P A R E C E R ESTADO DA PARAÍBA TRIBUNAL DE CONTAS MINISTÉRIO PÚBLICO

Transcrição

1 1 Processo n º: 05818/2008 Parecer nº: 01421/10 Origem: Município de Santa Rita Natureza: Licitação (Inexigibilidade) Interessado: Marcus Odilon Ribeiro Coutinho LICITAÇÃO. INEXIGIBILIDADE. SERVIÇOS TÉCNICOS ESPECIALIZADOS DE NATUREZA SINGULAR. NOTÓRIA ESPECILIZAÇÃO. ARTIGO 25, INCISO II DA LEI 8.666/93. TREINAMENTO E APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL. COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DA JUSTIFICATIVA DE PREÇO. NÃO COMPROVAÇÃO DOS CRÉDITOS ORÇAMENTÁRIOS DAS RESPECTIVAS DESPESAS. REGULARIDADE COM RESSALVAS DO PROCEDIMENTO E DO CONTRATO ADMINISTRATIVO DECORRENTE. ENCAMINHAMENTO DOS AUTOS PARA AUDITORIA PARA VERIFICAR POSSÍVEL EXCESSO DE PREÇOS. P A R E C E R O processo em comento tem por objeto inexigibilidade de licitação, autoridade homologadora Sr. Marcus Odilon Ribeiro Coutinho, Prefeito Constitucional do Município de Santa Rita, cuja finalidade é a contratação de serviços de realização de cursos de qualificação profissional. Documentação encartada às laudas 02 a 18.

2 2 Em sede de Relatório Inicial, fls. 20 a 23, a Divisão de Licitações e Contratos manifestou-se pela IRREGULARIDADE do procedimento de inexigibilidade, apontando os seguintes vícios: 1- Inexiste comprovação de recursos orçamentários para respectiva despesa; 2- Não há nos autos orçamento detalhado em planilhas que expressem todos os custos unitários dos serviços, impossibilitando a comprovação de compatibilidade com os preços praticados no mercado. Destarte, descumpri-se o inciso II do parágrafo único do artigo 26 da lei 8.666/93; 3- Não há justificativa de preço, tendo a pesquisa sido realizada unicamente com a empresa contratada; 4- O instrumento contratual não foi publicado, desatendendo a exigência do artigo 61, parágrafo único da LLC; 5- Não há previsão de alteração unilateral do contrato, contrariando as exigências dos artigos 65, I e II e 77 e seguintes da LLC; 6- Não há previsão de prazos, regime de execução nem tampouco de forma de pagamento em desacordo com exigências da Lei 8.666/93, no seu artigo 55, II, III e IV; 7- Inexiste no contrato o crédito pelo qual correrá a despesa, com a indicação da classificação funcional programática e da categoria econômica, descumprido o que estabelece o artigo 55, V da LLC. Com supedâneo nos postulados constitucionais do contraditório e da ampla defesa, através do ofício nº 1424, de 09 de julho de 2009, publicado em meio oficial no dia 28 subsequente, a Secretaria da 1ª Câmara do Egrégio Tribunal de Contas do Estado, fls. 24 a 26, notificou o Sr. Marcus Odilon Ribeiro Coutinho, Chefe do Poder Executivo do Município de Santa Rita, a fim de apresentar defesa e/ou justificativa no prazo regimental de 15 dias. Defesa exposta às laudas 27 a 38. A Unidade Técnica, em sede de Análise de Defesa, fls. 40 a 47, manifestou-se pela permanência das irregularidades apontadas no Relatório Inicial, salvo as constantes nos itens 4 e 5. Consequentemente, o Corpo Técnico entende que o procedimento de inexigibilidade e o contrato decorrente são irregulares. Os autos ingressaram na seara ministerial para lavra de parecer em 01 de outubro de Eis os fatos. Passo a opinar. A licitação é procedimento administrativo que tem por fito a escolha da proposta que melhor se subsuma aos interesses públicos, qual seja aquela que configure a proposta mais vantajosa para a Administração Pública.

3 3 A ordem jurídica vigente imprime caráter compulsório ao processo licitatório, só sendo permitida a contratação direta nos casos especificados em lei. A Lei nº 8.666/93, Estatuto das Licitações e Contratos Administrativos, expõe hipóteses que permitem ao Poder Público celebrar ajustes diretamente com particular, independentemente da realização do procedimento licitatório. A contratação direta é possível nas situações de dispensa e inexigibilidade. Na dispensa há possibilidade de competição pública, o serviço pode ser prestado por mais de um interessado. Não obstante, o legislador permite a formalização de contratações diretas pelo caráter singular de algumas situações. A inexigibilidade caracteriza-se pela inviabilidade de competição, sendo que a própria situação fática impõe a contratação direta, como acontece diante de fornecedores exclusivos. O Estatuto arrola as hipóteses de inexigibilidade, em seu artigo 25, verbis: Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: [...] I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes; II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação; III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. Doravante, passa-se à análise do caso concreto. O Município de Santa Rita representado pelo chefe do Poder Executivo local, Sr. Marcus Odilon Ribeiro Coutinho, celebrou contrato administrativo com o SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL (SENAI), entidade paraestatal componente do Terceiro Setor, cujo objeto foi a realização de cursos de qualificação profissional nas áreas de ajustador mecânico, automação industrial eletricista de automóveis, mecânica de automóveis, injeção eletrônica, montagem e manutenção de PC e serigrafia.

4 4 A contratação direta foi formalizada com fulcro no artigo 25, inciso II da Lei nº 8.666/1993, por se tratar de serviço técnico de natureza singular a ser desempenhado por profissional ou empresa de notória especialização. Os administrativistas apontam três requisitos para materialização da inexigibilidade em comento: 1º) o serviço deve ser técnico, exigindo-se habilitação específica do contratado prestador do serviço; 2º) a singularidade da prestação deve se demonstrar evidente, pois não pode se referir a serviços comuns, corriqueiros e 3º), por fim, deve ser aferida a notória especialização da empresa prestadora das necessidades públicas, através do prestígio e reconhecimento no campo de sua atividade, em virtude de vários aspectos, como estudos, experiências, publicações, desempenho anterior, aparelhamento, organização, equipe técnica e outro do gênero. Observa José dos Santos Carvalho Filho: 1 A contratação direta no caso em pauta é uma exceção ao principio licitatório, e exceção bem delineada. Lamentavelmente, alguns administradores desonestos ou despreparados têm recorrido a essa modalidade para escapar àquele principio, cometendo flagrante desvio de finalidade e ofensa ao principio da moralidade e, freqüentemente, provocando graves prejuízos a Administração. Desse modo, cabe aos Tribunais de Contas atuar com rigor na verificação desses casos de inexigibilidade de licitação em virtude da notória especialização do contratado, bem como ao Judiciário invalidar tais contratos e encaminhar ao Ministério Público representação no sentido de ser promovida a responsabilização penal e administrativa dos servidores responsáveis por essa espécie de improbidade ou incompetência. O artigo 13 da Lei nº 8.666/1993 expõe os serviços técnicos considerados especializados, entre eles se inclui o treinamento e aperfeiçoamento de pessoal. Destaca-se ser imperiosa a presença dos outros requisitos singularidade do serviço e notória especialização do prestador para caracterização da hipótese de inexigibilidade, pois nem toda contratação que tem por objeto a realização de cursos profissionalizantes prescinde do processo licitatório. É oportuno destacar que o parecer jurídico situado nos autos, laudas 05 a 07, não demonstra os requisitos necessários para caracterização da hipótese de inexigibilidade em apreço. Caberia a municipalidade explicitar a singularidade do serviço, bem como a notória especialização da entidade paraestatal contratada. Inobstante, esta representante do Ministério Público de Contas entende ser de conhecimento público o caráter ético-profissional do SENAI, e o fato de nosso Estado não possuir empresas capazes de desempenhar serviços com tamanha especificidade - cursos de qualificação profissional nas áreas de ajustador mecânico, automação industrial eletricista de automóveis, mecânica de automóveis, injeção eletrônica, montagem e manutenção de PC e serigrafia. Diante do 1 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 16. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 229.

5 5 exposto, a contratação efetuada pela edilidade de Santa Rita, sem formalização de processo licitatório, é legítima em virtude de estarem presentes os requisitos do artigo 25, inciso II da Lei 8.666/93. O entendimento ministerial encontra respaldo na jurisprudência do Tribunal de Contas da União, Acórdão nº 1089/2003, relatado pelo Ministro Augusto Sherman Cavalcanti, cuja transcrição segue in verbis: 6.1Sobre a contratação de entidade executora com inexigibilidade de licitação sem a devida demonstração dos requisitos legais, em desacordo com o art. 25 da Lei nº 8.666/93, aquiescemos com o ponto de vista firmado pelo do Sr. Informante por que sejam acatadas as justificativas apresentadas pelos responsáveis. Reconhecidamente detém o SENAI qualificação no aperfeiçoamento de mão-de-obra específica na área industrial. Ademais, cremos que o gestor agiu com cautela em contratar a referida entidade, contribuindo para a tomada de decisão as dificuldades enfrentadas pela GDS/MA para capacitar 600 (seiscentas) pessoas na cidade de Imperatriz/MA, na especialidade ali prevista (fabricação artesanal de artigos trançados para bolsas, cabedais, sapatos, cintos e vestuário), sendo que as respectivas justificativas salientam que naquela localidade somente o SENAI encontrava-se com estrutura adequada para efetivar o treinamento; 4.No tocante à contratação do Senai com inexigibilidade de licitação, entendo, em consonância com o Sr. Secretário, que a inviabilidade de competição restou demonstrada, tendo em vista que o referido Serviço Social Autônomo era a única entidade aparelhada com o maquinário indispensável para dar o treinamento na fabricação de artigos de couro trançado a seiscentas pessoas na cidade de Imperatriz/MA, município distante, aproximadamente, 600 km da capital do Estado. É de se criticar, nesse contexto, a falta de menção clara a esses aspectos no processo de contratação. A Auditoria aponta que inexiste comprovação de recursos orçamentários para a respectiva despesa, cujo valor contratado é de R$ ,00. Ademais, explicita que no contrato administrativo não há indicação do crédito pelo qual correrá a despesa, com a devida exposição da classificação funcional programática e da categoria econômica. O Parquet Especial corrobora a manifestação da Unidade Técnica. O fato de o contrato administrativo indicar que as despesas correrão por conta de recursos próprios da contratante (parágrafo segundo da cláusula terceira) não elide a mácula apontada no Relatório Inicial.

6 6 Destaca-se que inexiste nos autos a justificativa de preço contratado. O documento inserido nos autos, lauda 37, não justifica o valor despendido pela Administração Pública, R$ ,00, nem tampouco reflete pesquisa de mercado a fim de que se verifique a compatibilidade do montante pago pelo Município com os valores médios praticados no mercado. O Parquet Especial sugere a remessa do álbum processual à Unidade Técnica para fins de apuração de possível sobrepreço. Não há possibilidade, conforme documento situado no processo, de aferir a compatibilidade do preço contratado com os valores praticados em média no mercado. As outras irregularidades apontadas pelo Corpo de Instrução são máculas meramente formais, e por conseqüência, incapazes de viciar o procedimento em sua inteireza. ANTE O EXPOSTO, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas alvitra a REGULARIDADE COM RESSALVAS DA INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO Nº 261/2008, e do consequente Contrato celebrado pelo Município de Santa Rita com o SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL (SENAI). Por fim, sugere-se a remessa dos autos para Auditoria para apuração de possível excesso de preços. João Pessoa, 17 de agosto de ISABELLA BARBOSA MARINHO FALCÃO Subprocuradora-Geral do Ministério Público junto ao TCE/PB mbn