MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

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1 Nº /CS HABEAS CORPUS Nº RIO DE JANEIRO IMPETRANTE : JOÃO FRANCISCO NETO IMPETRADO : RELATOR DO HC Nº DO STJ PACIENTE : PAULO HÉRCULES MELLO MATTOS THOMÉ DE SOUZA JUNIOR RELATOR : MINISTRO GILMAR MENDES HABEAS CORPUS. ESTELIONATO, USO DE DOCUMENTO FALSO E USO DE ENTORPECENTES. ALEGAÇÃO DE EXCESSO DE PRAZO PARA A FORMAÇÃO DA CULPA E AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS PARA PRISÃO PREVENTIVA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONSTITUCIONAL PARA CABIMENTO DE HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 691/STF. ARGUIÇÕES IMPROCEDENTES. INSTRUÇÃO CRIMINAL ENCERRADA. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO LEGAL POR EXCESSO DE PRAZO. PRECEDENTES. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. PRISÃO CAUTELAR FUNDAMENTADA NO ART. 310, PARÁGRAFO ÚNICO NO CPP E NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO DO WRIT, E, SE CONHECIDO, PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de PAULO HÉRCULES MELLO MATTOS THOMÉ DE SOUZA JUNIOR, contra decisão do Ministro Jorge Mussi, que denegou a medida liminar pleiteada nos autos do Habeas Corpus nº /RJ, em trâmite no Superior Tribunal de Justiça.

2 MPF/PGR Nº /CS 2 2. O paciente foi preso em flagrante e denunciado como incurso nas sanções do artigo 171, caput, e artigo 304 (com a aplicação das penas cominadas no preceito secundário do art. 297), na forma do artigo 70, todos do Código Penal e art. 28 da Lei /06, na forma do art. 69 do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos: No dia 14 de outubro de 2010, por volta das 15:30 horas, na Loja C&A, localizada na Rua Conde de Bonfim, n 36, Tijuca, nesta comarca, o denunciado, consciente e voluntariamente, obteve, para si ou para outrem, vantagem ilícita no valor de R$ 122,00 (cento e vinte e dois reais), em prejuízo de C&A Modas, induzindo a erro a referida pessoa jurídica, mediante meio fraudulento, utilizado para a obtenção dos cartões de crédito C&A/IBI e C&A/Mastercard em nome de Leonardo Martins Pestana. A fraude consistiu na realização, pelo denunciado, da proposta de adesão - CARTÃO C&A/CARTÃO C&A VISA E MASTERCARD/IBICARD IBI - de fls. 39/44, em nome de Leonardo Martins Pestana, mediante a apresentação pelo denunciado de carteira funcional falsificada do Ministério da Fazenda, em nome de Leonardo Martins Pestana, cargo de Procurador da Fazenda Nacional e do comprovante de rendimentos de fls. 37. Ressalte-se que o denunciado de posse dos referidos cartões de crédito, obtidos fraudulentamente, realizou saque no valor de R$ 110,00 (cento e dez reais) e uma recarga de telefone celular no valor de R$ 12,00 (doze reais) com os mesmos, ainda no interior da Loja C&A, tendo a quantia de R$ 110,00 (cento e dez) reais em espécie sido apreendida com o denunciado durante revista pessoal na delegacia. Nas mesmas circunstâncias de tempo e local anteriormente descritas, o denunciado, consciente e voluntariamente, fez uso de documento público falsificado, consistente em uma carteira funcional do Ministério da Fazenda, em nome de Leonardo Martins Pestana, cargo de Procurador da Fazenda Nacional, que foi apresentada ao policial civil que lhe abordou. Na ocasião, ao ser abordado por policial civil, o denunciado se identificou como o Procurador da Fazenda Nacional Leonardo Martins Pestana, apresentando a carteira funcional acima referida, para evitar que a fraude praticada pelo mesmo para a obtenção dos cartões de crédito C&A/IBI e C&A/Mastercard junto à Loja C&A fosse descoberta. Nas mesmas circunstâncias de tempo e local anteriormente descritas, o denunciado, consciente e voluntariamente, trazia consigo, para consumo pessoal, 1,2g (um grama e dois decigramas) de Cannabis sativa L. (MACONHA), contendo resina e canabinóis, acondicionada em um pequeno saco de plástico incolor, fechado por nó feito com o próprio saco, conforme laudo prévio de fls. 28. Já na delegacia, durante revista pessoal, foi arrecadado com o denunciado uma "trouxinha" de maconha para seu consumo pessoal.

3 MPF/PGR Nº /CS 3 3. A defesa formulou pedido de liberdade provisória em favor do paciente, tendo o Juízo da 25ª Vara Criminal da Comarca do Rio de Janeiro deferido o pleito, condicionando a liberdade provisória ao comparecimento do paciente a todos os atos processuais. O termo de compromisso foi assinado e o paciente foi posto em liberdade. 4. Designada a audiência de instrução e julgamento para o dia 29/03/2011, o paciente não compareceu. Após apresentação espontânea do paciente em juízo, a magistrada de primeira instância determinou nova audiência para oitiva do acusado, que, mais uma vez, não compareceu ao ato processual que fora intimado, o que ensejou a revogação de sua liberdade. 5. A defesa impetrou ordem de habeas corpus perante o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, pugnando pela liberdade provisória do paciente. A ordem foi denegada nos seguintes termos: HABEAS CORPUS. Paciente preso pela prática de crimes previstos nos artigos 171 caput e art. 304, n/f do art. 70, todos do CP, tudo n/f do art. 69 do CP. Alega constrangimento perpetrado pelo Juiz de Direito da 25ª Vara Criminal da Capital. Sustenta haver excesso de prazo na instrução criminal e pretende a concessão de liberdade provisória diante da desnecessidade da prisão. - Nas informações prestadas pelo Magistrado monocrático apontado como autoridade coatora, verifica-se o seu reiterado comportamento de desrespeito às oportunidade concedidas pela Justiça: já foi beneficiado com liberdade provisória e não honrou o compromisso assumido, simplesmente não comparecendo aos atos para os quais estava regularmente intimado: AIJ realizada em 29/03/2011. Revogada a liberdade provisória. No dia 30/03/2011 apresentou-se e Juízo e, mais uma vez, recebeu a mercê de ficar solto, sendo intimado para comparecer ao ato designado para 18/05/2011. E, mais uma vez, não compareceu em Juízo. Novamente revogada a liberdade provisória. Preso em novembro de 2011, ainda pede, mais uma vez, concessão da liberdade provisória. O paciente já demonstrou não merecer a confiança do judiciário, já tendo recebido várias vezes mercês e descumprido os compromissos assumidos. A FAC com 04 anotações demonstra sua tendência às práticas delituosas. - Assim, forçoso reconhecerse que o paciente deu causa ao retardamento da instrução criminal e não pode agora beneficiar-se de sua própria torpeza. - Somente se cogita da existência de constrangimento ilegal quando o excesso de prazo for motivado pelo descaso injustificado do juízo,

4 MPF/PGR Nº /CS 4 o que não ocorreu na presente hipótese, em que o atraso no encerramento da instrução criminal não extrapola os limites da razoabilidade. - E presentes os requisitos para a manutenção da prisão cautelar, mostrando-se conveniente a manutenção de sua prisão para a garantia da ordem pública. - Inexistência de constrangimento ilegal. ORDEM DENEGADA. 6. Contra tal decisão foi impetrado writ perante o Superior Tribunal de Justiça, pretendendo novamente a concessão de liberdade provisória. A medida liminar foi indeferida pelo Ministro Relator em 29/12/2012, aos seguintes fundamentos: A concessão de liminar em sede de habeas corpus reserva-se aos casos excepcionalíssimos de ofensa manifesta ao direito de ir e vir, e desde que preenchidos os pressupostos legais, consistentes no fumus boni iuris e no periculum in mora. In casu, a análise acerca da presença dos pressupostos ensejadores da segregação cautelar e a desnecessidade da medida de exceção são matérias que se confundem com o próprio mérito do writ, devendo o caso concreto ser analisado mais detalhadamente quando do julgamento definitivo do mandamus. Diante do exposto, indefiro a liminar. 7. Daí a impetração do presente mandamus. A impetrante sustenta a ilegalidade da prisão preventiva do paciente, diante da ausência dos requisitos autorizadores e em razão de excesso de prazo na formação da culpa, eis que se encontra custodiada há mais de um ano e sete meses sem que tenha encerrado a instrução criminal. 8. Medida liminar deferida pelo Ministro Relator em 23/02/ Preliminarmente, impõe-se a extinção do feito sem apreciação do mérito em razão da incompetência dessa Corte para conhecer de habeas corpus impetrado contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça que, em habeas corpus, denegou a ordem. 10. A Primeira Turma dessa Colenda Corte, em decisão recente (HC nº ), decidiu não mais admitir habeas corpus que tenham por objetivo

5 MPF/PGR Nº /CS 5 substituir o Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC). Segundo o entendimento da Turma, para se questionar uma decisão que denega pedido de HC, em instância anterior, o instrumento adequado é o RHC e não o habeas corpus A Constituição Federal, que estabeleceu a competência dessa Corte em numerus clausus, previu, em seu art. 102, inciso I, d e i, as hipóteses em que é admissível o habeas corpus originário perante o Supremo Tribunal Federal: sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores Presidente da República, Vice-Presidente, membros do Congresso Nacional, Ministros de Estado, Procurador-Geral da República, comandantes da Marinha, do Exercito e da Aeronáutica, membros dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente ou quando o coator for Tribunal Superior ou quando o coator ou o paciente for autoridade ou funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal Federal, ou se trate de crime sujeito à mesma jurisdição em uma única instância, não sendo cabível a extensão desse rol exaustivo por interpretação da norma constitucional para permitir a inclusão de outras hipóteses ali não previstas. 12. O paciente, ao que consta, não exerce cargo que o insira na previsão constitucional. 13. O art. 102, II, da Constituição, atribuiu também a essa Corte competência para julgar em recurso ordinário o habeas corpus ( ) decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão; ( ). 1Trecho extraído de notícia divulgada pelo Supremo Tribunal Federal no dia 8 de agosto de 2012.

6 MPF/PGR Nº /CS Não há, portanto, previsão constitucional para o habeas corpus substitutivo de recurso ordinário. De acordo com o entendimento firmado pela Primeira Turma, no precedente citado, o instrumento processual cabível para impugnar as decisões tomadas pelo Superior Tribunal de Justiça em habeas corpus é o recurso ordinário. 15. Ainda sob outro fundamento impõe-se o não conhecimento do habeas corpus. 16. O impetrante se insurge contra decisão monocrática que indeferiu liminar em habeas corpus que tramita no Superior Tribunal de Justiça. 17. Tem afirmado essa Corte que a superação do entrave contido na Súmula nº 691 somente é possível quando presente situação de flagrante ilegalidade, que por si só autorize a apreciação do pedido antes que o faça o Tribunal constitucionalmente competente. 18. Este caso, entretanto, não revela essa situação de flagrante ilegalidade. O Relator, no Superior Tribunal de Justiça, indeferiu fundamentadamente a liminar, entendendo inexistentes indícios suficientes para a configuração do fumus boni iuris e do periculum in mora. 19. A decisão questionada é monocrática e tem natureza precária, desprovida, portanto, de conteúdo definitivo. Nela, o Relator indeferiu tão somente a liminar requerida por entender ausentes os requisitos para o acolhimento daquele pedido e, em seguida, determinou a requisição de informações da autoridade impetrada e, posteriormente, o encaminhamento dos autos a Procuradoria Geral da República, a fim de que houvesse o regular prosseguimento do habeas corpus para julgamento, na forma pedida pela parte. 20. Destarte, inequívoca é a incidência da Súmula 691 do Supremo

7 MPF/PGR Nº /CS 7 Tribunal Federal ( Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar ). 21. Assim, em preliminar, manifesta-se o Ministério Público Federal pelo não conhecimento do pedido. 22. No mérito, melhor sorte não assiste ao paciente. Quanto ao alegado excesso de prazo, em que pese o tempo em que o paciente encontra-se preso, a pertinência da alegação de ilegalidade depende da análise das circunstâncias do caso. 23. Em primeiro lugar, insta destacar que o processo, consoante o informações obtidas no site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro ( encontra-se com a instrução encerrada, aguardando apenas a prolação de sentença. 24. Assim, está superada a alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo na formação da culpa. Isso porque encerrada a instrução criminal, não há mais que se falar em constrangimento decorrente do excesso de prazo. Nesse sentido a a jurisprudência dessa Corte Suprema: DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ALEGAÇÃO DE EXCESSO DE PRAZO. INSTRUÇÃO ENCERRADA. COMPLEXIDADE DO PROCESSO. PRIMARIEDADE E BONS ANTECEDENTES. INSUFICIÊNCIA PARA AFASTAMENTO DA PRISÃO. ORDEM DENEGADA. 1. A questão de direito tratada nos autos deste habeas corpus diz respeito ao suposto excesso de prazo na prisão processual do paciente, que ainda não foi julgado. 2. A instrução criminal foi finalizada, estando os autos na fase de apresentação das alegações finais pela defesa. 3. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que fica prejudicada a alegação de excesso de prazo após encerrada a instrução (HC , rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma, DJ ). 4. Ademais, há elementos nos autos que apontam para a complexidade do processo, com a existência de vários réus, com defensores distintos, e de testemunhas a serem ouvidas via precatória. 5. Por outro lado, a primariedade, os bons antecedentes e a residência fixa, por si sós,

8 MPF/PGR Nº /CS 8 não são elementos aptos a afastar a prisão provisória. 6. Habeas Corpus denegado. (HC 98068, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, DJ de ) 25. Ademais, como já decidiu essa Corte, em se tratando de feito complexo, havendo, inclusive, a necessidade de expedir-se cartas precatórias para a realização de diligências, a contagem do prazo para conclusão da instrução deve obedecer à razoabilidade, eis que os prazos previstos em lei para a prática dos atos de instrução não são absolutos e improrrogáveis, podendo haver dilação, desde que justificada pelas peculiaridades do caso, o que de fato ocorreu na presente hipótese. Neste sentido, HC nº /PB (DJ de ) e HC nº /SP (DJ de ). 26. Sem embargo, a demora no julgamento se justifica pelo comportamento do paciente que, intimado por duas vezes para audiência de instrução e julgamento, não compareceu ao juízo, o que retardou a instrução criminal. Assim, reconhecendo-se que o paciente deu causa ao atraso, não pode ser beneficiado por sua própria torpeza. 27. No mais, não há qualquer ilegalidade a ser sanada. A prisão cautelar está fundamentada no art. 310, parágrafo único 2, do Código de Processo Penal, que condiciona a liberdade provisória ao comparecimento do réu em todos os atos do processo, sob pena de revogação. 2 Art Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: (Redação dada pela Lei nº , de 2011). I - relaxar a prisão ilegal; ou (Incluído pela Lei nº , de 2011). II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou (Incluído pela Lei nº , de 2011). III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. (Incluído pela Lei nº , de 2011). Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n o 2.848, de 7 de dezembro de Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação. (Redação dada pela Lei nº , de 2011).

9 MPF/PGR Nº /CS Desse modo, tendo o paciente, por duas vezes, deixado de comparecer a audiência de instrução e julgamento, a revogação da liberdade provisória deve ser mantida, diante do total descaso do paciente para com o Poder Judiciário. 29. Ademais, consta da folha de antecedentes criminais do paciente 04 anotações. Tal situação revela indícios de personalidade voltada para o crime, o que recomenda a prisão cautelar do paciente, sob o fundamento da garantia da ordem pública. 30. Ante o exposto, manifesta-se o Ministério Público Federal pelo não conhecimento do habeas corpus e, se conhecido, pela denegação da ordem, cassando-se a liminar anteriormente deferida. Brasília, 27 de agosto de 2012 CLÁUDIA SAMPAIO MARQUES Subprocuradora-Geral da República