filosofia alemã: idealismo e romantismo
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- Vergílio Santiago Carvalho
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1 filosofia alemã: idealismo e romantismo
2 não possuímos conceitos do entendimento e, portanto, tão-pouco elementos para o conhecimento das coisas, senão quando nos pode ser dada a intuição correspondente a esses conceitos; daí não podermos ter conhecimento de nenhum objecto, enquanto coisa em si, mas tão-somente como objecto da intuição sensível, ou seja, como fenómeno; de onde deriva, em consequência, a restrição de todo o conhecimento especulativo da razão aos simples objectos da experiência. Todavia, deverá ressalvar-se e ficar bem entendido que devemos, pelo menos, poder pensar esses objectos como coisas em si embora os não possamos conhecer. Caso contrário, seríamos levados à proposição absurda de que haveria fenómeno (aparência), sem haver algo que aparecesse. Kant. KrV B XXV-XXVI
3 O idealismo (o idealismo material, entenda-se) é a teoria que considera a existência dos objectos fora de nós, no espaço, ou simplesmente duvidosa e indemonstrável, ou falsa e impossível; o primeiro é o idealismo problemático de Descartes, que só admite como indubitável uma única afirmação empírica (assertio), a saber, eu sou; o segundo é o idealismo dogmático de Berkeley, que considera impossível em si o espaço, com todas as coisas de que é condição inseparável, sendo, por conseguinte, simples ficções as coisas no espaço. O idealismo dogmático é inevitável se se considera o espaço como propriedade que deve ser atribuída à coisa em si; sendo assim, tanto o espaço como tudo o que a que serve de condição é um não-ser. Mas o fundamento deste idealismo foi por nós demolido na estética transcendental KrV B274
4 "É em formas bárbaras como esta que Kant se expressa sempre: «Para que eu possa apreender as minhas sensações como pertencentes a algo exterior a mim, eu preciso de pressupor o espaço.» Sobre o tempo, Kant procede do mesmo modo: «De forma a que algo exterior a mim seja representado num espaço separado ou num tempo separado, a concepção do espaço ou do tempo deve vir antes, pois não pode ser derivado da experiência, na medida em que a experiência só é possível através desta concepção antecedente.» ( ) Como a priori, espaço e tempo são universais e necessários, o que quer dizer que é este o caso; mas não se segue que eles tenham de estar presentes como conceitos. Eles são, na verdade, fundamentais, mas eles são-no como uma condição externa." Hegel. Vorlesungen über die Geschichte der Philosophie
5 Karl Leonhard Reinhold na consciência, o sujeito distingue a representação do sujeito e do objecto e relaciona a representação com ambos. Beyträge zur Berichtigung bisheriger Missverständnisse der Philosophen I 167
6 O conceito de causa, como os conceitos puros do entendimento, não tem a menor significação se ele é retirado dos objectos da experiência e aplicado às coisas em si. É um conceito que pertence necessariamente à simples forma da experiência e à possibilidade desta última enquanto unidade sintética das percepções. Ele só funciona, por assim dizer, para soletrar os fenómenos com o fim de os ler como experiências. Só nos fornece conhecimento quando é aplicado às intuições empíricas e, sem estas intuições, é um pensamento puramente formal. Poder-se-ia certamente estendê-lo para lá da nossa intuição sensível, mas tal extensão não nos serviria de muito: o conceito de causa tornar-se-ia num conceito vazio de um objecto, do qual nunca poderíamos saber pelo conceito se é ele possível ou não. G.E. Schulze. Aenesidemus (1792), 129. Trad. Énésidème. Paris: Vrin. 2007,
7 O objecto fora das nossas representações [a coisa em si], que, segundo a Crítica, destina-se a fornecer os materiais das intuições ao influenciar a nossa sensibilidade, não é ele mesmo [o objecto fora das nossas representações] uma nova intuição ou representação sensível e deve ser algo de completamente diferente e independente delas [representações sensíveis]; logo não se pode aplicar a ele [o objecto fora das nossas representações, a coisa em si] nem o conceito de causa nem o de realidade efectiva; e se a dedução transcendental das categorias fornecida pela Crítica é exacta, então um dos primeiros princípios da Crítica, a saber que todo o conhecimento começa com a acção das realidades objectivas sobre o nosso espírito é inexacto e falso. G.E. Schulze. Aenesidemus. 264 (trad.franc. 180).
8 Que o espírito finito deve pôr algo de absoluto fora de si mesmo (uma coisa em si) e contudo reconhecer desse modo que este ser só é para ele (...) - tal é o círculo que os espírito finito pode ampliar até ao infinito, mas do qual não se pode libertar. Fichte. WL. SW I, 281 coisa em si é uma contradição nos termos, revelador do eu da representação - o eu finito - entrando, assim, num círculo sem fim. Ou é, de algum modo, para nós - e, como tal, é ainda um objecto para nós (e não é coisa em si) Ou é em si - e, como tal, é por si, autónomo, logo sujeito (e não é coisa em si)
9 Kant entra em contradição consigo mesmo. (...) Que é com efeito esta coisa em si, como ele a chama? Não será o supra-sensível? Certamente, pelo menos é o extra-sensível, o não-sensível. Ora só há duas maneiras para ela (coisa em si) ser assim: ou está acima ou abaixo da experiência sensível. Estaria abaixo da experiência sensível, se ela fosse pensada como um simples hypokeimenon, um simples substracto, uma pura matéria desprovida de toda a qualidade efectiva (...) Mas o conceito de substracto não é diferente do da substância. (...) A não ser que a queira pensar como um supra-sensível. Mas isso levanta uma nova questão: como é que este supra-sensível se distingue do outro, daquele que Kant apresenta como sendo pelo menos o objecto do nosso esforço de conhecer, mesmo que não possa ser efectivamente conhecido? (...) coisa em si (por causa do seus próprios conceitos é um círculo vicioso, pois se ela é coisa não é em si e se ela é em si, não é uma coisa) Schelling.Zur Geschichte der neueren Philosophie (1827). S.W. X: 83/84
10 O mundo é assim representação. Aliás, esta verdade está longe de ser nova. Ela constitui já a essência das considerações cépticas donde procede a filosofia de Descartes. Mas foi Berkeley quem primeiro a formulou de uma maneira categórica; por isso prestou à filosofia um serviço imortal ainda que o resto das suas doutrinas não mereça muito durar. O grande erro de Kant, como exponho no Apêndice que lhe é consagrado, foi de não reconhecer este princípio fundamental. Em compensação, esta importante verdade cedo foi admitida pelos sábios da Índia visto que ela aparece como a essência da filosofia vedanta Schopenhauer MVR 1
11 Representação e Princípio da Razão "Duas coisas, em particular, são absolutamente inexplicáveis, isto é, não se reduzem a uma relação que o princípio de razão exprime: em primeiro lugar o próprio princípio de razão, sob as suas quatro formas, visto que ele é a fonte de toda a explicação, o princípio de que ela recebe todo o seu sentido; em segundo lugar, um princípio que não depende do princípio de razão, mas que não está menos na raiz de toda a representação: é a coisa em si cujo conhecimento não está subordinado ao princípio de razão." Schopenhauer MVR 15 ratio fiendi: necessidade física - devir (lei da causalidade) ratio cognoscendi: necessidade lógico-conceptual - (certeza lógica) ratio essendi: necessidade matemática - ser no tempo e no espaço (sentido interno e externo) ratio agendi: necessidade prática - carácter e motivação (causalidade vista do interior)
12 [O Romantismo dá corpo a] um novo espírito, inquieto (restless), buscando violentamente eclodir (burst) para lá de formas antigas e envelhecidas (cramping), com uma preocupação nervosa com as perpétuas mudanças dos estados internos da consciência, um desejo em direcção ao infinito e ao indefinível, pelo perpétuo movimento e mudança, um esforço em retornar às fontes esquecidas da vida, um esforço apaixonado de auto-afirmação individual e colectiva, uma busca pelos meios de expressão que traduzam a ânsia insaciável por metas inatingíveis". Isaiah Berlin. The Crooked Timber of Humanity: Chapters in the History of Ideas, ed. Henry Hardy. London: John Murray. 1990, 92.
13 Eugenio Trías O belo não é mais do que o começo do terrível que nós mal conseguimos suportar Rainer Maria Rilke O caos deve resplandecer no poema sob o véu incondicional da ordem Novalis O sinistro [a inquietante estranheza] é aquilo que, devendo permanecer oculto, se revelou. Schelling
14 E.T.A. Hoffmann. Der Sandmann. 1816
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