J f ~~!.'-d '1 J 04 HOMENAGEM AO ~CENTENÁRIO DO SUPREMO T~IBUNAL FEDERAL CÂMARA DOS DEPUTADOS

Transcrição

1 CÂMARA DOS DEPUTADOS HOMENAGEM AO ~CENTENÁRIO DO SUPREMO T~IBUNAL FEDERAL Discursos pronunciados em homenagem ao centenário do Supremo Tribunal Federal, na sessão de 31 de outubro de J f ~~!.'-d '1 J 04 H.f~S t\c.~ Centro de Documentação e Informação Coordenação de Publicações BRASÍLIA

2 PRESIDENTE (Ibsen Pinheiro) - Para falar em nome do Partido Democrático Trabalhista, tem a palavra o seu Líder, Deputado Vivaldo Barbosa. VIVALDO BARBOSA (PDT - RJ) - Sr. Presidente Ibsen Pinheiro; Sr. Presidente Sidney Sanches, Ministro do Supremo Tribunal Federal; minha saudação, homenagem, respeito e devoção ao que V. Ex' representa como encarnação do Poder JudiciáriÇ) deste País, saudação que se estende a todos os Srs. Ministros integrantes do Supremo Tribunal Federal, Sr. Presidente do Superior Tribunal Militar, demais 'integrantes do Poder Judiciário do nosso País, os cem anos de história do Supremo Tribunal Federal devem tocar com um pouco mais de ressonância, com um pouco mais de profundidade o coração e a alma do povo brasileiro, e deveria tocar com mais profundidade ainda os representantes do povo brasileiro nesta Casa. Esta sessão não é adequada à homenagem que aqui deveríamos estar prestando ao Supremo Tribunal Federal. Hoje, no entanto, acontecimentos nesta Casa não estão propiciando a todos nós esta homenagem devida. Há, na Comissão de Constituição e Justiça e de Redação, o processo de deliberação sobre a cassação de um Parlamentar desta Casa, e exatamente relator do processo, o nobre Deputado Vital do Rêgo, seria o representante da bancada do PDT na homenagem aos cem anos de história do Supremo Tribunal Federal. Há também a presença do Ministro e de altos oficiais do Exército numa exposição sobre uma crise que atinge aquela instituição, que é do conhecimento de todos, pelo noticiário dos últimos dias. Mas nós, como Oposição - e o Partido Democrático Trabalhista constitui menos de 10% desta Casa -, também reclamamos contra o fato de esta Casa não ter homenageado o povo brasileiro como ele merece, na circunstância própria, especialmente o povo trabalhador deste País. Há, Sr. Ministro Sidney Sanches, Srs. Ministros do Supremo Tribunal Federal, uma tese que hoje atinge o Congresso Nacional de maneira muito ressonante, tese que nós, representantes do povo, com a responsabilidade e a visão da República, temos que enfrentar, tese que não faz justiça ao papel que o Supremo Tribunal Federal tem desempenhado ao longo da nossa História. Esta Casa, hoje, abraça, e parece-me que numa expressiva maioria, a tese parlamentarista, que debatemos na Assembléia Nacional Constituinte, quando estive no campo oposto, como ainda me encontro hoje, defendendo o sistema presidencialista de governo. O centro, a temática maior da tese 26

3 'parlamentarista, neste País, é de que o Brasil não poderia adotar o sistema presidencialista vigente nos Estados Unidos, porque, lá, a Suprema Corte americana, ao contrário do papel que alegam teria desempenhado o Supremo Tribunal Federal, desempenha um papel institucional de tal ordem que, ao contrário do que aqui ocorre, traz o equilíbrio institucional, traz a normalidade democrática, o que a República brasíleira não assistiu nos seus cem anos de História. Sr. Presidente, Sr~s e Srs. Deputados, Srs. Ministros, é evidente que a tese parlamentarista merece o nosso respeito, merece a nossa reflexão, mas merece também o nosso mergulho em todos os seus fundamentos, em todas as sua justificativas, em toda a "ua apresentação. E essa questão de atribuir ao Supremo Tribunal Federal, na História da República brasileira, um papel menor do que aquele atribuído ao papel da Suprema Corte americana é profundamente injusta ao papel do Supremo Tribunal Federal, não é reconhecedora da história dessa instituição. Sabemos que essa instituição foi drasticamente atingida em dois momentos da sua história: no Governo do Presidente Floriano, que perguntava: "E quem vai tirar da cadeia os Ministros do Supremo, depois que eles retirarem os revoltosos da cadeia?", e na intervenção brutal dos atos institucionais, no regime militar, com aposentadorias de Ministros, de respeitáveis figuras da Nação brasileira, o que, certamente, atingiu duramente a instituição. Mas há na história do Supremo Tribunal Federal instantes engrandecedores que não conheço em nenhum tribunal do Poder Judiciário de outra nação, muito menos na história da Suprema Corte americana. Quero aqui trazer o exemplo da evolução da teoria do habeas corpus, que foi a evolução mais engrandecedora do pensamento jurídico, não legislativo, não congressual, não constitucional. Pela ausência de dispositivos constitucionais, pois a Constituição de 1891 não nasceu atual nem para o seu tempo, já no final do século passado, especialmente no início deste século, início da nossa vida republicana, a sociedade brasileira já estava a exigir mecanismos constitucionais e institucionais de proteção aos direitos individuais, aos direitos civis, às liberdades públicas que a Constituição de 1891, repito, não contemplou. A legislação brasileira processual e substantiva, também no final do século, início deste século, não respondia mais às exigências de uma sociedade que começava a ensaiar um processo de industrialização, uma vez que a Constituição fora feita muito mais como resposta às relações sociais e econômicas do século XIX, para atender a um império parlamentarista que acobertou uma das nações mais atrasadas do século passado: a Nação brasileira. Quando, no final do século, início deste século, o avanço inicial, as pegadas iniciais da nossa República exigiam um instrumental de proteção aos direitos individuais, às liberdades públicas e individuais muito mais do que a legislação formal concebia e concedia, o Supremo Tribunal Federal, numa evolução do pensamento jurídico nacional, começou a dar cobertura, a dar salvaguardas 27

4 a essas liberdades individuais, às liberdades públicas, aos direitos civis dos cidadãos brasileiros. O Supremo Tribunal Federal começou a vestir cada brasileiro com um mínimo de vestes, mesmo ainda farrapos, mesmo ainda trapos, da cidadania plena e hoje o concebemos muito mais vestido que antes. Mas foi exatamente com o Supremo Tribunal Federal, na evolução da teoria brasileira do habeas corpus, talvez o marco mais esplendoroso do pensamento jurídico deste País, que conseguimos, mesmo com trapos e farrapos, vestir cada brasileiro com os seus direitos mínimos de cidadania. Por isso, Sr. Presidente da Câmara dos Deputados, Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal, Srs. Ministros, Sr"s e Srs. Deputados, o parlamentarismo brasileiro poderá ser implantado, o sistema parlamentar de governo poderá ter acolhida até no plebiscito a ser realizado, mas espero que não o seja por essa tese e por essa justificativa, porque esta fere a História, não merece consideração ao próprio respeito que devemos ter às teses, às teorias e aos ideais parlamentaristas, porque agride a nossa História e não faz respeitar a instituição suprema do Poder Judiciário deste País que, ao longo do tempo, por mais crítica que seja a nossa visão das instituições brasileiras, nós, trabalhistas; nós, sociais-democratas; nós, nacionalistas, também temos uma visão crítica da História deste País e de suas instituições, temos reclamos profundos em nome da nossa visão, do povo e da sociedade brasileira, mas jamais poderemos, a título de fazer propagar uma idéia e de querer criar uma mistificação, agredir uma instituição que merece o nosso respeito e consideração, já que é responsável pela ímpar evolução do nosso pensamento jurídico, o que não encontro em nenhuma história institucional de outros países, muito menos na da Suprema Corte americana. Historiadores e pensadores da envergadura de José Honório Rodrigues atribuem ao Poder Judiciário o atraso do País. Reflexões de estadistas, como João Mangabeira, mostram que o Poder Judiciário foi o que mais falhou na República. A visão crítica pode ter diversos ângulos de apreciação. A visão crítica e o reclamo podem, como é feito, derrotar as diversas instituições brasileiras. Não poderemos, neste debate sobre a questão parlamentarista, deixar de esclarecer a situação real de cada posição e de cada tese. Não podemos permitir que seja atacada uma instituição como o Supremo Tribunal Federal.e que, com isso, se pretenda criar argumentos em favor de uma tese onde os argumentos não existem e se procuram criar exemplos onde não há precedentes para justificar um princípio com conteúdo político, respeitável em tese, mas que, em circunstâncias históricas concretas, tem representado muito mais propósitos políticos imediatos que uma solução institucional válida, republicana para o nosso País. Desta forma, Sr.Presidente, Sidney Sanches; Srs. Ministros, a bancada do PDT, de forma, talvez, a menos adequada possível, não podia deixar de prestar esta homenagem ao STF, resgatando a história da instituição, louvando 28

5 a egrégia Corte por ter produzido o pensamento jurídico mais evoluído que a História deste País já concebeu, homenageando e louvando não apenas a sua história, os seus atuais integrantes, as decisões que engrandecem o saber jurídico deste País, mas, acima de tudo, porque a bancada do PDT está hoje presente em um debate nacional que quer compreender, sobre o qual tem reclamos profundos a fazer a todas as instituições brasileiras, mas nunca deixará de fazer justiça às instituições nacionais nos seus momentos de engrandecimento. A história republicana - registramos nós - deste País, no mínimo que resta, nos seus farrapos, nas peças que procuramos juntar - do que se pretende rasgar e estraçalhar - e legar às gerações futuras, faz justiça, homenageia, restaura e resgata o mais sublime que ela tem: a nossa História Republicana, onde o Supremo Tribunal Federal, sem dúvida alguma, está no centro. Minhas homenagens ao Sr. Presidente e aos Srs. Ministros do Supremo Tribunal Federal. Muito obrigado. (Palmas.) 29