A petição inicial se fez acompanhar de procuração (fl. 51) e dos atos constitutivos da entidade civil substituta processual (fls. 26/50).

Transcrição

1 I - RELATÓRIO Trata-se de ação civil pública proposta pela ASSOCIAÇÃO DE DEFESA DA CIDADANIA E DO CONSUMIDOR - ADECON, associação civil, inscrita no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas do Ministério da Fazenda sob nº / , através de advogado devidamente habilitado, contra a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, cujo objeto é a aplicação do índice de correção monetária (expurgo inflacionário) de JANEIRO/1989, no percentual de 42,72%, sobre os saldos das cadernetas de poupança dos substituídos processuais, descontando-se o percentual já aplicado. A petição inicial se fez acompanhar de procuração (fl. 51) e dos atos constitutivos da entidade civil substituta processual (fls. 26/50). Como fundamento da pretensão, a autora aduz que os titulares de caderneta de poupança, substituídos processuais, foram lesados pelas instituições financeiras, porquanto não houve a devida correção do saldo desta aplicação financeira em janeiro de 1989, haja vista a Medida Provisória 32, de 15 de janeiro de 1989, ao estatuir a aplicação do percentual de 22,35% para corrigir monetariamente os mencionados saldos, desrespeitou o direito adquirido dos poupadores ao índice de 42,72% medido pelo IPC/IBGE para o período de 1º a 14 de janeiro de A Caixa Econômica Federal apresentou resposta na modalidade contestação, em que argüiu, em preliminar, a existência de continência em relação à ação civil pública nº , ajuizada pela Defensoria Pública da União, em tramitação perante o Juízo Federal da 21ª Vara-PE. Aduziu, ainda, a ocorrência da prescrição qüinqüenal e a inaplicabilidade da inversão do ônus da prova. Na questão de fundo, em síntese, defendeu a inexistência de responsabilidade pelo dever de indenizar os poupadores por supostos expurgos de saldo de caderneta de poupança e a ausência de direito adquirido ao índice de correção monetária pleiteado, propugnando pela improcedência dos pedidos (fls. 61/92). O autor manifesta-se pela rejeição das preliminares argüidas pela ré (fls. 95/99). Intervindo no feito na condição de "custos legis", o Ministério Público Federal opinou pela procedência dos pedidos, tendo ainda vislumbrado a ocorrência de conexão a ensejar a reunião dos processos perante o Juízo da 21ª Vara Federal-PE (fls. 106/111). É o relatório. II - FUNDAMENTOS

2 1. PRELIMINAR - DA CONTINÊNCIA/CONEXÃO COM A AÇÃO CIVIL PÚBLICA Nº Suscita a CAIXA a preliminar de continência com a ação civil pública nº , em tramitação na 21ª Vara Federal - PE, haja vista haver identidade de causa de pedir e o objeto daquela demanda ser mais amplo que o desta. O Ministério Público Federal entende tratar-se de conexão, pois não há identidade de partes entre as demandas, requisito essencial para a configuração da continência. Embora configurada a existência de conexão entre esta demanda e a ação civil pública nº , não mais se impõe a reunião dos feitos, porquanto já fora proferida sentença naquela ação civil pública, conforme certidão da serventia deste Juízo (fls. 118/121), a evidenciar a desnecessidade de julgamento simultâneo pelo mesmo Juízo para evitar decisões contraditórias. 235): Nesse sentido, o entendimento sumulado do STJ (enunciado nº "A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado." Assim, rejeito a preliminar. 2. DA PRESCRIÇÃO De início, vale salientar não se tratar a presente demanda de cobrança de juros, dividendos ou prestações acessórias, e sim de ação pessoal, tendo como objeto o dever da instituição financeira de aplicar índices legais de correção monetária em cadernetas de poupança, com o fito de preservar o valor monetário das quantias depositadas. Ao caso, portanto, não se aplica a prescrição qüinqüenal prevista no art. 178, 10, inciso III, do CC/1916 (posteriormente reduzida para três anos, por força do art. 206, 3º, inciso III, do CC/2002), mas a prescrição vintenária contida no art. 177, "caput", primeira parte do CC/1916, em observância à norma de transição prevista no art do CC/2002. Nesse sentido, trago à colação aresto do Superior Tribunal de Justiça: CIVIL. CONTRATO. POUPANÇA. PLANO BRESSER (JUNHO DE 1987) E PLANO VERÃO (JANEIRO DE 1989). BANCO DEPOSITANTE. LEGITIMIDADE PASSIVA. PRESCRIÇÃO. VINTENÁRIA. CORREÇÃO. DEFERIMENTO.

3 2 - Os juros remuneratórios de conta de poupança, incidentes mensalmente e capitalizados, agregam-se ao capital, assim como a correção monetária, perdendo, pois, a natureza de acessórios, fazendo concluir, em conseqüência, que a prescrição não é a de cinco anos, prevista no art. 178, 10, III, do Código Civil de 1916 (cinco anos), mas a vintenária. Precedentes da Terceira e da Quarta Turma Recurso especial não conhecido. (STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL Processo: UF: SP. Órgão Julgador: QUARTA TURMA. Relator: Ministro FERNANDO GONÇALVES. Data da decisão: 17/05/2005. Documento: STJ Publicado no DJ em 01/08/2005, página 471). Com força nesse entendimento e tendo em vista que a Medida Provisória 32, de 16/01/89, convertida na Lei 7.730/89, o Governo modificou o critério de correção das cadernetas de poupança, determinando a incidência da LFT (Letra Financeira do Tesouro Nacional) sobre os valores aplicados em caderneta de poupança, constata-se o termo inicial da prescrição, para a defasagem de janeiro de 1989, ser o dia 16/01/89, de maneira que o respectivo índice somente poderia ser requerido judicialmente até 15/01/2009. Inaplicável o lustro prescricional previsto no Código de Defesa do Consumidor (art. 27, Lei 8.078/90), porquanto este diploma legal veio a lume para proteger os direitos dos consumidores, devendo ser afastada interpretação que resulte em prejuízo para aqueles em favor de quem fora editado o Código Consumerista. Assim, como a presente demanda foi ajuizada em 11/07/2007, anteriormente, portanto, ao dia 15/01/2009, rejeito a prescrição suscitada. 3. MÉRITO A matéria de mérito, objeto desta ação, diz respeito à verificação da existência do direito dos titulares de caderneta de poupança à aplicação de índice de correção monetária diverso do aplicado pela CAIXA. No caso dos autos, a controvérsia abrange a discussão acerca do índice aplicável no mês de janeiro de 1989, cuja percentual foi calculado, à época, com base na Medida Provisória 32, de 16 de janeiro de 1989, convertida na Lei nº 7.730/89. Inicialmente, observa-se que, antes da edição da Medida Provisória 32, de 16 de janeiro de 1989, vigia em nosso ordenamento o Decreto-lei nº 2.335/87, que determinava a aplicação da URP - Unidade de Referência de Preços para a correção monetária dos saldos das

4 cadernetas de poupança, calculada pela média mensal da variação do IPC, apurada no trimestre imediatamente anterior e aplicada a cada mês do trimestre subseqüente pelo seu valor fixo. Em janeiro de 1989, o índice obtido foi de 42,72%. Foi aí então que, no início de 1989, com a edição da MP (Medida Provisória) nº 32, publicada no dia 16/01/89, convertida na Lei 7.730/89, o Governo modificou o critério de correção das cadernetas de poupança, determinando a incidência da LFT (Letra Financeira do Tesouro Nacional) sobre os valores aplicados. MP nº 32, art. 17. Os saldos das cadernetas de poupança serão atualizados: I - no mês de fevereiro de 1989, com base no rendimento acumulado da Letra Financeira do Tesouro Nacional - LFT verificado no mês de janeiro de 1989, deduzido o percentual fixo de 0,5% (meio por cento). Com efeito, não poderia a alteração do critério, surgida, repitase, somente em 16/01/89, ser aplicada às contas de poupança que "fizeram aniversário" entre 01/01/89 e 15/01/89, pelo direito adquirido à utilização do indexador antigo. Na prática, a aplicação da variação da LFT do mês de janeiro de deduzindo-se o percentual de 0,5% - para a correção dos saldos das cadernetas que "aniversariaram" entre 01/01/89 e 15/01/89, conforme determinado no art. 17 da MP nº 32, gerou a correção por percentual menor, enquanto que, pela previsão normativa anterior, prevista nos itens II e IV da Resolução nº 1.338/87 do Conselho Monetário Nacional - CMN, seria aplicado o IPC no percentual maior de 42,72%. Por essa razão, os titulares de contas de poupança que "fizeram aniversário" entre 01/01/89 e 15/01/89 têm o direito de vê-las corrigidas pelo índice de 42,72%, ressalvando-se o percentual efetivamente aplicado à época. Reforçando tal entendimento, trago à colação os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça, conforme a seguir ementados: CIVIL. CONTRATO. POUPANÇA. PLANO BRESSER (JUNHO DE 1987) E PLANO VERÃO (JANEIRO DE 1989). BANCO DEPOSITANTE. LEGITIMIDADE PASSIVA. PRESCRIÇÃO. VINTENÁRIA. CORREÇÃO. DEFERIMENTO Nos termos do entendimento dominante nesta Corte são devidos, na correção de caderneta de poupança, o IPC de junho de 1987 (26,06%) e o IPC de janeiro de 1989 (42,72%). 4 - Recurso especial não conhecido.

5 (STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL Processo: UF: SP. Órgão Julgador: QUARTA TURMA. Relator: Ministro FERNANDO GONÇALVES. Data da decisão: 17/05/2005. Documento: STJ Publicado no DJ em 01/08/2005, página 471). ECONÔMICO. CADERNETA DE POUPANÇA. CORREÇÃO MONETÁRIA. CRITÉRIO. IPC DE JUNHO DE 1987 (26,06%). PLANO BRESSER. IPC DE JANEIRO DE 1989 (42,72%). PLANO VERÃO. I - O Superior Tribunal de Justiça já firmou, em definitivo, o entendimento de que no cálculo da correção monetária para efeito de atualização de cadernetas de poupança iniciadas e renovadas até 15 de junho de 1987, antes da vigência da Resolução n /87-BACEN, aplica-se o IPC relativo àquele mês em 26,06%. Precedentes. II - O Superior Tribunal de Justiça já firmou, em definitivo, o entendimento de que no cálculo da correção monetária para efeito de atualização de cadernetas de poupança iniciadas e renovadas até 15 de janeiro de 1989, aplica-se o IPC relativo àquele mês em 42,72% (Precedente: REsp n /SP, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU de ). Todavia, nas contas-poupança abertas ou renovadas em 16 de janeiro de 1989 em diante, incide a sistemática estabelecida pela Lei n /89 então em vigor. III - Agravo regimental desprovido. (STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Classe: AGRESP - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL Processo: UF: RS Órgão Julgador: QUARTA TURMA. Relator: Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR. Data da decisão: 16/08/2005. Documento: STJ Publicado no DJ em 05/09/2005, página 432). Dessa forma, com base na fundamentação acima esposada, têm os substituídos processuais da autora o direito de verem corrigidas as suas cadernetas de poupança pelo índice de 42,72% (Plano Verão), referentes ao mês de JANEIRO/1989, descontando-se o percentual efetivamente aplicado à época, desde que nas cadernetas de poupanças haja saldo à época e a data de "aniversário" das contas situe-se entre os dias 01/01/89 e 15/01/89. Quanto à inversão do ônus da prova, por se tratar de ação coletiva, em que se examina o direito invocado sem a necessidade de demonstração da situação individualizada de cada substituído processual, afigura-se despicienda, nessa fase de acertamento-cognição, inverter a carga probatória. III - DISPOSITIVO Posto isso, rejeito a preliminar e a prescrição suscitadas e, no mérito, julgo procedente o pedido, para condenar a CAIXA a revisar os cálculos de correção das cadernetas de poupança dos substituídos

6 processuais da autora aplicando-se aos seus saldos o índice de atualização monetária correspondente a 42,72%, referente ao mês de JANEIRO/1989, ressalvando-se, entretanto, os percentuais já porventura aplicados, ficando o cumprimento da sentença sujeito à conferência, pela CAIXA, da existência de saldo à época e da efetiva data de "aniversário" das contas entre os dias 01/01/1989 e 15/01/1989, carreando para os autos a prova do seu efetivo cumprimento, devendo os valores obtidos serem atualizados monetariamente de acordo com o previsto no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal (Resolução nº 242, de 03 de julho de 2001, do Conselho da Justiça Federal) até a data da citação (09/08/2007, fl. 57v), a partir de quando deverá incidir somente a Taxa SELIC, como sucedânea da atualização monetária e dos juros de mora, consoante previsão contida nos artigos 405 e 406 do Código Civil c/c o artigo 13 da Lei n 9.065/951, tudo a ser devidamente apurado quando do cumprimento do julgado, proferindo, assim, julgamento com resolução de mérito, nos termos do artigo 269, inciso I, do CPC. Condeno ainda a CAIXA ao recolhimento das custas processuais (iniciais e finais), bem como ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência ao advogado do autor, os quais arbitro em 15% (quinze por cento) do valor da condenação, nos termos do artigo 20, 3º do CPC. A presente sentença, esclareça-se, aplica-se a todas as cadernetas de poupança abertas no Estado de Pernambuco, com saldo em janeiro de 1989 e com aniversário na primeira quinzena do mês. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Recife-PE, 26 de maio de Incidência da SELIC respaldada pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: REsp n /RN, Rel. Min. Denise Arruda, 1ª Turma, DJ de 22/03/2007; REsp n /PE, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJ de 18/09/2006;REsp n /RJ, Rel.ª Min.ª Denise Arruda, Rel. p/ acórdão Min. Teori Albino Zavascki, 1ª Turma, DJ de 14/12/2006; AgRg no REsp n /SP, Rel. Min. José Delgado, 1ª Turma, DJ de 20/11/2006; REsp n /PR, Rel.ª Min.ª Eliana Calmon, 2ª Turma, DJ de 06/06/2005.