PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Transcrição

1 RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº , DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA - 5ª VARA CRIMINAL RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ RECORRIDO : ALEX SANDRO MACIEL DE MATOS RELATOR : DES. JOSÉ CARLOS DALACQUA APELAÇÃO CRIMINAL. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR (ART. 311 DO CP)- ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA POR ATIPICIDADE DA CONDUTA- PLEITO DE REFORMA FORMULADO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. MATERIALIDADE E AUTORIA SOBEJAMENTE COMPROVADAS. PERFEITA SUBSUNÇÃO DA CONDUTA À DESCRIÇÃO TÍPICA- AUSÊNCIA DE INSTRUÇÃO PROCESSUAL EM PRIMEIRO GRAU. RECURSO PROVIDO PARA QUE OS AUTOS RETORNEM À VARA DE ORIGEM, PARA O PROSSEGUIMENTO DO FEITO COM A INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Nos termos do art. 115 do Código de Trânsito Brasileiro, "o veículo será identificado externamente por meio de placas dianteira e traseira, sendo esta lacrada em sua estrutura, obedecidas as especificações e modelos estabelecidos pelo CONTRAN". 2. Havendo expressa previsão legal de que as placas são sinais identificadores de veículos, não é dado ao julgador eleger entre identificação interna e externa para fins de enquadramento da conduta ao crime disposto no art. 311 Página 1 de 9

2 fls. 2 do Código Penal, se tal distinção não foi feita pelo legislador. 3. É assente no Superior Tribunal de Justiça o entendimento segundo o qual "não se pode, num primeiro lanço, descartar a ocorrência do crime de adulteração de sinal identificador de veículo automotor quando há alteração das placas do carro, pois estas constituem sinal de identificação externo do veículo (AgRg no REsp /RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 01/03/2011, DJe 21/03/2011). VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso em Sentido Estrito nº , do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - 5ª Vara Criminal, em que é Recorrente MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ e Recorrido ALEX SANDRO MACIEL DE MATOS. I- RELATÓRIO Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Público do, recebido pela magistrada a quo como recurso de apelação, em face de sentença de folhas 68/70, mediante a qual a magistrada de primeiro grau absolveu sumariamente o réu da acusação relativa ao delito previsto no art. 311 do Código Penal com fulcro no art. 397, inciso III, do Código de Processo Penal, por entender que a conduta deve ser enquadrada em sanção administrativa e não em ilícito penal, o qual se destina a fraudes significativas, em Página 2 de 9

3 PODER JUDICIÁRIO fls. 3 consonância com o montante da pena abstratamente cominada ao tipo. Inconformado, o Ministério Público interpôs o presente recurso às folhas 89 e seguintes, em cujas razões alega: a) o caso em tela não se enquadra em nenhuma das hipóteses elencadas no art. 397, que prevê os casos em que deve ocorrer a absolvição sumária; b) existe conduta aparentemente típica, vez que o fato descrito na denúncia, em princípio, está em conformidade com o tipo pena previsto no art. 311, caput, do Código Penal; c) há nos autos prova de materialidade e indícios suficientes de autoria; d) a materialidade do delito restou comprovada conforme o Auto de Exibição e Apreensão (fl.08), Cópia do Certificado de Registro e Licenciamento do Veículo( fl. 17), fotos da placa do veículo (fls.22/27), assim como a confissão do réu (fls.09/10); e) não bastasse a confissão do réu, os indícios de autoria estão presentes nos depoimentos das testemunhas, durante o inquérito policial; f) a conduta delitiva em tela consiste em adulterar, ou seja, alterar, modificar, marcar de novo o sinal identificador do veículo, pouco importando o processo utilizado; g) o crime do art. 311 não exige resultado naturalístico, pois se baliza na potencialidade lesiva do próprio ato de adulteração; h) o objeto material é o sinal identificador do veículo, incluindo-se a placa traseira ou dianteira, caracterizando o crime de adulteração de sinal identificador de veículo alterar dado constante da placa; i) como se vê das fotografias, o falso tinha plena capacidade de ludibriar o homem médio, especialmente ao se considerar que placas de veículo são observadas a certa distância, e, na maioria das vezes, com esses veículos em movimento. Às folhas 131/139 a douta Procuradoria proferiu parecer, manifestando-se pelo conhecimento, bem como pelo Página 3 de 9

4 desprovimento do recurso interposto. fls. 4 É o relatório. II- VOTO E SEUS FUNDAMENTOS Preliminarmente, oportuno destacar que o recurso em sentido estrito é cabível tanto contra decisões interlocutórias quanto contra decisões definitivas terminativas de mérito, taxativamente nas hipóteses contempladas no art. 581 do CPP. No caso, o recorrente, num primeiro momento, baseou sua insurgência no inciso I do artigo citado, cuja hipótese se refere ao não recebimento de denúncia ou queixa, o que não é o caso. Desta forma, agiu corretamente a magistrada de primeiro grau, em seu despacho de folhas 123 e verso, no qual, em atenção ao princípio da fungibilidade recursal, recebeu a insurgência como recurso de apelação, com fulcro no artigo 593, inciso I, do Código de Processo Penal, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade, recebimento este que reitero neste momento. apelação interposto. Desta feita, passo à análise do mérito do recurso de O Ministério Público apela da decisão absolutória, Página 4 de 9

5 PODER JUDICIÁRIO fls. 5 aduzindo, em breves palavras, que tanto a materialidade do delito como a autoria restaram fartamente comprovadas, razão por que a Magistrada não poderia tê-los absolvido. Assiste-lhe razão. Como bem asseverou o recorrente, a materialidade restou comprovada conforme o Auto de Exibição e Apreensão (fl.08), Cópia do Certificado de Registro e Licenciamento do Veículo (fl. 17), fotos da placa do veículo (fls.22/27), assim como a confissão do réu (fls.09/10). E a autoria restou inconteste não apenas porque o próprio réu confessou, mas também pelos depoimentos das testemunhas na fase inquisitorial. No entanto, não obstante a magistrada de primeiro grau tenha reconhecido a autoria do apelado, entendeu pela atipicidade do fato, porque, de acordo com a doutrina, as placas são sinais identificadores externos e, portanto, a alteração destas não configuraria o crime descrito no art. 311 do Código Penal. Entretanto, tal argumentação não pode prosperar. Penal: Veja-se o que dispõe a letra do art. 311 do Código Página 5 de 9

6 fls. 6 Art Adulterar ou remarcar número de chassi ou qualquer sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento: Pena reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. Ora, a placa é componente identificador do veículo, conforme estabelecido no art. 115 do Código de Trânsito Brasileiro: Art O veículo será identificado externamente por meio de placas dianteira e traseira, sendo esta lacrada em sua estrutura, obedecidas as especificações e modelos estabelecidos pelo CONTRAN. Assim sendo, existe expressa previsão legal de que as placas são sinais identificadores de veículos, não sendo dado ao julgador eleger entre identificação interna e externa para fins de enquadramento da conduta ao crime disposto no art. 311 do Código Penal, se tal distinção não foi feita pelo legislador. Desse modo, a superposição de fita isolante, na placa da motocicleta, no intuito de alterar um de seus algarismos, como ocorreu no presente caso, configura, sim, o crime insculpido no art. 311 Página 6 de 9

7 PODER JUDICIÁRIO fls. 7 do Código Penal, consoante já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 311, CAPUT, DO CP. OCORRÊNCIA. ADULTERAÇÃO DE SINAL DE VEÍCULO AUTOMOTOR. TROCA DE PLACAS. CONDUTA TÍPICA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Não se pode, num primeiro lanço, descartar a ocorrência do crime de adulteração de sinal identificador de veículo automotor quando há alteração das placas do carro, pois estas constituem sinal de identificação externo do veículo. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. Desse modo, tem-se por imperativa a reforma da sentença que absolveu sumariamente o apelado, haja vista restar configurada, sim, na hipótese, o delito do art. 311 do Código Penal. E, tendo em vista a ausência de instrução processual em primeiro grau, os autos devem ser baixados a fim de que se dê continuidade ao feito. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA POR ATIPICIDADE DA CONDUTA. Página 7 de 9

8 fls. 8 IMPOSSIBILIDADE - CRIME DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO SUPRIMIDA. ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO IV, DA LEI /2003 "ABOLITIO CRIMINIS" QUE INCIDE APENAS AO DELITO DE POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO (ART. 12, DA LEI Nº /03) CARACTERIZADO O DELITO DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO CONFIGURADA A TIPICIDADE DE CONDUTA SUPRIMIDA INVIÁVEL A ABSOLVIÇÃO AUSÊNCIA DE INSTRUÇÃO PROCESSUAL EM PRIMEIRO GRAU IMPOSSIBILIDADE SEGUNDA INSTÂNCIA, SOB PENA CERCEAMENTO DE DEFESA - DE JULGAMENTO EM DE SE CONFIGURAR RECURSO PROVIDO PARA QUE OS AUTOS RETORNEM À VARA DE ORIGEM, PARA O PROSSEGUIMENTO DO FEITO COM A PROLAÇÃO DE NOVA SENTENÇA. (TJPR - 2ª C.Criminal - RSE Iretama - Rel.: Carlos Augusto A de Mello - Unânime - J ) Assim, diante dos argumentos aduzidos pelo representante ministerial e pelas razões já expostas, deve o feito ser novamente remetido ao primeiro grau para que seja dado prosseguimento à ação penal, tendo em vista o reconhecimento da tipicidade aparente da conduta. Assim, dou provimento ao recurso do Ministério Público, determinando a baixa dos autos à vara de origem para que seja dado prosseguimento com a regular instrução do feito. Página 8 de 9

9 fls. 9 III - DISPOSITIVO Por estas razões, ACORDAM os Desembargadores integrantes da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade, em conhecer do recurso e, no mérito, dar-lhe provimento, tudo nos termos do voto do relator. Participaram da sessão e acompanharam o voto do Relator Excelentíssimos Senhores Desembargadores JOSÉ MAURICIO PINTO DE ALMEIDA, Presidente, sem voto, LÍDIO JOSÉ ROTOLI DE MACEDO e Excelentíssima Senhora Desembargadora LIDIA MAEJIMA. Curitiba, 21 de março de Des. JOSÉ CARLOS DALACQUA Relator Página 9 de 9