CONSELHO DE CONTRIBUINTES DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Transcrição

1 Acórdão: 3.199/07/CE Rito: Sumário Recurso de Ofício: Recorrente: 3ª Câmara de Julgamento Recorrida: Rei do Ferro Ferragens p/construção Ltda. Proc. S. Passivo: Adilson Paulo Moura Pereira/Outro(s) PTA/AI: Inscr.Estadual: Origem: DF/Unaí EMENTA OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA EMISSÃO IRREGULAR DE DOCUMENTO FISCAL. Imputação fiscal de que a Recorrida emitiu notas fiscais que não correspondiam efetivamente a uma saída de mercadoria ou a uma transmissão de propriedade. Exigência de Multa Isolada prevista no artigo 55, inciso III da Lei n.º 6.763/75. No entanto, não há nos autos elementos suficientes para sustentar o trabalho fiscal, ensejando-se, assim, a aplicação do artigo 112, inciso II do Código Tributário Nacional para cancelar a exigência fiscal. Infração não caracterizada. Mantida a decisão a quo. Recurso de Ofício não provido. Decisão unânime. RELATÓRIO Versa a presente autuação acerca da imputação fiscal de emissão irregular de notas fiscais que não correspondiam efetivamente a uma saída de mercadoria ou a uma transmissão de propriedade. Tal imputação partiu de uma auditoria realizada na empresa Recorrida, quando a Fiscalização verificou a existência de um estoque considerado fictício. Foi observado neste depósito o registro da Nota Fiscal n.º , de 07 de novembro de 2002, emitida pela Ferragens Noroeste - Matriz. Ainda no dia 07 de novembro de 2002, foi emitida pela Ferragens Noroeste - Depósito Fechado, a Nota Fiscal nº , destinada à Ferragens Noroeste Matriz. A Fiscalização considerou então que estaria caracterizada a anulação contábil do estoque de mercadorias no Depósito Fechado, não havendo, a partir do dia 07 de novembro de 2002, mercadoria em seu estoque e que a transferência efetuada matriz-depósito foi meramente escritural, não ocorrendo a remessa física da mercadoria. Em virtude disso lavrou-se o Auto de Infração para exigência da Multa Isolada capitulada no artigo 55, inciso III da Lei nº 6.763/75. 1

2 Inconformada, a Recorrida apresentou, tempestivamente e por intermédio de procurador regularmente constituído, Impugnação às fls. 24/33, em síntese, aos argumentos seguintes: - a capitulação quanto a infringência tributária não guarda nenhuma relação com os fatos apontados no relatório do Auto de Infração; - não houve resistência em entrega ou exibição de qualquer tipo de solicitação do Fisco e a irregularidade apontada se trata de uma infração genérica; - o Auto de Infração noticia a emissão das notas fiscais da matriz e da filial, como se fosse a primeira remetendo as mercadorias para a filial e esta, por sua vez, as devolvendo à primeira, culminando com uma anulação contábil do estoque; - de fato o estabelecimento matriz emitiu a Nota Fiscal nº , destinando mercadorias a filial (depósito fechado) e esta emitiu a Nota Fiscal nº com as mesmas mercadorias e valores, mas não observaram os autuantes que a nota fiscal emitida pela filial é uma nota fiscal de entrada das mercadorias objeto da nota fiscal emitida pelo estabelecimento matriz, não se configurando a anulação contábil; - houve, por parte do contribuinte um erro material, pois não haveria necessidade da emissão da nota fiscal de entrada; - não pode o Fisco entender as operações como se fossem meramente de anulação e impor uma multa fiscal de forma totalmente incorreta, uma vez que ocorreu uma obediência em excesso ao artigo 16, inciso VI da Lei nº 6.763/75; - a segunda parte do relatório do Auto de Infração refere-se à devolução de parte das mercadorias, no decorrer de períodos seguintes, das mercadorias enviadas pela matriz mas a comprovação da regularidade da operação da Nota Fiscal nº , exclui a pretensa irregularidade tida como cometida pelos demais documentos fiscais; - os documentos fiscais juntados aos autos demonstram sua boa-fé, tendo simplesmente praticado um lançamento no qual não tinha necessidade; - os documentos fiscais se referem a uma única operação em que ocorreu uma saída da matriz e uma entrada na filial (depósito fechado). Ao final, requer a improcedência do lançamento tributário, e, alternativamente, que a multa por descumprimento de obrigação acessória seja cancelada ou reduzida, conforme prevê o 3º do artigo 53 da Lei nº 6.763/75. O Fisco se manifesta às fls. 43/45, contrariamente ao alegado pela defesa, afirmando que a Nota Fiscal nº , emitida pela filial, não é uma nota fiscal de entrada, não obstante a marcação da quadrícula entrada no documento. A emissão de notas fiscais de entrada era permitida pela legislação do RICMS/96 nas hipóteses previstas no artigo 20 do Anexo V, que não é o caso em tela. Na forma como foi emitida, a nota fiscal indicava que houve uma transferência de mercadorias da filial 2

3 para a matriz. Ademais, a Autuada não cumpriu também as exigências dos artigos 65 e 66 do RICMS/96 que dispõe sobre a remessa de mercadoria para depósito fechado. Estando demonstrada a anulação contábil do estoque na filial depósito fechado, pois foram operações distintas (entrada e saída do depósito fechado), caracterizado o estoque, estando as notas fiscais de transferências emitidas posteriormente pela filial irregulares. Pede seja mantido o lançamento. A decisão consubstanciada no Acórdão n /06/3.ª, pelo voto de qualidade, julgou improcedente o lançamento. DECISÃO Da Preliminar Cumpre verificar, uma vez tratar-se de Recurso de Ofício, do cumprimento da condição regulamentar para sua admissão. Tal condição encontra-se estatuída no artigo 139 da Consolidação da Legislação Tributária Administrativa do Estado de Minas Gerais CLTA/MG, aprovada pelo Decreto n.º /84 com suas alterações posteriores, in verbis: Art Caberá recurso de ofício para a Câmara Especial, quando a decisão da Câmara de Julgamento resultar de voto de qualidade desfavorável à Fazenda Pública Estadual, ressalvado o disposto no 1 do artigo O recurso de ofício devolverá à Câmara Especial o conhecimento de toda a matéria cuja decisão tenha sido contrária à Fazenda Pública Estadual, inclusive aquela não decidida pelo voto de qualidade. Desta forma, tendo a decisão recorrida consubstanciada no Acórdão n /06/3ª, sido tomada pelo voto de qualidade, revela-se cabível o presente Recurso de Ofício, devolvendo à Câmara Especial a análise de toda a matéria versada nos autos. Assim, superada a condição de admissibilidade estabelecida no retro transcrito artigo 139 da CLTA/MG, revela-se cabível o reexame da decisão consubstanciada no Acórdão n.º /06/3ª, de ofício. Do Mérito Trata-se o feito fiscal em apreciação em sede de recurso, da imputação fiscal de emissão irregular de notas fiscais que não correspondiam efetivamente a uma saída de mercadoria ou a uma transmissão de propriedade. 3

4 Importante ressaltar inicialmente que a imputação partiu, segundo consta do Auto de Infração, de uma auditoria realizada na empresa ora Recorrida, quando a Fiscalização verificou a existência de um estoque o qual foi considerado fictício. A Fiscalização observou neste depósito o registro da Nota Fiscal n.º , de 07 de novembro de 2002, emitida pela Ferragens Noroeste - Matriz. Ainda no dia 07 de novembro de 2002, foi emitida pela Ferragens Noroeste - Depósito Fechado, a Nota Fiscal nº , destinada à Ferragens Noroeste Matriz. A partir destes fatos a Fiscalização considerou que estaria caracterizada a anulação contábil do estoque de mercadorias no Depósito Fechado, não havendo a partir do dia 07 de novembro de 2002, mercadoria em seu estoque e que a transferência efetuada matriz-depósito foi meramente escritural, não ocorrendo a remessa física da mercadoria. Em virtude disso lavrou-se o Auto de Infração para exigência da Multa Isolada capitulada no artigo 55, inciso III da Lei nº 6.763/75. Verifica-se, portanto, que a acusação fiscal está diretamente ligada à afirmação de que houve anulação de estoque no estabelecimento autuado e, assim, não poderia haver a saída de mercadorias pelas notas fiscais de fls. 07/19, em transferência deste para outro estabelecimento da mesma empresa. A anulação do estoque estaria comprovada pelas notas fiscais de fls. 06 (Nota Fiscal Emitente: Ferragens Noroeste Ltda.- Depósito Fechado) e 19 (Nota Fiscal Emitente: Ferragens Noroeste Ltda.- EPP - Matriz). Afirma o Fisco que a Nota Fiscal não seria de entrada, mas de saída, apesar de nesta consta claramente o preenchimento do campo próprio como entrada. Analisando-se a primeira parte do relatório do Auto de Infração pode-se concluir que o mesmo noticia a emissão das notas fiscais da matriz e da filial, como se fosse a primeira remetendo as mercadorias para a filial e esta, por sua vez, as devolvendo. Este fato, sem dúvida, culminaria na anulação contábil do estoque, vez que, acontecendo duas operações, entre duas empresas, enviando entre si as mesmas mercadorias, na mesma data, se tratariam de operações que se anulariam, gerando o dito estoque fictício. Entretanto, este fato não está seguramente demonstrado nos autos, de forma a sustentar a presente autuação. É inegável que o estabelecimento matriz emitiu a Nota Fiscal nº (fl. 20), destinando mercadorias, ao seu estabelecimento filial depósito fechado. É fato não negado nem mesmo pela Recorrida em sua manifestação no presente processo. Também é inegável que o estabelecimento filial, autuado, emitiu a Nota Fiscal nº (fl. 06), com as mesmas mercadorias e valores. No entanto, não é inegável que a referida Nota Fiscal n.º seja uma nota de saída da mercadoria. Outrossim, pelas informações dela constantes evidencia-se 4

5 que a mesma não é uma nota fiscal de saída, mas sim, de entrada das mercadorias objeto da nota fiscal emitida pelo estabelecimento matriz. Embora tenha alegado, o Fisco não alcançou demonstrar que a Nota Fiscal n.º , representasse saída das mercadorias, pois o documento acostado aos autos dá noticia de uma entrada. Assim, considerando-se não se poder admitir a ocorrência de anulação contábil do estoque como pretende o Fisco, houve sim, uma operação de remessa de mercadorias da matriz para a filial e a sua entrada no estabelecimento destinatário por um documento fiscal emitido por este. Realmente a ora Recorrida emitiu a Nota Fiscal nº , desnecessariamente, uma vez que a emitida pela matriz, nº , já era suficiente para dar entrada em seu estabelecimento. Os documentos fiscais juntados às fls. 07 a 19, ou seja, as várias notas fiscais com descrição dos mesmos produtos constantes na nota fiscal de entrada, demonstram que a ora Recorrida praticou um lançamento desnecessário. O Fisco alega que a nota fiscal de fl. 06 foi preenchida equivocadamente e que a quadrícula que deveria estar preenchida era a de saída e não a de entrada, pois não há previsão para a emissão da nota fiscal de entrada, nesta hipótese. Mas, frise-se, pela importância, que embora não haja mesmo previsão para emissão de tal de entrada, não há também nos autos elementos que conduzam a conclusão irrefutável que as mercadorias ali descritas saíram do estabelecimento autuado. Em face da inexistência de comprovação de que as mercadorias descritas na Nota Fiscal n.º deram saída do estabelecimento acobertadas por este documento, não há como sustentar a imputação de que as notas fiscais de fls. 07 a 19 não correspondiam a uma efetiva saída de mercadoria. Sendo assim, no mínimo, deve ser aplicado o artigo 112 do Código Tributário Nacional, em face da inexistência de perfeita convicção quanto a natureza ou circunstância material do fato, in verbis:. Art A lei tributária que define infrações, ou lhe comina penalidades, interpreta-se da maneira mais favorável ao acusado, em caso de dúvida quanto: I - à capitulação legal do fato; II - à natureza ou às circunstâncias materiais do fato, ou à natureza ou extensão dos seus efeitos;... Da inteligência do artigo supra depreende-se o princípio da estrita legalidade tributária, que, segundo a ilustre Professora Maria de Fátima Ribeiro, traz consigo uma tipificação rigorosa, qualquer dúvida sobre o perfeito enquadramento do 5

6 fato ao conceito da norma compromete aquele postulado básico que se aplica com a mesma força no campo do direito penal in dubio pro reo. Portanto, cabível a aplicação do artigo acima transcrito pois diversos dos aspectos apontados nos autos deixam dúvidas quanto à natureza ou circunstância material do fato, ou à natureza ou extensão dos seus efeitos. Este julgamento se deu simultaneamente com o PTA Diante do exposto, ACORDA a Câmara Especial do CC/MG, à unanimidade, em negar provimento ao Recurso de Ofício. Pela Recorrida, sustentou oralmente o Dr. José Souza Lopes e, pela Fazenda Pública Estadual, a Dra. Daniela Victor de Souza Melo. Participaram do julgamento, além dos signatários, os Conselheiros Edwaldo Pereira de Salles, Antônio César Ribeiro, Aparecida Gontijo Sampaio e Luiz Fernando Castro Trópia. Sala das Sessões, 09/02/07. Roberto Nogueira Lima Presidente/Revisor Luciana Mundim de Mattos Paixão Relatora 6