APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO Nº DA 3ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE CURITIBA EMENTA

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1 APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO Nº DA 3ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE CURITIBA Apelante : ESTADO DO PARANÁ Apelado Relator : RUBENS GARCEZ DA LUZ : Des. LEONEL CUNHA EMENTA 1) DIREITO ADMINISTRATIVO. POLICIAL MILITAR. TRANSFERÊNCIAS POR INTERESSE DO SERVIÇO. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS. NULIDADE. a) A Administração Pública rege-se, constitucionalmente, pelos princípios da publicidade, legalidade, finalidade, eficiência e motivação dos atos administrativos. b) Assim, é necessário que os atos praticados pelo administrador mencionem, não apenas os fundamentos jurídicos, mas também a sustentação fática concreta, sob pena de nulidade. Página 1 de 10

2 c) Nessas condições, as transferências do Policial Militar por interesse do serviço não é justificativa suficiente para motivar o ato administrativo, uma vez que não foram expostos os elementos fáticos, existindo ofensa ao princípio da motivação. d) Por fim, vale ressaltar que existem indícios nos autos de que ambas as transferências tenham ocorrido em razão da alegada perseguição de seu superior hierárquico, uma vez que o Apelado depôs contra sua Chefia em Processo Investigatório, caracterizando, ainda, ofensa ao princípio da finalidade (desvio de finalidade). 2) APELO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO. Vistos, RELATÓRIO 1) RUBENS GARCEZ DA LUZ impetrou MANDADO DE SEGURANÇA em face de ato do Senhor COMANDANTE GERAL DA POLÍCIA MILITAR DO PARANÁ, alegando que: a) pertence ao Quadro da Polícia Militar do Paraná, na função de Capitão, residindo, com sua família, em Cascavel; b) em 25 Página 2 de 10

3 de janeiro de 2010, foi transferido, sem motivação, por interesse do serviço, para o 14º Batalhão da Polícia Militar, localizado em Foz do Iguaçu; c) em 26 de abril de 2010, foi novamente transferido, sob o fundamento de interesse do serviço, para o 3º Batalhão da Polícia Militar, com sede em Pato Branco; d) foi transferido porque prestou declarações como testemunha em procedimento investigatório instaurado contra seu superior hierárquico; e) assim, as transferências ofenderam os princípios da impessoalidade, moralidade, razoabilidade e motivação. Pediu a nulidade das transferências, com a sua permanência na cidade de Cascavel. 2) A Autoridade apontada Coatora prestou informações (fls. 44/59), sustentando que: a) não há direito líquido e certo, pois as alegações do Impetrante demandam a produção de provas; b) as transferências do Impetrante foram realizadas por autoridade competente e dentro dos limites legais; c) os motivos das transferências do Impetrante foram expostos no Ofício nº 002/P3; d) as transferências do Impetrante atenderam tanto o interesse da Administração quanto o interesse do próprio Impetrante; e) a movimentação dos policiais militares depende do juízo discricionário de conveniência e oportunidade da Administração Pública. 3) A sentença (fls. 148/157) concedeu parcialmente a segurança, porque: a) as transferências do Impetrante não foram devidamente motivadas, pois não foram expostos os Página 3 de 10

4 elementos de fato e de direito; b) (...) não há justificativa válida para as duas transferências atacadas, mesmo porque inexistiu interesse público que justificasse os atos de remoção, sendo que impera a valorização da proteção e unidade da família, em caso de impossibilidade de conciliação entre os interesses da Administração Pública (fl. 156). 4) ESTADO DO PARANÁ apelou (fls. 160/168), alegando que: a) o ato de remoção do Apelado foi devidamente motivado, uma vez que atendeu primariamente ao interesse da Corporação, no sentido de desenvolver nos oficiais experiência de comando, por meio do desempenho de diversas funções (fl. 162); b) as transferências do Impetrante foram motivadas no interesse do serviço; c) a função precípua do policial militar é atender às demandas da Administração para a manutenção da ordem pública; d) as relações familiares do Apelado não podem prejudicar os interesses da Administração Pública; e) a movimentação dos policiais militares está sujeita ao juízo discricionário de conveniência e oportunidade da Administração Pública. 173/178). 5) O Apelado apresentou contrarrazões (fls. É o relatório. Página 4 de 10

5 FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de Apelação interposta contra a Sentença que anulou as transferências do Policial Militar, ora Apelado, sob o fundamento de que não houve a devida motivação nos atos administrativos. Verifica-se dos autos que o Apelado foi admitido pela Administração Pública, por meio de concurso público, para o cargo de Policial Militar, tendo sido lotado na 3ª Companhia do Batalhão da Polícia Rodoviária Militar do Paraná, na cidade de Cascavel. Em razão do Boletim Geral da Polícia Militar nº 016, de 25 de janeiro de 2010 (fl. 17), tomou ciência de sua transferência, por interesse do serviço, da Companhia em que se encontrava lotado para o 14º Batalhão da cidade de Foz do Iguaçu. Em 26 de abril de 2010, por meio do Boletim Geral da Polícia Militar nº 077 (f. 18), foi novamente surpreendido com mais uma transferência, também por interesse do serviço, agora para o 3º Batalhão da cidade de Pato Branco. Nota-se que os referidos Boletins não são suficientes para atender à exigência da motivação, porquanto não Página 5 de 10

6 indicaram justificativa razoável de relevância e urgência que autorizasse a transferência de local de trabalho do Apelado. A mera sustentação de que o interesse do serviço seja a fundamentação para a transferência de um militar para outra localidade não é argumento suficiente para motivar o ato, que deveria ser exaustivamente justificado, sob pena de ofensa aos princípios da motivação e da finalidade. A transferência por interesse do serviço faz menção a razões abstratas e que não podem ser precisadas. Vale dizer, ocultam os motivos concretos do ato administrativo e impedem, inclusive, o controle (judicial ou interno) do ato. A Administração Pública rege-se, constitucionalmente, pelos princípios da publicidade, legalidade, finalidade, eficiência (CF, artigo 37), e também da motivação dos atos administrativos. Assim, é necessário que os atos praticados pelo administrador mencionem, não apenas os fundamentos jurídicos, mas também a sustentação fática concreta. Isso busca preservar o direito do cidadão, a fim de que os atos praticados encontrem correspondências no ordenamento jurídico. Garante-se, assim, que os Página 6 de 10

7 atos sejam exercidos de acordo com as necessidades concretas, publicamente exibidas e passíveis de avaliação. Portanto, o ato administrativo, inclusive o discricionário, eivado da ausência de motivação adequada a ensejar a transferência de servidor público de local de trabalho, não pode ser considerado válido. Sobre a necessidade de motivar o ato administrativo leciona Maria Sylvia Zanella Di Pietro: (...) Entendemos que a motivação é, em regra, necessária, seja para os atos vinculados, seja para os atos discricionários, pois constitui garantia de legalidade, que tanto diz respeito ao interessado como a própria administração pública; a motivação é que permite a verificação, a qualquer momento, da legalidade do ato, até mesmo pelos demais poderes do estado (in Direito Administrativo, São Paulo: Ed. Atlas, 12ª. Edição, p. 195). Ainda, vale dizer que cabe à Administração Pública dispor sobre a lotação e movimentação de servidores públicos, utilizando-se da competência discricionária. Entretanto, não pode o Poder Público deslocar seus servidores de maneira abusiva e indiscriminada ou sem Página 7 de 10

8 fundamentação. A discricionariedade só pode ser levada a efeito se realizado o indispensável juízo de conveniência e oportunidade, devendo sempre o ato ser motivado. Leciona MARÇAL JUSTEN FILHO que: (...) A relevância das questões disciplinadas administrativamente exige que o administrador externe as ponderações que realizou não apenas quanto aos meios, mas também quanto aos próprios fins que busca concretamente realizar. Para dizer de outro modo, a legitimação das decisões administrativas não se faz apenas pela invocação genérica e indeterminada do 'interesse público', mas exige que seja traduzida concretamente adotada pelo aplicador quanto ao fim por ele eleito para as decisões que adotar (Curso de Direito Administrativo, Marçal Justen Filho, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 169). Esta Corte já decidiu nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DECLARTÓRIA DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO. POLICIAL MILITAR. ATO DA ADMINISTRAÇÃO QUE O REMOVEU O SERVIDOR DO BATALHÃO DA POLÍCIA RODOVIÁRIA PARA OUTRO BATALHÃO DE POLICIAMENTO OSTENSIVO. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO DO ATO. NULIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Observa-se dos autos que a remoção do apelado do Batalhão da Polícia Rodoviária para o Página 8 de 10

9 Batalhão de Policiamento Ostensivo se deu sem que houvesse qualquer justificativa (motivo) razoável de relevância e urgência. A motivação do ato administrativo é obrigatória por força dos artigos 5º, XXXV, (Princípio do Acesso à Justiça) e 37, caput, (Princípio da Moralidade), ambos da Constituição Federal, sob pena de nulidade do ato. Assim, o ato administrativo, inclusive o discricionário, eivado da ausência de motivação adequada a ensejar a motivação de remoção de servidor público, não pode ser considerado válido (TJPR - 5ª C.Cível - AC Cascavel - Rel.: Luiz Mateus de Lima - Unânime - J ). APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA - REMOÇÃO DE POLICIAIS RODOVIÁRIOS ESTADUAIS PARA UNIDADE DIVERSA DA CORPORAÇÃO - ALEGAÇÃO DE NECESSIDADE DO SERVIÇO E SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO SOBRE O PRIVADO - AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO - RECURSO VOLUNTÁRIO IMPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA EM SEDE DE REMESSA OFICIAL. "Hoje, em face da ampliação do princípio do acesso ao Judiciário (CF, art. 5º, XXXV), conjugado com o da moralidade administrativa (CF, art. 37, "caput") a motivação é, em regra, obrigatória. Só não o será quando a lei a dispensar ou se a natureza do ato for com ela incompatível." (TJPR - 4ª C.Cível - ACR Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Salvatore Antonio Astuti - - J ). Página 9 de 10

10 Por fim, vale ressaltar que existem indícios nos autos (fl. 19) de que ambas as transferências tenham ocorrido em razão da alegada perseguição de seu superior hierárquico, uma vez que o Apelado depôs contra sua Chefia em Processo Investigatório, caracterizando, ainda, ofensa ao princípio da finalidade. ANTE O EXPOSTO, voto por que seja negado provimento ao Apelo e mantida a sentença em Reexame Necessário. DECISÃO ACORDAM os integrantes da Quinta Câmara Cível do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em negar provimento ao Apelo e manter a sentença em Reexame Necessário. Participaram do julgamento os Desembargadores LEONEL CUNHA, Presidente e Relator, o Juiz Substituto em 2º Grau EDISON DE OLIVEIRA MACEDO FILHO e o Desembargador JOSÉ MARCOS DE MOURA. CURITIBA, 25 de setembro de Desembargador LEONEL CUNHA Relator Página 10 de 10