A Curva de Lorenz e o Índice de Gini
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1 A Curva de Lorenz e o Índice de Gini Curva de Lorenz Considere n valores para uma variável x i e admita-os ordenados de forma que x x 2... x n. A proporção acumulada da população até a i-ésima pessoa é p i = i n e a correspondente proporção acumulada da variável x i é Φ i = nµ i j= x j. Os pares de valores (p i, Φ i ) correspondem a pontos que, uma vez unidos, formam a "curva de Lorenz". No caso de perfeita eqüidade, x i = µ para todo i, e a curva de Lorenz corresponde à reta diagonal que une os pontos (0,0) e (,). No outro extremo, temos o caso de perfeita iniqüidade, no qual um único indivíduo j possui tudo (x j = Nµ e x i = 0 para i j). Nesta situação, a curva de Lorenz coincide com o eixo horizontal do gráco até o ponto no qual a proporção acumulada da população corresponda a n /n. Pode-se mostrar que a declividade da curva de Lorenz correspondente à i-ésima pessoa é sua participação relativa no total de x. Devido ao ordenamento crescente da variável, garante-se a inclinação sempre não decrescente da curva de Lorenz. Índice de Gini A área compreendida entre a linha de perfeita eqüidade e a curva de Lorenz é a área de desigualdade, indicada por α na Figura. No caso de perfeita iniqüidade, n pessoas possuem 0 e um único indivíduo possui tudo. A área de desigualdade corresponde à área do triângulo cuja base (no eixo das abscissas) é igual a /n e cuja altura é igual a. Assim, o valor máximo de α para uma distribuição discreta é α max = 2 ( ) n Note que, à medida que o tamanho ( ) da população aumenta, α max converge para lim n α max = lim n 2 n =. 2 ()
2 Proporção Acumulada de x Perfeita Eqüidade Perfeita Iniqüidade Intermediário Curva de Lorenz α Proporção Acumulada da População Figura : Casos possíveis para curvas de Lorenz de uma distribuição O índice de Gini (G) é denido como o quociente entre a área de desigualdade α e o valor deste limite: Como 0 α 2 2 0, 5 =. G = α = 2α (2) 0, 5 ( ) ( n, temos que 0 G n). E Gmax = lim n 2α max = O cálculo do Gini de uma distribuição pode ser realizado sem que para tanto seja necessário recorrer à plotagem da curva de Lorenz. Denimos a área entre a curva de Lorenz e o eixo das abscissas por β. Então, temos α + β = 0, 5. É possivel decompor a área β em n trapézios. Indicamos a área do i-ésimo trapézio por S i, cuja altura é igual a p i p i = /n e bases maior e menor correspondem a Φ i e Φ i, respectivamente. Assumindo Φ 0 = 0, temos S i = 2n (Φ i + Φ i ) (3) A área β pode ser encontrada através da soma de todos os trapézios, isto é, β = i= S i = 2n (Φ i + Φ i ) (4) A partir da equação (2) e do fato de que α = 0, 5 β, obtemos a seguinte expressão para o índice de Gini G = 2β = n 2 i= (Φ i + Φ i ) (5) i=
3 O Gini pode ser então calculado a partir de uma distribuição x qualquer, dispensando o uso de uma curva de Lorenz. É possível recorrer a uma fórmula alternativa para o Gini, bastando notar que i= (Φ i + Φ i ) = nµ [(2n ) x + (2n 3) x x n + x n ] = nµ i= (2n 2i + ) x i Assim, temos que G = n { nµ i= (2n 2i + ) x i = i= (2n 2i + ) x i = i= ix i n O que nos dá a seguinte expressão para o Gini } G = 2 i= ( ix i + ) n (6) ou ainda, G = 2µ (7) onde = n i j x 2 i x j = 4 n 2 i ix i 2µ ( ) + n corresponde à diferença média de x, isto é, a média dos valores absolutos das diferenças entre dois valores quaisquer da variável. Dual do Índice de Gini Seja x uma variável aleatória com média µ e distribuição tal que o valor de certa medida de desigualdade é M. Chama-se dual a distribuição com as seguintes características:. x = 0, com probabilidade U, e x = µ U com probabilidade U (o que implica em uma média ainda igual a µ). 2. O valor da medida de desigualdade considerada é igual a M. A proporção (U) de elementos com valor igual a zero na distribuição dual é chamada duas da medida de desigualdade considerada. O dual apresenta algumas vantagens sobre a medida de desigualdade que o origina: Por ser uma proporção, seu valor é adimensional e varia no intervalo [0, ]. A sensibilidade de uma medida de desigualdade pode ser estudada através de seu dual. 3
4 Curva de Lorenz Proporção Acumulada de x α < U > Proporção Acumulada da População Figura 2: Curva de Lorenz da distribuição em que x = 0, com probabilidade U, e x = µ U com probabilidade U. As medidas de desigualdade podem ser comparadas por meio de seus duais. Note que a área de desigualdade na Figura 2 é igual a U /2. Uma vez que o Gini corresponde à duas vezes a área de desigualdade, temos que U = G, isto é, o dual do índice de Gini é o próprio índice. O conceito de dual pode ser empregado para determinar a modicação que sofre uma certa medida de desigualdade quando a uma população de n elementos é adicionado um novo conjunto de m elementos para os quais a variável é igual a zero. Sejam φ = m a participação do conjunto adicionado no novo total e m+n U o valor do dual na situação inicial. Então, para a proporção U da distribuição dual, a variável é igual a zero. Após a adição do novo conjunto de elementos, a proporção de elementos com valor igual a zero passa a ser m + U n m + n = m m + n + U n m + n = φ + U ( φ) Por denição, esta proporção é o dual da nova distribuição, com m+n elementos. U 2 = φ + U ( φ) Como o índice de Gini é igual ao próprio dual, temos G 2 = φ + G ( φ) onde G e G 2 são os valores do Gini das distribuições inicial e nal, respectivamente. 4
5 Transferências Regressivas de Renda, o Princípio de Pigou-Dalton e o Índice de Gini Uma transferência regressiva de renda consiste em substrair um montante de renda de uma pessoa e acrescentá-lo à de uma outra pessoa que, anteriormente, tinha renda igual ou maior que a primeira. A condição de Pigou-Dalton estabelece que as medidas de desigualdade devem ter seus valores aumentados quando há transferências regressivas de renda. Podemos vericar que o Gini obedece à condição de Pigou-Dalton. De acordo com a equação (6) G = 2 i= ix i ( ) + n = 2 (x + 2x ix i jx j nx n ) n onde j > i e as rendas estão em ordem crescente. Uma transferência regressiva consiste em retirar um montante θ > 0 de x i e acrescentá-lo a x j. Consideremos o caso em que não e necessária a reordenação dos valores. Se G 0 e G são, respectivamente, os valores do Gini para as distribuições inicial e nal, temos que G = G (j i)θ Como j > i, temos G > G 0. Decomposição do Índice de Gini Admita uma pouplação de N pessoas, dividida em k grupos. Denotamos por x hi a renda da i-ésima pessoa do h-ésimo grupo, e por n h o número de pessoas neste grupo. Denimos ainda π h = n h/n, a proporção de pessoas no grupo h, e µ h, a respectiva renda média. Temos N = h n h µ = h π hµ h A proporção da renda global recebida pelo grupo h é Y h = n hµ h Nµ = π hµ h µ Admita os grupos ordenados conforme o valor de suas rendas médias, isto é, µ µ 2... µ k O índice de Gini entre grupos é (8) G e = h (Φ h + Φ h )π h (9) onde Φ h = Nµ h j= µ jn j é a proporção da renda acumulada até o grupo h. Note que a equação acima é semelhante à equação (5), diferindo apenas quanto aos pesos atribuídos a cada parcela do somatório. 5
6 O índice de Gini dentro do i-ésimo grupo é G h = (Φ hi + Φ h,i ) (0) n h onde Φ hi = n h µ h i j= x hj. Quando não há superposição dos intervalos de renda, é possível mostrar que i G = G e + h π h Y h G h () Contudo, nos casos mais gerais em que há superposição dos intervalos de renda, temos G = G e + h π h Y h G h + G s (2) onde G s é o componente associado à superposição entre os grupos. Dessa forma, diz-se que o Gini é uma medida de desigualdade não decomponível. Exercícios. Considere uma pooulação com 4 pessoas e distribuição de renda x = [0; 2; 4; 6]. (a) Desenhe a curva de Lorenz. (b) Calcule o Índice de Gini associado à distribuição. (c) Desenhe a curva de Lorenz para a distribuição dual. (d) Encontre o dual do Gini para a distribuição acima. 2. Suponha que possamos dividir a população em 2 grupos. Então, x = [x ; x 2 ], onde x = [0; 2] e x 2 = [4; 6]. Calcule o Gini entre grupos (G e ) e o Gini intra-grupos (G h, h =, 2), e verique que G = G e + h π hy h G h. 3. Considere uma transferência de renda regressiva sobre a distribuição do exercício anterior, tal que a nova distribuição seja y = [0; ; 4; 7]. Calcule o Gini desta nova distribuição. Referências Homann, Rodolfo (998) Distribuição de Renda, Medidas de Desigualdade e Pobreza, São Paulo. Editora da Universidade de São Paulo. 998, Capítulo 3 6
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