Unidade 1 Propagação de Ondas
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1 Geração, Emissão, Propagação e Recepção de Ondas Eletromagnéticas* ROGÉRIO VOGT CARDOSO DOS SANTOS *Material desenvolvido como parte de um projeto sob orientação do Prof. Dr. Nelson Fiedler-Ferrara, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo.
2 Índice Introdução 03 Unidade 1 Propagação de Ondas 04 Introdução 04 Ondas 04 Características de ondas eletromagnéticas 07 As formas de propagação 11 Ionosfera: a camada ionizada 15 Freqüências x transmissões de rádio 21 Referências para aprofundamento 23 Unidade 2 Geração de Ondas Eletromagnéticas e Circuitos Oscilantes 25 Introdução 25 Os elementos que constituem o rádio 25 Oscilações num circuito indutor-capacitor 28 Sintonizando uma estação de rádio 31 As leis de indução e a onda eletromagnética 35 Referências para aprofundamento 41 Unidade 3 Antenas 42 Introdução 42 O que é uma antena 42 Principais características das antenas 42 As antenas 46 Antenas lineares 46 Conjuntos 52 Antenas de aberturas 63 Antenas inteligentes 68 Referências para aprofundamento 72 Considerações finais 73 Referências bibliográficas 74 Sítios consultados 77 2
3 Introdução O desenvolvimento científico e tecnológico nos últimas décadas tem alterado de forma significativa as nossas vidas. A rapidez do surgimento de novas tecnologias e a absolência de equipamentos pode dar a impressão equivocada de que os dispositivos eletrônicos postos no mercado estão baseados necessariamente em novos princípios científicos. O que talvez seja surpreendente para alguns é saber que muitos dos princípios científicos que estão por trás dessas novas tecnologias foram desenvolvidos há quase um século ou mais. Apesar disso, a abordagem das novas tecnologias, tão presentes em nosso dia-adia, e a discussão dos princípios científicos subjacentes, são raramente feitas no Ensino Médio atual. Isso ocorre com o tema tratado neste texto a geração, emissão, propagação e recepção de ondas eletromagnéticas, com ênfase na tecnologia de antenas bem como no processo de produção e recepção de ondas eletromagnéticas para fins de telecomunicação. Apesar dos sofisticados desenvolvimentos tecnológicos bastante recentes de eletrônica relacionados com esse assunto, como as chamadas antenas inteligentes, os princípios físicos básicos envolvidos foram estabelecidos ainda no século XIX. Acreditamos, portanto, que ao abordar esse tema no Ensino Médio estaremos colaborando para aproximar, no espaço escolar, o conhecimento cientifico em física às novas tecnologias que participam do cotidiano do cidadão no mundo globalizado em que vivemos. Nossa expectativa é de que ao contextualizar o ensino de física aproximando-o dos elementos presentes do dia-a-dia podemos torná-lo mais interessante e significativo para os alunos, permitindo melhor aprendizagem. Este texto está dividido em três Unidades de Ensino. Na primeira Unidade, serão abordadas as principais características das ondas, a diferenciação ente onda mecânica e onda eletromagnética, o espectro eletromagnético e o de radiofreqüência, as diferentes maneiras com que as ondas se propagam ente a antena emissora e a antena receptora, e as diversas utilizações das ondas eletromagnéticas. Na segunda Unidade, veremos as leis de indução eletromagnética e a geração de ondas eletromagnéticas. Abordaremos, também, o circuito oscilante e a geração da onda eletromagnética através da antena emissora. Por fim, na terceira e última Unidade apresentaremos e discutiremos as principais antenas, suas propriedades, características e usos. Ao término das três Unidades, esperamos que o aluno seja capaz de entender questões relacionadas ao seu dia-a-dia, dúvidas que dificilmente seriam tratadas em um conteúdo tradicional de ensino. Perguntas a respeito de como posicionar a antena de sua casa para sintonizar melhor um canal de televisão ou sobre as causas que podem gerar a degradação do sinal na comunicação por telefone celular são freqüentes e serão aqui tratadas. Ao fim de cada Unidade e no final deste texto são fornecidas referências para aprofundamento. Convido você, caro estudante, a penetrar no universo das ondas eletromagnéticas e das antenas, entendendo os princípios e a tecnologia envolvidos que participam de sua vida. O autor 3
4 Unidade 1 Propagação de Ondas Introdução Para se estabelecer uma comunicação à distância entre pessoas faz-se necessário a emissão de algum tipo de sinal. Seja utilizando algum equipamento eletrônico, como um telefone, ou simplesmente conversando ou acenando à distância, há sempre um elemento constituinte fundamental: as ondas! Ondas Uma onda é qualquer sinal que se transmite de um ponto a outro do espaço com velocidade definida. A onda transporta energia sem ocorrer transporte de matéria. É comum classificarmos as ondas quanto à sua natureza e forma de propagação. Quanto à natureza as ondas podem ser: Ondas mecânicas: A energia é transportada mediante a perturbação do meio em que ocorre a propagação. Isso ocorre quando o meio tem propriedades elásticas. Como exemplos, podemos citar as ondas na água (Fig. 1.1), ondas na corda de um violão, ondas sonoras. Figura 1.1 Ondas na água. Exemplo de ondas mecânicas. Ondas eletromagnéticas: Nas ondas eletromagnéticas a energia é transportada por campos elétricos e magnéticos. A propagação pode ocorrer tanto em meios materiais como no vácuo. A energia luminosa se propaga como uma onda eletromagnética (Fig. 1.2). Figura 1.2 Representação de onda eletromagnética. 4
5 Quanto à direção de oscilação, as ondas podem ser: Transversais: nesse caso, a direção de oscilação é perpendicular à direção de propagação da onda. Observe no exemplo da Fig. 1.3 que a oscilação ocorre na vertical e a onda se propaga na horizontal. As ondas eletromagnéticas são exemplos de ondas transversais. Figura 1.3 Onda transversal. Longitudinais: nesse caso, a direção de oscilação é paralela à direção de propagação da onda. Observe no exemplo da Fig. 1.4 que tanto a direção de oscilação como a direção de propagação ocorrem na horizontal. Um exemplo de onda longitudinal é o som propagando-se em fluidos (líquidos e gases). Figura 1.4 Onda longitudinal. Importante Todas as ondas eletromagnéticas são transversais. Ondas na água não são nem longitudinais nem transversais, mas uma combinação desses dois modos. Ondas sísmicas têm componentes longitudinais e transversais mas com velocidades diferentes. Nos líquidos e nos gases o som é uma onda exclusivamente longitudinal. Nos sólidos o som se transmite por vibrações longitudinais e transversais, sendo uma onda mista. Nomenclatura Uma onda é caracterizada pelos seguintes elementos, representados na Fig. 1.5: 5
6 Figura 1.5 Principais elementos de uma onda. Crista de onda é o ponto mais alto da onda. Vale de onda é ponto mais baixo da onda. Comprimento de onda (λ) é distância que a onda percorre durante uma oscilação completa. Amplitude de oscilação (A) é a máxima perturbação ou deslocamento de um ponto da onda em relação à posição de repouso. Período (T) é o intervalo de tempo que a onda leva para fazer uma oscilação completa. Freqüência (f) é a razão entre o número n de oscilações e o intervalo de tempo t que duram essas oscilações. A unidade usada para freqüência no Sistema Internacional de Unidades (SI) é o hertz (Hz), e representa o número de oscilações por segundo. A Fig. 1.6 faz uma comparação entre freqüência e comprimento de onda. Figura 1.6 Comparação entre ondas de diferentes freqüências. 6
7 Vale a relação entre período e freqüência: Sendo v a velocidade de propagação da onda e f sua freqüência, tem-se: Características de ondas eletromagnéticas Ondas eletromagnéticas são campos elétricos e campos magnéticos (veja caixa de texto na próxima página) que oscilam em direções perpendiculares à direção de propagação (ou seja, são ondas transversais) e podem se propagar tanto no vácuo como em meios materiais. Todas as ondas são caracterizadas por uma propriedade chamada propagação. Vibrações em um ponto específico no espaço excitam vibrações similares nos pontos vizinhos e assim a onda se propaga. Numa onda eletromagnética, o campo elétrico e o campo magnético são codependentes: uma variação no campo magnético induz um campo elétrico e uma variação no campo elétrico induz um campo magnético. Esse fenômeno se chama indução eletromagnética, e será tratado com mais detalhe na Unidade 2. As variações dos vetores campo magnético e elétrico ocorrem em fase, de tal maneira que os picos e os vales ocorrem ao mesmo tempo nas duas ondas (Fig. 1.7). Figura 1.7 Onda eletromagnética Campo elétrico ( ) e campo magnético ( ) oscilando em fase (no vácuo). As ondas eletromagnéticas se propagam com uma velocidade que depende do meio de propagação e da freqüência da onda. No vácuo a velocidade de propagação é de aproximadamente 3x10 8 m/s. Esse valor é comumente chamado de velocidade da luz no vácuo e é representado pela letra c. Em meios materiais, a velocidade de 7
8 propagação da onda eletromagnética é menor do que no vácuo, mas ainda assim muito alta. Campo Elétrico A presença de cargas elétricas no espaço físico altera as propriedades desse mesmo espaço. Assim, se uma carga de prova é colocada na presença de outras cargas, sobre ela atuará uma força que denominamos força elétrica. Trata-se de uma força à distância; não é necessário haver contato material entre as cargas. Dizemos, então, que há um campo elétrico nessa região do espaço. O campo elétrico é convenientemente representado por linhas de força. A tangente a uma linha de força em um dado ponto corresponde à direção da força que sofre uma carga de prova se for colocada em repouso nesse ponto. Na Fig. 1.8 são representados, através das linhas de força, campos elétricos associados a diferentes distribuições de carga. Fig. 1.8 Linhas de força associadas a campos elétricos de cargas: (a) carga pontual positiva; (b) duas cargas pontuais de mesma magnitude e sinais contrários; (c) duas placas condutoras paralelas com distribuições superficiais de carga de mesma magnitude e de sinais contrários. Campo Magnético Cargas elétricas em movimento em um condutor (por exemplo, um fio elétrico) o que se denomina corrente elétrica alteram as propriedades do espaço. Se uma carga de prova em movimento (aqui é essencial que a carga esteja animada com uma velocidade não nula) é colocada nessa região do espaço, sobre ela pode atuar uma força. A essa força denominamos força magnética. Como no caso da força elétrica, trata-se aqui também de uma força de ação à distância. Dizemos então que há um campo magnético nessa região do espaço. Além de correntes elétricas, campos magnéticos podem também ser produzidos por certos materiais chamados materiais magnéticos, como, por exemplo, os imãs. O campo magnético pode ser convenientemente representado no espaço por linhas de indução magnética. Essas linhas são tais que a força magnética, em um dado 8
9 ponto, é sempre perpendicular à própria linha de indução magnética e à velocidade da carga de prova; uma particularidade das forças magnéticas é que se o vetor for paralelo ao vetor, resulta uma força magnética nula. Na Fig. 1.9 são fornecidos exemplos de configurações de campos magnéticos representados pelas respectivas linhas de indução magnética. Fig 1.9 Linhas de indução magnética associadas a campos magnéticos produzidos em várias situações: (a) corrente em um fio retilíneo; (b) corrente em um fio em formato circular (espira); (c) imã (pólo norte (N) e pólo sul (S)). Espectro eletromagnético O espectro eletromagnético é o conjunto de faixas de freqüências, ou comprimentos de onda, que caracterizam os diversos tipos de ondas eletromagnéticas (Fig. 1.10). O espectro de radiofreqüência Figura 1.10 O espectro eletromagnético. No espectro eletromagnético, as ondas de rádio compreendem uma faixa desde a freqüência de alguns quilohertz até a freqüência de centenas de gigahertz. Essa faixa, no entanto, pode ser também subdividia. À classificação dessas subdivisões dá-se o nome de espectro de radiofreqüência, cujos limites são difíceis de definir, podendo até mesmo se sobrepor. As tabelas 1.1 e 1.2 mostram o espectro de radiofreqüência. 9
10 Designações usuais Siglas Faixa de freqüência Comprimento de onda ondas muito longas VLF - Very Low Frequency Freqüência muito baixa 3 a 30 khz 10 km km ondas quilométricas ondas longas LF - Low Frequency Freqüência baixa 30 a 300 khz 1 km - 10 km ondas hectométricas MF - Medium Frequency ondas médias Freqüência média 300 a 3000 khz 100 m - 1 km ondas decamétricas HF - High Frequency ondas curtas ou tropicais Freqüência alta 3 a 30 MHz 10 m m ondas métricas ondas muito curtas VHF - Very High Frequency Freqüência muito alta 30 a 300 MHz 1 m - 10 m ondas decimétricas ondas ultra curtas UHF Ultra High Frequency Freqüência ultra alta 300 a 3000 MHz 10 cm - 1 m ondas centimétricas microondas SHF Super High Frequency Freqüência super alta 3 a 30 GHz 1 cm - 10 cm ondas milimétricas EHF - Extremely High Frequency Freqüência extremamente alta 30 a 300 GHz 1 mm - 1 cm Tabela 1.1 O espectro de radiofreqüência: designações e faixas. Tabela 1.2 O espectro de radiofreqüência e a escala de freqüências. 10
11 As formas de propagação 1 Até agora vimos que as ondas de rádio são ondas eletromagnéticas de uma determinada faixa de freqüência (ou comprimentos de onda) que se propagam de forma transversal e viajam, no vácuo, com velocidade aproximada de m/s. São essas ondas de rádio que são emitidas pela antena transmissora e chegam à antena receptora. Elas serão o foco da nossa atenção a partir de agora. As principais formas de propagação das ondas de rádio, emitidas pela antena e captadas por algum receptor, de maneira geral, podem ser classificadas de duas formas: 1 Ondas terrestres: são as ondas de rádio que acompanham a superfície da Terra, sofrendo influência do relevo e do solo, podendo ser classificadas como: a) ondas de superfície: este tipo de propagação ocorre, como o próprio nome diz, próxima a superfície do planeta, acompanhando sua curvatura. As ondas de superfície são atenuadas pelo solo. b) ondas espaciais: são ondas que se propagam acima da superfície da Terra. Elas são emitidas por antenas altas (para altas freqüências essas antenas elevam-se do solo vários comprimentos de onda) e por isso não sofrem atenuação do solo. Uma de suas formas de propagação é chamada de onda direta ou propagação em linha de visibilidade (Fig trajeto 1). Nesse caso uma antena enxerga a outra, ou seja, não há nenhum obstáculo entre os extremos das duas antenas. A outra forma de propagação da onda espacial é a onda refletida (Fig trajeto 2), que também atinge a antena receptora mas por reflexão no solo ou em obstáculos adjacentes. 2 Ondas ionosféricas: são ondas emitidas em direção ao céu que podem se propagar por reflexão ionosférica (uma reflexão ou múltiplas reflexões). Também são conhecidas por ondas celestes (Fig. 1.12). Nas figuras 1.11 e 1.12 é possível observar os diferentes trajetos que a onda pode fazer entre a antena transmissora e a antena receptora. Quando a antena transmissora emite um sinal, esse pode se propagar como onda terrestre ou como onda ionosférica. A onda terrestre pode se propagar sobre o solo, sendo chamada de onda de superfície, ou ser emitida por antenas altas e ser denominada onda espacial. Esta onda espacial, por sua vez, pode se propagar em linha de visibilidade ou por reflexão no terreno (Fig. 1.11, trajetos 1 e 2 respectivamente). A onda ionosférica pode ser mais ou menos afetada pela ionosfera (ver caixa de texto na página 15), e, dependendo da sua freqüência, pode ser refletida de volta a Terra (Fig. 1.12, trajeto 3 e 4), ou se propagar em direção ao espaço e não mais retornar (Fig. 1.12, trajeto 5). O esquema na página 12 mostra um resumo das principais formas de propagação, que serão detalhados a seguir. 1 Utilizamos aqui o termo formas de propagação para designar as diferentes maneiras como as ondas se propagam desde a antena transmissora até a antena receptora. Num uso diferente do que aqui se faz, chama-se, algumas vezes, de formas de propagação ao fato das ondas se propagarem segundo oscilações transversais ou longitudinais. 11
12 Figura 1.11 Ondas terrestres espaciais: trajeto 1 linha de visibilidade; trajeto 2 refletida no solo. Figura 1.12 Ondas ionosféricas: 3 Propagação por reflexão ionosférica; 4 Propagação por várias reflexões; 5 Onda refratada na ionosfera. Classificação das principais formas de propagação das ondas de rádio. 12
13 A onda terrestre A onda terrestre é a onda que se propaga próximo à superfície do planeta, atingindo a antena receptora sem deixar a atmosfera inferior. Ela pode viajar fazendo contato com o solo (onda de superfície), ou diretamente entre as antenas transmissoras e receptoras, quando essas são grandes o suficiente para que uma veja a outra (onda espacial). Quando as ondas se propagam fazendo contato com o solo, ondas de superfície, elas sofrem severa atenuação por absorção. Essas perdas são por resistência ôhmica devido à condutividade da terra. Em outras palavras, o sinal aquece a terra perdendo energia. A atenuação das ondas de superfície aumenta rapidamente com o aumento da freqüência. A altas freqüências (acima de alguns megahertz) a onda é rapidamente atenuada. A onda de superfície passa a ser importante então a baixas freqüências, principalmente em radiodifusões que usam polarização vertical 2. Essa atenuação faz com que as ondas de superfície com polarização vertical se curvem acompanhando o contorno da Terra, tornando possível a transmissão de ondas de baixas freqüências a grandes distâncias, quando o sinal emitido pela antena transmissora tem elevada potência. Na propagação entre duas antenas situadas na linha de visão, que é a forma mais simples de comunicação de sinais entre duas antenas, a energia viaja diretamente entre essas antenas e, a menos que elas sejam muito altas ou estejam muito próximas, uma porção apreciável de energia é refletida no solo. Essa onda refletida, combinada com a onda direta, afeta o sinal recebido. A interação entre a onda direta e a onda refletida é a principal causa de interferências observadas na recepção de ondas na faixa de VHF (FM) nos rádios receptores dos automóveis e por fantasmas na recepção do sinal de TV. Essa interação pode, até mesmo, proporcionar interferência destrutiva entre os sinais direto e refletido, reduzindo drasticamente a intensidade do sinal recebido a níveis insuficientes para serem captados 3. Na faixa de UHF a reflexão no solo é eliminada pois a radiação da antena nessa faixa se comporta como um feixe de luz, e a propagação se dá em linha de visibilidade. A comunicação via satélite, embora seja longe da superfície do planeta, é, em princípio, feita de forma direta ente a antena situada na Terra e o satélite, sofrendo apenas desvios causados pela influência da atmosfera. 2 A polarização de uma onda é definida como sendo a direção em que ocorrem as oscilações. No caso da onda eletromagnética, a polarização é determinada pela direção de oscilação do campo elétrico, como veremos na Unidade 3. 3 Na Unidade 3 veremos que esta interação entre a onda direta e a onda refletida pode também perturbar o sinal captado pelo telefone celular. 13
14 A onda ionosférica Pode-se dizer que a onda ionosférica é a onda que se propaga em direção ao céu e que é refletida ou refratada pelas camadas da ionosfera. As ondas que são emitidas em direção ao céu seriam perdidas no espaço se não houvesse uma forma de fazê-las retornar à Terra. Dependendo da freqüência do sinal, a ionosfera (ver caixa de texto na próxima página) se comporta como uma camada refletora para essas ondas, podendo-se estabelecer comunicação a longas distâncias por reflexão ionosférica. A máxima distância que o sinal pode atingir em uma única reflexão na atmosfera é cerca de 4000 km. Distâncias maiores são cobertas por várias reflexões do sinal (Fig. 1.13). Figura 1.13 Reflexões ionosféricas. A propagação das ondas de rádio pela ionosfera tem uma maior importância para comunicações nas faixas de VLF, LF, MF e HF, quando são aproveitados os efeitos das reflexões e refrações. Em freqüências mais altas, logo após o início da faixa VHF (por volta de 50 MHz), a ionosfera é praticamente transparente às ondas eletromagnéticas, havendo então a necessidade do uso de comunicação via satélite para essas altas freqüências. 14
15 Ionosfera: a camada ionizada A camada superior da atmosfera, a ionosfera, que se estende de km até cerca de km de altitude, é uma camada ionizada principalmente pela ação da radiação ultravioleta emitida pelo Sol e, em menor intensidade, pelos raios cósmicos e outros tipos de radiações provenientes do espaço. Essas radiações, por possuírem altas energias, interagem com as moléculas de ar, arrancando elétrons de algumas moléculas. Como resultado, a ionosfera fica com alta densidade de elétrons livres e íons. Nessa camada, contudo, a densidade do ar é tão baixa que os íons podem viajar a distâncias relativamente longas antes de se recombinarem com íons de cargas de sinais opostos, para formar moléculas neutras. Como resultado, a ionosfera permanece ionizada por grandes períodos durante o dia, até mesmo após o pôr-do-sol. A baixas altitudes (menor que km) a densidade do ar é grande e a recombinação ocorre rapidamente. A essas altitudes, a ionização do ar é desprezível. Em altitudes superiores a km, o ar é muito rarefeito e a ionização também é praticamente desprezível. A propriedade mais importante da ionosfera para as comunicações de rádio está na sua habilidade para refletir ondas de rádio. Contudo, somente uma determinada faixa de freqüência é refletida. Isso ocorre porque para freqüências acima de 50 MHz pouco depois do início da faixa VHF a ionosfera é quase transparente e, acima de 200 MHz, ela é totalmente transparente, de tal maneira que as ondas não são refletidas. A ionosfera é formada por diferentes camadas (D, E, F 1 e F 2 ) que são ionizadas de diferentes maneiras. Somente as regiões E, E-esporádica 4 (quando presente), F 1 e F 2 refratam as ondas de HF. A região D influencia nas transmissões de ondas de rádio porque as absorve, sendo que na freqüência de 1400 khz a absorção da onda ionosférica atinge o seu máximo. A região F 2 é a mais importante para a propagação das ondas médias pois está presente 24h por dia, além de sua alta altitude permitir comunicações mais distantes. As camadas da ionosfera (Fig. 1.14) estão em constante alteração e variam de dia a dia, de mês a mês e de ano a ano. As condições climáticas e a atividade solar também influenciam essas camadas. Em adição à grande mobilidade dessas camadas, a ausência de raios ultravioletas do Sol à noite faz com que a ionosfera como um todo fique mais alta nesse período, modificando o alcance das ondas de rádio. Figura 1.14 Camadas da ionosfera 4 A camada E-esporádica é uma camada temporária que tem características similares àquelas da camada F. 15
16 Como a atmosfera afeta a propagação das ondas de rádio? A ionosfera, por ser uma camada ionizada, interage com as ondas eletromagnéticas, podendo mudar a direção de propagação dessas ondas. Quando a radiação eletromagnética penetra na ionosfera, os elétrons livres dessa camada absorvem parte da energia da onda e, dependendo da freqüência de oscilação do sinal, esses elétrons começam a vibrar. As cargas elétricas dos elétrons em oscilação geram campos elétricos variáveis que, de acordo com as leis de indução que veremos mais detalhadamente na Unidade 2, produzem ondas eletromagnéticas que passam a se propagar com velocidades diferentes da onda original. A esse fenômeno dá-se o nome de refração (ver caixa de texto a seguir). Refração Quando uma onda de comprimento de onda λ penetra em um outro meio, diferente do anterior, ela sofre uma mudança de velocidade de propagação. A esse fenômeno dá-se o nome de refração. A variação de velocidade pode vir acompanhada também de uma variação na direção de propagação, que pode ser determinada pela Lei de Snell-Descartes (Fig. 1.15): onde i é o ângulo de incidência e r o ângulo de refração e n 1 e n 2 são os índices de refração absolutos dos meios 1 e 2 respectivamente. O índice de refração absoluto n de um material é definido como a razão entre a velocidade da luz no vácuo e a velocidade da luz v no material. O índice de refração absoluto é expresso por O índice de refração absoluto depende do meio e do comprimento de onda λ da luz. Quanto maior for o índice de refração absoluto da onda no meio, mais difícil é para essa onda se propagar e, conseqüentemente, menor é a velocidade de propagação. O estudo dos índices de refração da atmosfera é fundamental para se entender como se dá a trajetória das ondas de rádio. Figura 1.15 Incidência oblíqua. 16
17 Quando a onda de rádio atinge a ionosfera, ela pode ou não penetrá-la, dependendo do ângulo crítico. Ângulo crítico Para compreender melhor como ocorre a propagação da onda na ionosfera, podemos examinar as leis da refração, no domínio da óptica geométrica e, em seguida, estabelecer um paralelo com o que ocorre com as ondas de rádio. Para isso, considere um aquário preenchido com água até a metade. Um raio proveniente de uma lâmpada submersa no aquário irá se propagar através da água até atingir a superfície de separação dos dois meios podendo, parte dele, refratar e passar a se propagar no ar ou ser refletido de volta à água (Fig. 1.16). Observe que o fato determinante aqui é se o raio incide com um ângulo maior ou menor que um determinado ângulo crítico (também chamado de ângulo limite). Desprezando-se efeitos de absorção, caso o ângulo de incidência seja menor que o ângulo crítico (raio 1), parte dele será refratado e parte será refletido; caso o ângulo de incidência seja maior que o ângulo critico (raio 2) ocorrerá reflexão total. O ângulo crítico depende da densidade dos meios de propagação e do comprimento de onda (ou freqüência) do raio. Figura 1.16 Óptica geométrica: Ângulo crítico. O mesmo princípio se aplica às ondas de rádio. Observe que no exemplo acima a água é mais densa que o ar. Analogamente, uma onda de rádio que se origina na superfície da Terra e se propaga em direção ao espaço pode ser refratada através das camadas da atmosfera (que, em geral, têm sua densidade diminuída com o aumento da altitude) e se perder no espaço, ou pode ser refletida de volta ao planeta. Mais uma vez, o fator determinante é o ângulo crítico. Novamente, o ângulo crítico depende da densidade das camadas da atmosfera e do comprimento de onda da onda incidente. 17
18 Figura 1.17 A onda de rádio 2 incide na ionosfera com ângulo maior que o crítico, sendo curvada nas camadas sucessivas da ionosfera voltando à Terra. Quando as ondas de rádio atingem a ionosfera com um ângulo inferior ao ângulo crítico (Fig trajeto 1), elas a penetram e não retornam mais a Terra (refratam em direção ao espaço exterior). Entretanto, as ondas de rádio que incidem na ionosfera com um ângulo superior ao ângulo crítico são refletidas para a Terra (sofrem reflexão ionosférica. Fig trajeto 2), Quando o Sol está a pino, a ionosfera está mais densa, e, conseqüentemente, maior é o seu índice de refração. Logo, o ângulo crítico é maior de dia do que a noite. A reflexão ionosférica faz com que o sinal atinja distâncias superiores àquelas que seriam atingidas pela propagação por ondas terrestres. A distância terrestre coberta por um sinal de rádio depois de refletido uma vez na ionosfera e retornado à Terra se chama comprimento de salto. O sinal emitido pela antena transmissora alcança um determinado ponto por propagação da onda de superfície. A partir desse ponto até o local onde a onda atinge a Terra por reflexão ionosférica não há cobertura do sinal emitido, sendo essa região entre esses dois pontos chamada de zona de salto ou zona de silêncio (Fig. 1.18). Uma região de centenas de quilômetros de zona de salto é comum a altas freqüências. Essa lacuna com ausência de sinal é responsável pelo fato particular de um sinal ser recebido a uma grande distância da antena transmissora e não poder ser captado a distâncias intermediárias da mesma. A vantagem da zona de salto é poder transmitir um sinal que não seja captado por um receptor em particular. 18
19 Você sabia que... Figura 1.18 Comprimento e Zona de Salto. Dependendo da freqüência da onda utilizada, o contato de um rádio-amador brasileiro com um japonês é melhor estabelecido quando a onda se propaga pelo lado do planeta onde é noite, pois ocorre um menor número de reflexões e perdas no solo. Ou seja, quando é de manhã no Brasil (e noite no Japão), os radioamadores devem orientar suas antenas para que o contato entre elas ocorra pelo oceano Pacífico. Quando é noite no Brasil (e de manhã no Japão), as antenas devem ser posicionadas de maneira que a propagação ocorra sobre o oceano Atlântico, Europa e Ásia. As ondas de rádio, após serem refletidas pela ionosfera, atingem a Terra, sendo refletidas atingindo novamente a ionosfera e assim sucessivamente, mantendo basicamente o mesmo ângulo de reflexão. Como a cada reflexão parte da energia da onda é dissipada, esse processo continua até que a onda seja totalmente absorvida. Há muitos trajetos pelos quais uma onda do céu pode se propagar de uma antena transmissora a uma antena receptora. As mais simples são aquelas que atingem a camada F da ionosfera. Algumas modalidades de propagação mais complexas consistem em combinações de reflexões entre as camadas E e F e a Terra, e na formação de dutos (Fig. 1.19). A forma de propagação em dutos envolve um número de reflexões na ionosfera sem ocorrerem reflexões intermediárias na Terra. A inversão de temperatura na atmosfera, e conseqüente alteração dos índices de refração das camadas, pode provocar a formação de um duto, similar a um guia de onda ou a uma fibra óptica, permitindo comunicação a longa distância desde as baixas freqüências de VHF até microondas. 19
20 Figura 1.19 Propagação complexa e propagação por duto. Vamos recordar que a refração é um fenômeno ondulatório e ocorre quando a onda passa a se propagar em meio diferente do anterior (meios que possuem diferentes índices de refração). Como a densidade do ar e também o índice de refração normalmente diminuem com o aumento da altitude, a trajetória da onda será encurvada proporcionalmente a essa diferença entre os índices de refração das camadas da atmosfera, fazendo com que o sinal, na faixa de UHF e microondas, seja encurvado para baixo (Fig. 1.20). Figura 1.20 Encurvamento da trajetória da onda (arco descendente) em camadas com índices de refração variável com a altitude. 20
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