Filipe César Pereira
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- Patrícia Padilha Neto
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1 70 A RELAÇÃO ENTRE RURAL E URBANO NO CONTEXTO DAS TEORIAS CURRICULARES E O PROCESSO (DES)CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA: UM ESTUDO DE CASO DAS ESCOLAS MUNICIPAIS DE SÃO JOÃO DEL-REI/MG Filipe César Pereira fylipecesar@hotmail.com Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia Universidade Federal de São João del-rei Dra. Lígia Maria Brochado de Aguiar ligiamaria.baguiar@yahoo.com.br Adjunta IV do Curso de Graduação e do Programa de Mestrado de Geografia Departamento de Geociências Curso de Geografia- UFSJ Gabriel Max de Oliveira Dias gabriel_ervalia@yahoo.com.br Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia Universidade Federal de São João del-rei Introdução O presente trabalho é parte de um projeto maior, cuja temática é a Relação campo-cidade e as novas territorialidades produzidas no contexto da teoria curricular crítica e pós-crítica: a inclusão dos alunos do campo nas escolas urbanas de São João del-rei/mg. Trata-se de uma pesquisa de mestrado em andamento, iniciada no ano de 2015, que levantou questões importantes no âmbito das discussões curriculares para a compreensão do mundo rural presente no cotidiano escolar urbano, através dos alunos. No bojo dessa discussão as análises teóricas que fundamentam esse trabalho tem como finalidade compreender o papel dos mecanismos oficiais de ensino e das
2 suas normatizações, que a nosso ver resultam na (des) construção de identidades. Nossa base bibliográfica centrou-se nos estudos realizados por FOUCAULT (1994; 2011); SILVA (1995, 2004, 2010); SANTOS (2000, 2001, 2008) e HAESBAERT (2006) tendo por finalidade reforçar nossa hipótese de pesquisa de que os saberes e as práticas educativas estão enquadrados em um regime de saber, através de um discurso legitimado por grupos hegemônicos, implicando na presença das relações de relações de poder também nas instituições de ensino. É Através dos decretos e das leis aplicadas no sistema educacional, intermediadas pelo Estado que nossa sociedade é disciplinada e domesticada pela lógica capitalista, voltada para o consumo. Assim as reflexões e inquietações criadas em torno das teorias tradicionais (ou jesuíticas) resultaram no surgimento das teorias críticas e pós-críticas, como forma de denúncia e questionamento às bases curriculares, que se perpetuam em nossas escolas. 1 Nesse sentido concordamos com Silva (2010, p. 16) ao dizer que: É precisamente a questão do poder que vai separar as teorias tradicionais das teorias críticas e pós-críticas. O papel da geografia se mostra importante para a compreensão do território, das territorialidades, dos conflitos, do jogo de interesses, no decorrer do percurso histórico. Isso implica dizer que onde reina o poder também há resistência. As territorialidades concretas, simbólicas e indentitárias são partes constituintes de um território dominado, regido por relações de poder. Assim, o território funciona como recurso, obstáculo e potencialidade para a produção e reprodução capitalista. A leitura dos diferentes espaços-tempos realizadas pelo geógrafo se mostram necessárias, na medida em que este se propõe a compreender o contexto das relações sociais, através da interação humana, com o espaço natural, transformado em território apropriado, como nos lembra o Geógrafo Milton Santos (2000, 2008). O processo de inclusão dos alunos do campo nas escolas urbanas compõe o nosso problema de pesquisa, pois aborda os desafios que os alunos do mundo rural enfrentam no decorrer de sua jornada de estudos. O primeiro ocorre diante das 71 1 Palavras-chave usadas pelo autor Tomaz Tadeu da Silva (2010, p.17) para enfatizar conceitos a partir das diferentes teorias curriculares: Teorias Tradicionais: ensino; aprendizagem; avaliação; metodologia; didática; organização; planejamento; eficiência; objetivos. Teorias Críticas: ideologia; reprodução cultural e social; poder; classe social; capitalismo; relações sociais de produção; conscientização; emancipação; currículo oculto; resistência. Teorias Pós-Críticas: identidade, alteridade, diferença; subjetividade; significação e discurso; saber-poder; representação; cultura; gênero, raça, etnia, sexualidade; multiculturalismo.
3 medidas adotadas pela Secretaria Municipal de Ensino - SME, responsável pelo fechamento e nucleação de várias escolas rurais, como medida econômica. O segundo, se mostra a partir da precariedade do transporte, relatado, por alunos e professores e, o terceiro, está na inclusão dos alunos da zona rural nas escolas urbanas, bem como as práticas educativas, presentes nesse cotidiano. Esse último é visto por nós como preocupante, ao tomarmos conhecimento de que os documentos oficiais de ensino adotados pelo Município e pelo Estado seguem uma padronização dos conteúdos e das práticas educativas, a partir de um currículo unificado, que propõe uma homogeneização dos objetivos de ensino, por meio do cumprimento de metas. As práticas e abordagens educativas, direcionadas ao mundo urbano, também são responsáveis pela (des)construção de outras territorialidades no espaço da escola, que é povoado por diferentes realidades, entre elas a rural. Assim, os alunos sujeitos de nossa investigação se sentem diferentes, distantes de sua realidade e, portanto desinteressados ou conformados com o sistema de ensino imposto sobre eles. Portanto, o nosso objetivo aqui é entender como as teorias críticas e pós-críticas para o currículo podem contribuir para o reconhecimento das multiculturalidades e territorialidades que não são valorizadas no cotidiano escolar 2, em contraponto com as teorias tradicionais. 72 Metodologia / Fundamentação Teórica A escola, na qual realizamos a pesquisa para o nosso estudo de caso, se deve ao fato desta concentrar o maior número de alunos oriundos da zona rural, quando comparado às demais unidades de ensino, segundo a SME/SJDR 3. Através do diário escolar foi possível confirmar que 57% desses indivíduos de fato não pertenciam a área urbana, daí o nosso interesse pelo recorte de estudo. A análise bibliográfica utilizada nesse trabalho recorre às teorias da territorialização (SANTOS, 2001 e 2008) e desterritorialização/reterritorialização (HAESBAERT, 2006), que contribuem para (re) pensarmos a escola como território, realidade constituída de um campo de forças onde operamos intervenções através de macro e micro políticas, com a finalidade de liberar a vida dos movimentos que negam a sua afirmação inventiva ou diminuem a potência das suas territorialidades. 2 Mais especificamente no caso dos alunos da zona rural do município de São João del- Rei/MG. 3 Secretaria Municipal de Ensino de São João del-rei.
4 A macropolítica tem como eixo a captura da mais valia através da subordinação da força de trabalho para a acumulação capitalista. A ação macropolítica busca através da educação a redistribuição social desigual dos lugares e seus agenciamentos por meio da adequação dos sujeitos à racionalidade instrumental. Por outro lado, temos a micropolítica, ação que resulta da tensão entre as experiências vividas neste mundo dado como campo de forças e suas formas supostamente estáveis e, o mundo sensível, em constante mudança que ativa a nossa potência de pensamento, invenção e criação. Concordamos com SILVA (2010) ao dizer que a seleção de determinado conteúdo no lugar de outros é uma demonstração de que o currículo não é um documento ingênuo. Essa colocação reforça a ideia de que há um conjunto de interesses para a formação de alguém, para desempenhar funções que atendam às necessidades de determinado ramo de mercado ou setor econômico. Como dizia SILVA (2010, p. 15): [...] um currículo busca precisamente modificar as pessoas que vão seguir aquele currículo. É nesse ponto que as teorias curriculares, seus discursos e efeitos, analisados pelo referido autor se mostram importantes para nossa discussão, pois nos desafiam entender como as relações de poder organizam e transformam o território, sendo que [...] há um uso privilegiado do território por forças hegemônicas [...], conforme SANTOS (2000, p. 23). 73 Considerações Preliminares As análises preliminares deste estudo nos levam a considerar que a aceitação do currículo tradicional nas escolas resulta das relações de poder, que são transmitidas através do discurso, da linguagem e dos métodos disciplinares que contribuem para criação de um sujeito ideal, passivo, consumista, acrítico e dócil às condições de vida imposta pelas sociedades modernas. Segundo SILVA (2010) a construção histórica do currículo inicialmente objetivou na capacitação do aluno para a indústria e, posteriormente para determinado setor econômico, administrativo ou político, o que não difere dos objetivos ainda traçados no atual sistema de ensino. Os métodos disciplinares utilizados pelas escolas tradicionais, como o som da sirene, para definir o início e o término das aulas; as avaliações teóricas, que medem o conhecimento através de notas, bem como a organização das salas de aula em fileiras contribuem para a construção do aluno, que aprende desde cedo como se adaptar aos padrões de comportamento desejados pelas instituições de ensino, e pela sociedade capitalista.
5 Acreditamos que a (des) construção das múltiplas identidades decorre dessas ações normativas, transpostas no currículo formal. A seleção de determinado conteúdo, em razão da sua importância (em detrimento de outros), parte de um discurso universal, responsável por silenciar diversos grupos, dos quais destacamos os alunos do meio rural que estudam nas escolas urbanas. Portanto consideramos que, através do questionamento realizado diante do modelo tradicional de ensino as teorias curriculares críticas e pós-críticas reconhecem diferentes jogos de interesse em curso, no que diz respeito a: para que formar? Ou, formar para quem?. Daí a relevância atribuída por nós a tais teorias, pois estas valorizam a subjetividade, a identidade, a interação e o movimento, bem como as territorialidades, contribuindo para a construção de uma escola que de fato seja para todos. 74 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, p. FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 11 ed. Petrópolis: Vozes, p. HAESBAERT, Rogério. Territórios alternativos. 2.ed. São Paulo: Contexto, 2006, 186p. SANTOS, Milton e SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Record, RJ-SP, SANTOS, Milton. et al. O papel ativo da geografia um manifesto. Estudos Territoriais Brasileiros. São Paulo: Laboplan. FFLCH, USP, p. SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 17.ed. Rio de Janeiro: Record, p. SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.). Alienígenas na sala de aula: uma introdução aos estudos culturais em educação. Petrópolis: Vozes, p. SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.). Identidade e Diferença: A perspectiva dos Estudos Culturais. 3. ed. Petrópolis: Vozes, p. SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de Identidade: uma introdução Às teorias do currículo. 3. ed. 1. Reimp. Belo Horizonte: Autêntica, p.
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