TRIBUNAL DE JUSTIÇA DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL

Transcrição

1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL Apelação Cível nº Apelante: Fabiana Machado Shelton Apelado (1): Via BR Turismo e Eventos Ltda Apelado (2): Copa Companhia Panameña de Aviación S/A Relator: Des. Elton M. C. Leme R E L A T Ó R I O de fls Adota-se, na forma regimental, o relatório lançado na sentença Trata-se de ação de reparação de danos sob o rito ordinário, ajuizada por Fabiana Machado Shelton em face de Via BR Turismo e Eventos Ltda e Copa Companhia Panameña de Aviación S/A, alegando que contratou pacote de viagem junto à ré, para viajar com seu namorado, que é estrangeiro, para a República Dominicana. Diz que enviou os passaportes à ré para conferência, que garantiu estar tudo certo. Iriam de São Paulo ao Panamá e de lá para a República Dominicana, sendo que foram retirados do avião no Panamá, pois o passaporte do namorado da autora estava sem o visto para seguir viagem. Ficaram três horas no aeroporto esperando até serem conduzidos para a Delegacia de Polícia, tentando acionar a primeira ré, sem êxito. Só no dia seguinte conseguiram falar com a agência, que ofereceu outro pacote, a Cuba, mas o pacote era limitado (não incluía transporte, alimentação). Diante do exposto, pede a condenação da ré ao pagamento de cem salários mínimos bem como o pagamento de todas as despesas realizadas na viagem que estavam incluídas no pacote anterior.

2 Contestação da segunda ré a fls , arguindo preliminar de ilegitimidade ativa e falta de pedido certo e determinado. No mérito, argumenta que o transporte aéreo é regulamentado pela Convenção de Montreal. Argumenta a culpa exclusiva da autora, que interrompeu a viagem para acompanhar seu namorado, e dele, por não estar com a documentação requerida. Defende a inexistência de dano moral e requer a improcedência dos pedidos. A primeira ré ofereceu resposta a fls Argúi inicialmente a ilegitimidade passiva e pede a denunciação da lide à agência de turismo com a qual foram firmados os contratos e seguro do pacote. No mérito, afirma tratar-se de aventura jurídica da autora, salientando que não pode responder por serviços de outra empresa. Impugna os pedidos formulados, requerendo a improcedência. A sentença de fls julgou improcedentes os pedidos, pois a autora não comprovou a obrigação da ré de tirar o visto. Condenou a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, observando a gratuidade de justiça deferida. A autora apelou a fls , argumentando que ela e seu namorado são hipossuficientes tecnicamente na relação jurídica, sendo certo que a ré informou a desnecessidade de visto, sem indicar expressamente que a dispensa era só para brasileiros. Argumenta ter sofrido humilhação por ter sido retirada da aeronave. Sustenta a necessária observância ao caráter punitivo da indenização por dano moral. Pleiteia, nesses termos, a reforma da sentença.

3 desprovimento do recurso. Contrarrazões da primeira ré a fls , pugnando pelo sentença. Contrarrazões da segunda ré a fls , prestigiando a É o relatório. À douta revisão. Rio de Janeiro, 22 de agosto de Des. Elton M. C. Leme Relator

4 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL Apelação Cível nº Apelante: Fabiana Machado Shelton Apelado (1): Via BR Turismo e Eventos Ltda Apelado (2): Copa Companhia Panameña de Aviación S/A Relator: Des. Elton M. C. Leme APELAÇÃO. CONSUMIDOR. FALTA DE VISTO PARA VIAGEM. FALHA NA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÃO ADEQUADA E CLARA. RESPONSABILIDADE QUE CABIA À AGÊNCIA DE TURISMO. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. 1. Trata-se de relação de consumo, respondendo o fornecedor objetivamente pelos danos que causar em decorrência dos defeitos dos serviços que presta, independentemente da perquirição de culpa, nos termos do art. 14 1º, da Lei nº 8.078/ A agência de turismo que vendeu o pacote turístico responde pela deficiência das informações prestadas ao consumidor quanto às formalidades para ingresso em país estrangeiro ao qual se destinava a viagem, especialmente no tocante à necessidade de visto consular. 3. A violação do dever de prestar informação adequada e clara ao consumidor (art. 6º, III do CDC) configura falha no serviço prestado pela agência de turismo. 4. Entretanto, a responsabilidade pela deficiência de informação não pode ser atribuída à empresa aérea, já que não contribuiu direta ou indiretamente para o ocorrido. 5. O dano moral decorrente da frustração de sonhada viagem do casal é in re ipsa, decorrente da própria potencialidade lesiva da conduta. 6. A falta de prova do

5 dano material conduz à improcedência de tal pedido. 7. Provimento parcial do recurso. ACÓRDÃO VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº , julgada na sessão de 14/09/2011, originária da 35ª Vara Cível da Comarca da Capital, em que é apelante Fabiana Machado Shelton e apelados (1) Via BR Turismo e Eventos Ltda e (2) Copa Companhia Panameña de Aviación S/A. ACORDAM, por unanimidade de votos, os Desembargadores que compõem a Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do relator. ACÓRDÃO apresentado na data da sessão. V O T O Cuida-se de pretensão indenizatória deduzida por consumidora que teve sua viagem de final de ano frustrada diante da falta de visto de seu namorado para ingresso no local de destino.

6 A tese é de que, como consumidora, a autora é hipossuficiente técnica na relação jurídica apresentada, de forma que cabia às rés a informação adequada acerca da documentação necessária à viagem. Trata-se de relação de consumo, em que a prestação de serviço está vinculada às normas cogentes do Código de Defesa do Consumidor, que em seu artigo 14, 3º, estabelece as hipóteses de exclusão da responsabilidade do fornecedor de serviço, respondendo o fornecedor objetivamente pelos danos que causar em decorrência dos defeitos dos serviços que presta, independentemente da perquirição de culpa, nos termos do art. 14 1º, da Lei nº 8.078/90. Para a configuração da responsabilidade objetiva, baseada no risco da atividade, basta que haja demonstração do fato, do dano e do nexo causal, não havendo que se cogitar do elemento culpa, somente sendo afastada tal responsabilidade em razão de fato exclusivo da vítima ou de terceiros, ou, ainda, pela inexistência de defeito na prestação do serviço. Consumidor que: Com efeito, dispõe o art. 6º do Código de Defesa do Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

7 Depreende-se que a norma impõe ao fornecedor o dever de prestar informação clara e adequada sobre os serviços postos à disposição do consumidor, a respeito dos limites e das restrições que gravitam sobre o contrato, conforme ensina a doutrina: trata-se do dever de informar bem o público consumidor sobre todas as características importantes de produtos e serviços, para que aquele possa adquirir produtos, ou contratar serviços, sabendo exatamente o que poderá esperar deles. (GRINOVER, Ada Pelegrini e outros. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense. 9ª ed. 2007, pág. 146). Assim, falha o fornecedor de serviços ao vender pacote turístico sem informar correta e adequadamente aos consumidores os requisitos para ingresso e permanência no local de destino, o que impediu, na hipótese, que a autora usufruísse dos serviços contratados, inclusive da passagem aérea adquirida. A esse respeito, convém transcrever o julgado a seguir, promanado deste Tribunal de Justiça: CIVIL E CONSUMIDOR. VIAGEM DE FÉRIAS. AGÊNCIA DE VIAGEM. DEFEITO NA PRESTAÇAO DO SERVIÇO. Viagem de férias frustrada. Falta dos vistos dos passageiros para ingresso na cidade de Moscou. Passageiros retidos na imigração e deportados. Compromisso assumido e não cumprido pela Agência de viagem. Responsabilidade solidária entre esta e a operadora de turismo. Dever de indenizar. Transtornos e aborrecimentos causados em razão

8 da má prestação de serviços da empresa de viagem que não teve o cuidado na contratação dos serviços prestados aos viajantes. Defeito na prestação do serviço bem reconhecido. Reparação moral arbitrada em R$ ,00 (vinte e cinco mil reais) para cada passageiro que se mostra adequada a compor os danos sofridos. Sentença que nesse sentido apontou, incensurável, improvimento aos recursos que pretendiam revertê-la. Unânime. ( APELAÇÃO - DES. MARILIA DE CASTRO NEVES - Julgamento: 07/04/ DÉCIMA CÂMARA CÍVEL) A venda de pacote turístico a quem não pode usufruir do serviço, diante a ausência de visto, é evidentemente uma frustração que supera e muito o mero aborrecimento. Por outro lado, a autora não contratou diretamente com a ré Copa Companhia Panameña de Aviación S/A, de forma que cabia apenas à agência, com antecedência necessária, informar acerca das exigências para ingresso nos locais de destino, tarefa esta que não pode ser imputada à empresa aérea quer direta, quer indiretamente, inexistindo, nesse ponto, solidariedade entre as empresas prestadoras de serviço. Quanto à ausência da prova do dano moral, vale ressaltar que a jurisprudência é pacífica no sentido de não se exigir tal comprovação, diante da impossibilidade de se aquilatar o elemento subjetivo que a compõe. Basta, portanto, a potencialidade lesiva do ato ilícito para caracterizar o dano in re ipsa, pelo que restaram reconhecidos os fatos geradores do dano.

9 Uma vez reconhecidos os fatos geradores do dano, que aqui restaram patenteados, passa-se à questão do seu arbitramento. O princípio da razoabilidade determina que o valor arbitrado deve guardar proporcionalidade ao fato, redundando logicamente deste, e não deve, em contrapartida, apresentar caráter insignificante em face das características econômicas do causador dos danos e nem constituir fonte de lucro. Assim sendo, os danos morais assumem a importante função preventiva de, como verdadeira sanção civil, evitar que episódios semelhantes se repitam. Tendo em conta o evento e as circunstâncias fáticas, bem como a capacidade financeira das partes envolvidas, considero moderado o valor de R$ 5.000,00. A autora não comprovou que a falha na prestação dos serviços tenha lhe acarretado prejuízos materiais, gastos além do esperado para uma viagem internacional, devendo ser destacado que, apesar de não ter ido à República Dominicana, seu pacote foi substituído por viagem a Cuba, não havendo assim efetivo prejuízo econômico. Portanto, o pedido de indenização por dano material não merece ser acolhido. Por tais fundamentos, voto no sentido de dar parcial provimento ao recurso, para julgar parcialmente procedente o pedido e condenar a primeira ré ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de juros de mora de 1% ao mês desde a citação e corrigido monetariamente a contar da presente data. Diante

10 da sucumbência, as custas processuais serão rateadas entre a parte autora e a parte sucumbente, sendo que cada qual arcará com o pagamento dos honorários de seus respectivos patronos, observada a gratuidade de justiça, ficando mantida a improcedência da ação em relação à segunda ré. Rio de Janeiro, 14 de setembro de Des. Elton M. C. Leme Relator Certificado por DES. ELTON LEME A cópia impressa deste documento poderá ser conferida com o original eletrônico no endereço Data: 16/09/ :49:28Local: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Processo: Tot. Pag.: 10