(Pausa) Tudo sem descuidar da enorme capacidade técnica de alguém que devotou sua vida

Transcrição

1 No maravilhoso cancioneiro brasileiro, há muitas obras insuperáveis. Uma delas, que sempre que ouço me emociona muito, é a canção cidadão com letra e música de Lúcio Barbosa e imortalizada na voz de Zé Ramalho, que começa assim: Tá vendo aquele edifício moço // Ajudei a levantar //Foi um tempo de aflição //Eram quatro condução //Duas prá ir, duas prá voltar //Hoje depois dele pronto //Olho prá cima e fico tonto // Mas me vem um cidadão // E me diz desconfiado // "Tu tá aí admirado? // Ou tá querendo roubar?" // Meu domingo tá perdido // Vou prá casa entristecido// Dá vontade de beber // E prá aumentar meu tédio // Eu nem posso olhar pro prédio // Que eu ajudei a fazer... A canção é belíssima, e por falar em cidadania, em construção, ou até mesmo cidadania em construção; em justiça social, em retribuição, em sonho e em realização; é que ela me ajudará a tecer minha exposição na data de hoje. Retornaremos a este assunto mais adiante. Excelentíssimo Conselheiro Ulices Andrade, Excelentíssimas Autoridades, Senhoras e Senhores, a saudação do Ministério Público Especial ao novel integrante do Conselho já é algo tradicional, que se repete ao longo da história, como ocorreu aqui neste mesmo Tribunal, cerca de um ano e meio atrás, na cerimônia de posse do Eminente Conselheiro Clóvis Barbosa, na qual tive a honra de saudá-lo. E no meu entendimento, esta saudação do Ministério Público de Contas, não é algo simplesmente protocolar, pois se reveste de três papéis primordiais: o primeiro é fazer uma apresentação do Conselheiro empossando, mostrando ao Tribunal (e à sociedade) o seu currículo, sua experiência e seus méritos que delinearam sua trajetória até a posse no honroso cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Sergipe. O segundo momento, igualmente relevante, é fazer, digamos, o contrário, é apresentar o Sodalício ao novo Conselheiro; mas não uma apresentação formal, da letra fria da legislação, pois isto já é do amplo conhecimento de todos. Mas sim colocá-lo a par das discussões, dos sentimentos, das idéias que norteiam o presente momento histórico neste Tribunal. Por fim, em um terceiro momento, como atual Procurador-Geral do parquet especial, é tentar espelhar ao novel Conselheiro, o que este Ministério Público espera da atuação de Sua Excelência. Comecemos, pois, o trabalho, fazendo a apresentação do vasto e ilustrado currículo de Dr. Ulices, que, por impossibilidade material, não retratarei integralmente, mas sim farei um resumo, expondo as mais importantes passagens de sua vida pública e acadêmica.vejamos.

2 O Conselheiro Ulices Andrade é Bacharel em Administração pela Faculdade de Administração e Negócios de Sergipe FANESE (turma de 2003). Em 2006, Obteve o título de Pós-Graduação lato sensu com MBA Executivo em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas FGV. Exerceu diversas vezes o cargo de Secretário de Estado, como na Secretaria de Estado da Administração no biênio 93-94; de Secretário Especial de Desenvolvimento Regional em 1995; e Secretário especial do Desenvolvimento Regional e Metropolitano nos anos de 1995 e Foi Deputado estadual por cinco mandatos consecutivos, nas legislaturas ; ; ; ; e 2007 até agora; com intensa atividade parlamentar, e participação em comissões temáticas, onde destaco as Comissões de Orçamento e de Justiça, das quais foi presidente. Pontificou sua carreira, eleito pelos seus pares, como Presidente da Assembléia Legislativa, ocupando tal cargo desde o início da atual legislatura; e, nessa condição, chegou a exercer, interinamente, o cargo de Governador do Estado de Sergipe, no período de 09 a 16 de janeiro de Ou seja, cumpriu uma trajetória consistente e vitoriosa, no Executivo e no Legislativo, o que lhe rendeu um grande número de homenagens e distinções honoríficas, oriundas das mais diversas e importantes instituições, tais como: a Ordem do Mérito Parlamentar; o Colar do Mérito Judiciário e a Ordem do Mérito Serigy, no grau de grande Oficial; como ainda, cito porque entendo importante, já que criança e adolescente são prioridade constitucionais, para o Estado e para a Sociedade, o Diploma de Amigo da Criança, concedido pela Fundação Renascer de Sergipe, no ano de Ou seja, um homem com uma vida pública ímpar, com larga e categorizada experiência, que pode trazer muito desta dilargada experiência à Corte de Contas sergipana. Isto sem falar que sua indicação, Dr. Ulices, mais uma vez traz a marca do consenso: Vossa Excelência traz consigo não só a chancela de uma vida pública mais do que profícua, mas também o aval de todo nosso parlamento, o que, convenhamos, é um cartão de visita admirável para o exercício da nova função que ora se inicia. (pausa) Assim, expostos os inegáveis méritos de Dr. Ulices Andrade para o cargo de Conselheiro, é hora de, como prometido, falar um pouco a Dr. Ulices do momento histórico por que passa o Tribunal de Contas do Estado de Sergipe. Com efeito, Excelentíssimas Autoridades, minhas senhoras meus senhores, vive o TCE um momento de grande ebulição, que anuncia, ouso dizer profundas transformações. Vejamos.

3 Realmente, não é necessário recordar os problemas que houve neste Corte em seu passado recente. O período de desconfiança por parte da Sociedade, que foi superado graças ao esforço e determinação de todos que compuseram este Sodalício, sob as direções seguras, em cada período de gestão, dos Presidentes Heráclito Rollemberg e Reinaldo Moura Ferreira. E, como sempre, da adversidade surgiu a oportunidade; e a resolução dos problemas internos adveio de duas posturas essenciais que têm norteado esta Corte desde então: a primeira, a do faça-se o que tem que ser feito se uma situação está errada, deve ser corrigida; se se cometeu uma falta, realize-se o procedimento pertinente e, cumpra-se a lei quanto às conseqüências do ato. E a segunda, do incremento com o diálogo com a Sociedade, o que gera, sem sombra dúvidas, um círculo virtuoso, na medida em que o Tribunal expõe seu trabalho, ganha credibilidade, e a Sociedade se aproxima, apóia, fornece informações; que o Tribunal utiliza, aprimorando seu trabalho. Porém, Conselheiro Ulices Andrade, se grandes problemas foram ultrapassados, outros desafios se demonstram; desafios que merecem a atenção deste Tribunal, e de Vossa Excelência que ora chega para reforçar esta luta. O primeiro deles, e aquele que vejo de modo mais urgente, é o problema do equacionamento da questão de pessoal desta Corte; seja com a modernização e padronização de sua estrutura de cargos comissionados e de funções de confiança; seja por uma maior valorização do pessoal efetivo, implementando-se um plano de cargos e salários; seja pela necessidade premente da realização de concurso público; tudo isto sem olvidar as disposições da Lei de responsabilidade Fiscal, já que o limite com que trabalhamos é exíguo, e demanda ainda preocupações neste sentido. Além de outros aspectos, que também estão maduros na necessidade, tais como: a implantação de um controle gerencial dos prazos de tramitação de processos, para que haja uma maior celeridade no andamento dos feitos; a premência da implantação do processo eletrônico; como ainda, e talvez o mais importante, o redesenho da fórmula de atuar das Coordenadorias de Inspeção, fazendo-se a migração do critério geográfico de competências, para um critério de especialização. Isto porque, é praticamente assente, que devam ser criadas Coordenadorias de Inspeção especializadas nas áreas de Pessoal, Engenharia, Educação e Saúde. Pessoal, porque esta é a maior despesa do orçamento público. Engenharia, porque são nesta área os maiores gastos licitáveis. Educação e Saúde, pela complexidade das fontes de financiamento, e pela óbvia importância para que se assegure vida, futuro e oportunidades a todos os cidadãos sergipanos.

4 Porém, Eminente Conselheiro, deve ser realçado que nem tudo está no porvir; muitos e importantes passos já foram dados por nossa Corte, e somente à guisa de exemplificação, direi alguns: Primeiro, a consolidação da Auditoria Operacional como ferramenta diagnóstico da gestão, e de fomento à excelência no Serviço Público. Onde em moldes rápidos podemos citar Auditorias de cunho Operacional em três áreas de grande relevância no Serviço Público sergipano, tais como as Auditorias efetivadas na Secretaria de Estado da Educação, quanto ao Programa de Formação de Professores; no Corpo de Bombeiros quanto à sua infraestrutura disponível para o combate a sinistros; e na Fundação Hospitalar de Saúde, quanto às condições de atendimento do HUSE. Em todos os casos, foram coletadas informações relevantes, que serviram de substrato concreto para a melhoria dos serviços prestados à população, vislumbrandose ganhos efetivos à sociedade nas três áreas auditadas. Segundo, estamos em plena realização de um Planejamento Estratégico para o Tribunal de Contas; planejamento que denotará o rumo e o método para que este Sodalício possa estar cada vez mais afinado com a Sociedade. Terceiro, que esta Corte também já iniciou os Estudos para a implantação, no âmbito deste Tribunal, do Termo de Ajustamento de Gestão ou de Conduta, instrumento atualmente utilizado com brilhantismo pelos Ministérios Públicos estadual, federal e do Trabalho, e que certamente servirá, junto com o instrumento da audiência pública, para resolver no nascedouro e do modo imediato muitas situações que, na forma tradicional, demoram algum tempo para serem finalizadas. (Pausa) Feito este registro, Dr. Ulices, passemos à terceira fase desta oração, que é exatamente o que o Ministério Público Especial espera de Vossa Excelência. Ora, espera este parquet especial que Vossa Excelência espelhe neste Tribunal todo o sucesso de sua vida pública, o seu compromisso inarredável com a causa pública e com os cidadãos. É certo que a responsabilidade é grande, notadamente porque Vossa Excelência substituirá o Excelentíssimo Conselheiro Antonio Manoel de Carvalho Dantas, ao qual, desde já rendo todas minhas homenagens. Realmente, Dr. Antonio deixa saudades neste Sodalício, principalmente por sua capacidade de aglutinação e articulação; sempre com uma palavra amiga, uma intervenção afável, um gesto de pacificação. Tudo sem descuidar da enorme capacidade técnica de alguém que devotou sua vida

5 ao serviço público; um servidor de carreira que alçado ao cargo de Conselheiro muito contribuiu para a modernização deste Tribunal. Um nome que fica na história por seu exemplo, por sua lhaneza, por seu caráter, pelo seu legado, reconhecido diuturnamente na sociedade sergipana. Não só pelo passado, mas também pelo futuro, pois o conselheiro Antonio Manoel ainda tem muito a dar a este Tribunal e a toda a sociedade. Sua Excelência deixa saudades antecipadas do nosso convívio diário; saudade que espero possa ser rapidamente satisfeita por sua presença, que desejo constante nesta e sempre sua casa. (pausa) Porém, Conselheiro Ulices Andrade, como se não bastasse a responsabilidade de Vossa Excelência em substituir o Conselheiro Antonio Manoel. Não bastasse o seu compromisso com seu parâmetro pessoal de sucesso e excelência, além de todas as contribuições já de antemão reconhecidas que Vossa Excelência certamente trará à causa do controle, duas contribuições, em especial, eu tenho certeza que se concretizarão. A primeira, é a do fomento, ou do aperfeiçoamento da parceria entre este Tribunal de Contas e a Assembléia Legislativa, na causa do Controle Externo. Digo isso porque, respeitando-se a independência de cada uma das instituições, muito pode cada uma das instituições colaborar com a outra. Primeiro porque este é o mandamento constitucional, ao rezar que a função controle externo será efetivada pelo Poder Legislativo, com a parceria de uma instituição independente e de extração constitucional que é o Tribunal de Contas. Segundo porque as formas de atuação são complementares, cabendo à Assembléia Legislativa um controle político da atuação do Estado e à Corte de Contas uma atuação técnica, mas que certamente poderão se somar em uma sinergia positiva em favor da cidadania. Terceiro porque o parlamento é indubitavelmente a casa do povo, e como tal, é o foro indicado para discussão com profundidade de questões complexas, que envolvem decisões políticas, tais como eleição de prioridades orçamentárias; escolha de modelos de gestão, como o modelo aplicável à saúde, por exemplo; o tamanho do Estado; entre outras questões de caráter nitidamente discricionário, e que, por tal natureza, têm escopo de discussão limitado no foro técnico das Cortes de Contas. E Vossa Excelência, como recém egresso do parlamento, terá muita autoridade para advogar em prol deste interesse.

6 Por fim, sua experiência de gestor pode muito colaborar com o novo perfil que defendemos para as Cortes de Contas, exatamente o perfil de órgão traçador de diagnósticos; de aferição da excelência da gestão; e muito mais do que isso: órgão defensor de direitos fundamentais. Isto porque entendo e já disse isso anteriormente, que o modelo de atuação dos TCs deve ser aperfeiçoado; pois não há sentido em se fiscalizar despesas com fulcro no seu prisma meramente formal. O foco na cidadania se impõe. E quem diz isto não sou eu; os dois lados que protagonizaram a eleição presidencial em 31/10 concordam com esta tese. Primeiro, cito o Ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, em entrevista dada à revista Veja, edição do dia 03/11/2010, ao explicar a sua migração de Presidente para expresidente, disse: uma coisa é o Planalto; outra é a planície. Na planície você é promovido a povo. Repito: promovido a povo. Ou seja, há que se respeitar competências e liturgias de cada cargo no serviço público, mas o centro da atuação estatal estará inapelavelmente vinculado ao cidadão, ao povo. Por isso sua importância, por isso a relevância desta condição, que não pode ser encarada de modo subalterno. Fato igualmente reconhecido pela Presidente Eleita Dilma Rousseff que, com muita propriedade, disse por diversas vezes em sua campanha, que seu foco não está na frieza dos números, mas sim nas pessoas; nas pessoas que têm sentimentos, necessidades e que precisam ver tais necessidades adimplidas, para que muitos brasileiros possam evoluir da mera sobrevivência, para a vida com dignidade. Ou seja, resumindo o pensamento da Presidente Dilma, não adianta dizer que 99% dos doentes foram atendidos, se um prejudicar sua saúde por falta de atendimento. O foco e a preocupação do Estado tem que estar no cidadão não atendido e não na fria e incompleta estatística. Por isso, parafraseando a Excelentíssima Presidente Eleita, não há sentido, nas auditorias, em dar primazia a papéis e números; a relevância tem que estar em verificar se o serviço público está sendo satisfatório; se a escola tem condições de funcionamento; se o transporte escolar é de boa qualidade; se o pronto-socorro tem remédios, equipamentos e profissionais suficientes para o salvamento de vidas. Enfim garantir que os serviços públicos atinjam seu escopo, que é, não me canso de repetir: garantir dignidade - vida digna a todos os brasileiros e brasileiros. Mantra que deve ser repetido exaustivamente porque, infelizmente, apesar de todos os esforços, o funcionamento com excelência do serviço público ainda não é regra. Lembro, neste ponto, mais um excerto da canção com que iniciei esta fala, que diz, acerca do precário acesso ao direito à educação:

7 Tá vendo aquele colégio moço // Eu também trabalhei lá // Lá eu quase me arrebento Fiz a massa, pus cimento // Ajudei a rebocar // Minha filha inocente //Vem prá mim toda contente //"Pai vou me matricular" // Mas me diz um cidadão: // "Criança de pé no chão // Aqui não pode estudar" // Essa dor doeu mais forte // Por que é que eu deixei o norte // Eu me pus a me dizer // Lá a seca castigava // Mas o pouco que eu plantava // Tinha direito a comer... Assim, diante deste quadro, Eminente Conselheiro Ulices Andrade, Excelentíssimas Autoridades, Minhas Senhoras e meus senhores, finalizo fazendo uma exortação para que todas as instituições, e todos nós servidores e agentes públicos pratiquemos o ato simbólico de abrir portas; abrir portas para a transparência; abrir portas para revelar aos cidadãos os meandros da gestão pública; abrir portas para o efetivo acesso a um serviço público de excelência. E, por maior que sejam os desafios da igualdade e da justiça social, da excelência no serviço público. Possibilidade há de resolução. Digo isso, pois o mundo está em constante mudança, profunda transformação: há 120 anos havia escravidão e monarquia no Brasil; há 30 anos havia uma ditadura; há 25 anos a eleição para Presidente era indireta; há 15 anos não havia internet ou telefonia celular consolidada; fatos que me permitem imaginar que, com trabalho árduo, e vontade política, em poucos anos, todas as portas mencionadas estarão abertas, aliás, como é a vocação do mundo, a vocação da vida, pelo menos na vontade e visão de igualdade do criador, pois, como mais uma vez diz a canção cantada por Zé Ramalho: Tá vendo aquela igreja moço // Onde o padre diz amém //Pus o sino e o badalo Enchi minha mão de calo //Lá eu trabalhei também //Lá foi que valeu a pena Tem quermesse, tem novena //E o padre me deixa entrar //Foi lá que Cristo me disse: "Rapaz deixe de tolice // Não se deixe amedrontar // Fui eu quem criou a terra Enchi o rio, fiz a serra // Não deixei nada faltar //Hoje o homem criou asa E na maioria das casas // Eu também não posso entrar " Façamos do ato de abrir portas um ofício. Muito obrigado.