LINGUARAZ: O QUE FALA ESTA LÍNGUA? Uma leitura de alguns poemas de Pedro Américo de Farias 1
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- Ian Ramires Castel-Branco
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1 LINGUARAZ: O QUE FALA ESTA LÍNGUA? Uma leitura de alguns poemas de Pedro Américo de Farias 1 Liliane Maria Jamir e Silva 2 Resumo Este artigo é resultado de estudos de autores pernambucanos realizados na FAFIRE, no programa de ação e extensão comunitária, através do Projeto Roteiros Poéticos de Pernambuco: história, memória, paisagem, aprovado e subsidiado pelo FUNCULTURA. Nesta oportunidade 3, em que homenageamos Cida Pedrosa e Pedro Américo de Farias, cujas estéticas consideramos inovadoras e representativas da genuína poesia contemporânea a tomar corpo no cenário pernambucano e nacional, apresentamos uma leitura da poesia de Pedro Américo de Farias, notadamente de alguns textos do audiolivro Linguaraz (2009), obra já tão festejada pela inventividade do autor ao querê-la harmonizada com arranjos musicais. Palavras chave Linguaraz. Poesia de Pedro Américo. Experiência intersemiótica. Pedro Américo de Farias é mesmo chegado às experimentações poéticas. Dentre elas, a experiência intersemiótica. Sua participação na Antologia Imagem passa palavra, publicada em Porto, Portugal, 2004, já mostra o quanto o poeta aprecia o diálogo literatura e artes plásticas. Nesta antologia, o autor apresenta o poema Celebração da vida, em consonância com o espírito do Movimento Identidades 4, cuja proposta seria poetizar a partir da imagem de um artista plástico filiado ao grupo. Assim, coube a Pedro Américo traduzir, em palavras, a obra de Siza Vieira, nome de grande notabilidade na arquitetura portuguesa. Em Linguaraz, o novo livro de poesia (audiolivro) de Pedro Américo, lançado em maio de 2009, o autor confirma, logo na apresentação, seu desejo de fazer um trabalho que casasse livro e disco em que os [...] poemas tivessem tratamento de composição musical, com direito a arranjos para percussão, guitarra elétrica, apitos de arremedo, tromboca, berimbau et caterva (p. 9). Sem dúvida, um belo trabalho. 1 Comunicação apresentada no III Encontro FAFIRE e XXXVIII Fórum FAFIRE de Ideias Contemporâneas, no dia 23 de setembro de 2009, das 19 às 21h30, cujo tema girou em torno da poética dos pernambucanos Cida Pedrosa e Pedro Américo de Farias. A mesa intitulou-se PoesiaentrePedras: uma conversa entre Cida Pedrosa e Pedro Américo. 2 Professora de Teoria da Literatura/FAFIRE e doutora em Literatura e Cultura/UFPB. 3 Evento mencionado na primeira nota. 4 Movimento artístico iniciado em 1996, com participantes de Angola, Portugal, Moçambique, Brasil, Cabo Verde entre outros países ligados pela língua portuguesa. 1
2 Todavia, ainda que o aparato musical de Linguaraz surta um efeito lúdico agradável, contagiante, a poesia de Pedro Américo, enquanto artefato poético de palavras, tem valor em si mesma, já contém musicalidade e plasticidade próprias. Mais ainda: diríamos que o foco do poeta é a palavra de efeito insólito, a língua poética, mas ferina, contundente, que pesa e é seca como as pedras do sertão: língua-ruda, rude, sem bravata, como conclui o autor na apresentação do livro (p. 9). Com ares metalinguísticos, o eu-poemático se define, se descreve em vários poemas da obra, traça sua trajetória fazendo despontar uma meta poética, como bem mostra em PARALELEPÍPEDRO, o canto pedregoso em terça rima 5 (p ): nasci pedro, assim me encaixo pedregulho entre pedreiras rolando penhasco abaixo cresci pedra por ladeiras açudes, roças e rios fui trempe para fogueiras sofri febres, calafrios senti no couro chibatas meus ais viraram assobios sonhei sonhos em cascatas neles cacei capivaras vivi com nefelibatas habitando nuvens raras caí que nem bendengó amassando algumas caras mas hoje sou pedra-mó Sem abrir mão da tradição medieval, adentrada nos sertões e preservada no cancioneiro popular, o poema discorre solto em versos simétricos (redondilho maior ou heptassilábicos) e encadeados com rimas entrecruzadas. A plasticidade se insinua nos 5 A terça rima ou terceto (terza rima, em italiano) tem, para uns, origem remota, tendo sido usada desde a Idade Média; outros lhe atribuem filiação ao soneto. Contudo, a estrutura que passou a ostentar deve-se a Dante Alighieri, em sua Divina Comédia, no século XIV, toda composta de tercetos. Na Literatura Brasileira foi cultivada no Barroco (Gregório de Matos), no Arcadismo, no Romantismo e no Parnasianismo. A terça rima se constitui como estrofe de três versos com rima entrecruzada, apresentado o esquema aba, bcb, cdc, ded, efe e assim por diante. Ao derradeiro terceto, acrescenta-se um verso que rima com o intermediário da estrofe antecedente - ded e - que pode ficar isolado ou aglutinado formando um quarteto (cf. MOISÉS, 2002, p ). No poema PARALELEPIPEDRO tal verso permanece isolado funcionando como fecho de ouro. 2
3 motivos, através de um léxico representativo da paisagem e dos costumes sertanejos, a exemplo de termos como pedregulho, pedreiras, açudes, roças, rios, [caçar] capivaras, [cair] que nem bendengó, entre outros. Além do aspecto visual, percebido logo na primeira estrofe (fanopeia 6 ), o poema toma fôlego através do recurso sonoro, farto no poema, como as aliterações que se reiteram, dificultando, de certa forma, uma leitura oral (em que o leitor pode tropeçar), como ocorre nos desafiantes travalínguas. Há também que se destacar, na poesia de Pedro Américo, a palavra concisa, mas plena de significados, a palavra plurissignificante, como se vê na alegoria do poema FORMIGAS que abre o Linguaraz (p. 10): formigas dormem à noite nem todas sentinelas vigilantes velam escravas corujas provisões armazenam o sol abre o dia o pão vai à mesa A letra branca sobre a página negra (única do livro) promove um belo efeito que dialoga com a ilustração de Victor Zalma. No entanto, o poema se destaca pelo jogo de palavras. A disposição gráfica sugere o movimento das formiguinhas no percurso de sua labuta. No contexto poético, a palavra é sutilmente pedregosa, conota o imperceptível e persistente trabalho noturno das formigas, ou dos poetas na calada da noite. Como sentinelas vigilantes ou escravas corujas, as formigas como os poetas e tantos trabalhadores noturnos (o jornalista, o padeiro, o vigilante...) provisões armazenam, deixando, quando o sol abre o dia, o poema-alimento para aclarar a consciência dos que dormem. 6 Segundo Massaud Moisés (2001, p. 316), Ezra Pound propõe uma distinção entre fanopeia, melopeia e logopeia. A seu ver, fanopeia consiste em projetar o objeto (fixo ou em movimento) na imaginação visual ; a melopeia, em produzir correlações emocionais por intermédio do som e do ritmo da fala ; e a logopeia, em produzir ambos os efeitos estimulando associações (intelectuais ou emocionais) que permaneceram na consciência do receptor em relação às palavras ou grupos de palavras efetivamente empregados. 3
4 Em DECIFRA-ME E EU TE DEVORO (p. 12), como o próprio título sugere, o eupoético incita o receptor a entrar no seu jogo, a decifrá-lo como a um enigma, sendo já advertido de que, na contenda, poderá ser tragado pelas artimanhas do texto. O título também brinca com o clássico enigma da esfinge, a guardiã dos segredos, que aparece no Édipo Rei, cuja decifração rendeu indistintamente ventura e desgraça ao herói trágico de Sófocles. Leiamos o poema: quem ama dá valor à auto-estima ando lendo notícias atrasadas mitos, lendas de eras já passadas donde vem essa anima que me anima que a mim torce e tritura em rica rima a criança que vem para brincar maraca, maracá, maracajá faz-me tonto, o amor é minha fé marca passo e compasso avante e a ré fica doido quem tenta decifrar Os dois primeiros versos, ensaiando um romantismo ingênuo que logo se dissipa talvez uma forma sutil de o autor subvertê-lo, soa estranho em relação ao todo do poema. Em versos simétricos, o poema apresenta seu campo-metáfora, em que o ludismo de ideias e palavras se articula num misto de heranças culturais mostrando, desde logo, a intenção experimental do eu-poético a (re) inventar paradigmas nem sempre claros ao leitor menos avisado. Apesar da simetria dos versos decassilábicos e da regularidade das rimas, há uma múltipla combinação decorrente do encadeamento progressivo dos versos que se processa pela ligação entre o primeiro e o segundo, entre o segundo e o terceiro, entre o terceiro e o quarto, e assim sucessivamente, resultando em efeito similar ao leixa-pren 7, cujo processo de repetição igualmente se observa no uso da renka 8. 7 Proveniente do galego-português [deixa-prende], o termo designa o expediente poético que consiste em repetir, à entrada de uma estrofe, o último verso da anterior. Assim, uma estrofe prendia, ou seja, tomava o que a precedente deixava (conforme Dicionário de termos literários, de Massaud Moisés, Cultrix, 1974). 8 Forma extinta de poesia japonesa, descendente de outra mais antiga, a waka. Segundo Alberto da Cunha Melo, em seu desenvolvimento, a renka é um poema paralelístico, forma que adotou para seu livro O cão 4
5 Entre o fluxo de ir e vir no tempo de suas experiências poéticas marca passo e compasso avante e a ré, o eu lírico vive o tenso jogo da poesia, e desafia o leitor a encontrar, nas combinações interfásicas, uma resposta, um sentido, mesmo correndo o risco de não racionalizar de fica [r] doido em face dos limites de seu próprio horizonte de expectativa. Reiterando nossa hipótese, afirmamos que a palavra contundente, que machuca e denuncia (sem ser panfletária, bom que se ressalte), enfim, a palavra que liberta é a grande obsessão do poeta Pedro Américo. Não é à-toa que seu livro intitula-se Linguaraz (2009), adjetivo que no Aurélio significa linguareiro, o que tem língua solta ou no melhor sentido de maledicente, de uma maledicência de quem busca definir a necessidade de a poesia se soltar um pouco da condição de refém do sublime, como ele próprio afirmara 9. Obras publicadas anteriormente como Conversas de pedra (1981) e Picardia (1994) também apresentam títulos sugestivos da palavra demolidora de posturas estereotipadas e do tom ameno das poéticas bem-comportadas. Este aspecto é bem lembrado na primeira estrofe do poema Picardia (2009, p. 11) a seguir transcrito: chupo manga trepado na mangueira cafungando no pó da poesia violando o bom tom da burguesia bailo jogo mortal da capoeira abaixo o burocrata e o reunismo por não te desejar um bibelô estes lírios vos dou de camelô e com isso me poupa o feminismo No início da segunda estrofe abaixo o burocrata e o reunismo, o tom de manifesto (primeiro verso) lembra a Poética de Manuel Bandeira, quando a enunciação ensaia uma subversão ideológica, já inaugurada na primeira estrofe, não obstante manter o padrão simétrico dos versos decassílabos e a regularidade das rimas intercaladas, nas duas estrofes. de olhos amarelos & outros poemas inéditos (2006). O poeta esclarece (na nota inicial, p l) que, não sendo mera repetição do modelo japonês, houve a intenção de reinventá-lo, fazendo, no citado livro, uma homenagem à forma poética extinta. 9 Em entrevista concedida a Schneider Carpegianni, do JC, que serviu de base para a matéria publicada no Caderno C, na edição de 28 de maio de 2009, enviada pelo poeta, via , em setembro de
6 Em FUGA (p. 18), aspectos da paisagem e da cultura sertanejas são trabalhados esteticamente com simplicidade, concisão e expressividade. Livre da amarração do encadeamento sintático (enjambement), a justaposição dos versos brancos, hegemonicamente tetrassilábicos, constrói uma trajetória rápida e progressiva, em que as experimentações do eu-lírico, em princípio circunstanciadas num determinado espaço, superam tais limites, ganhando identidade e autonomia expressiva. Vejamos o poema: arrombou cerca abriu porteira apurou ouvido liberou fala assobiou gemido lavrou palavra e foi embora mostrando a língua Entre as possibilidades de leitura, duas, pelo menos, estão ligadas à ideia de percurso: 1) uma topográfica, atrelada à própria biografia do autor, nascido na cidade de Ouricuri, no sertão do Araripe, mas transmigrado para o Recife e para o mundo; 2) a outra se reporta à trajetória estética, à emancipação auto-referenciada na palavra lavrada, cultivada com os componentes das paragens regionais, cujo léxico e semântica, representativos do locus e do modus vivendi sertanejos, transcendem e se universalizam no campo-metáfora. O texto dispensa elementos coesivos, com exceção dos dois últimos versos e foi embora / mostrando a língua, que funcionam como o fecho do poema. A composição dos versos (em esquema tetrassilábico) se repete num paralelismo de peso, cuja reiteração em verbos transitivos e seus respectivos complementos (até o sexto verso) assinalam o transcurso decisivo do eu-poético rumo a uma estética peculiar. A poesia de Pedro Américo também se destaca pelo experimentalismo gráfico notadamente observado no poema SOMA : SUMO (p. 22) a seguir transcrito: um fruta dizer em poema fruto numa cama flor fruto fica mesa enfim fluxo árido mais quero flora pomar pedra 6
7 O texto promove uma síntese, simboliza, com ludicidade, o que é essencial a sua poética: musicalidade, contenção lírica e motivos próprios. Interessante é que a disposição gráfica do texto sugere, de início, que os significados sejam projetados principalmente em função do efeito visual do poema, como normalmente acontece no poema concreto. Contudo, o que é recorrente, na estrutura textual, é o efeito sonoro, a aliteração, a reiteração de termos com a finalidade de construir gradativamente a ideia, o sentido. Usando as categorias de Ezra Pound, diríamos que a melopeia e a logopeia se destacam na poesia de Pedro Américo, mesmo no poema em foco, mais assemelhado ao modo concreto. Retornaremos a SOMA : SUMO adiante. Destacamos, ainda, o poema UM MARINHEIRO E O RECIFE (p ): indiferente à verdade e à fantasia ao traçado do primeiro e do último arquiteto à lógica que não seja a do olho e do tato ao amor louco dos bêbados ansiosos e à autoflagelação dos ressacados ao deslumbramento do turista aprendiz de hoje e à lamentosa tortura dos passadistas à complacência dos podres poderes e à penitência dos pobres beatos um marinheiro pinta para si mesmo a rua que lhe convém diminui distâncias e aproxima o porto desmancha a topografia recompõe a cidade sem perder de vista o mar e a linha do horizonte Seguindo os objetivos do projeto em desenvolvimento Roteiros poéticos de Pernambuco: história, memória, paisagem, também buscamos, na obra de Pedro Américo, algo que apresentasse uma visão eufórica (ou disfórica) de nosso Estado, de nossa Recife. De imediato, o título do poema nos parecia confirmar tal expectativa, o que não se faz na mesma proporção tão logo se apresentem os primeiros versos. Se há mesmo um 7
8 olhar sobre o objeto em questão, trata-se de uma visão poeticamente construída, sutilmente dissimulada, e não meramente contemplativa. Isto porque o sujeito da enunciação poética não se quer meramente regionalista, no sentido de acatar padrões regionais [ou] regionalizantes identificados como sentimentos nativistas, patrióticos, em que a exaltação de uma natureza regional, local [se mostre] superior à dos outros locais ; ou ainda no sentido de conceber um caráter nostálgico aos motivos poetizados, aspectos que Pedro Américo diz serem frequentes no regionalismo 10. Assim, o poema escamoteia a subjetividade lírica e se converte em instância narrativa com o distanciamento peculiar ao gênero. Com este artifício, o poeta disfarça o olhar contemplativo que registraria, em primeira pessoa, o que é indiferente ao marinheiro, mas caro ao eu-lírico, seja o quadro físico natural e urbano da cidade do Recife, o traçado do primeiro / e do último arquiteto, seja a percepção sensitiva da realidade a do olho e do tato, atenta ao amor louco dos bêbados ansiosos / e à autoflagelação dos ressacados, bem como ao deslumbramento do turista aprendiz [...] / e à lamentosa tortura dos passadistas ; seja ainda a percepção crítica a flagrar cenas de estorvo social, cenas em que o poeta e nós, leitores, reconhecemos como fruto da ingenuidade de muitos quando se dobram à falsa generosidade de poucos; ou à conformação dos ascéticos, prontos a pagarem, com penosos sacrifícios, um tributo social devido por outrem, aspectos que se expressam, principalmente, no sexto dístico, quando o marinheiro-personagem prossegue indiferente à complacência dos podres poderes / e à penitência dos pobres beatos. A construção invertida do poema (em hipérbato) também parece estratégica, visto que, em ordem direta, o terceto que integra a sétima estrofe, ocupando a função de oração principal, tanto encabeça as primeiras estrofes (os dísticos) que se interligam em enjambement a partir da expressão modal indiferente no início do texto, quanto funciona como oração principal da última estrofe, possibilitando, dessa forma, a leitura do poema em outra disposição sem prejuízo do sentido, que será sempre o mesmo nas duas formas de leitura. 10 Em entrevista concedida à jornalista Maria Alice Amorim. Disponível em Acesso em 3 de setembro de
9 Antes de finalizar, reiteramos que as hipóteses aqui postas são praticamente baseadas na leitura do texto escrito, do livro de poemas. A escuta dos poemas musicados foi posterior, já com intenção de experienciá-los segundo a proposta de seu autor, instigada pela euforia no lançamento do audiolivro, no auditório da Livraria Cultura. Ambas foram experiências gratificantes, mas distintas. Voltemos ao poema SOMA : SUMO com o fito de esclarecer a aludida distinção em termos mais práticos. Acompanhando o texto musicado e cantado, vê-se que a dicção define uma direção própria da leitura e que, sem a escuta, detendo-se apenas na leitura do texto, o leitor poderia compassar ou criar outra prolação, lembrando também que todos os textos do Linguaraz dispensam os sinais gráficos de pontuação. No poema em foco, observa-se que o texto cantado (e o mesmo poderia acontecer se fosse apenas declamado pelo poeta) define tanto as pausas (pontuação) quanto a direção vertical da leitura. Por outro lado, sabe-se que, em se tratando de formato concretista, o texto poderá admitir outras combinações de leitura sugeridas pela livre inserção da instância leitora. Vale ainda ressaltar que, no poema em questão, as palavras destacadas em negrito nas extremidades do primeiro e do último verso, também assinalam duas projeções textuais: no sentido vertical um / mais / poema / pedra, tal arranjo indicaria o aspecto quantitativo, um acréscimo, a SOMA que compõe o título, ou melhor, mais um poema pedra. Já no sentido horizontal, um / poema / mais / pedra, a construção reforça o elemento qualitativo, cuja essência o SUMO que também aparece no título se consolida na simbologia da pedra: um poema de natureza contundente e resistente. Não poderíamos concluir este breve estudo sem reiterar a beleza e a importância desse novo experimento de Pedro Américo. A perspectiva intersemiótica exigiria, evidentemente, uma leitura mais atenta, mais fundamentada, o que não caberia nesta breve proposta. Mas não resta dúvida de que o texto, casado com música, abre novas possibilidades, torna-se estimulante, contagiante, podendo funcionar como motivação para quem ainda permanece alheio à beleza da experiência que se descortina nas malhas do texto poético. Por outro lado, é bom lembrar que, em seu nascedouro, a poesia esteve visceralmente ligada à música, à dança, aos ritos sagrados. Assim, arriscamos, à revelia do autor, suscitar o que pareceria um paradoxo, uma via de mão dupla, na proposta do Linguaraz: enquanto criação 9
10 e reinvenção, quem sabe se o experimentalismo de Pedro Américo também não representa uma tentativa de retomar o caminho de volta às origens da poesia lírica? Continuemos, pois, com nossas leituras e a experiência gratificante com a poética de Pedro Américo, assim como a de outras vozes representativas da literatura e da cultura pernambucanas. REFERÊNCIAS a) Bibliografia CAMPOS, Antônio e CORDEIRO, Cláudia. Pernambuco, terra da poesia - um painel da poesia pernambucana dos séculos XVI ao XXI. Recife, PE: IMC - Instituto Maximiano Campos; São Paulo: Escrituras Editora, ID ed. Porto: Universidade do Porto, Faculdade de Belas Artes, (Col. Identidades Intercâmbio Artístico) IMAGEM passa palavra. 2. ed. Porto: Universidade do Porto, Faculdade de Belas Artes, (Coleção Identidades Intercâmbio Artístico) FARIAS, Pedro Américo de. Linguaraz. Desenhos de Victor Zalma. Recife: Edição do autor, MELO, Alberto da Cunha. O cão de olhos amarelos & outros poemas inéditos. São Paulo: A Girafa, MOISÉS, Massaud. Dicionário de termos literários. 11. ed. São Paulo: Cultrix, MORAIS, Heloísa Arcoverde e BRASIL, Magali. (Org.) Tradução Everardo Norões e Renaud Bárbaras. Recife: um olhar transatlântico: antologia poética. Nantes: un regard transatlantique: anthologie poétique. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, b) Webgrafia Acesso em 13/01/ Acesso em 01/03/ Acesso em 03/09/ Acesso em 03/09/2009. Recife, 25 de março de
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