A Consignação Judicial do Pagamento
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- Therezinha Mota Costa
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1 A Consignação Judicial do Pagamento O art. 164 do Código Tributário Nacional trata das hipóteses em que seria cabível a ação de consignação em pagamento, isto é, o contribuinte fazer o depósito de um crédito tributário através da Justiça: Art A importância do crédito tributário pode ser consignada judicialmente pelo sujeito passivo, nos casos: I - de recusa de recebimento, ou subordinação deste ao pagamento de outro tributo, de penalidade, ou o cumprimento de obrigação acessória; II - de subordinação de recebimento ao cumprimento de exigências administrativas sem fundamento legal; III - de exigência por mais de uma pessoa jurídica de direito público, de tributo idêntico sobre o mesmo fato gerador. 1º. A consignação só pode versar sobre o crédito que o consignante se propõe pagar. 2º. Julgada procedente a consignação, o pagamento se reputa efetuado e a importância consignada é convertida em renda; julgada improcedente a consignação no todo ou em parte, cobra-se o crédito acrescido de juros de mora, sem prejuízo das penalidades cabíveis. Oportuno ressaltar que o art. 164 não entra em choque com os termos do art. 163, ambos do CTN. Este último delega à autoridade fazendária a possibilidade de escolher o débito a ser extinto inicialmente, se o devedor tem mais de um deles. Assim, se o sujeito passivo deve o IPTU de 2007 e 2008, ambos vencidos e sem que se ofereça qualquer contestação judicial ou administrativa à cobrança, pode a autoridade fazendária determinar ex officio a imputação prévia do pagamento do imposto de 2007, em obediência a ordem crescente dos prazos de prescrição. Mas a imputação tem que ser determinada anteriormente ao pagamento, dando ciência ao sujeito passivo que o primeiro pagamento vai se referir ao débito previamente determinado. Em outras palavras, se o contribuinte estiver de posse dos dois carnês de IPTU, um de 2007 e outro de 2008, e resolver pagar, por vontade própria, o carnê de 2008, deixando de lado o de 2007, não poderá a autoridade fazendária descaracterizar esse pagamento, por decisão posterior ao fato ocorrido, fazendo alterações internas para liquidar o ano de 2007 em vez de A imputação, nos termos do art. 163, é faculdade que somente terá valia se exercida previamente ao pagamento. Aliás, a imputação prescrita no art. 163 é muito pouco utilizada na administração municipal. Quando um Fiscal, por exemplo, lança o ISS relativo a cinco anos de débitos do contribuinte, poderia a autoridade notificar o contribuinte que quaisquer pagamentos posteriores cumprirão uma ordem crescente diante dos prazos de prescrição. Isso, geralmente, não é feito.
2 Todos os casos descritos no referido art. 164 acontecem costumeiramente nas Prefeituras municipais. Vamos comentá-los: O inciso I trata da recusa de receber o pagamento de um tributo por alegações muitas vezes absurdas, como a de condicionar, por exemplo, o pagamento da taxa de fiscalização de estabelecimento à prévia renovação do alvará de funcionamento. Ou, então, recusar o recebimento do IPTU se o sujeito passivo estiver contestando administrativamente o valor da taxa de coleta de lixo, tributo geralmente associado ao IPTU numa única guia. Já o inciso II ocorre quando a autoridade faz exigências arbitrárias e ilegais. Difícil de acontecer? Não, infelizmente, não. Certa vez, estivemos de visita em um Município onde o novo chefe da fiscalização de Posturas passou a exigir, ao seu talante, que todos os ambulantes usassem luvas descartáveis. Talvez seja até uma boa idéia, mas esqueceu de prescrevê-la na lei do Município. E pior, todos os ambulantes surpreendidos pela fiscalização sem o uso de luvas foram inscritos numa tal lista negra e não podiam tirar suas guias para pagamento da taxa de ambulante. E sem pagar a taxa, os seus veículos, aqueles triciclos que eles usam, eram sumariamente apreendidos. Uma truculência sem par. Um outro exemplo deu-se no plantão fiscal do ISS. Um contribuinte levou seus livros e talonários para que o Fiscal examinasse e calculasse o imposto devido. Bom dizer que o contribuinte não estava sob fiscalização, mas como o pagamento estava em atraso foi pedir à fiscalização que fizesse as contas e emitisse a guia correspondente. O Fiscal desconfiou dos valores registrados nas notas fiscais e, pronto, negou-se peremptoriamente a emitir a guia, a não ser que o contribuinte procurasse todos os tomadores de serviços e trouxesse cópia das primeiras vias das notas emitidas. O sujeito passivo não ficou tão passivo assim e recusou-se a cumprir tão descabida exigência, reação que provocou no Fiscal, que não estava, realmente, nos seus melhores dias, um acesso de fúria, a virar mesas e cadeiras e a expulsar o infeliz da sala, que foi acompanhado, por justíssima razão, por todos que lá estavam, em debandada correria. Este foi um caso real de consignação judicial do pagamento. Como dizia um antigo chefe de fiscais: meu filho, bota primeiro o dinheiro no cofre e depois a gente fiscaliza. O inciso III permite ao contribuinte livrar-se de conflitos de competência. Hoje em dia, tais conflitos são corriqueiros no ISS, quando dois Municípios cobram ao mesmo tempo o mesmo imposto sobre um mesmo fato gerador. A clássica questão do local da incidência, combinada à responsabilidade de retenção do imposto na fonte pagadora, tem provocado uma série de conflitos e a constranger o contribuinte, muitas vezes obrigado a pagar duas vezes o imposto, se já não fosse exorbitante a carga tributária que todos sofrem.
3 Merece, porém, registro que se o valor do imposto já foi retido a favor de um Município, enquanto outro faz a sua cobrança, não caberia a ação de consignação judicial, pois o imposto já foi, de fato, pago a um deles. A ação seria outra. Outro aspecto a notar é o teor do 1º do referido artigo, que restringe o cabimento da ação aos casos cujo objeto é de exclusivamente pagar o crédito, e não discutir a legalidade da exigência. Cabe aos sujeitos ativos discutirem entre si a destinação do valor pago e, se for o caso, com a decisão da Justiça em uma ação judicial entre eles. Em tal discussão, não deve o contribuinte dar palpites sobre quem tem razão, ou não, de cobrar e receber. Apenas se afasta da disputa. Contudo, essa posição é controversa. Quando houver pretensão concomitante de cobrança de tributo idêntico sobre o mesmo fato gerador, por parte de sujeitos ativos distintos, não resta dúvida que a condição básica seria a indagação quanto à existência do próprio crédito e à definição do credor. Foi neste sentido a decisão abaixo do STJ: Na ação consignatória é perfeitamente admissível, e com frequência absolutamente necessário, conhecer da existência da dívida e de seu valor, a fim de que possa o juiz decidir quanto à procedência da própria pretensão do autor à liberação. A ação consignatória não é uma ação executiva às avessas, e nela a cognição não sofre limitações outras que as pertinentes à própria finalidade da demanda (STJ, 4ª Turma, R. Esp. nº RJ, Rel. Min. Athos Carneiro, DJU de ). Um exemplo: vamos supor que o contribuinte sofra duas cobranças de ISS sobre o mesmo fato gerador, mas a alíquota do Município A é de 2%, enquanto a do Município B é de 5%. O sujeito passivo precisa consignar o valor do débito, mas este valor cobriria a cobrança do Município A ou do Município B? Bem, fará a consignação pelo valor maior (Município B), mas, perguntamos, não poderia arguir, na ação, sua preferência, ou melhor, a que considera legalmente correta, coincidentemente endereçada à cobrança do Município A, de alíquota menor? A nosso ver, numa ação consignatória não caberia ao sujeito passivo fazer alegações sobre a legalidade da cobrança, matéria de outra ação judicial, mas, como visto, a Justiça nem sempre entende assim. Outro aspecto é que o sujeito passivo não pode consignar o valor do tributo por mera suspeita de que será cobrado por sujeitos ativos diferentes. Precisa juntar, na ação consignatória, provas inequívocas de que o tributo está sendo exigido por mais de um sujeito ativo. No magistério de Sacha Calmon: Imaginem-se dois municípios exigindo o ISS sobre um mesmo fato gerador. Há que provar que ambos estão a exigir, a um só tempo, o imposto.
4 Temos, então, em primeiro momento, a presença do autor, o contribuinte, a demonstrar em juízo o concurso de exigências e, por isso, a depositar o valor reclamado, chamando os sujeitos ativos para receberem o crédito. No segundo momento, entram em cena os sujeitos ativos, cada um a provar que o crédito lhe pertence, até a Justiça decidir a quem é realmente devido. De acordo com o art. 896 do Código de Processo Civil, o sujeito ativo poderá contestar a consignação quando: I - não houve recusa ou mora em receber a quantia ou coisa devida; II - foi justa a recusa; III - o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento; IV - o depósito não é integral, indicando o réu o montante que entende devido. O depósito deve ser, necessariamente, pago em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, não podendo o credor ser compelido a receber coisa diversa da obrigação. Veja a decisão abaixo: TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. TÍTULOS DA DÍVIDA PÚBLICA. FORMA DE PAGAMENTO NÃO PREVISTA. ARTS. 162, I E II, E 164 DO CTN. Em se tratando de matéria tributária, as hipóteses de cabimento da ação consignatória são as expressamente previstas no art. 164 do Código Tributário Nacional. Ressalvados os casos excepcionais em que os títulos da dívida pública são aceitos como meio de quitação de tributos, não há previsão de cabimento da ação consignatória para compelir o Fisco a aceitar estes títulos como forma de pagamento de tributo. (TRF4-2ª. T., AC /SC, Rel. Des. Federal João Surreaux Chagas, DJU ) A consignação judicial do pagamento não é via adequada para afastar as parcelas de multa, obter parcelamento de tributo ou, ainda, para obtenção de favores fiscais, como a moratória. Veja o teor da decisão abaixo: (...) 3. O depósito em consignação é modo de extinção da obrigação, com força de pagamento, e a correspondente ação consignatória tem por finalidade ver atendido o direito material do devedor de liberar-se da obrigação e de obter quitação. Trata-se de ação eminentemente declaratória: declara-se que o depósito oferecido liberou o autor da respectiva obrigação. 4. Sendo a intenção do devedor, no caso concreto, não a de pagar o tributo, no montante que entende devido, mas, sim, a de obter moratória, por meio de parcelamento em 120 meses, é inviável a utilização da via consignatória, que não se presta à obtenção de provimento constitutivo, modificador de um dos elementos conformadores da obrigação (prazo). Precedentes: AgRg no Ag /RS, Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em , DJ
5 ; REsp /RS, Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ Firmou-se na 1ª Seção o entendimento no sentido de que a simples confissão de dívida, seguida de pedido de parcelamento, não caracteriza a denúncia espontânea prevista no art. 138 do CTN. Precedentes: AgRg no RESP /RS, 1ª Turma, Min. Luiz Fux, DJ de ; RESP /PR, 2ª Turma, Min. Eliana Calmon, DJ de Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido. (REsp / RS, relatoria do Min. Teoria Albino Zavascki, DJ ). Roberto Tauil - março de 2009.
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