TRIBUNAL MARÍTIMO PROCESSO Nº /00 ACÓRDÃO
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- Sofia Farinha Bandeira
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1 TRIBUNAL MARÍTIMO PROCESSO Nº /00 ACÓRDÃO Veleiro NIGHT JAR. Encalhe em banco de areia, resultando em naufrágio com perda total da embarcação, sem vítimas. Tráfego da embarcação em região de bancos, com profundidades incompatíveis com o calado, em razão da falta da Tábua de Marés da área. Negligência e imprudência. Condenação do comandante. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. Consta dos autos que no dia 18/06/2000, cerca das 11:00h, o veleiro NIGHT JAR, de bandeira sul-africana, de propriedade de Charlie Christopher John Berry, sob o comando de Francis Edward John Doble, com três adultos e uma criança a bordo, encalhou em um banco de areia, na baía dos Lençóis, MA, na posição de LAT. 01º19,72S e LONG. 044º50,88W, sofrendo avaria no casco e ruptura do mastro, sendo os ocupantes resgatados pelo Navio Patrulha GUANABARA. O veleiro foi dado como perdido. No inquérito instaurado pela Capitania dos Portos do Maranhão foram ouvidas três testemunhas. Francis Edward James Doble, comandante do veleiro NIGHT JAR, declarou que, em 1997, já havia feito o mesmo percurso, ocasião em que registrou no livro de navegação do barco as coordenadas de entrada do canal, tendo seguido a mesma rota feita anteriormente. Acrescentou que o banco mudou de posição, tendo o barco encalhado, sendo que, quando a maré começou a encher, as ondas começaram a bater forte pelo través, provocando o emborcamento da embarcação. Declarou, ainda, que tinha a bordo uma carta inglesa similar à carta brasileira nº 400, mas não possuía tábua de maré e não conhecia a variação da maré na área.
2 Declarou, também, que sua intenção era fazer turismo e suprir a embarcação com água potável. Declarou, ainda, que a embarcação era dotada de dois aparelhos GPS, todas as cartas de navegação necessárias, um sextante, duas agulhas magnéticas, uma agulha giroscópica acoplada ao piloto automático, um ecobatímetro e um indicador de rotação. Burger Calvin Gareth e Clinton Clive Steenekamp, ambos ocupantes do veleiro, prestaram depoimentos uniformes com o do comandante. Consta dos autos que o veleiro, por ocasião do acidente, calava 1,65m. Laudo de exame pericial indireto, ilustrado com croqui, cópia de trecho de carta náutica DHN-400 e fotografias, atesta que, por ocasião da perícia, no dia 20/06/2000, não foi detectado qualquer sinal da embarcação. Aponta como causa determinante do acidente o total desconhecimento, por parte do comandante, da variação da maré no local. Juntados aos autos os documentos de praxe. O encarregado do inquérito, em seu relatório, apontou como possível responsável direto pelo acidente Francis Edward John Doble, comandante do veleiro, pois não estava bem navegado, não portava as cartas náuticas brasileiras do local, e desconhecia a tábua de marés. A Douta Procuradoria representou contra Francis Edward John Doble, comandante do veleiro NIGHT JAR, com fulcro no art. 14, alínea a (encalhe e posterior naufrágio), da Lei nº 2.180/54, fundamentando de acordo com as conclusões do inquérito. Citado por Edital, o Representado, que apresentava antecedentes no Tribunal Marítimo, permaneceu revel, sendo-lhe designado Defensor Público da União. A defesa de Francis Edward John Doble alega que o acusado possuía carta inglesa a bordo, similar à carta brasileira nº 400, e, segundo acordos internacionais 2
3 específicos, o Departamento de Hidrografia do Reino Unido pôde editar carta náutica da costa brasileira, a partir de informações prestadas pela Diretoria de Hidrografia e Navegação. Alega, ainda, que as infrações contidas na carta náutica brasileira nº 400 estavam desatualizadas, pois existe, conforme observado pelo Representado, um canal com produndidade de 3m na baixa-mar, cortando o barco, no sentido norte-sul, com largura próxima de 50 a 80 metros e distante da praia cerca de 10 a 20 metros. Alega, finalmente, que o acidente deve ser equiparado aos de fortuna do mar, pois, no local, a maré produz uma correntada forte e violenta, não deixando quaisquer vestígios do barco naufragado. Na fase de instrução, nenhuma prova foi produzida. Em alegações finais, manifestaram-se a Douta Procuradoria e a Douta Defensoria Pública da União. Analisando-se os autos, verifica-se que, na manhã de 18/06/2000, Francis Edward John Doble tentou entrar com o veleiro NIGHT JAR, que calava 1,65m, na Baía dos Lençois, MA, sem dispor da tábua de marés da área, desconhecendo a real variação de profundidade no local, levando sua embarcação para área de bancos de areia, com profundidades incompatíveis com seu calado, provocando o encalhe da mesma, que resultou no naufrágio com perda total, tendo os quatro tripulantes sido resgatados pelo Navio Patrulha GUANABARA. O Representado tenta debitar o sinistro à indicação errada contida na carta náutica inglesa similar à carta náutica DHN-400, quando, na verdade, não observou a situação da maré no momento em que decidiu adentrar a Baía dos Lençóis, baseando-se somente em anotações feitas em 1997, ocasião em que navegou na mesma área, sem 3
4 qualquer anormalidade, justamente por ter, ao acaso, encontrado maré com altura que possibilitava profundidade segura para o tráfego do veleiro. Conclui-se que procedem os termos da Representação da Douta Procuradoria, já que o acidente da navegação caracterizado pelo encalhe do veleiro NIGHT JAR em banco de areia, na Baía dos Lençóis, MA, resultando em naufrágio, com perda total da embarcação, sem vítimas, teve como causa determinante o tráfego da embarcação em região de bancos, com profundidades incompatíveis com o calado, em razão da falta da tábua de marés da área, ficando configurada a negligência do comandante, Francis Edward John Doble, que faltou com o dever de cuidado exigível de sua pessoa no tocante à segurança da navegação que realizava, por não ter dotado o veleiro com todas as publicações necessárias, assim como sua imprudência, ao tentar entrar na Baía dos Lençóis, baseado, unicamente, em anotações feitas três anos antes, razões pelas quais deve ser responsabilizado pelo evento em apreciação. Assim, A C O R D A M os Juízes do Tribunal Marítimo, por unanimidade: a) quanto à natureza e extensão do acidente: encalhe em banco de areia, resultando em naufrágio com perda total da embarcação, sem vítimas; b) quanto à causa determinante: tráfego da embarcação em região de bancos, com profundidades incompatíveis com o calado, em razão da falta da tábua de marés da área; c) decisão: julgar o acidente da navegação, capitulado no art. 14, letra a, da Lei nº 2.180/54, como decorrente de imprudência e negligência, condenando Francis Edward John Doble à pena de multa de R$ 1.000,00 (mil reais), de acordo com o art. 121, inciso III, c/c o art. 127, inciso II, 2º, ambos da Lei nº 2.180/54, com a redação dada pela Lei nº 8.969/94. Custas na forma da Lei. Honorários de Defensor Público da União no mínimo legal. P. C. R. Rio de Janeiro, RJ, em 04 de junho de
5 LUIZ CARLOS DE ARAÚJO SALVIANO Juiz-Relator WALDEMAR NICOLAU CANELLAS JÚNIOR Almirante-de-Esquadra (RRm) Juiz-Presidente 5
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