Volney Zanardi Júnior Presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (IBAMA)

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1 Brasil, 09 de Julho de Aos Excelentíssimos Senhores Izabella Mônica Vieira Teixeira Ministra de Estado do Meio Ambiente Volney Zanardi Júnior Presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (IBAMA) Roberto Ricardo Vizentin Presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) Excelentíssimos Senhores, Como especialistas em sirênios, participantes do Plano de Ação Nacional (PAN) para a Conservação dos Sirênios (Portaria ICMBio no. 85 de 2010) e do Grupo de Especialistas em Sirênios da América do Sul da International Union for Conservation of Nature and Natural Resources (IUCN) e pesquisadores de instituições da Rede de Encalhe e Informação de Mamíferos Aquáticos do Brasil (REMAB), gostaríamos de manifestar nossa preocupação quanto à decisão de envio de exemplares de peixes-bois da subespécie antilhana (Trichechus manatus manatus) do Brasil para Guadalupe, no Caribe, para futura reintrodução da espécie naquela área, conforme anúncio oficial feito pelo Ministério do Meio Ambiente no dia 22 de maio do presente ano, em evento comemorativo ao Dia Internacional da Biodiversidade. O peixe-boi marinho está classificado como espécie em perigo de extinção no mundo pela IUCN e é considerado criticamente ameaçado no Brasil (Instrução Normativa MMA no. 03 de 27 de maio de 2003), onde é citado como o mamífero aquático mais ameaçado da fauna nacional, em decorrência de diversos impactos antrópicos. Com uma população de apenas poucas centenas de indivíduos distribuídos de forma fragmentada ao longo do litoral brasileiro (Lima, 1997; Luna 2001; Alves, 2013), a espécie ainda corre o risco de desaparecer da natureza. Assim, qualquer retirada de animais, sejam cativos ou de vida livre, representaria a remoção de uma significativa parcela de peixes-bois do país. Além dessa questão, vale ressaltar que os aspectos genéticos são extremamente relevantes em programas de reintrodução. Uma vez que os peixes-bois da costa brasileira apresentam baixa diversidade genética e não compartilham haplótipos com os animais do Caribe, eles tornam-se inadequados para um programa de reintrodução nessa região (Vianna et al., 2006; Luna et al., 2012; Marsh et al., 2012). A soltura desses espécimes no Caribe poderia causar danos às populações próximas, através da inserção de alelos ou genótipos não adaptados às condições locais, visto que peixes-bois são capazes de realizar longos deslocamentos. Ademais, a falta de adaptação genética dos animais oriundos do Brasil a condições ambientais, nutricionais e climáticas distintas, bem como o elevado risco de endogamia e a necessidade de translocação de mais indivíduos para suplementar essa futura população de Guadalupe, são fatores preocupantes para a sua sustentabilidade a longo prazo.

2 Consideramos que o Brasil tem dado passos importantes em direção à conservação e recuperação da espécie, como mostra o objetivo principal do PAN de Sirênios, que consiste na melhoria do status de conservação do peixe-boi em sua área de distribuição na costa brasileira. Para isto, dentre diversas ações, o plano indica a realização de soltura e monitoramento de animais em águas nacionais, o que vem sendo executado pelo Centro Mamíferos Aquáticos/ICMBio nas últimas décadas com grande esforço. Entretanto, o envio de peixes-bois do Brasil para programas de repovoamento da espécie fora do país não é uma ação prioritária. Julgamos que a reintrodução do peixe-boi antilhano em áreas onde se encontra extinto é de extrema importância para a sua conservação em nível global. Entretanto, considerando todos os pontos discutidos acima, acreditamos que deve-se priorizar a soltura desses animais em águas brasileiras, sejam espécimes resgatados ou nascidos em cativeiro. Dessa forma, proporcionam-se maiores chances de recuperação das populações locais, e os programas de conservação de espécies ameaçadas da fauna brasileira serão fortalecidos. Considerando as questões acima colocadas, solicitamos a Vossas Excelências que essa decisão seja reavaliada e discutida com uma ampla comissão formada por especialistas brasileiros que compõem os grupos já citados anteriormente. Sem mais para o momento, colocamo-nos a disposição para esclarecer quaisquer dúvidas que possam surgir. Atenciosamente, Ana Carolina Oliveira de Meirelles Coordenadora do Programa de Mamíferos Marinhos Cristine Pereira Negrão Silva Pesquisadora do Programa de Mamíferos Marinhos

3 Danielle dos Santos Lima Pesquisadora do Laboratório de Mamíferos Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Amapá e Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Mamíferos Aquáticos Amazônicos Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá Diogo Alexandre de Souza Pesquisador do Laboratório de Mamíferos Aquáticos Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e Associação Amigos do Peixe-boi (AMPA) Fernando César Weber Rosas Pesquisador titular do Laboratório de Mamíferos Aquáticos Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) Neusa Renata Emin de Lima Pesquisadora do Grupo de Estudos de Mamíferos Aquáticos da Amazônia Museu Paraense Emílio Goeldi e Presidente do Instituto Bicho D'água: Conservação Socioambiental João Carlos Gomes Borges Diretor-Presidente da Fundação Mamíferos Aquáticos

4 Jociery Vergara Parente Diretora Vice-Presidente da Fundação Mamíferos Aquáticos Jone César Fernandes Silva Diretor Executivo da Associação Amigos do Peixe-boi (AMPA) Katherine Fiedler Choi Lima Pesquisadora do Programa de Mamíferos Marinhos Miriam Marmontel Coordenadora do Grupo de Pesquisa em Mamíferos Aquáticos Amazônicos Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá Rodrigo de Souza Amaral Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas (IFAM) Stella Maris Lazzarini Gerente do Centro de Preservação e Pesquisa de Mamíferos Aquáticos Eletrobras Amazonas Energia

5 Vera Maria Ferreira da Silva Coordenadora do Laboratório de Mamíferos Aquáticos Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) Vitor Carvalho Luz Pesquisador do Programa de Mamíferos Marinhos Alberto Alves Campos Presidente da

6 Bibliografia citada ALVES, M.D.O Habitats da megafauna marinha na costa nordeste do Brasil, com ênfase em peixes-bois. Tese de Doutorado em Oceanografia, Universidade Federal do Pernambuco, Recife, 136p. LUNA, F. O.; BONDE, R. K.; ATTADEMO, F. L. N.; MEIGS-FRIEND, G.; PASSAVANTE, J. Z. O.; HUNTER, M. E Phylogeographic implications for release of critically endangered manatee calves rescued in Northeast Brazil. Aquatic Conservation: Marine and Freshwater Ecosystems, 22 (5): MARSH, H.; O SHEA, T. J.; REYNOLDS III, J. E Ecology and conservation of the Sirenia: dugongs and manatees. Conservation Biology 18, Cambridge University Press. 518 p. VIANNA, J. A.; BOND, R. K., CABALLERO, S.; GIRALDO, J. P.; LIMA, R. P.; MARMONTEL, M.; MORALES-VELA, B.; DE SOUZA, M. J.; RODRIGUEZ-LOPEZ, M.A.; MIGNUCCI-GIANNONI, A. A.; POWELL, J. A.; SANTOS, F. R Phylogeography, phylogeny and hybridization in trichechid sirenians: implications for manatee conservation. Molecular Ecology, 15 (2):