Semeando nos Jogos Mankalas: explorando o conteúdo divisibilidade com o jogo Awalé
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- Jonathan Affonso Domingos
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1 Semeando nos Jogos Mankalas: explorando o conteúdo divisibilidade com o jogo Awalé Leonardo Dourado de Azevedo Neto 1 GD2 Educação Matemática nos anos finais do Ensino Fundamental Resumo: O objetivo desta pesquisa é analisar possibilidades de explorar o conteúdo divisibilidade nas aulas de matemática dos anos finais do ensino fundamental, por meio dos jogos da família mankala. Para isto, escolhemos o jogo Awalé que é milenar na África e abrange, na fase dos movimentos de captura e defesa das peças, conceitos matemáticos, práticas religiosas, filosóficas e culturais africanas. Para atingir o objetivo utilizaremos a Teoria das Situações Didáticas proposta por Brousseau como referencial teórico, e, a Engenharia Didática descrita por Artigue como referencial metodológico. Temos a intenção de realizar 10 sessões onde será proposta uma sequência de atividades contendo jogadas que, para a captura ou a defesa, envolva situações de divisibilidade. A coleta dos dados será por meio de registros escritos e gravações audiovisuais das conversas dos alunos durante as sessões. Os sujeitos desta pesquisa serão alunos dos anos finais do ensino fundamental de uma escola pública localizada no município de Campo Grande MS. Ao final da pesquisa esperamos que o jogo Awalé possibilite ao aluno desenvolver habilidades de: realizar divisões utilizando o cálculo mental, reconhecer os múltiplos e divisores de determinados números, bem como, elaborar boas estratégias. Palavras-chave: Estratégias. Jogos Mankalas. Cultura Africana. Introdução O Brasil, histórica e culturalmente, tem mantido uma postura de aceitação diante do preconceito que atinge os afrodescendentes brasileiros, desde o Brasil Colônia até hoje; apesar da atual mudança de postura de parte significativa da população e de ações governamentais diferenciadas que começam a se concretizar. Ao meu ver, com esta realidade de preconceito, os afrobrasileiros vêm enfrentando dificuldades de acesso e também de permanência nas escolas. Em diferentes realidades culturais, a educação constitui um dos principais mecanismos de transformação do povo e, particularmente, na realidade brasileira deveria ser papel da escola estimular a formação de valores e hábitos que respeitassem as características e as diferenças de cada grupo sociocultural. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) enfatizam a integração da História da Matemática e do ensino de Matemática com a temática da pluralidade cultural. 1 Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, leonardo.dourado13@gmail.com, orientador: José Luiz Magalhães de Freitas.
2 Desse modo, um currículo de Matemática deve procurar contribuir, de um lado, para a valorização da pluralidade sociocultural, impedindo o processo de submissão na relação com outras culturas, de outro, criar condições para que o aluno transcenda um modo de vida restrito a um determinado espaço social e se torne ativo na transformação de seu ambiente. Nas últimas décadas, em várias partes do planeta, começaram a surgir novas formas de encarar as realidades social e cultural. A educação escolar também vem constantemente sendo desafiada e, em meio às buscas de superação dos desafios, surge como paradigma torná-la contextualizada, vinculada ao cotidiano e geradora de competências. No âmbito do conhecimento matemático, estes desafios têm tornado crescente o movimento em prol da Educação Matemática e, também, têm gerado reestruturações no currículo e nos métodos de ensino em uma busca de oportunizar aos alunos a capacidade de pensar crítica e reflexivamente. Para garantir a valorização da cultura africana, na atual conjectura, o Brasil necessita de leis que garantam e valorizem a dignidade da população negra. O encontro da educação escolar básica com a pluralidade cultural, proposta nos PCN na intenção de contextualizar diferentes modos de vida, valores e conhecimentos, apresenta-se para a Educação Matemática como um desafio. No contexto educacional, uma busca de reversão desta realidade de exclusão foi assumida legalmente por meio da Lei nº , de 9 de janeiro de 2003, que alterou a Lei nº , de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. A Lei brasileira nº /2003 (Art. 26-A: 2) salienta que os conteúdos referentes à História e Cultura Afrobrasileira deverão ser ministrados no âmbito de todo o currículo escolar. A aplicação desta temática poderá ser feita por diferentes meios, como elaboração de projetos que abranjam um estudo da influência e participação dos africanos na construção econômica, social e cultural do Brasil, enfatizando os modos em que as culturas africanas adentram em diferentes áreas do conhecimento (Matemática, Engenharia, Língua, etc.), a criação tecnológica e artística, dentre outras. Contextualizado nesta realidade legal, o problema central da pesquisa proposta neste projeto pode ser assim descrito: Que possibilidades de explorar o conteúdo divisibilidade
3 nas aulas de matemática dos anos finais do ensino fundamental por meio dos jogos da família mankala? Buscando responder o problema de pesquisa descrito acima, temos como objetivo principal: Analisar possibilidades de explorar o conteúdo divisibilidade nas aulas de matemática nos anos finais do ensino fundamental, por meio do jogo mankala Awalé. Para alcançar o objetivo principal, elencamos os seguintes objetivos específicos: Analisar estratégias mobilizadas envolvendo múltiplos e divisores de um determinado número; Investigar conhecimentos e dificuldades manifestadas pelos alunos diante do jogo proposto. Percebemos a importância de valorizar a inclusão das temáticas História e Cultura Afrobrasileira nos currículos de matemática da educação básica. Para isso, consideramos importante buscar de modo fundamentado nos campos da Educação Matemática saberes que possam contribuir para esse fim. A referida inclusão nos parece essencial para a autocompreensão da formação da identidade por parte de cada um dos indivíduos que compõem a população brasileira. Sendo assim, na busca de explorar os conteúdos de História e Cultura Afrobrasileira nas aulas de matemática, desenvolveremos um trabalho com um jogo da família mankala, denominado Awalé. Consideramos então que, em relação aos outros jogos, o diferencial de trabalhar com o jogo mankala Awalé, está no fato dele envolver nas suas jogadas práticas religiosas, filosóficas e culturais africanas. Como a nossa proposta não é do jogo pelo jogo, mas deste como recurso para estudar conteúdos matemáticos, exploraremos o conteúdo divisibilidade, pois a partir das jogadas é possível formular outras que vão conferir significados à divisão, associadas às ações repartir (igualmente) e determinar quanto cabe (BRASIL, 1998, p. 109). Quando se pensa no ensino da divisão, muitas vezes se considera como ponto central o algoritmo (DEUS; TAHAN, 1998, p. 19), no entanto, nosso interesse não está na construção do algoritmo da divisão bem como nos critérios de divisibilidade.
4 A representação da divisão não pode se reduzir ao conhecimento de uma estratégia de solução acompanhada de um suposto sentido ou significado que permita aplicar a operação (DEUS; TAHAN, 1998, p. 23). Por isso, trabalharemos com situações que envolvam jogadas de captura ou de defesa que para executá-las o aluno usará estratégias que utilizam as noções de múltiplo e de divisor de determinados números. 1. O Multiculturalismo e os Jogos Mankalas As preocupações com as diferenças culturais, a pluralidade cultural e o multiculturalismo estão sendo mais enfatizadas nas diretrizes nacionais para a educação básica. Nesta perspectiva D'Ambrosio (1998) afirma que, Estamos passando por grandes transformações na sociedade, e em particular, na educação. [ ] As profundas transformações nos sistemas de comunicação, de informatização, de produção e de emprego surgem como um resultado da mundialização e, consequentemente, dão origem à globalização e ao multiculturalismo (D'AMBROSIO, 1998). Em uma sala de aula, especialmente na escola pública, se inter-relacionam indivíduos de diferentes grupos socioculturais, que terão que lidar com outros indivíduos, cujas raízes são distintas das suas. Assim, fazer com que as diretrizes nacionais, ao nível do respeito à diferença, sejam efetivadas no cotidiano das escolas brasileiras é por nós considerada como uma ação fundamental. A África é um continente multicultural, com povos que pensaram, pensam e desenvolvem uma diversidade de raciocínios de natureza matemática, povos que têm suas próprias formas de contar, inferir, mensurar, jogar, maneiras de desenvolver técnicas geométricas, dentre outras. No entanto, esses saberes não têm sido valorizados na realidade brasileira. Para que passem a ser, é fundamental realizar pesquisas que contribuam neste sentido. Miguel e Miorim (2004) assim afirmam, Segundo os Parâmetros é de extrema importância que em situações de ensino sejam consideradas as contribuições significativas de culturas que não tiveram hegemonia política e, também, que seja realizado um trabalho que busca explicar, entender e conviver com procedimentos, técnicas e habilidades matemáticas desenvolvidas no entorno sociocultural próprio a certos grupos sociais (MIGUEL; MIORIM, 2004, p. 54). Nesta pesquisa investigaremos potencialidades dos jogos mankalas, em especial o Awalé, na busca de explorar o conteúdo divisibilidade, nas aulas de matemática dos anos finais do ensino fundamental de uma escola pública do município de Campo Grande MS. Em relação a utilização de jogos os PCN (1998), relatam que
5 O jogo além de ser um objeto sociocultural em que a Matemática está presente, é uma atividade natural no desenvolvimento dos processos psicológicos básicos; supõe um fazer sem obrigação externa e imposta, embora demande exigências, normas e controle (BRASIL, 1998, p. 47). Por isso, escolhemos o jogo Awalé que é milenar na África e envolve estratégias, estimativa, cálculo mental e raciocínio lógico matemático. As estratégias são exercícios de cálculos matemáticos, pelos quais desenvolvemos a rapidez mental, a lógica e a concentração (LIMA; GNEKA; LEMOS, 2005, p. 54). Envolve ainda, na fase dos movimentos de captura e defesa das peças, conceitos matemáticos, práticas religiosas, filosóficas e culturais africanas. Neste contexto, Huizinga (2012), afirma que Não foi difícil mostrar a presença extremamente ativa de um certo fator lúdico em todos os processos culturais, como criador de muitas das formas fundamentais da vida social. O espírito de competição lúdica, enquanto impulso social, é mais antigo que a cultura, e a própria vida está toda penetrada por ele, como por um verdadeiro fermento. O ritual teve origem no jogo sagrado, a poesia nasceu do jogo e dele se nutriu, a música e a dança eram puro jogo. [ ] Daí se conclui necessariamente que em suas fases primitivas a cultura é um jogo (HUIZINGA, 2012, p. 193). Partindo da afirmação que a cultura é um jogo iremos por meio da utilização do Awalé trabalhar elementos da cultura africana nas aulas de matemática. Pela África o awalé, recebe vários nomes: awele, lela, chosolo, kalak etc (LIMA; GNEKA; LEMOS, 2005, p. 54). O mankala, antigamente, era associado a rituais mágicos e sagrados. Alguns jogos eram somente para homens ou reservado para os idosos ou sacerdotes. É um jogo de semeadura e colheita que na movimentação das sementes o princípio fundamental é semear para colher, que não varia. Ao jogar o que se está fazendo, é repetir os ciclos da natureza: o cultivo do solo e das colheitas, que seguem o ritmo das estações (LIMA; GNEKA; LEMOS, 2005, p. 54). Para Zaslavsky (2000, p. 32) Mankala é uma palavra árabe, que significa transferir. Pedras ou sementes são transferidas de um recipiente a outro em um tabuleiro com duas, três ou quatro filas de recipientes. Em cada região o jogo tem seu próprio nome e seu próprio conjunto de regras (ZASLAVSKY, 2000, p. 32). E, geralmente, nas extremidades existem grandes cavidades, denominadas depósitos, destinadas ao armazenamento das peças capturadas. A maioria dos jogos são para duas pessoas, que transferem as peças ou sementes de um recipiente para outro.
6 Figura 1 Tabuleiro distribuído em duas filas de recipientes Fonte: elaborado pelo autor A matemática envolvida desenvolve nos alunos a criatividade, a habilidade de contar, calcular e resolver problemas. Acima de tudo, eles aprendem a pensar criticamente. Nos jogos da família mankala existem características comuns às diferentes modalidades existentes, descritas por Odeleye (1977, p. 8 apud MACEDO et al. 2000, p. 71): a) são jogados por duas pessoas, uma em frente à outra, com o tabuleiro longitudinalmente colocado entre elas 2 ; b) antes de começar o jogo, o mesmo número de sementes é distribuído em cada uma das cavidades do tabuleiro; c) os jogadores se alternam para jogar, distribuindo as sementes da cavidade escolhida, uma a uma, no sentido anti-horário, nas cavidades subseqüentes 3 ; d) sempre há captura de sementes, sendo a forma de captura diferente, dependendo do jogo em questão; e) a partida termina quando restam muito poucas sementes para o jogo continuar ou quando resta apenas uma semente em cada lado; f) ganha que tem o maior número de sementes; g) as estratégias do jogo envolvem movimentos calculados, que exigem muita concentração, antecipação e esforço intelectual. Para jogar o Awalé usaremos as regras escritas por Gneka (2005), em um encarte do livro A semente que veio da África. O objetivo do jogo é realizar uma grande colheita, portanto o jogador que colher o maior número de sementes até o final da partida, é o vencedor. O tabuleiro do jogo é dividido em dois territórios, com seis recipientes em cada um. Cada recipiente receberá 4 sementes, de forma que cada jogador preencha todos os recipientes de seu território, perfazendo um total de 24 sementes. Os jogadores decidem quem irá iniciar a partida. Quem começa, escolhe um dos recipientes do seu território e retira as 4 sementes para redistribuí-las. O sentido para a redistribuição é sempre o anti-horário (direita). Depois de retirar as 4 sementes do 2 Como existem variações dos jogos mankalas para mais de dois jogadores esta característica não é definitiva. 3 Existem variações em que o jogador pode distribuir as sementes da cavidade escolhida no sentido horário ou anti-horário, dependendo da estratégia planejada.
7 recipiente escolhido, o jogador coloca uma das 4 sementes em cada um dos recipientes seguintes. O próximo a jogar é o adversário. Ele escolhe um recipiente, no seu território, retira dele todas as sementes e as redistribui, respeitando o sentido (anti-horário) e a sequência (não pular nenhum recipiente). Dependendo da quantidade de sementes contidas em um recipiente, na redistribuição as sementes podem se deslocar por entre os recipientes do seu território, mas também nos do adversário. Na distribuição cada recipiente vai acumulando novas sementes, que se somam às iniciais. Também pode acontecer situações em que os recipientes fiquem com poucas sementes. Os recipientes com 1 ou 2 sementes estão em perigo. Se um jogador calcular bem, de forma que a última semente distribuída caia em um recipiente do adversário que tenha 2 ou 3 sementes (contando com a semente que acabamos de depositar), ele tem o direito de recolher as sementes para si e colocá-las no seu depósito. Nesse momento está ocorrendo a captura também conhecida como colheita. Se um jogador consegue capturar todas as sementes de algum recipiente, conforme descrito acima, todos os recipientes precedentes que também contiverem 2 ou 3 sementes serão esvaziadas. Quando isso acontece dizemos que ocorreu uma colheita múltipla. Se o recipiente escolhido pelo jogador para iniciar a partida tiver mais de 11 sementes, ele terá que depositá-las, uma em cada recipiente, dando uma volta completa no tabuleiro, passando pelos dois territórios. Nesse caso, cada vez que o jogador passar pelo recipiente de partida ele deverá pulá-lo, deixando-o sempre vazio. Se em algum momento da partida o adversário não tiver mais nenhuma semente em seu território, o outro jogador deve escolher um recipiente que tenha a quantidade suficiente de sementes para alimentar o território do adversário. Quando um jogador fica sem sementes em seu território e o adversário não tem como jogar para alimentá-lo, a partida termina e o adversário recolhe as sementes que estão nos seus recipientes para seu depósito. Ganha a partida quem tiver capturado o maior número de sementes (25 ou mais).
8 2. Teoria das Situações Didáticas Tentando responder nossa questão de pesquisa buscaremos, no jogo mankala Awalé, formas de trabalhar com os divisores de um número natural. Com relação aos números naturais, os PCN (1998) dizem que, É fundamental que o aluno continue a explorá-los em situações de contagem, de ordenação, de codificação em que tenha oportunidade de realizar a leitura e escrita de números grandes e desenvolver uma compreensão mais consistente das regras que caracterizam o sistema de numeração que utiliza (BRASIL, 1998, p. 66). O jogo mankala Awelé será de grande proveito para tal finalidade por ser um jogo de estratégia que envolve muita contagem. Lara (2011), entende que os jogos estratégicos são, [ ] jogos que façam com que o aluno crie estratégias de ação para uma melhor atuação como jogador. Onde ele tenha que criar hipóteses e desenvolver um pensamento sistêmico podendo pensar múltiplas alternativas para resolver um determinado problema (LARA, 2011, p. 24). Para analisarmos as estratégias desenvolvidas utilizando os divisores será necessário uma adaptação na regra que fornece as condições de distribuição das sementes. A regra, em questão, diz que o jogador escolhe um dos recipientes do seu território e retira todas as sementes para redistribuí-las. Depois de retirar as sementes do recipiente escolhido, o jogador coloca uma semente em cada um dos recipientes seguintes. Na regra adaptada o jogador decidirá o número de sementes que irá distribuir em cada recipiente, fazendo a divisão do número de sementes em partes iguais e distribuindo as partes em sequência nos recipientes. Nesse momento, o jogador estará buscando os divisores de um determinado número. Por exemplo, se o jogador escolhe um recipiente que contenha 8 sementes, ele poderá fazer a distribuição das sementes nos recipientes seguintes de quatro maneiras: de uma em uma, de duas em duas, de quatro em quatro ou colocar as oito sementes no recipiente seguinte. Para preparar nossa sequência de atividades, iremos utilizar como referencial teórico a Teoria das Situações Didáticas proposta por Brousseau (1986). Segundo Freitas (2012, p. 77), a Teoria das Situações Didáticas trata de formas de apresentação, a alunos, do conteúdo matemático, possibilitando melhor compreender o fenômeno da aprendizagem da matemática.
9 Durante os encontros trabalharemos com as situações adidáticas, as quais o aluno não sofre nenhuma interferência (direta sobre a construção do saber) do professor na realização das atividades propostas. O professor deve fazer o trabalho inverso do cientista, recontextualizando, repersonalizando e temporizando o conteúdo matemático, evitando apresentações de resultados prontos, promovendo sempre que possível simulação de um ambiente científico, onde o aluno possa ter momentos de investigações e criar suas próprias conjecturas, refazendo alguns passos do cientista. O desafio está em criar condições para que o aluno construa um conhecimento que demorou muito tempo para ser construído. Nessa concepção onde o aluno deve se tornar um pequeno cientista, o professor não deve apenas fazer a comunicação do conhecimento pronto, mas a devolução de um bom problema. De acordo com Freitas (2012) A devolução, aqui, tem o significado de transferência de responsabilidade, uma atividade na qual o professor, além de comunicar o enunciado, procura agir de tal forma que o aluno aceite o desafio de resolvê-lo, como se o problema fosse seu e não somente porque o professor quer. Se o aluno toma para si a convicção de sua necessidade de resolução do problema, ou seja, se ele aceita participar desse desafio intelectual e se ele consegue sucesso nesse seu empreendimento, então inicia-se o processo da aprendizagem (FREITAS, 2012, p. 83). No momento em que os alunos se apropriaram da situação, procurando encontrar uma solução, caracteriza-se a situação adidática. Nas situações adidáticas temos as seguintes etapas: ação, formulação e validação. Na situação adidática de ação, o aluno empenha-se na busca de solução de um problema, realizando ações que resultam na produção de um conhecimento operacional. O aluno na maioria das vezes nos fornece uma resposta, mas sem nenhum argumento teórico para fundamentá-la, não explicitando sua elaboração. Em uma situação de ação o aluno realiza ações mais experimentais sem se preocupar em explicar ou justificar sua resposta. No momento em que o aluno começa a utilizar alguns esquemas na tentativa de fundamentar sua resposta, constitui uma situação adidática de formulação. Na situação de formulação o saber tem uma função de justificação e controle das ações. O aluno começa a tentar justificar suas ações, com uma abordagem mais teórica, mas sem muito rigor matemático. Já na situação adidática de validação o aluno já utiliza esquemas de provas e utiliza o saber para essa finalidade.
10 3. Engenharia Didática A pesquisa será realizada com alunos dos anos finais do ensino fundamental de uma escola pública localizada no município de Campo Grande MS. Temos a pretensão de trabalhar com um grupo de 10 alunos, que serão escolhidos aleatoriamente. Pretendemos realizar 10 sessões onde será proposto uma sequência de atividades contendo situações-problema que, para a captura ou a defesa, envolva situações de divisibilidade. A coleta dos dados será por meio de registros escritos e gravações audiovisuais das conversas dos alunos durante as sessões. Como referencial metodológico usaremos a Engenharia Didática descrita por Artigue (1988), de modo que essa, contribui para a elaboração e análise de nossa sequência de atividade. Artigue (1988) define engenharia didática como um esquema experimental baseado sobre realizações didáticas em sala de aula, isto é, sobre a concepção, a realização, a observação e a análise de sequências de ensino. Esse esquema experimental da Engenharia Didática, conforme apresenta Machado (2012, p. 238), se compõe de quatro fases: primeira fase: análises preliminares; segunda fase: concepção e análise a priori das situações didáticas; terceira fase: experimentação; quarta fase: análise a posteriori e validação (MACHADO, 2012, p. 238). Na primeira fase, análises preliminares, iremos pesquisar como o livro didático aborda o conteúdo de divisibilidade, iremos também analisar os documentos oficiais afim de verificar como é proposto o conteúdo. Além disso, analisaremos como a utilização de jogos no ensino da matemática é abordada nas pesquisas e também nos documentos oficiais. Analisaremos ainda, o desenvolvimento histórico de divisibilidade e o que as pesquisas apontam sobre esse tema. Depois de realizar as análises preliminares sobre o conteúdo divisibilidade e sobre a utilização de jogos no ensino da matemática iniciaremos a segunda fase, concepção e análise a priori da sequência de atividades, onde iremos elaborar situações-problema que envolvam jogadas de captura e defesa, para a qual o aluno terá que analisar suas jogadas e buscar boas estratégias. Após a elaboração, iremos realizar a análise a priori, listando as possíveis estratégias que poderão surgir na execução da nossa sequência de atividades.
11 Assim, é necessário registrar as ações durante uma determinada partida. Por isso, fazer o registro de diferentes situações durante as partidas de Awalé é importante, pois há como reconstituir as jogadas possibilitando as análises dos movimentos realizados. Pensando nisso, adotaremos uma forma de registro que nos permita fazer tais análises que consiste em: 1. numerar os recipientes do tabuleiro com as letras do alfabeto de m a x, de tal forma que para o jogador A considera-se os recipientes de m a r (m, n, o, p, q, r) e para o jogador B os recipientes de s a x (s, t, u, v, w, x); Figura 2 Numeração dos recipientes que adotaremos na sequência de atividades Fonte: elaborado pelo autor 2. Anotar o movimento inicial de cada situação (jogada), isto é, o número de sementes correspondente a cada recipiente antes das sementes serem retiradas para a semeadura. Na terceira fase, experimentação, iremos inicialmente apresentar o jogo Awalé, explicando sua origem, suas regras dentre outros. Utilizaremos algumas sessões onde os alunos jogarão, inicialmente, com as regras originais e depois com a regra adaptada. Depois disso, trabalharemos com a sequência de atividades elaboradas afim de obtermos os dados para a nossa pesquisa. E na quarta fase, análise a posteriori e validação, analisaremos os dados obtidos na fase anterior e também validaremos a nossa pesquisa. A validação será interna, ao confrontar a análise a priori com a posteriori. Referências ARTIGUE, Michèle. Ingénierie Didactique. Recherches en Didactique des Mathématiques. v. 9. n BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. LDB Lei nº 9394/96, de 20 de dezembro de Estabelece as diretrizes e bases da Educação Nacional. Brasília: MEC, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática, 5ª a 8ª Séries. Brasília, 1998.
12 BROUSSEAU, Guy. Fondements et Méthodes de la Didactique des Mathématiques. Recherches en Didactique des Mathématiques. v. 7. n D'ABROSIO, Ubiratan. Ciência: perspectivas multiculturais. In: BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos. Debates: Multiculturalismo e educação. Brasília, DEUS, Jorgina de Fátima Pereira de. TAHAN, Simone Panocchia. A natureza da divisão. In: Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação a Distância. Secretaria de Educação Fundamental. Cadernos da TV Escola: PCN na Escola/Coordenação Geral Vera Maria Arantes. Brasília, FREITAS, José Luiz Magalhães de. Teoria das Situações Didáticas. In: MACHADO, Silvia Dias Alcântara (Org.). Educação Matemática: uma (nova) introdução. 3. ed. revisada. 2. reimpr. São Paulo: EDUC, p HUIZINGA, Johan. Homo Ludens: o jogo como elemento da cultura. [tradução João Paulo Monteiro]. 7. ed. São Paulo: Perspectiva, LARA, Isabel Cristina Machado de. Jogando com a Matemática na Educação Infantil e Séries Iniciais. 1. ed. Catanduva, SP: Editora Rêspel; São Paulo: Associação Religiosa Imprensa da Fé, LIMA, H. P. GNEKA, G. LEMOS, M. A semente que veio da África. [ilustrações de Véronique Tadjo]. São Paulo: Salamandra, MACEDO, Lino de. PETTY, A. L. S. PASSOS, N. C. Aprender com Jogos e Situaçõesproblema. Porto Alegre: Artmed, MACHADO, Silvia Dias Alcântara. Engenharia Didática. In: MACHADO, Silvia Dias Alcântara (Org.). Educação Matemática: uma (nova) Introdução. 3. ed. revisada. 2. reimpr. São Paulo: EDUC, p MIGUEL, Antonio. MIORIM, Maria Ângela. História na Educação Matemática: propostas e desafios. 1. ed. 1. reimp. Belo Horizonte: Autêntica, ZASLAVSKY, Claudia. Jogos e Atividades Matemáticas do Mundo Inteiro diversão multicultural para idades de 8 a 12 anos. [tradução de Pedro Theobald]. Porto Alegre: Artmed, Resultados Esperados Ao final da pesquisa esperamos que o jogo Awalé possibilite ao aluno desenvolver habilidades de: realizar divisões utilizando o cálculo mental, reconhecer os múltiplos e divisores de determinados números, bem como, elaborar boas estratégias. Esperamos ainda, conseguir maneiras para explorar elementos da cultura africana nas aulas de matemática nos anos finais do ensino fundamental.
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