A ENERGIA DO FUTURO Uma nova revolução industrial
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- Sílvia Esteves Teixeira
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1 6 A ENERGIA DO FUTURO Uma nova revolução industrial
2 A busca por fontes alternativas de energia cresceu após a primeira crise do petróleo nos anos Hoje, as motivações para buscar novas fontes de energia não são apenas econômicas. É imperativo reduzir a emissão de gases de efeito estufa e acelerar avanços tecnológicos que aumentem a eficiência na geração e no uso da energia. Nasce uma geração de inventores, pesquisadores, empreendedores com potencial de dar novos rumos à história da civilização.
3 60 capítulo 6 a energia do futuro Os estudos sobre as mudanças climáticas no planeta, realizados pelos cientistas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), fizeram governos e setor privado repensarem os custos do desenvolvimento socioeconômico que não dá atenção aos cuidados ambientais. A poluição lançada pela queima de carvão e petróleo começou a ser questionada não apenas por ambientalistas, mas também por empresas que temem perder renda se as catástrofes ambientais se agravarem. O temor é de que furacões como o Katrina, que assolou os Estados Unidos em 2005, ocorram com maior frequência e intensidade. Secas e inundações também podem alterar a produção industrial e de alimentos. Todos esses fatores poderão impulsionar uma revolução energética. A questão ambiental, ao ser inserida no planejamento do sistema energético, não é mais vista como mera restrição ao uso de combustíveis fósseis. Ela é agora uma variável de decisão que aponta oportunidades, tanto para o uso mais intenso de fontes alternativas quanto para o uso eficiente de energia. Assim como o século XIX pertenceu ao carvão e o século XX foi dominado pelo petróleo, o século XXI pertencerá ao Sol, ao vento, e à energia geotérmica, prevê Lester Brown, fundador do Instituto de Políticas da Terra em Washington (EUA). Além da discussão sobre a viabilidade técnica e econômica das fontes alternativas de energia, devemos entender como uma fonte energética alternativa difere de uma fonte convencional. Primeiro, podemos distinguir as fontes alternativas como complementares ou substitutas das fontes convencionais. Em 2002, o governo brasileiro instituiu dois mecanismos para isso: o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa) e recursos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). O Proinfa tem como principal meta alcançar, até 2022, o atendimento de 10% do consumo anual de energia elétrica por fontes alternativas. Também podemos distinguir as fontes alternativas quanto a sua aplicação. Basicamente, elas podem servir para geração de calor, eletricidade e no uso automotivo. No caso da geração de eletricidade, há uma gama bastante variada de fontes ener géticas alternativas, que vão desde a energia solar fotovoltaica e heliotérmica, a energia eólica e a energia das marés, até o aproveitamento de fontes derivadas de biomassa. Conheceremos a seguir as várias fontes de energia alternativa e nossa capacidade de convertê-las. + + Para saber mais: Atlas de Energia Elétrica do Brasil (3ª edição)
4 . prêmio jovem cientista 61 caderno do professor Convertendo a energia do Sol A cada hora, o Sol fornece à Terra mais energia do que toda a humanidade utiliza em um ano inteiro. Mas, a energia solar que chega à Terra ainda é pouco usada e não se distribui de forma uniforme por toda sua superfície. Essa distribuição depende da latitude, da estação do ano e de condições atmosféricas como nebulosidade e umidade relativa do ar. Em média, a região compreendida entre os trópicos recebe uma parcela de energia solar maior que as demais. O Brasil tem grande parte de sua superfície compreendida nessa faixa, que vai aproximadamente da cidade do Rio de Janeiro em direção ao norte do país. Por isso, possui enorme potencial para uso da energia solar. Muitas tecnologias têm sido empregadas para transformar a energia do Sol, incluindo coletores térmicos e células fotovoltaicas. Coletores térmicos Os sistemas de aproveitamento térmico coletam a energia luminosa incidente do Sol e a convertem em energia eletromagnética de baixa frequência, mais conhecida como calor. O calor recolhido nos coletores destina-se a satisfazer numerosas necessidades, desde a obtenção de água quente para o consumo doméstico ou industrial até o aquecimento de casas, escolas, fábricas ou a climatização de piscinas. Concentração Termo Solar Energia Solar Energia Térmica (calor) Energia Mecânica Energia Elétrica Concentração Termo Solar Uma das aplicações mais populares da energia solar térmica é o aquecimento da água de residências. Trata-se de uma aplicação direta e seu princípio de funcionamento é semelhante ao que foi apresentado na descrição do efeito estufa. Consulte a ficha Número 6 Energia e Cidadania / Energia Solar no Brasil Nela você encontrará sugestões para abordar este tópico e desenvolver atividades com seus alunos.
5 62 capítulo 6 a energia do futuro Como funciona o aquecedor de água Reservatório térmico energia solar 1. A radiação solar é recebida nos coletores solares, absorvida e reemitida sob a forma de calor; 2. O calor fica retido na cobertura de vidro do coletor e aquece a água contida nos canos da serpentina ali existente; 3. As correntes de convecção formadas pelo aquecimento da água fazem com que ela seja transferida para o reservatório térmico, de onde pode ser desviada para servir o imóvel; Coletores solares 4. Uma caixa d água comum fornece água ao sistema para evitar que seu esvaziamento interrompa as correntes de convecção. Esquema de funcionamento do aquecedor solar de água. A utilização deste tipo de aquecedor solar em cidades da região Sul do país tem propiciado uma economia média de 50% na conta de luz das famílias que o adotaram. Já é grande o número de governos locais que incentivam sua adoção e, em certos casos, até fornecem um aquecedor de baixo custo, feito com materiais reaproveitados, para a população de baixa renda. Exemplo de utilização de aquecedor solar de baixo custo.
6 . prêmio jovem cientista 63 caderno do professor A casa do futuro Turbina eólica supre a região. A água no reservatório é aquecida pelo coletor solar do teto. Um dispositivo elétrico convencional contribui para o aquecimento em condições mais frias. Coletores de placas planas propiciam água quente, mesmo com céu nublado. Painéis de células fotelétricas produzem eletricidade para armazenamento em um acumulador. Árvores protegem a casa dos ventos, diminuindo a perda de aquecimento. Beirais largos proporcionam sombra às janelas, quando incide o forte sol do verão. Esquema de uma residência aquecida com energia solar. Ecocasa A casa integrada, desenvolvida no Reino Unido para as condições dos países frios do hemisfério Norte, apresenta muitas características que economizam energia. Controle de alta tecnologia Computadores controlam a saída de energia e a temperatura; circuitos integrados possibilitam a comunicação diária entre os dispositivos para otimizar o uso de energia. Paredes grossas, com isolamento térmico. Conjunto de bateria com inversor e transformador fornece eletricidade. Grande janela voltada para a face sul com persianas controladas por computador. Energia solar térmica em escala Nessa aplicação, a forma de conversão da energia solar é diferente. Ela é concentrada em um foco, por meio de diferentes arranjos de espelhos, aquecendo algum tipo de fluido. O calor gerado é utilizado na produção de energia elétrica, em geral pelo aquecimento secundário de água. O vapor resultante aciona uma turbina a vapor, de maneira semelhante à que foi ilustrada quando tratamos da produção de eletricidade em usinas termelétricas. Exemplo de sistema de geração de eletricidade com uso de concentradores e coletores solares torre solar.
7 64 capítulo 6 a energia do futuro A fazenda solar O projeto Solar Two (ver a ilustração ao lado) foi implantado em 1995 no deserto de Mojave, próximo à cidade de Barstow, Califórnia (EUA). A energia solar era refletida por centenas de espelhos parabólicos móveis, capazes de acompanhar o movimento do Sol ao longo do dia (os heliostatos), armazenada em uma mistura de 60% de nitrato de sódio e 40% de nitrato de potássio e depois transferida para a produção de vapor d água, para a geração convencional de energia elétrica por meio de uma turbina a vapor. O Solar Two teve suas atividades encerradas em Em função do sucesso do empreendimento, porém, foi iniciada na Espanha a construção do Solar Tres, usina solar com base nos princípios do Solar Two. A fornalha solar de Odeillo-Font-Romeu, na França, com 63 espelhos planos. A fornalha solar Para uma aplicação bem diferente foi construída, em Odeillo-Font-Romeu, nos Pirineus franceses, uma fornalha solar. Formada por 63 espelhos planos que acompanham automaticamente o movimento do Sol, a luz solar é dirigida para um ponto focal. A enorme concentração de energia é usada para finalidades metalúrgicas, produzindo aço a partir de minério de ferro. A ideia do empreendimento foi reduzir a queima de combustíveis fósseis na produção de aço, que demanda quantidades monumentais de energia. Os conversores fotovoltaicos A conversão direta de raios solares em energia elétrica é feita por células fotovoltaicas. Estas células são compostas por elementos semicondutores, como o silício. Ligados a um circuito externo, os conversores funcionam de modo que, ao serem atingidos por uma quantidade de luz solar, gerem uma corrente elétrica.
8 . prêmio jovem cientista 65 caderno do professor Tais painéis já são comercialmente viáveis para pequenas instalações. Seu uso é particularmente vantajoso em regiões remotas, de difícil acesso a redes de transmissão de energia em grande escala. Os sistemas de comunicação e, de modo geral, todos os equipamentos eletrônicos com baixo consumo de potência, podem ser carregados por painéis fotovoltaicos. Torna-se especialmente notável a utilização de energia solar na alimentação de dispositivos eletrônicos existentes em foguetes, satélites e astronaves. A Alemanha é líder no uso da energia solar. O país possui as maiores centrais produtoras desse tipo de energia. Os alemães geram 1,5 GW a partir de fontes so Placas de captação de energia solar por células fotovoltaicas. lares. Esse modelo é bem-sucedido porque tem uma política de financiamento definida. Os avanços tecnológicos e o aumento do uso de energia solar são pagos por todos os consumidores finais de energia do país. O programa é conhecido como Electricity Feed Act (Lei de Alimentação de Eletricidade) e foi criado em O governo alemão pretende satisfazer metade da demanda energética do país a partir de fontes renováveis até Os recursos para bancar as mudanças no sistema energético são captados por meio de um pequeno acréscimo na tarifa convencional de todos os consumidores. São depositados em um fundo e utilizados para reembolsar os investimentos dos produtores independentes de energia solar que interligam suas usinas ao sistema energético nacional. O reembolso é feito gradualmente e os produtores independentes recuperam seus investimentos num período de dez a 12 anos. O programa também visa o investimento em outras fontes, como a eólica, com o objetivo de reduzir a dependência de fontes poluentes de energia. No fim de 2008, o Centro Brasileiro para Desenvolvimento da Energia Solar Fotovoltaica (CB-Solar), da Faculdade de Física da PUC-RS, fabricou o primeiro módulo fotovoltaico com tecnologia brasileira. O projeto buscou desenvolver tecnologia industrial para beneficiar tanto a população urbana, em sistemas conectados à rede, quanto a rural, não atendida por sistemas de distribuição de energia elétrica. O projeto, que obteve cerca de R$ 6 milhões entre investimentos públicos e privados, tem como objetivo o desenvolvimento de uma tecnologia de fabricação de células solares e de módulos fotovoltaicos competitivos com o mercado internacional, tanto em eficiência quanto em custo. A equipe de Consulte o Roteiro de Trabalho Número 4 Fontes Limpas de Energia Nele você encontrará questões para a discussão sobre esse assunto e sugestões de atividades para desenvolver com seus alunos.
9 66 capítulo 6 a energia do futuro pesquisadores do CB-Solar é chefiada por Izete Zanesco e Adriano Moehlecke, tendo o último recebido, em 2002, o primeiro lugar no XVIII Prêmio Jovem Cientista, categoria Graduados. + Capturando a força dos ventos O uso de energia eólica vem de épocas remotas da história da humanidade e é quase tão antigo quanto a queima de madeira para obtenção de energia térmica e geração de vapor. Sua primeira aplicação foi para bombeamento de água e moagem de grãos. Contudo, essa forma de uso foi pouco a pouco sendo abandonada em função da eficiência e escala obtida com fontes energéticas oriundas de outras tecnologias, como a queima de combustíveis fósseis e as hidrelétricas. Hoje, os geradores eólicos são a grande vedete na área de produção de energia limpa. A geração cresce a uma taxa de 8% ao ano. No mundo, os principais produtores de energia eólica são: Alemanha, em primeiro lugar, com 23,7% do total; Estados Unidos em segundo lugar, com 17,9%; em terceiro lugar a Espanha, com 16,1%; a Índia, em quarto lugar, com 8,4%; e a Dinamarca em quinto lugar, com 3,3%. O Brasil ocupa a 25ª colocação entre as nações que mais produzem este tipo de energia, com 0,3% do total mundial. A atividade de todos os países nessa área é cada vez mais intensa, apesar da Geradores eólicos na Dinamarca. tímida participação da geração de energia eólica na produção total de energia elétrica do mundo, ou seja, apenas 0,1%. A China tem investido muito nesta fonte energética. Estima-se que nos próximos cinco anos o país passe a fazer parte do grupo dos grandes produtores de energia eólica. Um gerador eólico consiste de uma turbina que lembra um grande cata-vento (ainda que com menor número de pás, em geral três), com o eixo acoplado a um conjunto de engrenagens, que, por sua vez, aciona um gerador de eletricidade. De novo, trata-se de transformar energia mecânica em energia elétrica. A diferença é que, neste caso, a fonte primária de energia é renovável e não poluente: o vento. + Para saber mais: Centro Brasileiro para Desenvolvimento da Energia Solar Fotovoltaica
10 . prêmio jovem cientista 67 caderno do professor Potência de Energia Eólica Mundial Instalada País Potência (MW) % em relação ao total 1º Alemanha ,40 23,7 2º Estados Unidos ,80 17,9 3º Espanha ,10 16,1 4º Índia 7.850,00 8,4 5º China 5.912,00 6,3 6º Dinamarca 3.125,00 3,3 7º Itália 2.726,10 2,9 8º França 2.455,00 2,6 9º Reino Unido 2.389,00 2,5 10º Portugal 2.130,00 2,3 25º Brasil 247,10 0,3 Total , Fonte: Associação Mundial de Energia Eólica, 2008 Apesar da aparência simples, a turbina de um gerador eólico incorpora tecnologia de ponta. A pá da turbina tem o mesmo desenho da asa de um avião. Da mesma forma que a asa fornece sustentação à aeronave, a forma da pá fornece energia de rotação à turbina. O segundo ponto crítico é o material das pás. Ele deve cada vez mais estar adaptado a condições extremas de abrasividade e salinidade, sobretudo em função do uso frequente de turbinas eólicas no litoral, ou mesmo, crescentemente, dentro da própria plataforma continental costeira a chamada energia eólica offshore. O tamanho dos geradores eólicos é um ponto fundamental. Precisam ser muito robustos e altos para dar conta de uma grande geração de energia. Isso também traz alguns problemas técnicos e estéticos. Uma das preocupações mais recentes com a tecnologia é o risco que as turbinas impõem à fauna. Porém, este risco pode ser atenuado com a realização de estudos que indiquem as áreas com menor índice de aves. As últimas pesquisas também indicam que as fatalidades envolvendo aves em turbinas eólicas são minúsculas quando comparadas com a colisão destas com arranha-céus ou carros. Outros impactos ambientais gerados pela energia eólica estão relacionados principalmente a ruídos. Nas décadas de 1980 e 90, as questões ligadas ao ruído gerado foram uma barreira à disseminação da tecnologia. Entretanto, com o desenvolvimento de novos materiais e sistemas, houve uma diminuição significativa dos níveis de ruído produzidos pelas turbinas eólicas. O ruído gerado por elas depende de fatores como a aleatoriedade do seu funcionamento e a variação da frequência do ruído, relacionada à velocidade do vento que incide nas pás. Um dos casos mais bem divulgados sobre os impactos trazidos pelos ruídos das turbinas ocorreu numa fazenda da Carolina do Norte (EUA). Ali, as máquinas das turbinas emitiam vibrações de tal magnitude que várias pessoas adoeceram em função do barulho. Os animais também sofreram: a produção de leite das vacas da região diminuiu consideravelmente.
11 68 capítulo 6 a energia do futuro Além do ruído, o impacto visual é bastante significativo, pois as turbinas medem mais de 40 m de altura e têm hélices de mais de 20 m. Este tipo de impacto é de difícil quantificação, já que depende muito da paisagem afetada pela instalação das turbinas. Dependendo da localização, isto pode trazer impactos econômicos negativos, como no caso de polos com forte atividade turística. Mas, nos Estados Unidos, fazendeiros do Colorado ou do estado de Nova York competem para abrigar as turbinas eólicas que podem gerar entre 3 mil a 10 mil dólares por ano em royalties. Os impactos ambientais desta fonte de geração são muito pequenos quando comparados aos de outras fontes, como o petróleo. Isso torna compensadora a implementação da energia eólica. Em 20 anos, uma turbina de 600 kw pode evitar a emissão de a toneladas de CO 2. A maior preocupação quanto a esta tecnologia é a garantia de fornecimento de energia. O principal problema é a inconstância dos regimes de vento. Para evitar isto, vêm sendo feitos estudos para mapear os ventos em diversas regiões do Brasil e do mundo. Apesar de eficiente e não poluente, a energia eólica ainda se depara com um problema similar ao enfrentado pela e- nergia solar, que ainda não pode ser utilizada em escala capaz de suprir toda a demanda energética atual. Hoje, a energia eólica ainda é uma fonte complementar a outros sistemas. Cientistas de todo o mundo concordam que o caminho da sustentabilidade deve se basear no uso de Cubo para conexão de pás dos cata-ventos para a geração de energia eólica. Consulte a ficha Número 2 Energia e Cidadania / Potencial e produção de energia eólica no Brasil Nela você encontrará sugestões para abordar este tópico e desenvolver atividades com seus alunos.
12 . prêmio jovem cientista 69 caderno do professor múltiplas fontes energéticas, o que garante a autonomia energética e reduz as dependências por combustíveis fósseis únicos, como a que vivemos atualmente em relação ao petróleo e, em menor escala, nos países ricos, ao carvão. Nesse cenário a energia eólica terá um grande papel. Esquema de um gerador multipolos para turbina eólica. A energia do interior da Terra Como diz Fred Krupp, presidente do Fundo de Defesa Ambiental, é preciso ter um espírito aventureiro para se lançar no mundo da energia geotérmica. O calor da crosta terrestre contém 50 mil vezes mais energia do que todas as reservas mundiais de gás e petróleo combinadas. Mas, pouco tem se investido para converter essa energia em eletricidade. A energia geotérmica é gerada no centro da Terra. Resulta da desintegração natural de elementos radioativos. A Terra tem várias camadas: Núcleo Manto Crosta o núcleo, que é formado por metais como ferro e níquel a altíssimas temperaturas e níveis de pressão; o manto, formado por vários tipos de rochas, as quais, devido às altas temperaturas, encontram-se em estado pastoso e recebem o nome de magma ; a crosta, a casca que circunda a Terra, podendo chegar a 20 km de espessura. Essa camada superficial mudou bastante desde que o planeta surgiu há 4,6 bilhões de anos. Veio se solidificando com o esfriamento da superfície da Terra. Mas, ficaram algumas falhas. Por isso, hoje, o invólucro terrestre parece mais um quebra-cabeça. Ele é formado por 12 peças chamadas placas tectônicas, que constituem os continentes e o fundo dos oceanos. As emendas entre as peças não são perfeitas. Fendas se abrem, permitindo que o material quente do manto suba. Esse fenômeno é particularmente visível no Anel de Fogo do Pacífico abrangendo o leste da Ásia, desde a península de Kamchatka e as ilhas do Japão até as Filipinas, além do oeste do continente americano. Nesta área, ocorrem numerosas erupções vulcânicas e pontos quentes.
13 70 capítulo 6 a energia do futuro Esquema de utilização da Energia Geotérmica Camada impermeável Fonte termal Poço de vapor Fumarola Gêiser Chuva Vapor Água na rocha porosa Aquífero (rocha porosa) Rocha cristalina impermeável Fonte de calor (rocha derretida) Em muitos desses pontos, há o acúmulo de água aquecida, que libera vapor. Esses gases quentes podem aflorar à superfície na forma de fontes termais e gêiseres. Aproveitando a proximidade desses reservatórios de calor, perfuram-se poços para a utilização da energia térmica. Pontos em que há concentração de fontes geotérmicas no mundo. Apesar de conhecida desde 1904 ano da construção da primeira usina geotérmica em Lardarello, na Itália, a evolução deste segmento foi lenta e se caracterizou pela construção de poucas unidades em pontos isolados. No Brasil, por exemplo, não há nenhuma unidade em operação, nem sob a forma experimental.
14 . prêmio jovem cientista 71 caderno do professor O porte dos atuais empreendimentos é significativo. A potência instalada no campo de gêiseres da Califórnia é de 500 MW. Nos últimos anos, no esforço para diversificar a matriz, alguns países, como México, Japão, Filipinas, Indonésia e Itália, procuraram expandir o parque geotérmico. Nos Estados Unidos, havia mais de 60 projetos geotérmicos em construção ou em desenvolvimento em A Islândia e a França são os líderes no uso direto de energia geotérmica. Mais de 90% das residências da Islândia são aquecidas com energia geotérmica, eliminando quase que completamente o uso de carvão para este fim. De acordo com os dados sobre energias renováveis da Revisão Estatística da British Petroleum sobre a Energia Global de 2008, a capacidade mundial total instalada em usinas geotérmicas era de MW. A maior parte desta potência concentra-se nos Estados Unidos (2.936 MW), Filipinas (1.978 MW) e México (959 MW) que, juntos, respondem por 60% da capacidade mundial instalada. Energia do oceano Cerca de 16% da eletricidade mundial tem origem hidráulica. Além da energia obtida pela força dos rios, o que no Brasil acontece em grande escala como vimos anteriormente nas usinas hidrelétricas, o mar também é uma alternativa para a geração de eletricidade. Segundo o estudo sobre Fontes Alternativas do Plano Nacional de Energia 2030, esse potencial de geração de energia elétrica inclui o aproveitamento das marés, das ondas, das correntes marítimas e da energia térmica. As mais promissoras são as correntes marítimas, causadas pelas variações de salinidade e temperatura da água, e as ondas, que resultam da ação de ventos na superfície do mar. Ainda de acordo com este estudo, produzido em 2008, todas as tecnologias estão em fase de desenvolvimento, com exceção do aproveitamento da energia potencial em usina maremotriz. Atualmente, os principais locais para aproveitamento das marés são Argentina, Austrália, Canadá, Índia, Coreia do Sul, México, Reino Unido, Estados Unidos e Rússia. Entre os países com projetos pilotos para aproveitamento das marés ou das ondas estão Estados Unidos, Canadá, França e Rússia. No Brasil, a Coordenação dos Programas de Pós-Graduação de Engenharia (Coppe) da Universidade Federal do Rio de Janeiro está desenvolvendo um projeto piloto para geração de energia a partir das ondas no litoral do Ceará, em Porto de Pecém, a 60 km de Fortaleza. A proposta é construir uma usina composta por 20 módulos, com capacidade de geração de 500 KW. A tecnologia desenvolvida pelos pesquisadores da Coppe utiliza as ondas do mar para movimentar flutuadores ligados a braços mecânicos, que acionam bombas hidráulicas e injetam água tratada de um tanque numa câmera hiperbárica (onde um condutor extremamente estreito faz a água ganhar enorme pressão), que depois é expulsa em jato equivalente a uma queda d água de 500 m de altura, similar a de grandes hidrelétricas. Este jato movimenta a turbina hidráulica, que é ligada a um gerador, que por sua vez produz energia elétrica. Os coordenadores do projeto estimam que se investíssemos em usinas de ondas, nos próximos dez anos já poderíamos contar com 15 GW gerados por tal tecnologia no Brasil.
15 72 capítulo 6 a energia do futuro Ainda que o potencial total desta energia represente apenas uma fração do potencial solar, a energia do mar oferece várias vantagens. Uma delas é a consistência. O oceano funciona como um grande sistema de estocagem de energia. Uma vez geradas, as ondas são preservadas e podem cruzar boa parte do oceano sem perder muita energia. A segunda vantagem é a previsibilidade. Sistemas bem desenvolvidos de previsão de ondas e correntes indicam, com dias de antecedência, como o mar vai se comportar, permitindo que os gestores planejem a geração e a distribuição de energia. Estimativas de organismos internacionais são de que não haverá aplicação em escala das tecnologias marítimas para produção de energia no curto e médio prazo. Mas, a partir de 2025, a expansão poderá ocorrer de forma acentuada. A energia da biomassa A biomassa é todo recurso renovável oriundo de matéria orgânica que possa ser transformado em energia mecânica, térmica ou elétrica. Sua origem pode ser florestal (madeira, principalmente), agrícola (soja, cana-de-açúcar, mamona, dentre outros) e rejeitos urbanos e industriais (sólidos ou líquidos, como o lixo). O potencial energético da biomassa depende tanto da matéria-prima utilizada quanto da tecnologia de processamento. A biomassa é uma das fontes para produção de energia com maior potencial de crescimento nos próximos anos. É considerada uma das principais alternativas para a diversificação da matriz energética e a consequente redução da dependência dos combustíveis fósseis. Dela é possível obter energia elétrica e biocombustíveis, como o biodiesel e o etanol, cujo consumo é crescente em substituição aos derivados de petróleo, como o óleo diesel e a gasolina. Principais processos de utilização da biomassa Combustão é a transformação da biomassa em calor por meio da queima em presença de oxigênio. Ela ocorre em fogões (cocção de alimentos), fornos (metalurgia) e caldeiras, para a geração de vapor. Os biodigestores são utilizados para queimar metano produzido por dejetos de animais. Esse é um exemplo do aproveitamento de biomassa. Gaseificação é a transformação de combustíveis sólidos em combustíveis gasosos pela combustão incompleta em presença de ar ou oxigênio, podendo haver ainda a introdução de vapor d água. O resultado
16 . prêmio jovem cientista 73 caderno do professor é uma mistura de monóxido de carbono, hidrogênio, metano, dióxido de carbono e nitrogênio. Na gaseificação, é feita a retirada de componentes químicos prejudiciais ao meio ambiente e à saúde humana, principalmente os óxidos de enxofre. A mistura de gases resultante pode ser utilizada para acionar tanto motores de combustão interna (a exemplo dos motores a explosão) como turbinas a gás (a exemplo das usinas termelétricas de ciclo combinado). Pirólise ou carbonização é a conversão de um combustível, geralmente a lenha, em outro, pelo aquecimento a alta temperatura na quase ausência de ar. O principal produto da pirólise lenta é o carvão vegetal. A pirólise rápida permite a obtenção de bio-óleos. Digestão anaeróbia consiste na decomposição da biomassa pela ação de bactérias. É um processo que ocorre naturalmente em quase todo ambiente. Quando realizado em biodigestores, o processo é favorecido pela umidade e pelo aquecimento. O produto final é o biogás, composto por metano e dióxido de carbono. O resíduo da digestão anaeróbia pode ser empregado como fertilizante. Fermentação é um processo biológico anaeróbio, no qual os açúcares de plantas como o milho, a beterraba e a cana-de-açúcar são convertidos em álcool por micro-organismos. O produto final é o álcool, composto por etanol. No Brasil, ele é utilizado como combustível puro ou misturado à gasolina, para acionar motores de combustão interna. O uso combinado ou isolado desses processos de transformação e utilização da biomassa pode levar a um novo padrão de interação com o meio ambiente, no âmbito da oferta e uso de energia. A biomassa no Brasil O Brasil tem uma longa história de produção, utilização e desenvolvimento científico e tecnológico na área de biocombustíveis. Desde a década de 1930, o país produz etanol a partir da cana-de-açúcar para mover sua frota de veículos. A partir dos anos 70, com o advento do Programa de Incentivo ao Álcool Automotivo (o chamado Pró-álcool, desativado anos depois) o uso do etanol para fins automotivos se intensificou no país. Apenas nos automóveis tipo flex fuel (que utilizam tanto gasolina quanto etanol) o consumo de etanol mais que dobrou nos últimos sete anos, superando os 60 milhões de litros em Hoje, o Brasil se destaca como o segundo maior produtor mundial de etanol, apresentando potencial energético similar e custos muito menores que o etanol dos Estados Unidos e da União Europeia. Segun Consulte a ficha Número 7 Energia e Cidadania / Energia que vem do lixo Nela você encontrará sugestões para abordar este tópico e desenvolver atividades com seus alunos.
17 74 capítulo 6 a energia do futuro do o Balanço Energético Nacional, a produção brasileira alcançou mil tep (toneladas equivalentes de petróleo) em 2007 contra mil tep em 2006, o que representa um aumento de 34,7%. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado pelo Governo Federal em 2007, prevê, até 2010, investimentos de R$ 13,3 bilhões na construção de mais de cem usinas de etanol e biodiesel e outros R$ 4,1 bilhões na construção de dois alcooldutos: um entre Senador Canedo (GO) e São Sebastião (SP) e outro entre Cuiabá (MT) e Paranaguá (PR). No Brasil são produzidos dois tipos de biocombustíveis líquidos com finalidade automotiva: 1. Biodiesel Derivado de lipídios orgânicos renováveis, como óleos vegetais e gorduras animais, para utilização em motores de ignição por compressão. É produzido por transesterificação, processo que compreende a reação de óleos vegetais com um produto intermediário ativo obtido pela reação entre metanol ou etanol e uma base (hidróxido de sódio ou de potássio). É um combustível biodegradável alternativo ao diesel de petróleo, criado a partir de fontes renováveis de energia, livre de enxofre em sua composição. Atualmente, o biodiesel é produzido no Brasil a partir da palma e babaçu (região Norte), soja, girassol e amendoim (regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste) e mamona (semiárido nordestino), entre outras matérias-primas de origem vegetal. 2. Bioetanol O etanol é um álcool incolor, volátil, inflamável e totalmente solúvel em água, derivado da cana-de-açúcar, do milho, da batata, da beterraba ou de outros cereais, produzido a partir da fermentação pela ação de micro-organismos (em geral, leveduras). O produto final é o etanol na forma de álcool hidratado e, em menor escala o álcool anidro (isto é, com menos de 1% de água). Se o primeiro é usado como combustível puro em motores de combustão interna, o segundo é misturado à gasolina (no Brasil, na proporção de 20% a 22%). O resíduo sólido do processo de fermentação pode ser utilizado em usinas termelétricas para a produção de eletricidade. Dada a necessidade de escala na produção de resíduos agrícolas para a produção de biocombustíveis e energia elétrica, os maiores fornecedores potenciais da matéria-prima desses produtos são os países com agroindústria ativa e grandes dimensões de terras cultivadas ou cultiváveis. O Brasil tem, atualmente, 388 milhões de hectares de terras aráveis férteis e com alto potencial de produção, de acordo com dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Isso faz do Brasil um dos países mais propícios para o cultivo de biomassa para alimentação e para produção de energia. Tamanha disponibilidade de terras dá ao país uma vantagem na produção de biocombustíveis líquidos.
18 . prêmio jovem cientista 75 caderno do professor Principais meios de transporte utilizados, por classe econômica, em 2006 Distribuição da população por classe socieconômica 80% 70% 60% 50% 40% 41% 78% 70% 56% C 34% D 30% B 24% A 6% E 6% 30% 20% 10% 0% Ônibus ou micro-ônibus 17% 2% Carro próprio 19% 13% 7% 9% 2% 3% 5% 4% 2% 2% 3% 4% 3% 3% 2% A pé Bicicleta Metrô Lotação (van, Moto própria kombi ou perua) A/B C D/E Fonte: NTU, 2006 A cana-de-açúcar, matéria-prima utilizada para produzir álcool no Brasil, é a terceira maior cultura por área ocupada (números de 2006). A cana-de-açúcar ocupa 6 milhões de hectares, atrás apenas da soja (22 milhões de hectares) e do milho (13 milhões de hectares) quase metade dessa extensão, no entanto, destina-se à produção de açúcar (como alimento) e não de etanol. + É crescente a utilização da biomassa como fonte de energia elétrica no Brasil. De acordo com o Banco de Informações de Geração da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em novembro de 2008 existiam 302 termelétricas movidas a biomassa no país, que correspondiam a um total de 5,7 mil MW instalados. Do total de usinas relacionadas, 13 são abastecidas por licor negro (resíduo da celulose) com potência total de 944 MW; 27 por madeira (232 MW); três por biogás (45 MW); quatro por casca Consulte a ficha Número 5 Energia e Cidadania / Biodiesel Nela você encontrará sugestões para abordar este tópico e desenvolver atividades com seus alunos. + Para saber mais: Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP)
19 76 capítulo 6 a energia do futuro de arroz (21 MW) e 252 por bagaço de cana (4 mil MW). Uma das características desses empreendimentos é o pequeno porte com potência instalada de até 60 MW, o que favorece a instalação nas proximidades dos centros de consumo e suprimento. Os impactos da biomassa no Brasil e no mundo O bom desempenho ambiental dos biocombustíveis depende do tipo de matéria-prima, de agricultura e das tecnologias de processamento praticadas. Se utilizada para produção de energia pelos meios tradicionais, como cocção e combustão, a biomassa se apresenta como fonte energética de baixa eficiência e alto potencial de emissão de gases. Assim, sua aplicação moderna e sustentável está diretamente relacionada ao desenvolvimento de tecnologias de produção da energia. No caso das plantações de cana-de-açúcar, o uso dos resíduos para produção de eletricidade beneficia os aspectos ambientais da fase de colheita. O método tradicional é a colheita manual acompanhada da queima da palha que, além de produzir a emissão de grandes volumes de CO2, é fator de risco para a saúde humana sendo responsável, inclusive, pela ocorrência de incêndios de grandes proporções. Na utilização sustentável do bagaço da cana para a produção de eletricidade por meio de usinas termelétricas, o balanço de emissões de CO2 é quase nulo, pois as emissões resultantes da atividade são absorvidas e fixadas pela planta durante o seu crescimento. Quanto aos biocombustíveis produzidos a partir de produtos agrícolas, é preciso ter em conta o impacto dos adubos e dos pesticidas utilizados. Também devem ser considerados o consumo de água e o impacto na biodiversidade (quando imensas zonas de cultura substituem áreas ricas em espécies e ecossistemas). A conversão de florestas tropicais em matéria-prima para biocombustíveis provou-se ineficiente como fonte limpa de energia, pois é uma grande emissora de gases do efeito estufa. No Brasil essa discussão levou à proibição do cultivo de cana-deaçúcar na Amazônia. E, de fato, o país pode expandir sua produção de cana e de etanol sem causar desmatamento. Os impactos citados podem ser contornados por técnicas e processos que aumentam a produtividade da biomassa reduzindo, portanto, a necessidade de crescimento de áreas plantadas. Apenas como exemplo, segundo dados da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), no Brasil é possível produzir 6,8 mil litros de etanol por hectare plantado. Nos Estados Unidos, para obtenção do etanol a partir do milho, a relação é de 3,1 mil litros por hectare.
20 . prêmio jovem cientista 77 caderno do professor Um relatório da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) alertou para os impactos da produção de biocombustíveis sobre a produção de alimentos. Os produtores de biocombustíveis foram acusados de pressionar os preços de alguns produtos, com destaque para os cereais Estados Unidos e Europa foram os mais criticados no relatório da FAO, acusados de provocar alta dos alimentos na África e na China. A produção brasileira de etanol foi uma das poucas que ficaram livres da acusação de pressionar o preço dos alimentos no mundo. + + Para saber mais: Plano Nacional de Energia
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