Características do trabalho e Transtornos Mentais Comuns entre trabalhadores informais

Transcrição

1 Cândido Portinari: Siembra de café (1935) Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia-UESB Universidade Estadual de Feira de Santana-UEFS Núcleo de Epidemiologia-NEPI/UEFS Características do trabalho e Transtornos Mentais Comuns entre trabalhadores informais Ana Cláudia Conceição da Silva Tânia Maria de Araújo Mercado Ambulante I (1953), Manuel Alves Neto

2 INTRODUÇÃO

3 Crescimento do número de postos de trabalho informais no Brasil Novo padrão de adoecimento dos trabalhadores Reestruturação Produtiva Heterogeneidade da estrutura ocupacional

4 As facetas da metamorfose do trabalho Processo de Reestruturação Produtiva Redefinição dos padrões de saúde doença no campo da saúde dos trabalhadores

5 As facetas da metamorfose do trabalho Padrões de saúde-doença SAÚDE MENTAL TRANSTORNOS MENTAIS COMUNS

6 Características do trabalho Saúde mental e trabalho informal: desvelando seus laços ASPECTOS PSICOSSOCIAIS DO TRABALHO Modelo Demanda-Controle Robert Karasek Demanda psicológica; Controle do trabalhador sobre o próprio trabalho.

7 Modelo Demanda-Controle

8 Transtornos Mentais Comuns Saúde mental e trabalho informal: desvelando seus laços TRANSTORNOS MENTAIS COMUNS Inclui sinais e sintomas como: insônia irritabilidade fadiga ansiedade esquecimento dificuldade de concentração Goldberg & Huxley (1992)

9 OBJETIVO DO ESTUDO

10 Avaliar associação entre aspectos psicossociais do trabalho no setor informal, e a ocorrência de Transtornos Mentais Comuns.

11 MATERIAIS E MÉTODOS

12 Desenho de estudo Projeto-mãe: Distúrbios Psíquicos Menores: estimativas de prevalência e validação de instrumento diagnóstico (SRQ- 20) Estudo de corte transversal

13 PLANO AMOSTRAL E SELEÇÃO DOS INDIVÍDUOS Estimativas para cálculo do tamanho da amostra Prevalência de TMC: 25%; Erro amostral: 3%; Intervalo de Confiança: 95%; Recusas e perdas: 20%; 800 indivíduos dobrou-se o tamanho em função do efeito do desenho do estudo + 20% perdas 1920 indivíduos com 15 anos ou mais de idade

14 PLANO AMOSTRAL E SELEÇÃO DOS INDIVÍDUOS SETORES censitários Ruas Subdistritos Domicílio (Unidade Amostral)

15 CAMPO DO ESTUDO Zona urbana do município de Feira de Santana - Ba

16 POPULAÇÃO DE ESTUDO Os trabalhadores da zona urbana do município de Feira de Santana Ba 15 anos de idade Sem carteira de trabalho assinada

17 POPULAÇÃO DE ESTUDO VERIFICAÇÃO DO PODER PARA AVALIAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO ESTUDADA Freqüência esperada dos expostos 36,4% Freqüência esperada dos não-expostos 21,9% Intervalo de confiança 95% Poder 80% n amostral 334 indivíduos

18 POPULAÇÃO DE ESTUDO Fluxograma da população estudada. Feira de Santana-Ba, 2002.

19 INSTRUMENTO DE PESQUISA Ficha domiciliar Questionário (12 blocos) características sócio-demográficas características do trabalho aspectos psicossociais do trabalho avaliação da saúde mental

20 INSTRUMENTO DE PESQUISA ASPECTOS PSICOSSOCIAIS DO TRABALHO Job Content Questionnaire JCQ (49 questões) Karasek et al, 1998; Araújo, 2000; Pelfrene et al, 2003;Araújo et al, 2003b;Fisher et al, 2005

21 INSTRUMENTO DE PESQUISA SAÚDE MENTAL (TMC) Self Reporting Questionnaire SRQ-20 (20 questões)

22 INSTRUMENTO DE PESQUISA SAÚDE MENTAL (TMC) Self Reporting Questionnaire SRQ-20 1,00,75 Ponto de corte: 6/7 Sensibilidade,50,25 Sensibilidade: 70% Especificidade: 70% 0,00 0,00,25,50,75 1, Especificidade

23 DEFINIÇÃO DAS VARIÁVEIS DE ESTUDO Variáveis independentes: controle sobre a atividade desenvolvida e a demanda psicológica Dicotomização: Controle (baixo/alto) Demanda (baixa/alta)

24 DEFINIÇÃO DAS VARIÁVEIS DE ESTUDO Variável dependente: Transtornos Mentais Comuns Co- variáveis: sexo, idade, situação conjugal, nível de escolaridade, carga horária, renda.

25 MODELO DE PREDIÇÃO

26 ANÁLISE DOS DADOS 1. Caracterização da população Aspectos sociodemográficos; Aspectos ocupacionais; Aspectos psicossociais do trabalho; Padrão de ocorrência dos TMC.

27 ANÁLISE DOS DADOS 2. Análise estratificada Objetivo: Divisão dos dados em estratos; Avaliar e descrever os modificadores de efeito; Avaliar e ajustar os confundidores. ROTHMAN (1986)

28 ANÁLISE DOS DADOS 3. Análise multivariada Objetivo: Avaliar simultaneamente um determinado número de variáveis (potenciais confundidoras); Regressão Logística Múltipla - RLM. HENNEKENS (1987)

29 ANÁLISE DOS DADOS Utilização do software SPSS (Statistical Package for Social Sciences) versão 9.0 for Windows; The R Foudation for Statistical Computing Version ; Epi Info Version 6.04.

30 ASPECTOS ÉTICOS DA PESQUISA Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa envolvendo Seres Humanos, Resolução CNS 196/96.

31 RESULTADOS

32 RESULTADOS Prevalência global de TMC 27,9

33 RESULTADOS Tabela 1 Prevalência (%) de Transtornos Mentais Comuns segundo variáveis sociodemográficas entre os trabalhadores informais. Feira de Santana Ba, Brasil, Variáveis N n P(%) RP IC95% Valor de p Sexo Feminino ,6 1,76 (1,55 2,00) 0,000 Masculino ,5 * - - Nível de escolaridade Analfabeto ,8 2,36 (1,60 3,48) 0,000 Ens. Fundamental ,4 1,44 (1,27 1,63) 0,000 Ens. médio/graduação ,9 * - - Faixa etária Até 20 anos ,3 * a 30 anos ,5 1,59 (1, ) 0, a 40 anos ,4 1,63 (1,09 2,44) 0,013 >40 anos ,8 1,44 (0,97 2,15) 0,064 Situação conjugal Casad/União estável ,2 1,10 (0,86 1,42) 0,431 Solt / ,6 * - - Viúvo/Div/Disq/Sep ,3 1,42 (1,00 2,00) 0,057 Chefia de família Sim ,1 0,77 (0,59 1,00) 0,048 Não ,9 * - - Renda Até 1SM ,3 1,27 (1,17-1,38) 0,000 >1 a 2SM ,0 1,26 (1,11 1,42) 0,003 >2S a 4SM ,8 1,14 (0,90 1,45) 0,341 > 4SM ,1 * - - Migração Sim ,6 0,76 (0,39 1,48) 0,424 Não ,3 * - -

34 RESULTADOS Tabela 2 Prevalência (%) de Transtornos Mentais Comuns segundo variáveis ocupacionais. Feira de Santana Ba, Brasil, Variáveis N n (%) RP IC95% Valor de p Ramo de atividade Serviços domésticos ,7 5,41 (1,80 16,21) 0,000 Construção civil ,0 3,40 (1,05 11,06) 0,024 Ind. Manufatureira ,1 1,37 (0,33 5,67) 0,482 Comércio ,5 3,23 (1,08 9,66) 0,013 Transporte* ,8 - * - Ensino ,0 4,08 (1,23 13,55) 0,011 Outros serviços ,3 2,30 (0,75 7,01) 0,112 Tipo de trabalho Regular ,5 * - - Temporário ,2 1,11 (0,80 1,55) 0,522 Sazonal ,4 1,30 (0,65 2,62) 0,453 Carga horária Até 8 horas ,5 * - - > 8 horas ,9 0,79 (0,63 0,99) 0,040 Total de dias de trab semanal Até 4 dias ,8 * a 6 dias ,4 0,78 (0,59 1,04) 0,094 7 dias ,3 0,81 (0,59 1,11) 0,194

35 RESULTADOS Tabela 3 Prevalência (%) de Transtornos Mentais Comuns segundo hábitos de vida entre trabalhadores informais. Feira de Santana Ba, Brasil, Variáveis N n P(%) RP IC95% Valor de p Atividades de lazer Sim ,3 - * - Não ,1 1,88 (1,51 2,35) 0,000 Consumo de bebida alcoólica Sim ,2 0,83 (0,66 1,04) 0,098 Não ,5 - * - Hábito de fumar Sim ,2 1,49 (1,16 1,90) 0,002 Não ,7 - * -

36 RESULTADOS Tabela 4 Prevalência (%) de Transtornos Mentais Comuns segundo sobrecarga doméstica entre trabalhadores informais. Feira de Santana Ba, Brasil, Variável N n (%) RP IC95% Valor de p Sobrecarga doméstica Baixa ,5 - * - Média ,7 2,04 (1,58 2,62) 0,000 Alta ,5 2,60 (1,98 3,40) 0,000

37 RESULTADOS Tabela 5 Prevalência (%) de Transtornos Mentais Comuns entre trabalhadores informais segundo Aspectos psicossociais do trabalho. Feira de Santana Ba, Brasil, Aspectos psicossociais do trabalho (%) RP IC95% Baixa exigência+ (? controle e? demanda) 21,9 * - Trabalho passivo (? controle e? demanda) 30,5 1,39 (0,98 1,98) Trabalho ativo (? controle e? demanda) 26,0 1,19 (0,84 1,68) Alta exigência (? controle e? demanda) 36,4 1,66 (1,20 2,30) * grupo referência

38 RESULTADOS Tabela 6 Estimativa do modelo selecionado na análise de RLM. Feira de Santana Ba, Brasil, Variáveis β Erro-padrão de β Valor de p Exp (β) Alta exigência (HST) 0,776 0,243 0,002 2,150 Trabalho ativo (ACT) 0,331 0,242 0,171 1,393 Trabalho passivo (PAS) 0,431 0,253 0,088 1,539 Faixa etária (IDADDIC) 0,046 0,189 0,810 0,955 Sexo (SEXO) 1,260 0,182 0,000 3,526 Constante -2,001 0,247 0,000 0,135

39 RESULTADOS Modelo final obtido: Logito (TMC) = β 0 + β 1 HST + β 2 ACT + β 3 PAS + β 4 IDADDIC + β 5 SEXO

40 RESULTADOS Tabela 7 Razões de Prevalência ajustadas e intervalos de confiança (95%) entre aspectos psicossociais do trabalho e transtornos mentais comuns. Feira de Santana Ba, Brasil, Aspectos psicossociais do trabalho Alta exigência Trabalho ativo Trabalho passivo Baixa exigência RP (IC 95%) RP (IC 95%) RP (IC 95%) Referente Modelo 1** 1,66 (1,20 2,30) 1,19 (0,84 1,68) 1,39 (0,98 1,98) 1,0 Modelo 2 *** 1,54 (1,25 1,89) 1,18 (0,91 1,46) 1,25 (1,01 1,56) 1,0 ** bruto *** ajustado por sexo e idade

41 RESULTADOS Diagnóstico do modelo (1) Teste de Hosmer & Lemeshow p = 0,143 (3) Gráfico diagnóstico de influência (2) Curva ROC do modelo estudado 1,00 ROC Curve,75,50 Sensitivity,25 0,00 0,00,25 Área = 0,684,50,75 1, Specificity Diagonal segments are produced by ties.

42 DISCUSSÃO

43 DISCUSSÃO Causalidade reversa; Limitações do estudo: Efeito do trabalhador sadio; A lacuna existente na literatura acerca da avaliação principal estudada entre trabalhadores informais pode ter comprometido a obtenção de parâmetros de comparação similares à população estudada.

44 Sexo e TMC: DISCUSSÃO A prevalência de TMC entre as mulheres foi maior que entre os homens. As condições neuropsiquiátricas são a segunda causa de adoecimento para as mulheres. OMS (2001) As mulheres tem duas ou três vezes mais risco de TMC que os homens. OMS (2001a)

45 DISCUSSÃO Nível de escolaridade e TMC: Grande absorção de força de trabalho em ocupações, cujas relações de trabalho são frágeis e precarizadas; Submissão em quaisquer condições para atender as necessidades individuais e coletivas.

46 DISCUSSÃO Renda mensal e TMC: Oferta de salários baixos e renda mensal instável nos postos de trabalho informal; Sugere-se a possível causalidade reversa (TMC Renda baixa). Segundo o PNAD, no Nordeste a proporção de indivíduos com renda até 1 salário mínimo mensal é 60% a mais que o observado no Brasil. IBGE (2006)

47 DISCUSSÃO Hábito de fumar e TMC: Os achados podem ser decorrentes de outros fatores associados aos TMC; Segundo a OPAS, os pobres fumam mais; Segundo a OMS a pobreza está associada aos TMC. Possivelmente existe uma linha causal entre estas exposições e os TMC

48 DISCUSSÃO Sobrecarga doméstica e TMC: A sobrecarga doméstica alta contribui para a elevada prevalência de TMC entre os trabalhadores informais; A dupla jornada de trabalho pode estar contribuindo para potencializar as exigências de determinadas atividades; Cuidar de crianças, cuidar da limpeza, cozinhar, lavar e passar roupas imprimem uma maior carga de trabalho.

49 DISCUSSÃO Aspectos psicossociais do trabalho e TMC: As novas formas de vida e os novos modos de produção indicam mudanças nos fatores estressores; Os aspectos organizacionais aparecem como fatores potenciais para o processo saúde-doença mental; Alta demanda psicológica e baixo controle sobre o trabalho (alta exigência); Baixo controle e baixa demanda (trabalho passivo). Fatores de risco para os TMC

50 DISCUSSÃO Aspectos psicossociais do trabalho e TMC: Não foi encontrado outro estudo que avaliasse a associação estudada entre trabalhadores informais, o que impossibilitou parâmetros de comparação similares. Araújo et al (2003); Porto et al (2006); Doef & Maes (1999); e O Connor et al (2000) encontraram associação entre demanda e controle sobre o trabalho e TMC.

51 CONSIDERAÇÕES FINAIS

52 Faz-se necessária a adoção de medidas, através da sistematização e operacionalização da atenção à saúde do trabalhador e saúde mental; Salienta-se também, a importância de investigações futuras acerca da realidade do trabalho informal, na tentativa de desvelar a relação entre as dimensões psicossociais do trabalho e TMC;

53 Os TMC constituem-se num problema de Saúde Pública; Emerge como elemento de reflexão, o papel dos atores sociais frente a construção e monitoramento das políticas de saúde do trabalhador e saúde mental em nosso pais;

54 A atuação intersetorial, capaz de fornecer subsídios para implantação e implementação de equipamentos sociais coletivos, serviços de saúde especializados e atuantes, e ambientes e processos de trabalho salubres.

55 (...) Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou, desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso que me alegra, montão (...) (Guimarães Rosa, 1984, p.21)