AQUISIÇÃO FONOLÓGICA EM CRIANÇAS DE 3 A 8 ANOS: A INFLUÊNCIA DO NÍVEL SÓCIO ECONÔMICO
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- Eugénio Peixoto Regueira
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1 AQUISIÇÃO FONOLÓGICA EM CRIANÇAS DE 3 A 8 ANOS: A INFLUÊNCIA DO NÍVEL SÓCIO ECONÔMICO Palavras Chave: Criança, Fala, Desenvolvimento da Linguagem Introdução: A aquisição do sistema fonológico ocorre durante os primeiros anos de vida da criança, período em que os fonemas são adquiridos e estabilizados de acordo com a comunidade lingüística onde está inserida. Para adquirir uma língua a criança deve dominar o inventário fonético e o sistema fonológico considerados como padrão, ou seja, a norma encontrada na fala do adulto de sua comunidade lingüística. Problemas na aquisição de sons levam não só à dificuldade na comunicação como também à dificuldade na aquisição da língua e conseqüentemente na vida escolar de uma criança, as conseqüências a partir daí são óbvias. Neste sentido, o presente estudo teve por objetivo investigar a influência do nível sócio econômico no processo de aquisição fonológica de crianças falantes do Português Brasileiro. Método: Foram avaliadas 80 crianças, residentes na cidade do Rio de Janeiro, de ambos os sexos, com idades entre 03 e 08 anos. As crianças foram divididas em 0 grupos, de forma que cada grupo fosse composto de 96 crianças, sendo 8 meninas e 8 meninos. Do total de crianças 0 eram de nível sócio econômico alto e 0 de nível sócio econômico baixo. Os participantes de nível sócio econômico alto eram estudantes de escolas particulares que podem ser consideradas como representativas da classe média alta, da cidade do Rio de Janeiro com base na localização na cidade e o preço da mensalidade escolar. As crianças de nível sócio econômico baixo foram selecionadas em escolas públicas da cidade do Rio de Janeiro e Baixada Fluminense. Foram incluídas na pesquisa apenas as crianças que não apresentassem nenhum problema auditivo, neurológico ou de fala/linguagem, de acordo com a observação das professoras e coordenadoras pedagógicas e triagem realizada pelas pesquisadoras. As crianças que estavam ou já haviam feito tratamento fonoaudiológico também foram excluídas da amostra. A coleta de dados foi realizada através de um teste de nomeação composto de 9 palavras apresentadas impressas em papel fotográfico, tamanho X, desenvolvida no Programa de Mestrado Profissional da Universidade Veiga de Almeida. As crianças foram avaliadas nas escolas em salas silenciosas e as amostras de fala foram gravadas em formato digital em áudio apenas. A notação fonética (normas do Alfabeto Fonético Internacional - IPA 993) foi realizada durante a avaliação e reavaliada posteriormente utilizando a gravação digital. Os dados foram confrontados com a análise de um segundo avaliador com competência na área. Após a comparação, esclarecidas as divergências possíveis entre as duas notações, foi definida a notação final. Os dados foram analisados buscando determinar ) o inventario fonético (quantas e quais consoantes estavam adquiridas) ) o percentual de consoantes corretas - PCC e 3) os
2 processos fonológicos presentes. Os dados foram comparados em relação à idade, ao sexo e ao nível sócio econômico. Resultados: Na análise do Inventario fonético, foi utilizado um critério de % de produção correta para que um som fosse considerado como adquirido e foi observado que a completude do mesmo aumenta com a idade. Com o aumento da idade também foi observado a diminuição da variabilidade entre as crianças como indicado pelo desvio padrão (tabela ). Tabela. Inventário fonético. Número de sons adquiridos (máximo de ) por faixa etária. Idade média mínimo máximo DP Ao se considerar cada grupo etário separadamente, não foram observadas diferenças significativas entre meninos e meninas (p>0.0). No entanto ao se analisar o grupo como um todo, observou-se que a completude do inventário fonético foi maior no sexo feminino, apesar da pequena diferença (média de consoantes adquiridas 9.93 vs. 9.9 respectivamente; Mann-Whitney U test Z = -,; p = 0. 0). A comparação entre as classes sociais demonstrou que as crianças da classe alta apresentam um inventário fonético mais completo do que às da classe baixa, a partir de anos. (tabela ). Os sons que demonstraram estar adquiridos mais precocemente (aos 3 anos) foram as consoantes plosivas /p/, /b/, /t/, /d/, /k/, /g/, as nasais /m/, /n/, / ɲ /, as africadas /tʃ/ and / dʒ / e as fricativas /f/, /v/ and /S/. As crianças da classe baixa demonstraram de um modo geral um processo de aquisição mais tardio do que as crianças de classe alta. Especialmente nas consoantes líquidas este dado se apresentou de forma mais acentuada. Notou-se também maior dificuldade das crianças com estruturas silábicas mais complexas, por exemplo, apenas 6.3% das crianças demonstraram ter adquirido o fonema /l/ em onset complexo aos 8 anos (tabela 3). Tabela. Inventário Fonético. Comparação entre as classes alta e baixa. N médio de sons adquiridos Idade classe alta classe baixa p < < <0.00 Tabela 3. Porcentagem de crianças que já adquiriram o som (critério: % de produção correta) idade 3- anos - anos -6 anos 6- anos -8 anos classe Baixa Alta Total Baixa Alta Total Baixa Alta Total Baixa Alta Total Baixa Alta Total som N CV p CV b CV3 t CV d CV k CV6 g CV f CV8 v
3 CV9 s CV0 z CV ʃ CV ʒ CV3 tʃ CV dʒ CV m CV6 n CV λ CV8 ɲ CV9 r CV0 R CV l CCV p CCV b CCV3 t CCV d CCV k CCV6 g CCV f CCV8 v CCV9 r CCV l CVC ʃ CVC0 R O PCC 3 também mostrou uma tendência a aumentar com a idade e a variabilidade entre as crianças a diminuir (tabela ). Nenhuma diferença foi observada entre meninos e meninas (média respectivamente 9.33 vs ; Mann-Whitney U test Z = -,; p = 0. 6). A comparação entre as crianças de classe alta e baixa apontou para um PCC mais alto para a classe alta a partir dos anos (tabela ). Tabela. Porcentagem de consoantes corretas PCC Idade média mínimo máximo DP Tabela. PCC. Comparação entre as crianças de classe alta e baixa PCC Idade classe alta classe baixa p < < <0.00 A análise dos processos fonológicos demonstrou que poucos processos ocorrem além de 6 anos (tabela 6). Os processos mais frequentemente observados nos grupos mais jovens foram redução de encontro consonantal, apagamento de consoante final e lateralização. Aqui também não foram observadas diferenças entre os sexos (média para meninas e meninos 3.3 vs. 3.9 respectivamente; Mann-Whitney U test Z = -,600; p = 0. 0), mas entre as classes sociais observou-se maior ocorrência de processos na classe baixa em quase todas 3
4 as faixas etárias (tabela ). Curioso observar que 8,3% das crianças de classe baixa fizeram uso do processo de substituição do /l/ pelo /r/, até a idade de 8 anos, o que não foi observado nas crianças de classe alta. O processo de apagamento de consoante final também chama a atenção, uma vez que foi observado em 83,3% das crianças de classe baixa até a idade de 8 anos (tabela 8). Tabela 6. Número de processos fonológicos utilizados Idade Média mínimo máximo DP Tabela. Número de processos fonológicos utilizados: Comparação entre as crianças de classe alta e baixa Média de processos Idade Classe alta Classe baixa p < < < <0.00 Tabela 8. Porcentagem de crianças utilizando os processos idade 3- anos - anos -6 anos 6- anos -8 anos classe Baix Alta Tota Baix Alta Tota Baix Alta Tota Baix Alta Tota Baix Alta Tota a l processos N RED ENC CONS 9 AP SIL ÁTONA AP CONS FINAL REDUPLICAÇÃ O EPÊNTESE APÓCOPE METÁTESE PLOSIVIZAÇÃO AFRICAÇÃO ANTERIORIZ POSTERIORIZ ENSURDECI LATERALIZ SEMIVOCALIZ MONOTONG ASSIMILAÇÃO
5 9 APAG LIQUIDA DESAFRICAÇÃ O ACRÉSCIMO SONORORIZ SUBST l > r Conclusão: Os resultados do presente estudo vêm contribuir para o desenvolvimento de dados normativos, que podem ajudar o fonoaudiólogo na avaliação e tratamento de crianças com transtornos dos sons da fala. É importante ressaltar que os dados não podem ser generalizados para outras populações, como por exemplo, a região rural. Os resultados indicam uma diferença entre as crianças das classes alta e baixa em relação ao inventario fonético e o PCC, principalmente acima dos anos. No que se refere aos processos fonológicos essa diferença ocorre desde os 3 anos. Tomando como panorama a realidade descrita acima, compreendemos que as famílias que fazem parte dela, muitas vezes não utilizam a fala padrão (utilizada pela classe dominante e legitimada pela escola). Em vista disso, as crianças só passam a ter acesso a essa linguagem no ambiente escolar. Os dados demonstram uma necessidade de desenvolvimento de programas que busquem diminuir as diferenças entre as classes sociais e que possam checar o modelo lingüístico oferecido nas escolas públicas. Referências.Wertzner, H, F. Fonologia: Desenvolvimento e alterações. In: Ferreira, LP.; Befi-Lopes, D M.; Limongi, S C. O. Tratado de fonoaudiologia. São Paulo: Roca, 00. P Amayreh, M.;Dyson,A. The acquisition of arabic consonants. J Speech Lang Hear Res 998; () Shriberg Ld, Austion D, Lewis Ba, Mscweeny Jl, Wilson Dl. The percentage of consonants correct (PCC) Metric: Extensions and Reliability Data.. J Speech Lang Hear Res 99 aug; 0:08-.
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