CONTEÚDOS DIGITAIS PARA O ENSINO DE CÁLCULO: ACEITAÇÃO, DEMANDAS E EXPECTATIVAS DOS ALUNOS

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1 CONTEÚDOS DIGITAIS PARA O ENSINO DE CÁLCULO: ACEITAÇÃO, DEMANDAS E EXPECTATIVAS DOS ALUNOS Eixo 10: Tecnologias de Informação e Comunicação-TIC no Processo de Ensinar e Aprender e na Formação Docente BIZELLI, Maria H. S. S.; FISCARELLI, Silvio Henrique; OLIVEIRA, Luiz Antonio Andrade de 1 ; 1 - Introdução Atualmente, existem muitas experiências relacionadas ao desenvolvimento de ferramentas computacionais de apoio ao processo de ensino e aprendizagem. Uma das linhas de pesquisa que tem sido bem aceita pela comunidade acadêmica, no campo das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), é a que se refere ao desenvolvimento de sistemas hipermídia para serem utilizados como auxiliar no processo de ensino e aprendizagem. Entende-se por hipermídia a intersecção entre hipertexto e multimídia, onde multimídia são os diversos meios utilizados na representação de uma informação (texto, vídeo, áudio, animação) e hipertexto é um sistema onde a informação em geral aparece na forma de texto, organizada não-seqüencialmente, mas por meio de ligações entre palavraschave. Através desses recursos computacionais é possível apresentar o conteúdo, necessário para a aprendizagem, de uma maneira dinâmica por meio de textos explicativos, imagens, áudio, vídeos e animações. Em meados de 2005, o projeto de pesquisa denominado Produção de Material Didático de Matemática, utilizando recursos de Hipertextos e Multimídia, iniciou-se e começou a tomar forma no início de O projeto tinha como objetivos gerais: Desenvolvimento, implementação e avaliação de material didático sobre conteúdos específicos de Matemática, utilizando recursos de hipermídia. Desenvolvimento e introdução de novas metodologias de ensino utilizando recursos de hipermídia. Pesquisa bibliográfica sobre o tema. 1 Agência Financiadora: FAPESP Instituto de Química UNESP Campus de Araraquara Av. Prof. Francisco Degni, S/N, Bairro Quitandinha Araraquara SÃO PAULO, Brasil, CEP: Telefone: ramal mlena@iq.unesp.br

2 Digitalização do material impresso, atualmente existente, relativos às disciplinas de Matemática e Estatística do Curso de Química e da Farmácia da Unesp de Araraquara (apostilas, notas de aula e listas de exercícios). Disponibilização do material didático na Internet, em um site de apoio didático às disciplinas de Cálculo. Reunião de material preliminar para a criação de cursos à distância. Com o passar do tempo, o objetivo principal do projeto passou a ser a criação de um ambiente interativo multimídia (site) para o ensino de Cálculo, direcionado ao acompanhamento das disciplinas regulares ministradas para alunos ingressantes do Curso de Química da UNESP de Araraquara (SP). A idéia era construir uma rede hipertextual composta de links, animações, vídeos e applets (objetos de aprendizagem 2 ), que possibilitasse a construção de conhecimento significativo por parte dos alunos. Assim, para adquirir os subsídios necessários ao desenvolvimento desses objetos de maneira bastante criteriosa, consciente e cuidadosa, foi analisado um grande número de livros didáticos de Cálculo, no intuito de compreender de que maneira os autores realizam a construção dos significados matemáticos. Além disso, os vários anos de experiência com o ensino de Cálculo para químicos e a elaboração da Tese de Doutorado (A Matemática na formação do químico contemporâneo.) envolvendo o mesmo tema, foram essenciais para estabelecer as características do site em questão. Inicialmente, foi imprescindível aprender a trabalhar com alguns softwares (Flash, Dreamweaver, CorelDraw, Fireworks, Photoshop, Camtasia), necessários ao desenvolvimento dos objetos de aprendizagem e do site que seria também utilizado como um repositório desses objetos. Esse aprendizado continua até hoje. No final de 2006, o site foi colocado no ar com alguns hipertextos e poucos objetos de aprendizagem (animações em flash) relacionados aos conteúdos de Cálculo. Durante os anos de 2007 e 2008 foram produzidos vários objetos e, a partir de 2009, com a criação do GPIEQ (Grupo de Pesquisa em Informática no Ensino de Química) vinculado à FAPESP, essa produção intensificou-se, diversificou-se e aprimorou-se com a criação de novas animações em flash, localização e 2 Objetos de Aprendizagem (Learning Objects) podem ser definidos por "qualquer entidade, digital ou não digital, que possa ser utilizada, reutilizada ou referenciada durante o aprendizado suportado por tecnologias. A tecnologia de objetos de aprendizagem baseia-se na hipótese de que é possível criar pequenos pedaços de material instrucional e organizá-los de forma a permitir a sua reusabilidade, promovendo economia de tempo e de custo na produção de materiais didáticos online.

3 tradução de applets (relacionadas com o aprendizado de Cálculo) disponíveis na Internet, produção de vídeos e conteúdos digitais para o site em questão. 2 - Fundamentação teórica Não é de agora que se observam as enormes dificuldades apresentadas no ensino e aprendizagem do Cálculo Diferencial e Integral, nos vários cursos onde ele se apresenta. O que se pode notar, nas Instituições de Ensino Superior, de uma maneira geral, é que o aluno chega à universidade com inúmeras dificuldades de aprendizado, particularmente aquelas relacionadas com o aprendizado da Matemática. Essas dificuldades impedem que o aluno tenha um bom desempenho nas disciplinas relacionadas com a Matemática (Cálculo, Geometria, Álgebra e Estatística) e, conseqüentemente, naquelas que dependem destas para o seu desenvolvimento. Podemos observar que já há muito tempo a literatura vem apontando problemas relacionados com a preparação matemática dos alunos em um curso de Química. Williams (1952) mostra em seu trabalho que a causa principal da dificuldade em Físico-Química, uma das áreas da Química, está relacionada com a preparação matemática dos alunos. Por diferentes motivos, que podem ser de ordem pessoal, contextual ou formativa, muitos alunos encontram dificuldades de compreensão e assimilação de conceitos abstratos, elementos de fundamental importância nas disciplinas que fazem parte do conteúdo programático do Curso de Química. Entre estas disciplinas podemos destacar as disciplinas de Cálculo Diferencial e Integral. Essas dificuldades, encontradas nos alunos, para fazer as abstrações necessárias ao entendimento de modelos matemáticos, pode desmotivar e criar uma certa aversão aos conteúdos. Além disso, existe ainda o problema da existência de alunos, em sala de aula, com níveis de conhecimentos desiguais, reunindo grupos com um nível de desenvolvimento alto e outros que não conseguem acompanhar a aprendizagem básica. Uma situação como essa tem como conseqüência uma queda na qualidade do ensino e aprendizagem, acabando também por desmotivar os professores, levando-os a estimular o processo de decoreba e não a compreensão. Aliado a isso está o fato do pouco tempo disponível para as disciplinas básicas na grade curricular do curso de graduação, tempo esse necessário para que se possa desenvolver um trabalho de nivelamento desses alunos de modo que consigam desempenhar-se a contento nessas disciplinas.

4 É neste cenário que o uso da tecnologia da informática vem sendo apontado como uma ferramenta útil que pode promover uma aprendizagem mais significativa e com um custo relativamente baixo. Além disso, possibilita uma aprendizagem personalizada [...] ao estudante, pois permite ajustar-se melhor aos seus objetivos, ao seu estilo, à sua formação e ao seu ritmo de aprendizagem ( AMORIM et al. 2002, p. 8). Principais contribuições dos conteúdos digitais: Maior contextualização dos conteúdos O que se pretende com o ambiente e conteúdos digitais é ampliar as possibilidades do aluno experimentar, observar, conjeturar, deduzir e pesquisar, habilidades que estão associadas à criação do raciocínio lógico (GALVIS-PANQUEVA, 2003). O uso de simulações, animações e vídeos busca justamente incrementar o apelo sensorial na apresentação da informação e, assim, ampliar as associações entre a teoria e a prática, fornecendo novas alternativas ao aluno para a sistematização da aprendizagem. Ampliação do acesso às referências e conteúdos Para Peters (2003), o modelo presencial com suporte dos recursos digitais tem demonstrado ser uma alternativa interessante para elevar os níveis de formação, pois para seguir o conteúdo programático da disciplina dentro do cronograma estabelecido, o professor muitas vezes não dispõe de flexibilidade para inserir, em sala de aula, atividades complementares, como a apresentação de vídeos, a demonstração de um software, a apresentação de uma simulação, a proposição de exercícios adicionais, entre outras atividades que poderiam melhorar o processo de ensino-aprendizagem. Neste sentido, os conteúdos digitais, além de ampliar o acesso à referências, podem diversificá-las, pois o professor pode criar ou indicar diversos conteúdos que serão posteriormente ou anteriormente consultados pelos alunos (ALONSO, 2000). Melhor aproveitamento do tempo e conteúdos Muitos alunos sentem-se constrangidos de interromper a aula para realizar questionamentos e tirar dúvidas sobre a matéria abordada. Este procedimento muitas vezes acaba prejudicando a compreensão do conteúdo transmitido durante a aula. Shimada e Kitajima (2006) ressaltam ainda que muitas vezes, no decorrer da aula, o tempo é curto para a reflexão sobre o conteúdo, principalmente pelo fato do processo de assimilação ser diferente para cada pessoa. Assim, o ambiente e conteúdos digitais possibilitam que os alunos criem seu próprio tempo e espaço de estudo, pois o aluno tem a liberdade de rever conteúdos, como um texto, um vídeo, uma simulação, quantas vezes forem necessários até que compreenda o

5 processo. Pinheiro e Mendes (2007) argumentam que o uso de materiais didáticos digitais coloca nas mãos dos alunos a gestão de sua aprendizagem, pois são os próprios alunos que decidem quando passar para uma nova etapa, quando retornar a uma informação e quantas vezes precisam acessar o material para compreender o conteúdo abordado; ou seja, os alunos possuem maior grau de autonomia sobre a sua própria aprendizagem. 3 - Materiais e Métodos Questionário Um questionário é um instrumento de investigação que tem como objetivo recolher informações de maneira rápida e objetiva por meio do uso de perguntas à um grupo representativo da população em estudo. Nesta pesquisa, o questionário foi aplicado a 50 alunos da disciplina Cálculo I, do curso de Bacharelado em Química. Segundo Ghiglione e Matalon (2001), o uso dos questionários não se limita apenas ao levantamento de características de uma determinada população, mas pode também levantar dados estatísticos sobre grandezas absolutas e relativas, explicitar relações e comprovar proposições ou hipóteses sobre um determinado fenômeno analisado. Nesta pesquisa, o questionário foi elaborado buscando levantar indicadores que permitissem investigar o grau de acesso dos alunos aos conteúdos on-line, a opinião dos alunos sobre a adequação e utilidade dos conteúdos e as possíveis sugestões deles para a melhoria dos materiais disponibilizados. Para tanto estabelecemos uma relação entre os indicadores desejados e as perguntas a serem elaboradas no questionário, conforme pode ser observado no quadro1. Acesso Indicadores Adequação dos conteúdos Utilidade dos conteúdos Sugestões Questões Você Utiliza (ou já utilizou) o material de Cálculo on-line? Por que nunca utilizou? Com que freqüência utiliza o material do site? Qual tipo de material costuma utilizar? Quais os recursos disponíveis são mais adequados ao seu aprendizado? Material melhorou seus conceitos sobre cálculo? Como o material ajudou no aprendizado? Qual sua opinião sobre a resolução de dúvidas? Como melhorar os animações e vídeos? Quais suas sugestões para melhorar os materiais de maneira geral? Quadro 1 Indicadores da pesquisa

6 Após aplicação, foram recolhidos 49 questionários válidos, as perguntas fechadas foram tabuladas em um software estatístico e as abertas foram analisadas individualmente e categorizadas em grupos representativos. Os resultados permitiram elaborar uma síntese das atitudes, opiniões e demandas dos alunos quanto aos conteúdos digitais disponibilizados para a disciplina de Cálculo I. 4 - Discussão dos resultados Os resultados da tabulação do questionário mostraram que a grande maioria dos alunos (76%) fez uso do site durante o período do curso de Cálculo Diferencial e Integral I. Os alunos que disseram não terem acessado os materiais, indicam como principal motivo a dificuldade de acesso regular à Internet. Quando questionados sobre a freqüência com que acessam os recursos disponíveis no site, 64% responderam que consultam o material semanalmente, 19% pelo menos uma vez por mês e 16% acessam somente nos períodos próximos a realização de provas. Com relação ao tipo de material, 71% disseram fazer uso dos hipertextos, 18% tem preferência pela sessão de dúvidas freqüentes e 11% utilizaram os objetos de aprendizagem. Sobre a utilidade dos materiais como apoio a aprendizagem, 62% afirmam que o material possibilitou revisar conteúdos e esclarecer dúvidas, 19% apontaram que os materiais complementam e ampliam os conteúdos dados em sala de aula e 11% vêem os exercícios adicionais disponibilizados como um ótimo recurso para melhorar a compreensão da matéria. De forma geral, 97% dos alunos disseram que o material disponibilizado auxiliou de alguma forma sua aprendizagem. Consultados sobre quais tipos de materiais são mais importantes e adequados para melhorar sua aprendizagem, os alunos consideraram a resolução de exercícios (54%) como o principal recurso a ser disponibilizado. Uma boa parcela dos alunos (25%) sugere que a resolução de exercícios deva ser apresentada não somente nos conteúdos hipertexto, mas também na área de dúvidas freqüentes. Buscando aprimorar o material disponibilizado, foi perguntado aos alunos que tipo de melhorias poderiam ser realizadas no site, sendo que neste quesito 71% apontaram que aumentar o número de exercícios e exemplos de resolução seria a principal medida. Com relação aos vídeos/animações disponibilizados, 31% sugeriram que eles fossem acompanhados de legenda ou narração. Ainda foram apontadas como possíveis melhorias a ampliação do material e o maior detalhamento dos conteúdos.

7 5 - Conclusões Considerando que a pesquisa foi realizada com alunos do primeiro ano, que estão passando por um período de adaptação à dinâmica de um curso de ensino superior, acreditamos que o índice de 76% de acesso está além das expectativas iniciais e pode ser considerado promissor para o desenvolvimento do projeto, principalmente, pelo fato de que grande parte dos alunos, que não acessaram o site, apontou como justificativa, problemas com relação à infra-estrutura de acesso. Com relação à freqüência de acesso, notamos que a maioria diz consultar o site com regularidade, sinalizando que o uso de recursos da Internet já faz parte do seu processo de estudo. Importante salientar que, apenas 16% tendem a ter uma visão utilitarista de consultar o site somente no momento de estudar para as provas. Conforme levantado, a grande maioria dos alunos indica que os recursos disponibilizados trouxeram algum tipo de benefício ao processo de ensino e aprendizagem, principalmente com relação ao esclarecimento de dúvidas e sinalizam suas demandas, quando solicitam o aumento do número de exercícios, a resolução de exercícios no site e a inclusão de legendas ou narrações nas animações. O diagnóstico inicial, obtido a partir da análise dos questionários e as demandas expressas pelos alunos, nos levam a concluir que, neste estudo de caso, identificamos um cenário propício para o uso das novas tecnologias, no qual os alunos já incorporaram, ao seu processo de estudo, o uso de recursos da Internet como complementação a aula presencial. Compete agora a nós professores/pesquisadores investigar qual a melhor forma de apresentar um conteúdo aos alunos.

8 Bibliografia ALONSO, K. M. Educação a distância e formação de professores na sociedade tecnológica. In: MARTINS, O.B.; POLAK, Y.N.S. N (Orgs.) Formação em educação a distância UniRede Fundamentos e políticas de educação e seus reflexos na educação a distância - Módulo. 1. Curitiba: MEC/SEED/UFPR. 2000, p AMORIN, Joni de Almeida; et. al. Ambientes de Compartilhamento de Material Didático em Educação a Distância. Tecnologia Educacional/: Revista Brasileira de Tecnologia Educacional, Rio de Janeiro, ano XXX, n. 157/158, p.7-18, abr/set GALVIS-PANQUEVA, A.H.D. Software educativo multimídia aspectos críticos no seu ciclo de vida. Disponível em < Acesso em: 19 dez GHIGLIONE, R. & MATALON, B. (2003). O Inquérito: teoria e prática. Oeiras: Celta Editora PETERS, O. Learning With New Media in Distance Education. Em: Moore, M.G., Anderson, W (Orgs). Handbook of distance education (2003) (pp ). London: Lawence Erlbaum Associates Publishers. PINHEIRO, Margarida e MENDES, Antônio José. Contribuições para a construção de um curso EAD para adultos. In: V Conferência Internacional de TIC na Educação. Disponível em: < MargaridaPinheiro.pdf >. Acesso em: junho de SHIMADA, H. e KITAJIMA, M. Why Do Illustrations Promote Tex Comprehension? Motivation Effect and Elaboration Effect. 5th International Conference of the Cognitive Science. Vancouver, British Columbia, Canadá, July, WILLIAMS, H. B. Elementary Physical Chemistry and Mathematics Journal of Chemical Education, 29 (2): 77, 1952