INFLUÊNCIA DA ADIÇÃO DE RESÍDUO DE GRANITO EM MASSA ARGILOSA USADA NA PRODUÇÃO DE TELHAS CERÂMICAS

Transcrição

1 INFLUÊNCIA DA ADIÇÃO DE RESÍDUO DE GRANITO EM MASSA ARGILOSA USADA NA PRODUÇÃO DE TELHAS CERÂMICAS A.S. Reis 1 ; V.P.Della-Sagrillo 2 ; F.R.Valenzuela-Diaz 3 Rua Raquel Madeli Vitalli, 150, Marista, Colatina-ES-cep 29707/870 - alessandrar@ifes.edu.br 1 IFES-Campus Colatina-ES; 2 IFES-Campus Vitória-ES; 3 PMT-EPUSP A incorporação de resíduo de granito na massa argilosa é uma alternativa de tornar o setor de rochas mais sustentável ambientalmente e ao mesmo tempo diminuir o consumo de matéria-prima argilosa. Este trabalho visa estudar a viabilidade técnica de adição do resíduo de granito em massa argilosa usada na produção de telhas cerâmicas. As amostras de resíduo de granito e de argila foram submetidas a ensaios de caracterização química, mineralógica e microestrutural. Amostras com teores de resíduo de granito variando entre 10% e 90% foram produzidas e queimadas em forno industrial à temperatura entre 800ºC e 900ºC durante 24 horas. As características tecnológicas avaliadas foram: absorção de água, porosidade aparente, massa específica aparente e resistência à flexão. Os resultados evidenciam que o comportamento das massas argilosas é influenciado pela caracterização do resíduo e da argila usados. O aumento no teor de resíduo diminuiu a absorção de água, porém o melhor resultado para a resistência mecânica ocorreu no teor de 10%. Palavras-chave: resíduo, resíduo de granito, cerâmica vermelha, telha cerâmica. INTRODUÇÃO A indústria de rochas ornamentais no Brasil vem se desenvolvendo ao longo dos anos e apresentando aumento significativo na produção. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Rochas Ornamentais - ABIROCHAS (1), cerca de 2,7 milhões de toneladas de rochas ornamentais foram exportadas em 2013, e a participação das rochas processadas no volume físico das exportações foi de 47%. 1687

2 O estado do Espírito Santo se destaca como principal produtor e maior processador e exportador de rochas ornamentais do Brasil, sendo responsável junto com os estado da região sudeste por 64,5% da produção brasileira de rochas (1). O processamento das rochas ornamentais gera resíduos que podem causar impactos ambientais indesejáveis principalmente se dispostos inadequadamente. Na serragem dos blocos de granito em teares de lâminas metálicas e no polimento das placas gera-se um resíduo, na forma de lama, que contém pó da rocha, água, cal e granalha de aço que auxiliam no processo do corte. A lama depois de seca torna-se um pó muito fino e devido à grande produção do setor representa um elevado volume. Em 2013, no Brasil, foram gerados 3,7 milhões de toneladas de resíduo no processamento das rochas (1). A reutilização do resíduo é uma forma de tornar o setor mais sustentável ambientalmente minimizando sua disposição em aterros industriais e até mesmo evitando a disposição inadequada, que pode causar contaminações no solo, ar e água. Na literatura, existem estudos sobre o uso do resíduo de granito em massas argilosas (2-9) com teores de adição variando de 5% a 60% (em massa) em cerâmica vermelha, em especial para telhas. Em geral, a viabilidade técnica de uso do resíduo foi baseada nos resultados de absorção de água, porosidade aparente e resistência mecânica em corpos de prova queimados na faixa de 800ºC a 1150ºC, as melhorias nas propriedades ocorreram numa faixa de teores de 10% a 40% de resíduo (2-9). Nesse sentido, este trabalho visa estudar a viabilidade técnica de adição do resíduo de granito em massa argilosa usada para a produção de telhas cerâmicas. MATERIAIS E MÉTODOS As amostras de argila e de resíduo de granito foram coletadas em pilha de armazenagem de matéria-prima em fábrica de cerâmica vermelha. Após a coleta, os materiais foram destorroados com almofariz, homogeneizados e quarteados. Parte do material foi destinada a ensaios de caracterização, e parte foi usada para confecção dos corpos de prova. A caracterização dos materiais foi feita através de: fluorescência de raios X (FRX) em espectrômetro Philips PW2400; difração de raios X (DRX) com fonte de cobre (radiação K α) em aparelho Philips X-PERT MPD e microscopia eletrônica de varredura (MEV) em microscópio eletrônico de varredura Philips XL

3 Com os materiais passados na peneira nº 80 da ABNT foram preparadas misturas de argila com resíduo de granito nos teores variando de 10% a 90% (em massa). Foram confeccionadas barras (Fig. 1) com dimensões de 20 mm x 60 mm x 5 mm por prensagem uniaxial em matriz de aço a 250 Kgf/cm² conforme metodologia de Souza Santos (10). As barras foram secas em estufa à 110ºC por 24h, e verificada a resistência à flexão, parte das barras foi queimada em forno industrial contínuo tipo túnel por 24h com temperatura na zona de queima entre 800ºC e 900ºC em fábrica de cerâmica vermelha. 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% (a) Barras secas (b) Barras queimadas Figura 1- Barras (rompidas à flexão) com teor de resíduo variando de 10% a 90% Após a queima, as barras foram submetidas à ensaios de absorção de água, porosidade aparente, massa específica aparente, resistência à flexão, retração linear de queima e perda de massa de acordo com Souza Santos (10). RESULTADOS E DISCUSSÃO Na análise química (Tab.1) pode-se verificar que a argila apresenta composição química característica de matéria-prima argilosa, com predominância de sílica e de alumina, com valores de 43,39% e 30,16% respectivamente. Esses teores situam-se nos intervalos de 43,2% a 77,6% para sílica e de 6,8% a 38% para alumina (10) e indicam a presença da caulinita. O óxido de ferro, com teor de 9,29%, confere a cor avermelhada após queima. O valor da perda ao fogo de 13,2% está situado no intervalo de 6% a 15,7%, estipulado por Souza Santos (10), específico para matérias-primas argilosas de cerâmica vermelha, indicando que a argila em questão possui matéria orgânica. Quanto à análise química do resíduo de granito, foi observado que é constituído predominantemente por sílica e alumina, evidenciando ser um material sílico-aluminoso. A presença dos óxidos alcalinos Na 2 O e K 2 O pode contribuir na queima das peças cerâmicas por serem óxidos fundentes. A presença de Fe 2 O 3 está 1689

4 associada à granalha de aço, e o CaO está associado à cal, ambos usados na lama. O resíduo possui baixo valor de perda ao fogo em relação à argila. Tabela 1 - Composição química por FRX da argila e do resíduo Composição dos óxidos (% em peso) SiO 2 Al 2 O 3 Fe 2 O 3 TiO 2 K 2 O MgO P 2 O 5 Na 2 O CaO BaO PF argila 43,39 30,16 9,29 1,39 1,25 0,62 0,12 0,17 0,24-13,2 resíduo 62,88 14,11 5,72 0,67 4,36 1,02 0,38 2,54 4,42 0,2 2,97 Nota: PF = perda ao fogo O difratograma de raios X da argila (Fig. 2) indica que o argilomineral predominante é a caulinita. A presença da caulinita no DRX corrobora com o resultado da FRX, pois em geral, a argila com elevado teor de Al 2 O 3 e baixo percentual de óxidos fundentes apresenta a caulinita como principal argilo mineral (9). Foram detectados também picos característicos da ilita, da goetita e do quartzo, o qual é uma forma cristalina da sílica, encontrada na análise química. Figura 2 Difratograma de raios X da argila No caso do resíduo, o DRX (Fig. 3) indica a presença de quartzo, feldspato, mica e calcita, minerais constituintes das rochas ornamentais (10). Figura 3 Difratograma de raios X do resíduo de granito 1690

5 A microscopia eletrônica nos materiais (Fig. 4) indica que os grãos apresentam formato delgado e lamelar, alguns dispersos e outros aglomerados com tamanhos dos grãos variando de 2 µm a 46 µm. (a) MEV argila x (b) MEV argila x (c) MEV resíduo x (d) MEV resíduo x Figura 4 - MEV da argila e do resíduo de granito As características cerâmicas obtidas nos corpos de prova são apresentadas na Tab. 2, que faz referência aos valores prescritos em Souza Santos (10). A resistência à flexão nos corpos de prova secos (até o teor de 70% de resíduo), a absorção de água e a massa específica aparente (ambas em todos os teores) atendem aos valores das argilas-padrão brasileiras (10). O teor de 10% de resíduo proporcionou maiores valores de resistências à flexão (à seco e após queima). A partir daí, com o aumento do teor de resíduo, as resistências à flexão, a perda de massa e a retração linear diminuíram seus valores. Logo, o resíduo colaborou na diminuição dos valores da perda de massa e da retração linear durante a queima. A adição do resíduo promoveu maior estabilidade dimensional às peças cerâmicas, corroborando com o trabalho de Taguchi et al. (9), o que pode resultar em redução de fissuras. Porém, a diminuição da retração abaixo do valor mínimo de referência (10), 2%, pode significar baixa densificação da peça e 1691

6 consequentemente maior porosidade e menor resistência, fato que ocorreu com as barras com o aumento do teor de resíduo. Os valores de absorção de água e de porosidade aparente diminuíram com o aumento do teor de resíduo evidenciando o efeito principal do resíduo de contribuir com a formação da fase vítrea e densificação da peça cerâmica. No limite de 60% de resíduo foram obtidos percentuais mínimos de absorção e de porosidade. A partir de 60% não houve mais preenchimento do resíduo nos poros existentes entre os grãos da argila, não havendo mais o empacotamento físico entre os grãos e a vitrificação esperada aumentando assim a porosidade. Comparando-se os valores obtidos na argila (teor de 0% de resíduo) com as misturas contendo o resíduo, observa-se que houve melhoria em todas as características exceto na resistência à flexão dos corpos queimados, o que confirma a benéfica atuação do resíduo de granito na massa argilosa. Tabela 2 Resultados das características cerâmicas PF AA PA MEA R LQ σ FS Teor resíduo (%) (%) (%) (%) (g/cm³) (%) (MPa) σ FQ (MPa) 0 12,16 24,17 39,33 1,63 1,74 1,36 3, ,19 23,15 38,85 1,68 1,33 1,44 3, ,02 23,11 38,40 1,66 1,32 1,34 3, ,27 23,09 38,28 1,66 0,99 1,29 2, ,57 22,63 38,13 1,68 0,78 1,26 2, ,63 22,44 37,76 1,68 0,38 1,25 1, ,62 21,90 37,23 1,70 0,32 1,01 1, ,57 24,50 39,71 1,62 0,21 0,56 0, ,18 24,57 39,71 1,62 0,17 0,40 0, ,65 24,05 39,21 1,63 0,02 0,46 0,87 Referência (10) ,5 a 2,0 2 a 17* 0,5 a 7,0 6,0 Nota: PF=perda de massa à queima ; AA=absorção de água; PA=porosidade aparente; MEA=massa específica aparente; R LQ = retração linear após queima; σ FS = resistência à flexão após secagem; σ FQ = resistência à flexão após queima. Nota:*valores para argila caulinítica. CONCLUSÕES A caracterização química e mineralógica da argila usada como matéria-prima em fábrica de cerâmica estrutural no ES demonstrou ser predominante caulinítica, contendo teores de quartzo e de ferro adequados. A argila e o resíduo de granito 1692

7 podem ser considerados materiais sílico aluminosos; no resíduo ainda existem os óxidos fundentes que podem auxiliar no processo de queima da massa argilosa. Os valores encontrados para tensão de ruptura à flexão após secagem (até 70% de resíduo), absorção de água e massa específica aparente atendem aos valores das argilas-padrão brasileiras para uso em cerâmica vermelha encontrados na literatura; já a porosidade aparente e a resistência à flexão após queima não atendem aos limites. Com o estudo pode-se concluir que o resíduo de granito influencia principalmente na formação da fase vítrea da peça cerâmica, diminuindo a absorção de água, obtendo-se a maior densificação com 60% de resíduo, inclusive comparando-se aos valores obtidos na massa argilosa sem resíduo; entretanto o melhor resultado na resistência à flexão foi obtido para amostra com 10% de resíduo. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao IFES e à USP/PMT. REFERÊNCIAS (1) Associação Brasileira da Indústria de Rochas Ornamentais. Balanço das exportações e importações brasileiras de rochas ornamentais em Inf. 01/2014. SP Disponível em: 6/17/3050/Informe_01_2014.pdf. Acesso em: 15 ago (2) NEVES, G. A. Reciclagem de resíduos da serragem de granitos para uso como matéria-prima cerâmica f. Tese (Doutorado em Engenharia de Processos) Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Processos, Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande/Paraíba, (3) MOREIRA, J. M. S.; FREIRE, M. N.; HOLANDA, J. N. F. Utilização de resíduo de serragem de granito proveniente do Espírito Santo em cerâmica vermelha. Revista Cerâmica. v. 49, p , São Paulo, (4) VIEIRA, C. M. F.; PEÇANHA, L. A.; MONTEIRO, S. N. Efeito da incorporação de resíduo de serragem de granito em massa de cerâmica vermelha. Vértices. Ano 5, n.3, p , set/dez (5) SILVA, J. B.; HOTZA, D.; SEGADÃES A. M. ; ACCHAR, W. Incorporation of marble and granite sludge in clay materials. Cerâmica. v. 51, p , S. P.,

8 (6) ACCHAR, W.; VIEIRA, F.A; HOTZA, D. Effect of marble and granite sludge in clay materials. Materials Science and Engineering. v.419, n.1-2, p , (7) MANHÃES, J.P.V.T.; MOREIRA, J.M.S.; HOLANDA, J.N.F. Variação microestrutural de cerâmica vermelha incorporada com resíduo de rocha ornamental. Cerâmica. V.55, p , São Paulo, (8) RODRIGUES, D.V.; XAVIER, G.C.; SABOYA, F.; MAIA, P.C.A.; ALEXANDRE, J. Durabilidade de peças cerâmicas vermelhas com adição de rejeito de rochas ornamental isenta de granalha. Cerâmica. V.58, p ,são Paulo,2012. (9) TAGUCHI, S.P.; SANTOS, J.C.; GOMES, T.M.; CUNHA, N.A. Avaliação das propriedades tecnológicas de cerâmica vermelha incorporada com resíduo de rocha ornamental proveniente do tear de fio diamantado. Cerâmica, v.60, p ,2014. (10) SOUZA SANTOS, P. Tecnologia das argilas. v.1-2. SP: Edgard Blucher, INFLUENCE OF THE ADDITION OF DIMENSION STONES WASTE IN CLAYEY MASS USED IN THE ROOF TILES PRODUCTION ABSTRACT Incorporation of granite waste in the clayey mass is an alternative to make the stone sector more environmentally sustainable while reducing the consumption of clayey raw material. This work aims to study the technical feasibility of granite waste addition in clayey mass used in the roof tiles production. Samples of granite waste and clay were tested for chemical, mineralogical and microstructural characterization. Samples containing granite waste contents, varying from 10% to 90%, were produced and burned in a kiln at a temperature between 800 C and 900 C for 24 hours. The technological features evaluated were: water absorption, apparent porosity, bulk density and flexural strength. The results show that the behavior of clayey masses is influenced by the characterization of the waste and clay used. The increase in the content of waste decreased the water absorption, but the best result for the mechanical strength occurred at the content of 10%. Key-Words: waste, dimension stone waste, structural ceramic, ceramic roof tile. 1694