira (Franca SP). Considerando R$ 6,87/kg, uma carcaça renderá R$ 68,70 a R$ 82,44 e a pele, aproximadamente, R$ 6,00 2, equivalendo a cerca de 7,3 a 8,7% do valor da carcaça. Se a venda da pele contribui com aproximadamente 8% do preço total da carcaça, esse sub-produto talvez represente a diferença entre prejuízo e lucro na caprinocultura de corte, podendo ser contabilizado como produto. Segundo MEDEIROS (1999) a pele é um sub-produto de grande importância para a caprinocultura de corte nordestina, podendo representar 30% do valor comercial da carne, entretanto o produtor recebe um baixo valor por ela; a agregação de valor ocorre entre os intermediários e o curtume. A caprinocultura tem na Região Nordestina seu mais importante reduto, apresentando um efetivo de aproximadamente 7,4 milhões de cabeças (IBGE, 1999), cerca de 93,7% do total nacional (7,9 milhões de cabeças). Considerando os dados sobre caprinocultura de corte de RIBEIRO & RIBEIRO (2000), de que em 1996 a população humana da região SUDESTE do Brasil era de 67,0 milhões (IBGE, 1999) e o consumo de carne caprina de 1,20 kg/habitante/ano, chegase a um consumo potencial de 80,4 milhões de kg de carne caprina ao ano. Considerando-se carcaças de 12 kg, para atender a essa demanda, deverão ser abatidas 6,7 milhões de cabeças ao ano. O rebanho necessário para satisfazer ao consumo seria de 4,7 milhões de cabras (índices utilizados: fertilidade 90%; prolificidade = 1,5; mortalidade = 10%; taxa de reposição = 20%). Deduzindo-se 10% 1 Cotação oficial do dólar americano em = 2,72 reais. 2 Preço médio praticado na Região Nordeste e em Franca (Curtume São Sebastião) 1

2 relativo a perdas devido, principalmente ao manejo e má conservação, o número de peles disponíveis seria de aproximadamente 6,03 milhões, representando um incremento R$ 36,18 milhões de reais na cadeia produtiva. Na venda do animal para a produção de carne, a pele tem valor ponderal importante e pode ser aproveitada se corretamente retirada e conservada, originando um produto valorizado pelo mercado pelo seu aspecto e características mecânicas peculiares, denominado pelica (JACINTO, 1999). O mercado importador mundial classifica as peles caprinas em quatro categorias (A, B, C e D), baseadas em tamanho, peso e tipo de fibra (pêlo), e estabelece o uso para cada categoria (HOLST, 1990). Na categoria A, as peles devem ser pequenas, finas, leves com pêlos curtos e finos, provenientes de caprinos jovens. As peles desta categoria são de especial interesse e apresentam alto valor, decorrente da aparência estética do produto acabado, associado à aparência do grão, resultante do padrão criado pela disposição dos folículos pilosos (Figura 1) na superfície do couro. Figura 1: Eletromicrografia de um folículo piloso da pele de caprino alpino x boer macho, responsável pela aparência do grão. Aumento de 500 vezes (equipamento Digital Scanning Microscope DSM 960 ZEISS). Na categoria B estão compreendidas as peles grandes, espessas, pesadas, com pêlos grosseiros. Existe pequena demanda para as peles dessa classificação. Utilizada na fabricação de bolsas. Na categoria C estão as peles com propriedades intermediárias. Com boa demanda para o mercado calçadista. 2

3 Na categoria D estão as peles com alta densidade de pêlos (raça angorá). Sujeitas à flutuação na demanda, muito dependente das tendências da moda feminina. A boa aparência está relacionada com a alta densidade de folículos primários de diâmetros uniformes (< 60 µm), produtores de finas fibras meduladas. Esta aparência decresce com o aumento da idade, pois o número de folículos primários em caprinos é fixo desde o nascimento e, com o crescimento do animal, ocorre o aumento proporcional de área da pele, diminuindo, conseqüentemente, a densidade folicular. Todas as raças de caprinos produtores de couros famosos pela aparência do grão, são pigméias ou semi-pigmeias; no Brasil, apesar dos caprinos SRD nordestinos não serem raças pigméias, a prática aceita pela indústria é abater os animais antes que alcancem 20 kg, peso em que a área da pele e a densidade folicular são determinantes para a aparência do grão (HOLST 1990). O mesmo autor estudando caprinos (feral goats) com idades de 1 dia e de uma semana a dezesseis semanas, coletou amostras para contagem dos pêlos (NAGORCKA et al., 1995), antes de enviar os animais para o abate e, após este, as peles foram enviadas para o curtume e processadas até à etapa semi-acabada. Dos couros, foram retiradas amostras da região dorsal e lateral para o levantamento da densidade folicular. Os resultados são apresentados na Tabela 2 e mostram que, até aos 70 dias, as peles se apresentam com grãos de boa aparência. Tabela 2: Efeito da idade ao abate, no diâmetro dos pêlos e densidade folicular e a Idade (dias) classificação da aparência do grão da pele caprina. Diâmetro médio dos pêlos (µm) Densidade de folículos primários (nº/mm 2 )* Número de peles por classificação de aparência do grão** ,65 11, ,00 9, ,55 7, ,80 8, ,16 6, ,33 6, ,87 5, ,82 5, ,95 5, ,30 4, ,20 3, FONTE: HOLST et al. (1989). * Região lateral da pele. ** 1= muito fina, 6= grossa JACINTO (2000), estudando a aparência do grão (folículos pilosos) no couro de caprinos da raça Saanen, Anglo Nubiana e Alpina, machos com noventa e cento e oitenta dias de idade respectivamente notou que os animais jovens apresentaram alta 3

4 densidade folicular (Figura 2) e animais com o dobro da idade, baixa densidade folicular (Figura 3), resultados coerentes com os observados na literatura (HOLST 1990). O material de estudo foi preparado, empregando-se a metodologia de JACINTO (1996), através do curtimento e recurtimento das peles para a obtenção do semiacabado. 2 3 Figura 2: Couro semi-acabado de caprino da raça Alpina com noventa dias de idade. Aumento = 6 vezes. Figura 3: Couro semi-acabado de caprino da raça Alpina com cento e oitenta dias de idade. Aumento = 6 vezes Figuras 4 e 6: Couros semi-acabados de caprinos das raças Saanen e Anglo Nubiana com noventa dias de idade. Aumento = 1,5 vezes. 4

5 Figura 5 e 7: Couros semi-acabados de caprinos das raças Saanen e Anglo Nubiana com cento e oitenta dias de idade. Aumento = 1,5 vezes. Segundo RIBEIRO (1993), na Região Sudeste as peles são descartadas ou beneficiadas com tecnologias inadequadas, apresentando baixa qualidade para comercialização. Este item bem explorado, somado à produção de animais para abate, certamente poderá tornar-se uma alternativa complementar da renda do criatório, voltado para a produção de carne e/ou de leite. Na região Sudeste, a pele caprina não é processada pelos curtumes, pois estes se dedicam à produção de couro bovino, o que é justificável, considerando-se que o grande efetivo deste rebanho se encontra no centro do Brasil (IBGE, 1999), relativamente próximo a essa Região. Pela mesma razão, os curtumes especializados no tratamento de peles caprinas estão localizados próximos à fonte de produção, ou seja, a Região Nordeste. Segundo informações atualizadas (JACINTO, 1999), os curtumes nordestinos Campelo, Cobrasil, Europa e Moderno compram pele salgada seca por aproximadamente R$6,00 independentemente de classificação e tamanho. O rendimento após o processamento é de 20% classificação única, 60% classificação econômica e 20% classificação forro. As peles caprinas são compradas por unidade, curtidas com base na massa e vendidas por área. São consideradas pequenas as peles entre 40 a 60 dm 2 e, grandes, aquelas acima de 60 dm 2. Os couros pequenos são mais valorizados como pode ser observado pelos dados da Tabela 2. Tabela 2: Preço médio por couro segundo o artigo, a classificação e o tamanho. Preço médio (R$) dos artigos (m 2 ) Classificação Pelica lustrada Pelica pigmentada Camurça Pelica forro Pequena Grande Pequena Grande Única 50,87 46,44 49,33 42,12 53,54 24,00 Econômica 40,70 37,16 39,46 33,70 42,83 19,20 FONTE: JACINTO (1999), atualizada para novembro de 2001 com dados do Curtume Campelo. Qualquer trabalho de valorização da pele e do couro deve considerar ações na transmissão de informações e conscientização de produtores em nível de propriedades rurais, associações de classe, cooperativas e instituições de apoio oficiais com o objetivo de disseminar técnicas de esfola e conservação das peles. Cuidados com o manejo durante a permanência do animal no campo e com a matéria-prima durante o 5

6 abate, a esfola e a conservação, são condições fundamentais para a garantia da qualidade do produto final, a pelica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS HOLST, P. J. Pretanning factors that affect the grain appearance on goat leather. Cowra: NSW Agriculture & Fisheries, p.1-5. (Technical Bulletin,36). INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Anuário estatístico brasileiro. Rio de Janeiro, IBGE, JACINTO, M. A. C. Características anátomo-estruturais da pele de ovinos (Ovis áries L.) lanados e deslanados, relacionadas com o aspecto físico-mecânico do couro após o curtimento. Jaboticabal, p. Dissertação (Mestrado em Zootecnia) Departamento de Produção Animal, Universidade Estadual Paulista. Qualidade e aproveitamento de peles caprinas. (Internet: /06/99). Influência da raça e idade nas características histológicas e físico-mecânicas de couros caprinos. São Paulo, 2000, 118 p. Tese (Doutorado em Curtimento) Departamento de Zootecnia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" UNESP, Campus de Jaboticabal. MAGORCKA, B. N. et al. A techinique to quantify and characterize the density of fibres and follicles in the skin of sheep. Aust.J. Agric. Res., v. 46, p , MEDEIROS, A. N. Caprinocultura de corte no Nordeste Brasileiro. (Internet: 26/11/99). RIBEIRO, S. D. A. A Caprinocultura no sudeste. Jaboticabal, p. Monografia Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista.. Caprinocultura: criação racional de caprinos. São Paulo: Livraria Nobel S.A., p. RIBEIRO, S. D. A., RIBEIRO, A. C. Caprinocultura de corte. (Internet: acesso em 28/10/01). 6