UMA REFLEXÃO SOBRE O PAPEL DAS ENTIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS NAS RELAÇÕES COM PRODUTORES RURAIS DO RINCÃO DO 28, ALEGRETE, BRASIL

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1 UMA REFLEXÃO SOBRE O PAPEL DAS ENTIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS NAS RELAÇÕES COM PRODUTORES RURAIS DO RINCÃO DO 28, ALEGRETE, BRASIL Aportes teórico-metodológicos para o trabalho de Extensão Rural Ensaio Adriana Ferreira da Costa VARGAS Vicente Celestino Pires SILVEIRA Fundação Maronna Universidade Federal de Santa Maria Brasil vcpsilveira@gmail.com RESUMO Este trabalho visa fazer uma reflexão sobre como as diferentes entidades publicas e privadas atuam junto aos produtores do Rincão do 28. A área está localizada ao sul do município de Alegrete, no estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Está inserida dentro da Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã (APA do Ibirapuitã), Unidade de Conservação de uso direto gerenciada pelo ICMBio inserida no Bioma Pampa. As principais atividades produtivas são a bovinocultura de corte e a ovinocultura com pequenas áreas agrícolas. A comunidade é formada, em sua maioria, por pequenas propriedades rurais caracterizando seus proprietários como pecuaristas familiares. No início de 2007, pela iniciativa da Fundação Maronna foi dado início ao Projeto de Desenvolvimento Sustentável do Rincão do 28. Este projeto de extensão partiu de ações em parceria entre diversas entidades públicas e privadas e faz parte das ações do convênio entre a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e a Fundação Maronna. A Secretaria de Agricultura e Pecuária de Alegrete (SAP), o Instituto Federal Farroupilha (IFF), o Sindicato Rural de Alegrete (SRA), a Inspetoria Veterinária e Zootécnica de Alegrete (IVZ), o Escritório de Alegrete da Ascar-Emater/RS; SENAR-RS e SEBRAE-RS, através do Programa Juntos para Competir, e o Pólo Educacional do Rincão do 28 entre outras também participam do projeto. O objetivo principal do projeto é de desenvolver a região e entorno nos aspectos social e econômico de forma sustentável a fim de elevar a qualidade de vida da comunidade. A metodologia adotada no projeto é o da participação efetiva dos produtores como definidores das prioridades de ações. Cabe assim a Fundação Maronna e demais parceiros viabilizar a efetivação das ações acordadas com os produtores, através da articulação entre as diversas entidades. A definição das ações se dá através de reuniões periódicas com produtores, comunidade e entidades. Palavras Chaves: pecuarista familiar, enfoque sistêmico, desenvolvimento local

2 1. INTRODUÇÃO O Rincão do 28 é uma região localizada ao sul do município de Alegrete, no 4º Subdistrito denominado Vasco Alves, no Rio Grande do Sul, Brasil. Esta localidade está inserida dentro da Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã (APA do Ibirapuitã), Unidade de Conservação Federal de uso direto gerenciada pelo Instituto Chico Mendes para a Biodiversidade (ICMBio) com área de 318 mil hectares no Bioma Pampa. Além de Alegrete a APA abrange regiões de outros municípios: Rosário do Sul, Santana do Livramento e Quarai (Figura 1). A comunidade é formada, em sua maioria, por pequenas propriedades rurais caracterizadas como pecuaristas familiares (produtor que tem a pecuária como atividade principal, e utiliza mão-de-obra da família). As principais atividades produtivas desenvolvidas são a bovinocultura de corte e a ovinocultura com pequenas áreas agrícolas de culturas de subsistência e arroz irrigado em algumas propriedades. A produção pecuária é baseada na pastagem nativa normalmente utilizada com alta carga animal, apesar da estacionalidade de produção dessa pastagem. Isto contribui para os baixos índices de produtividade e consequente baixa renda. O sobrepastejo é geralmente acentuado em propriedades de pecuaristas familiares. Rincão do 28 Figura 1. Ecossistemas Brasileiros e a localização da APA do Ibirapuitã. A Fundação Maronna, que coordena este projeto, está inserida dentro da região do Rincão do 28. A Estância do 28 é propriedade rural cujas atividades produtivas possuem bons índices que podem ser alcançados e disseminados em toda região. A adoção de práticas de manejo e uso de tecnologias de baixo custo que possam ser facilmente utilizadas pelas pequenas propriedades são algumas alternativas para se alcançar índices satisfatórios de produção. Este projeto foi idealizado em 2006 a partir de demanda dos produtores da região em dia de campo realizado na Estância do 28. Está alicerçado em parcerias com a Universidade Federal de Santa Maria, Secretaria de Agricultura e Pecuária de Alegrete, Emater, SENAR, SEBRAE, Pólo Educacional do Rincão do 28 entre outras. Tem como objetivo levar as tecnologias disponíveis aos produtores do entorno da Estância do 28, capacitá-los e incluí-los nos vários projetos de desenvolvimento da região.

3 O objetivo principal do projeto é desenvolver a região do Rincão do 28 e entorno nos aspectos social e econômico de forma sustentável visando elevar a qualidade de vida da comunidade. Os objetivos específicos são: Promover o acesso dos produtores e comunidade aos diversos projetos de desenvolvimento que estão disponíveis no município; Promover o associativismo entre os produtores da região; Aproximar as entidades ligadas ao setor primário à comunidade local; Capacitar pessoas em tecnologias aplicadas ao setor primário de forma a melhorar índices técnicos e econômicos das atividades produtivas; Promover ações de bem-estar social para melhoria da qualidade de vida da comunidade. O presente trabalho descreve as atividades do projeto de extensão em desenvolvimento no Rincão do 28, uma ação de várias entidades públicas e privadas de pesquisa e extensão. 2. METODOLOGIA A metodologia adotada no projeto é o da participação efetiva dos produtores como definidora das prioridades de ações. Em reuniões periódicas com a participação da comunidade, produtores e seus familiares e entidades parceiras as demandas são expostas e definidas as ações prioritárias. Cabe a Fundação Maronna e demais parceiros viabilizar a efetivação das ações acordadas com os produtores, através da articulação de diversas entidades que possam auxiliar para que os objetivos propostos sejam alcançados. Com esta finalidade diversas instituições estão também envolvidas no projeto algumas com participação esporádica e outras com a participação mais sistemática. 3. AÇÕES DO PROJETO Com o enfoque metodológico adotado, inicialmente os produtores demandaram auxilio na viabilização da execução do programa Luz para Todos do governo federal, bem como do programa Patrulha Agrícola (programa municipal da Secretaria de Agricultura e Pecuária para utilização de maquinário agrícola), este último visando a implantação de pastagens e realização de roçadas em campo nativo. No primeiro ano do projeto foram definidos os cursos de capacitação técnica que os produtores desejavam realizar. Em parceria com o SENAR-RS foram realizados diversos cursos técnicos como: manejo e melhoramento de campo nativo, construção e manutenção de cercas elétricas, tecelagem com lã crua, inseminação artificial de bovinos de corte. Ao final de 2007 ocorreu uma ação que teve como principal objetivo levantar dados dos produtores da localidade em número, área, atividade produtiva e principais dificuldades encontradas, assim como mobilizar a comunidade para participar do projeto. Para visitar as propriedades foram organizadas cinco equipes com quatro integrantes de diferentes entidades e um líder da comunidade local. Nessas visitas foi aplicado um questionário, além de registro fotográfico, determinação das coordenadas geográficas com GPS e feitas observações socioeconômicas e ambientais. Ao todo foram entrevistados 34 proprietários. Observou-se que 63,7% das propriedades têm área menor que 100 hectares e que não possuem condições de estabelecer escala de produção. Quanto às rendas não-agrícolas, 73,53% possuem rendas extras além de sua atividade agropastoril, em sua maioria proveniente de aposentadoria rural. Quanto à atividade agrícola produtiva, 85,29% têm a bovinocultura de corte como atividade única ou principal, demonstrando a tradição histórica da região, podendo estar associada à ovinocultura de lã (55,9%) ou corte (17,5%). Foi identificado que 82% dos produtores não fazem nenhum tipo de controle gerencial, como anotações das receitas e despesas da propriedade. Também é elevado o número de propriedades ou casas inabitadas (denominadas localmente de taperas ), evidenciando o êxodo rural, fato que pode estar relacionado a pouca perspectiva econômica das atividades desenvolvidas e da permanência na atividade rural, pois 32,35% responderam que a perspectiva futura dos filhos é o trabalho urbano. Outras informações levantadas mostraram que 41,2% das propriedades não possuíam energia elétrica e 76,6% não possuíam poço artesiano, utilizando-se de outras fontes de abastecimento de água como cacimbas, açude, etc.

4 De posse destas informações, os resultados foram apresentados tanto para as entidades parceiras como para a comunidade local discutindo-se, assim, as próximas ações direcionadas às necessidades desta população e serviu como base para a dissertação de mestrado de um aluno da UFSM com o título Indicações geográficas no Brasil: possibilidades para os produtores inseridos na Área de Proteção Ambiental do Ibirapuitã RS. Também pela Universidade Federal de Santa Maria foram definidas novas ações de maneira a inserir mais dois projetos de pesquisa de alunos de mestrado, assim como um projeto de extensão em controles gerenciais com um produtor local, que ainda está em andamento. Este último consiste em fazer anotações sobre todas as despesas realizadas na propriedade rural com auxílio do núcleo familiar. As informações são tabuladas pelo departamento de Extensão da UFSM e as informações são retornadas ao produtor. Esta ação teve início em julho de 2008 após a realização de um levantamento detalhado dos bens e semoventes, denominado inventário inicial. Foi disponibilizado a todos os produtores envolvidos, porém apenas um decidiu realizar estes controles. A partir de meados de 2008, o Programa Juntos para Competir, uma parceria do SEBRAE-RS, SENAR-RS e FARSUL, une-se ao projeto para desenvolver uma produção de terneiros de qualidade e melhorar os índices produtivos da pecuária de corte já que a atividade produtiva local era a cria e recria de bovinos de corte. Os objetivos específicos desta ação em parceria foram implementar a utilização da técnica de inseminação de bovinos para melhorar geneticamente os rebanhos e padronizar a produção de terneiros, trabalhar o associativismo entre os produtores e organizar a comercialização conjunta dos terneiros buscando agregar valor ao produto através de maior qualidade e escala. As ações de extensão, além das reuniões coletivas e cursos de capacitação, foram direcionadas para a atuação individualizada dos técnicos nas propriedades, de acordo com a decisão de cada produtor. Alguns processos produtivos foram introduzidos coletivamente, como a inseminação artificial de bovinos. Neste processo foram identificados os produtores interessados, selecionados os pontos de inseminação em número de quatro e treinados os inseminadores e auxiliares através de curso específico para a comunidade. Os animais, vacas e novilhas, foram identificados individualmente e foi escolhido o sêmen específico para cada um. Foi muito importante a parceria com as Associações de Raça de Criadores de Hereford e Braford, Angus e Brangus, as quais doaram sêmen de reprodutores geneticamente superiores. O trabalho dos técnicos do Juntos para Competir teve sequência com a realização do diagnóstico de gestação dos ventres inseminados. Foi realizado um diagnóstico individual das propriedade e disponibilizado a organização dos estoques de animais e o planejamento forrageiro para a passagem do período crítico do inverno de cada propriedade individualmente. O principal problema encontrado foi a mantença de categorias improdutivas, e altas cargas animal nos campos com baixa disponibilidade forrageira. Na propriedade Dois Angicos, o proprietário permitiu uma intervenção técnica mais acentuada e foi realizado um ajuste de carga animal, conforme proposto no trabalho executado no Durasnal, eliminando categorias improdutivas como vacas falhadas, novilhas com mais de 3 anos, e terneiros machos. Foi dada ênfase na recria de fêmeas, categoria geralmente não priorizada nas propriedades. O planejamento forrageiro foi realizado com a implantação de 13,9 ha, no primeiro ano, mais 18,9 ha no segundo ano de trabalho, de pastagem de azevém (Lolium multiflorum Lam.) e cornichão (Lotus corniculatus L.) sobressemeada em campo nativo para ser utilizada com fêmeas em recria e vacas de primeira cria. Uma visita técnica a uma propriedade do programa de Redes de Referência do Juntos para Competir foi realizada com o apoio do Instituto Federal Farroupilha. Nesta visita os produtores puderam observar as transformações ocorridas na Unidade de Referência a partir de decisões tomadas entre o técnico responsável e o administrador. Em 2009 foram realizados outros cursos de capacitação técnica do SENAR como manejo de forrageiras de inverno, manejo sanitário de bovinos de corte e de manejo reprodutivo de bovinos de corte e mais recentemente em abril de 2010 um curso de desmame e recria de bovinos de corte. Em abril de 2010 foi realizada a primeira venda conjunta de terneiros na feira oficial do município de Alegrete. Foram comercializados 155 terneiros machos castrados distribuídos em 15 lotes padronizados por pelagem e peso dos animais. Cada lote de terneiros, então, foi composto por animais de mais de um proprietário. A definição da forma de padronização foi feita pelos produtores com auxílio dos técnicos bem como a escolha do escritório de remates. O Sindicato Rural de Alegrete teve uma participação importante no processo por permitir a inscrição de produtores com menos de 10 animais e a mistura de lotes assim como a insenção de taxas para os pecuaristas familiares. O

5 valor de comercialização foi de R$ 3,16 por quilo de terneiro, dois centavos a mais que a média comercializada na feira, um volume de negócios de R$ ,00. No dia 18 de agosto de 2010 foi realizado um dia de campo na Estância do 28 e Propriedade Dois Angicos para produtores pecuaristas familiares de outras regiões do município de Alegrete e outros municípios vizinhos como Quaraí, Santana do Livramento, Rosário do Sul e da cidade uruguaia de Rivera. Participaram 70 pessoas. Na ocasião foram apresentados os resultados das ações de 2007 a julho de Todos os parceiros têm função importante e fundamental para o sucesso do projeto. O papel exercido por cada um soma-se ao conjunto. Cabe salientar que a aceitação por parte dos produtores é variável no que diz respeito à interferência dos técnicos em cada propriedade. Quanto a ação institucional dos diferentes parceiros, a principal dificuldade detectada é que o objetivo de cada instituição em muitos casos coincide com outra, mas com enfoque diferenciado. Fazer perceber entre os produtores este fato como uma contingência das estruturas das organizações nem sempre é fácil, causando desconforto entre os técnicos envolvidos. Entretanto, este aprendizado é enriquecedor para técnicos e produtores e de fundamental importância neste novo ambiente institucional em que órgãos públicos e privados atuam simultaneamente num mesmo território. 4. CONCLUSÕES: A metodologia utilizada pela Fundação Maronna e parceiros no projeto de Desenvolvimento Sustentável do Rincão do 28 inspirou a metodologia utilizada na elaboração da proposta aprovada pelo Programa URB-AL: ao invés de apresentar ( importar ) as soluções para os problemas da população local, o projeto prevê no primeiro ano (2009) a realização de um censo especificamente para levantar os dados socioeconômicos das comunidades e identificar as fragilidades e potencialidades para uso sustentável das propriedades existentes no território-alvo do projeto. Desta forma, primeiro serão identificadas e dimensionadas quais as reais demandas e urgências das comunidades, para somente depois deste diagnóstico planejar como deverá ser feita a aplicação dos recursos do projeto nos três anos seguintes ( ). Finalmente é importante ressaltar que a efetiva participação dos produtores nas decisões sobre quais ações devem ser realizadas torna o processo legitimo, pois as ações definidas são resultados de um acordo entre o produtor e a entidade que pode oferecer o serviço solicitado, cabendo à Fundação Maronna o papel de intermediário no processo, neste caso o bom papel da intermediação. Assim, um novo modo de enfocar o problema da extensão rural está sendo construído, procurando substituir o falido paternalismo tradicional e o abandono atual. O Projeto de Desenvolvimento Sustentável do Rincão do 28 representou localmente o primeiro passo para a união de esforços entre as diferentes instituições para atuar na região. O esforço em realizar as atividades de forma conjunta e a iniciativa em trabalhar pelo desenvolvimento sustentável da região resultaram em uma ampliação das parcerias bem além do esperado. Outro resultado da experiência trazida pelo projeto do Rincão do 28 é o desenvolvimento, financiado pelo projeto Aglomerados Urbanos em Área Protegida (URBAL -Pampa), de um banco de dados integrado on-line. Este banco está sendo elaborado para abrigar os dados que serão coletados a campo ao longo do primeiro ano do projeto, os quais dados deverão estar disponíveis para consulta gratuita através da internet. O planejamento do Banco de Dados (BD) prevê a alimentação contínua pelas instituições que atuam na região, mediante assinatura de convênios de parceria e liberação de permissões de acesso mais amplo ao BD. Ele representa mais um esforço em garantir que as instituições que atuam na região passem a trabalhar conjuntamente na busca de um desenvolvimento que seja realmente sustentável do ponto de vista social, econômico e ambiental, e que realmente beneficie as comunidades locais. 6. ORGANIZAÇÕES ENVOLVIDAS: Fundação Maronna Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Universidade da Região da Campanha (Urcamp)

6 Secretaria de Agricultura e Pecuária de Alegrete (SAP); Escritório de Alegrete da Ascar-Emater/RS Instituto Federal Farroupilha (IFF); Sindicato Rural de Alegrete (SRA); Inspetoria Veterinária e Zootécnica de Alegrete (IVZ); Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR-RS); Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Rio Grande do Sul (SEBRAE-RS); Pólo Educacional do Rincão do 28 Silvestre Gonçalves; Associação Brasileira de Hereford e Braford (ABHB); Associação Brasileira de Angus; Associação Brasileira de Brangus.