A Importância da Observação e Manutenção Periódicas para Garantir a Eficácia de Obras de Estabilização de Taludes Naturais: Um Caso Concreto
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- Elza Camelo Quintão
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1 A Importância da Observação e Manutenção Periódicas para Garantir a Eficácia de Obras de Estabilização de Taludes Naturais: Um Caso Concreto Faiçal Massad e Milton Assis Kanji Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, Brasil Homero. A. Araújo Filho, Paulo Pena e Antônio Carlos Cachonis Petrobrás S. A., RPBC, RESUMO: O trabalho apresenta o caso de um talude com cerca de 100 m de altura, que foi submetido a um corte parcial em meados da década de 1970, em Cubatão (SP). Durante o verão de , o talude sofreu algumas instabilizações, que foram sanadas através de técnicas apropriadas e em uso na época. No início de 2005, durante intensas e prolongadas chuvas, houve uma reativação de algumas das antigas instabilizações. O trabalho mostra que essa reativação ocorreu face: a) à deterioração de partes das obras originais de estabilização; e b) à perda do histórico dos eventos pretéritos e do conceito das obras executadas. Destaca a importância de um Manual de Observação e Manutenção das Obras Executadas, com a prescrição de inspeções periódicas, e revela que seria possível antever as instabilizações se tivesse havido um acompanhamento com fotos aéreas tiradas periodicamente; ou mesmo um acompanhamento através do google earth, por exemplo. PALAVRAS-CHAVE: Talude Natural, Estabilização, Observação e Manutenção, Fotos Aéreas. 1 INTRODUÇÃO No início da década de 1970 foi executada uma terraplenagem no pé da Serra do Mar, em Cubatão (SP), para possibilitar a instalação de tanques de óleo de uma refinaria (Foto 1). Este serviço envolveu o corte parcial de um talude natural, até metade de sua altura, de mais de 100m. Após o corte, o talude ficou com inclinação de 1(V):1,2(H), 4 bermas, uma a cada 10 m, com cerca de 2,5 m de largura. As intensas chuvas de verão de 1974/76 provocaram trincas, pequenos escorregamentos em alguns pontos do talude principal e uma movimentação excessiva de massa de solo num talude lateral, em frente ao Tanque P 121-B. Para a estabilização recorreu-se a técnicas de uso corrente na época: terraceamento em degraus, com linhas de escoras de madeira; impermeabilização superficial com material betuminoso; drenagem superficial e profunda; e um muro atirantado em frente ao tanque. As sondagens disponíveis, feitas no talude principal, uma na cota 130 e a outra em torno da cota 70, indicaram a ocorrência de silte arenoso compacto a muito compacto (solo residual de gnaisse e micaxisto), de elevada resistência (SPTs>30, em geral). Talude Lateral Muro de Arrimo P121-B Foto 1: Talude da Área NW Flare (El. 140) Talude Principal Av. Perimetral El 40
2 Decorridos 30 anos, houve deterioração de partes das obras originais de estabilização, apesar de terem sido bem concebidas e bem executadas. Como decorrência, em fevereiro de 2005, após chuvas intensas e prolongadas, houve uma reincidência dos mesmos fenômenos de instabilização do talude de corte. O trabalho mostra a necessidade de preservar na memória o histórico dos eventos pretéritos e o conceito das obras. Daí a importância de um Manual de Observação e Manutenção das Obras Executadas, com um plano de inspeções periódicas e leituras dos instrumentos de observação, quando existentes. Daí também a necessidade de um entrosamento entre o pessoal técnico e o de manutenção das instalações, o que nem sempre existe, principalmente quando se trata de empresa voltada para uma atividade fim industrial. Mostra também que um acompanhamento com fotos aéreas periódicas ou de satélites é hoje possível e desejável. 2 AS INSTABILIZAÇÕES DE 1974/76 Durante as chuvas de 1974/75, a área foi sede de movimentações, que levaram à impermeabilização de partes do talude e à execução de trincheiras drenantes superficiais, preenchidas por areia. Tais medidas fizeram com que cessassem as movimentações até o verão de 1976, quando ocorreram muitas trincas e pequenos escorregamentos, entre as cotas 70 e 130 do talude principal. Outros pequenos escorregamentos foram registrados mais abaixo, causados pelo represamento da água infiltrada, junto ao pé do talude, onde o revestimento estava intacto. Além disso, no talude lateral esquerdo houve uma movimentação excessiva de uma massa de solo, que chegou a provocar um levantamento de cerca de 3 a 6 cm da base do Tanque P 121- B (Foto 1), em início de construção. Nessa época foram feitas as seguintes obras de estabilização: a) um sistema de drenagem superficial, constituído de canaletas de concreto e escada d água; b) um conjunto de drenos horizontais profundos; c) novas valetas preenchidas por areia (trincheiras drenantes); d) um muro de arrimo atirantado, em frente ao Tanque P121-B; e e) o recobrimento de toda a área com material betuminoso. Os pequenos escorregamentos foram estabilizados com Local do Escorregamento Superficial de Fev/2005 Massa em Creep El a. Berma 3 a. 2 a. 1 a. El. 40 Av. Perimetral Oeste Muro de Arrimo P 121-B P 121-B Foto 2: Talude da Área NW Foto Aérea de Junho de 2001
3 Foto 3: Vista lateral do escorregamento superficial de Fev/2005 Foto 4: Crista do escorregamento superficial (Fev/2005), lado direito linhas de escoras de madeira, em vários níveis, formando pequenos degraus. Entre as cotas 70 e 130 foram instalados 2 inclinômetros, já que a preocupação principal era com a segurança do Flare, na El. 140 (Foto 1). A grande obra de estabilização foi, sem dúvida, o muro de arrimo atirantado, que consistiu de linha de estacas metálicas (perfis duplo I soldados), de 12 m de comprimento, espaçadas de 2 em 2 m, e, entre elas, paredes de concreto armado, com 4 m de altura e 30,5 cm de espessura. O muro é escorado por 2 linhas de tirantes, o que permitiu manter um desnível de 2,8 m entre o terrapleno e o fundo da bacia do Tanque P121-B, garantindo a sua integridade. O talude permaneceu estável durante cerca de 30 anos, um atestado sobre o acerto das obras de estabilização citadas acima. 3 OS EVENTOS DE FEV/2005 Em fevereiro de 2005 ocorreram 2 eventos de instabilização: a) um escorregamento superficial, acima da 3 a berma, e b) a aceleração de um fenômeno de deformação lenta ( creep ) ou rastejo, a serem descritos mais adiante. micaxistos, um silte arenoso, medianamente a muito compacto, SPTs de 15 a 40 golpes. Enquanto no talude principal o colúvio apresentava-se com 1 a 3 m de espessura no talude lateral esquerdo variava de 4 a 5 m. O nível d água não foi detectado nas partes mais elevadas do talude principal, mas, no talude lateral situava-se a 2 ou 3m de profundidade, nas partes mais elevadas, e era aflorante nas partes mais baixas. Depreende-se desta descrição que o talude lateral é, na realidade, um corpo de tálus que foi submetido a um corte parcial. 3.2 Escorregamento Superficial O escorregamento superficial ocorreu acima da 3a berma, entre as cotas 70 e 90, aproximadamente (Fotos 2 e 3), e tinha forma conchoidal, com largura máxima estimada em torno de 20m. A sua crista superior sofreu deslocamentos verticais de cerca de 1 m (Foto 4). Com o escorregamento, parte do solo ficou exposto às intempéries e foi lavado pelo intenso fluxo das águas pluviais Caracterização do Subsolo Uma campanha mais abrangente de sondagens revelou a ocorrência, de forma generalizada, de camada superficial de colúvio, com até 5 m de espessura, SPTs de 2 a 7 golpes, sobrejacente a solo residual de alteração de gnaisses e Foto 5: Trincas no revestimento betuminoso
4 Foto 7: Surgências d água no pé do talude Foto 6: Arbustos distribuídos na face do talude, de forma generalizada O revestimento betuminoso apresentava uma série de problemas, desde a existência de trincas (Foto 5) até a proliferação de vegetação (arbustos e até árvores), distribuída em grandes extensões (Fotos 3 e 6). Tais fatos tornaram o revestimento betuminoso inoperante, pois permitiram a infiltração de água na encosta. O pé do talude apresentava sinais de uma grande quantidade de surgências de água, que romperam o revestimento betuminoso (Foto 7). Várias destas surgências mostravam sinais de carreamento de partículas de solo. Todas as canaletas superficiais estavam obstruídas por vegetação e detritos, uma delas inclusive com material betuminoso. Na 3a. e 4a. bermas as canaletas estavam seccionadas por trincas. 3.3 Deformação Lenta O segundo evento (ver as Fotos 2 e 8) envolveu o talude lateral, de menor inclinação, abaixo da cota 60, aproximadamente, em frente ao Tanque P 121-B, com reflexos na pista de uma via de acesso, junto ao acostamento. Trata-se de uma instabilização do tipo rastejo ou deformação lenta ( creep ), fato confirmado por sondagens e a abertura de poços de inspeção, feita recentemente. De fato, esta investigação Canaleta desalinhada 3a. Berma 2a. Berma TALUDE Superfície de Ruptura movimento 1a. Berma PRINCIPAL Bacia do Tanque P121-B MURO DE ARRIMO Foto 8: Vista geral do Talude Lateral, em creep
5 1a. Berma Flecha da deformada Foto 9: Talude lateral em creep - Desalinhamento de canaleta de concreto cisalhando em vários planos, fato constatado pela inspeção feita em poço. Foram observados vários pontos de surgência d água no talude, na superfície do seu revestimento betuminoso, com carreamento de partículas de solo (Foto 7). Após a limpeza da área em creep, constatouse um deslocamento superficial demais de 1 m na sua parte central, como revelado pela flecha da deformada da linha da canaleta das Fotos 8 e 9. Notou-se também que houve um empolamento do solo, logo abaixo da canaleta. Na pista da via de acesso (Av. Perimetral Oeste), junto ao acostamento, notouse a formação de trincas com enrugamento do revestimento betuminoso (Foto 10). A tubulação de água de combate a incêndios, no acostamento desta via, foi deslocada num ponto (Foto 11). Além disso, o muro atirantado, do outro lado da pista, em frente ao Tanque P 121B (Foto 12), sofreu leves desalinhamentos e inclinação em direção à bacia desse tanque. 3.4 Foto 10: Trinca e enrugamento do asfalto da Av. Perimetral Oeste Prováveis Causas As causas das instabilizações foram: a) as intensas e prolongadas chuvas que incidiram na região, nas últimas semanas de janeiro; e b) a falta de uma manutenção adequada. Como os sistemas de drenagem interna e externa estavam inoperantes, parte das águas fluiu livremente pela superfície do talude, encosta abaixo, em queda livre de cerca de Foto 11: Deslocamento de tubulação de água de combate a incêndios confirmou a ocorrência de um corpo de tálus, de 4 a 5 m de espessura, que sofreu processo de plastificação total: a massa de solo movimentou-se como um material viscoso, Foto 12: Muro de Arrimo levemente deformado
6 100m de altura. Mas, face ao estado em que se encontrava o revestimento betuminoso, com trincas e a presença de vegetação, houve intensa infiltração de água no solo, o que gerou uma rede de fluxo interna, parcialmente represado no pé do talude, pelas partes intactas do revestimento, propiciando uma elevação das pressões neutras e, conseqüentemente, uma redução na resistência ao cisalhamento do solo. Em particular, o primeiro evento, isto é, o escorregamento superficial, foi causado pela concentração de fluxo de água que desceu a encosta superior. Contribuíram para a deflagração do escorregamento: as canaletas obstruídas; a existência de vegetação e trincas no revestimento betuminoso; e o não funcionamento de parte dos drenos subhorizontais profundos. Quanto ao segundo evento, ao que tudo indica, a causa foi a subpressão da água infiltrada e parcialmente represada pelo revestimento betuminoso. Não havia drenos sub-horizontais profundos no corpo de tálus, o que provocou o fenômeno de creep citado acima. Os danos foram superficiais, e é possível que esse fenômeno não se degenerou num escorregamento franco graças ao muro de arrimo atirantado, em frente ao Tanque de Óleo P 121-A. 3.4 Uma previsível reincidência dos eventos de 1974/76 Estas instabilizações eram previsíveis se se levasse em conta o histórico da área. Pois o que houve foi uma reincidência de eventos antigos, que afetaram o referido talude na década de 1970, entre os anos 1974/1976. A Foto 2 é aérea e foi tirada em junho de Ela revela que já havia sinais de movimentação do solo nos dois locais, isto é, no talude principal (veja o detalhe na Foto 2) e no talude lateral. A massa de solo, que atualmente está em movimento lento ou creep (evento 2), é a que causa maior preocupação. Foi a instabilização dessa mesma massa, na década de 1970, que determinou a posição do muro de arrimo atirantado, em frente ao Tanque P 121-B. A sua extensão corresponde à base da trinca, em forma de ferradura, cujos contornos estão destacados na Foto 8 e prenunciados na Foto 2 (aérea). O muro de arrimo atirantado está levemente inclinado, com sinais de deterioração e deformações, o que exigiu uma verificação de suas reais condições de estabilidade. Atualmente estão sendo realizados trabalhos de estabilização, com obras de contenção por grampeamento no escorregamento superficial, DHPs em toda a área, trincheiras drenantes e reforço do muro de arrimo por tirantes adicionais, bem como recomendou-se selar as trincas no revestimento. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS O trabalho mostrou que a reativação de fenômenos de instabilização pretéritos pode ocorrer face à deterioração de partes das obras originais de estabilização, mesmo que tenham sido bem concebidas e executadas. Enfatizou a importância de uma manutenção periódica e adequada e que sejam preservados vivos na memória o histórico dos eventos pretéritos e do conceito das obras executadas. Neste contexto, torna-se importante a existência de um Manual de Observação e Manutenção das Obras Executadas, com a programação de inspeções periódicas e leituras de instrumentos, quando existentes, a serem feitas pelas equipes técnicas e de manutenção das instalações industriais, em conjunto. Finalmente, revela que seria possível antever as instabilizações se tivesse havido um acompanhamento com fotos aéreas tiradas periodicamente; ou mesmo um acompanhamento com fotos de satélites, através do google earth, por exemplo. Neste contexto, remete-se o leitor às seguintes coordenadas do google earth : Fly up to: , (isto é, latitude= e longitude= ), onde é possível ver a mesma situação revelada pela Foto 2, que é aérea. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem o apoio recebido da Petrobrás S A e da EPUSP Escola Politécnica da USP - para a realização deste trabalho.
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