ANTECEDENTES DA GLOBALIZAÇÃO: O CASO DA FÓRMULA 1
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- Moisés Bacelar Neves
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1 XI CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA 1 A 5 DE SETEMBRO DE 2003, UNICAMP, CAMPINAS, SP GRUPO DE TRABALHO SOCIOLOGIA DO LAZER E DO ESPORTE ANTECEDENTES DA GLOBALIZAÇÃO: O CASO DA FÓRMULA 1 AUTORA: ANDRÉA MIDORI TAKAI ORIENTADOR: PROF. DR. SÉRGIO GERTEL Campinas Setembro/2003
2 SUMÁRIO ANTECEDENTES DA GLOBALIZAÇÃO: O CASO DA FÓRMULA 1. 2 CONCLUSÃO BIBLIOGRAFIA UTILIZADA LEVANTAMENTO EM LIVROS LEVANTAMENTO EM PERIÓDICOS LEVANTAMENTO EM MEIO ELETRÔNICO
3 Antecedentes da globalização: o caso da Fórmula 1 Não reduzindo a Fórmula 1 somente a um esporte, mas sim contextualizando-a dentro dos moldes da produção do espaço capitalista podemos analisar o reflexo da realidade econômica, social, política existente. Isso quer dizer que nesse meio existem: relações de produção capitalista; uso do meio comunicacional (visual e auditivo) com o qual possibilita o mercado de consumo global; demonstra-se o uso avançado que se faz da informação tanto tecnológica quanto social e como elas se concretizam nesse meio. Destacam-se, ainda, características da globalização: a contradição de ser global e excludente, a distorcida relação global e local, cuja definição é uma problemática da atualidade; a utilização das máquinas informacionais que relacionam o real e o virtual no sistema produtivo; e por último, como a Fórmula 1 consegue ser adaptável dentro de sucessivas transformações cotidianas. Por isso, ao analisá-la, é preciso divisar um plano de investigação que contenha vários eixos. O seu nexo evidente é o tecnológico entre o homem e a máquina, mas também, a própria tecnologia (máquina) como mercadoria específica à sociedade de consumo. Para Ruth Scheps algumas noções são indissociáveis do desenvolvimento técnico contemporâneo: Sucedendo à miniaturização, a velocidade é uma das principais especificidades das tecnociências. O virtual, ambivalente pelas atitudes que provoca, que são do fascínio maravilhado à rejeição mais crítica. Certas fronteiras, enfim, são cada vez mais difíceis de traçar: entre o vivo e o artificial; entre as esferas privada e profissional; entre os territórios que dependem de legislações nacionais, pois as fronteiras políticas nada podem contra a disseminação dos organismos geneticamente modificados. (Ruth Scheps, 1996, p.21) Sob o ponto de vista histórico, notamos que a velocidade, o virtual e as fronteiras além de serem características do movimento do desenvolvimento contemporâneo, são características da Fórmula 1. A velocidade está presente nos carros e na organização; a virtualidade, no projeto e fabricação dos carros; e as fronteiras entre humano e máquina, mas também entre equipes, entre países e entre telespectadores. Esta investigação dos temas tecnológicos, comunicacionais, econômicos e informacionais encontra na Fórmula 1 uma arena tipicamente global, de múltiplas 2
4 possibilidades de análise do espaço atual. A técnica é, também, um elemento do mercado. Uma mercadoria resultado e produto da sociedade capitalista, existente em consonância com a mercadoria Informação. Levando-se em consideração que tanto ciência quanto tecnologia são negócios lucrativos do mundo capitalista, forma de controle e ainda, fator de desigualdade entre os países. Para tanto, o tema tecnológico merece destaque entre os diversos eixos traçados para o desenvolvimento da pesquisa. Segundo Diana Domingues em A arte no século XXI: A humanização das tecnologias: As informações através de imagens impressas e faladas circulavam em alguns segmentos da sociedade, mas os setores produtivos podiam funcionar sem elas. Hoje, tudo passa pelas tecnologias: a religião, a indústria, a ciência, a educação, entre outros campos de atividade humana, estão utilizando intensamente as redes de comunicação, a informação computadorizada; e a humanidade está marcada pelos desafios políticos, econômicos e sociais decorrentes das tecnologias. (Diana Domingues, 1997, p.17) A Fórmula 1, mesmo tendo um período romântico ( ) no qual prevaleciam as virtudes humanas, foi se tornando mais técnica, competitiva e homogeneizada. Se comparada ao futebol, a Fórmula 1 se apresenta como um esporte de elite, em que são exigidos um lugar apropriado com condições de segurança, infra-estrutura, roupas apropriadas e as tecnologias mais avançadas, enquanto que o futebol surgiu como esporte da burguesia, mas se converteu em esporte das massas, que não exige condições específicas para um jogo, quanto uma disputa automobilística. A Fórmula 1 acompanhando o desenvolvimento social, foi alterada para um negócio capitalista altamente lucrativo e de condições desiguais, após 1970, com a utilização das tecnologias microeletrônicas e dos novos meios de comunicação. Portanto, analisaremos a Fórmula 1 após 1970 tendo em vista a sua peculiaridade de exemplo da globalização. Sendo a Fórmula 1 expressão da globalização, vemos que diversos aspectos da sociedade capitalista se desenvolvem, e são envolvidas nesse meio, podendo ser destacadas, principalmente, a relação de mercado e de consumo envolvido em seu ambiente, bem como a produção do espaço capitalista desigual. Além disso, a F1 é um laboratório mundial de pesquisas tecnológicas. Assim, permite ser considerada um espaço de alta tecnologia em que somente os melhores conseguem adentrar e fixar-se. A sociedade capitalista encontra na Fórmula 1 um microcosmo perfeito no qual são desenvolvidos todas as suas atividades econômicas, sociais, políticas e até culturais. Já que 3
5 todas parecem estar vivendo um momento de convergência. As atividades econômicas desenvolvidas são principalmente as relações de trabalho, consumo e mercado, as quais acompanham em ritmo acelerado as mudanças da sociedade. Mesmo assim, não podemos nos esquecer que a Fórmula 1 é um negócio lucrativo restrito a um ínfimo número de homens extremamente ricos e influentes. Novamente aparece sua característica elitista e excludente, assim também a globalização age com os países não dotados de tecnologia ou técnicas, estas predominam como necessidades para o desenvolvimento econômico. A relação capitalista é estrutural, as equipes que antes se constituíam nas chamadas escuderias, passam a ser chamadas de equipes devido aos contratos de patrocínio, publicidade e/ou as associações com fabricantes de motores. Porém, os fabricantes de veículos não se contentaram apenas com o patrocínio, atualmente, estão comprando equipes ou estão se coligando à qualquer delas. A participação das indústrias automobilísticas acirra as disputas nas pistas e busca atrair o interesse do público pelo espetáculo, bem como ampliar a influência no mercado de consumo. A valorização econômica e financeira passa a fazer parte da rotina do grande prêmio. O consumo é estimulado para que as negociações dêem lucro, pilotos são garotospropagandas e carros são veículos de propaganda. Os interesses econômicos estão acima de qualquer atitude esportiva ou moralmente correta. Os pilotos não têm mais o direito de decidir sozinhos a suas ações na corrida, é transparente a sua posição de trabalhador que precisa cumprir regras e acordos anteriormente assumidos. É uma situação de hierarquização econômica da relação de trabalho, com direito a compra e venda de mão-deobra e sua sujeição aos interesses do capitalista dentro do esporte. As bases das relações de trabalho, na Fórmula 1, são semelhantes à de uma empresa capitalista em que se preza a eficiência no trabalho, em que os privilégios atingem os melhores empregados e ocorre o trabalho excessivo para alguns. O luxo que vive a Fórmula 1, está amalgamado com diversos aspectos sombrios. A relação de trabalho expressa a questão do poder, estabelecido e demarcado, seja no contrato ou pela mídia especulativa na esfera da relação dos pilotos com seus companheiros e com seus chefes. Os contratos exercem pressão sobre a conduta do piloto dentro e fora das pistas, tendo que seguir aos interesses da equipe e subjugando seus próprios desejos. 4
6 Uma outra característica desse esporte é a diversidade de nacionalidade de pilotos. por estar centrada na Europa, são os europeus os privilegiados. É um esporte mundial, mas de raízes locais. Não há pilotos africanos, há um australiano e há cinco americanos entre os vinte inscritos. Há somente uma equipe asiática (japonesa) que tem a sua equipe montada em solo alemão 1. Portanto, a F1 mantém-se excludente e europeizada, nisso está embutido não só a questão financeira, mas também racial. As divergências étnicas permanecem. Nas equipes, embora seja variada, a nacionalidade está majoritariamente localizada nos países desenvolvidos. O que pode ser considerado como mundial é a equipe como um todo, que pode ter a sede em um país, pilotos de outro, motor de outro e os patrocinadores de toda a parte do mundo, assim como seus torcedores e/ou consumidores. Estes são, sem dúvida, aspectos do global dentro do esporte. As fronteiras na Fórmula 1, embora sejam difíceis de serem demarcadas, elas existem para diferenciar culturas, já que a economia de modo geral não pode ser pensada apenas localmente. As relações se dão globalmente, há uma interdependência financeira, tecnológica e industrial, na qual estão envolvidos as equipes e seus patrocinadores agravando a relação de dependência entre as equipes. Por exemplo, a equipe McLaren, por intermédio da TAG constrói equipamentos para outras equipes: Hoje, a TAG MacLaren é considerada uma empresa líder em marketing, eletrônica, comunicação, pesquisa de patrocínio, logística e em mais algumas áreas. Somos fornecedores até mesmo de outras equipes de F1. (Ron Dennis em entrevista para François Granet. Guia de F1. n.1. Ed especial. p ) A questão local na Fórmula 1 parece estar mais envolvida nas corridas, o país ao sediar uma etapa do campeonato deve se adequar sob vários aspectos às necessidades impostas pela Federação Internacional de Automobilismo: com relação a estrutura dos autódromos, das arquibancadas, do transporte e do alojamento de pilotos, de tal modo que os autódromos passam a ter estruturas semelhantes. No caso do Brasil, em 2002, a Prefeitura de São Paulo investiu R$ 21 milhões em obras, e os organizadores investiram mais US$ 18 milhões com a organização do evento (Estado de São Paulo,3 abr. 2002). Este é um evento turístico que influencia na transação e na movimentação econômica. Mas, para estar incluído no circuito, é preciso ter um alto poder aquisitivo, pois este esporte também é elitista. 1 A sede da equipe localiza-se em Colônia (Revista Racing, n.103, p.49 e 74) e tem a pista de Paul Ricard, na França como base de teste, ou seja, a sede da equipe é num país mas a base de teste situa-se em outro. 5
7 Podemos afirmar que a Fórmula 1 tem como eixo a informação, comunicação e a tecnologia que perpassam por todos os âmbitos de interesse. Nesse caso, se constituem enquanto uma estrutura global da Fórmula 1 em que prevalecem os interesses econômicos. Esses eixos tornam-se mercadorias de altíssima qualidade se pensarmos nas condições extremas a que são submetidas pelo ambiente da F-1, desde condições climáticas desfavoráveis conciliadas com a alta velocidade. O campeonato de Fórmula 1 é um negócio rentável de várias maneiras, nas comunicações pela propaganda explícita ou na venda de direito de transmissão. Por isso, prevalece a necessidade da informação e da publicidade (propaganda insistente e enganosa). A difusão da informação só foi possível no mundo globalizado, após a formação de conglomerados internacionais de multimídia, que contaram ainda com o desenvolvimento tecnológico: os satélites, a microeletrônica e a digitalização. Todos esses equipamentos e o movimento da informação parecem que não podem ainda ser diagnosticados, mas sabemos que os impactos serão diversos e distintos conforme o local. As imagens impressas e faladas são uma necessidade nova para a sociedade, anteriormente somente alguns setores produtivos eram dependentes delas. Entretanto, as tecnologias são utilizadas intensamente pela religião, educação, esportes e ciência, as redes de comunicação, a informação computadorizada são os instrumentos de uso diário em quase todos os setores. A informação torna-se uma mercadoria no momento em que para dispô-la temos que pagar por ela e sendo ela a mercadoria mais vantajosa e cara na atualidade, percebemos que na F-1 pode ser aproveitada em benefício de algumas equipes. Os meios de comunicação dão a FOA (Administração da Fórmula 1) e a FIA (Federação Internacional do Automobilismo) lucros, pois as rádios pagam 120 mil dólares no mínimo para transmitir a corrida e uma câmera nos boxes pode custar 10 mil dólares (Martins, 1999). A FOA gerencia desde a ultra-rendosa venda de direitos de TV até uma agência de viagens, responsável pelo deslocamento do exército de homens e equipamentos durante as provas e testes. Ela foi criada em 1972 como uma empresa que serviria de base para a montagem do atual império de Bernie Ecclestone: a FOCA (Associação dos Construtores de Fórmula 1), com o objetivo de reunir a maioria das escuderias e defender seus interesses. 6
8 A FOCA, hoje é uma divisão da FOA que cuida de todo os negócios da Fórmula 1. Assim, a fase romântica da F-1 é exterminada, transformando-a num negócio extremamente lucrativo e competitivo. Arrastando as equipes para esta competição, fazendo do esporte um negócio. Portanto, desde que Bernie Ecclestone incentivou os investimentos na Fórmula 1, esse capital cada vez mais é requerido pelas equipes tanto que as disputas por patrocinadores começam cada vez mais cedo. A publicidade prepara o consumidor através de discursos ideológicos que acabam por ser motores de ações públicas e privadas. Por exemplo, uma única revista exclusiva sobre Fórmula 1 vende cerca de exemplares por mês em 14 línguas, através de 90 países e sabemos que o campeonato é constituído de apenas 17 provas, ou seja, visita apenas esses países mas tem comércio em mais de 100 países (Martins, 1999). Este consumidor foi produzido ao longo dessa meia década de existência da Fórmula 1. Podemos exemplificar as mudanças ocorridas: Bernie Ecclestone transformou, enfim, a F1 numa bolsa de valores, com pregões em cima de pilotos, carros, autódromos, pistas, TV e rádio. Tudo hoje paga direito à FOA. O maior exemplo é que o calendário da F1 se tornou um grandioso espetáculo mundial, isto ao vivo pela TV por 4,2 bilhões de telespectadores em 62 países. Esses números crescem para 17,6 bilhões em 96 países se forem computados os noticiários compactos dos vários noticiosos, reprises e videotapes. (Lemyr Martins, 1999, p. 312) No capitalismo, ciência e tecnologia são utilizadas como mercadorias, o que está presente na Fórmula 1 é o consumo que se faz desde o projeto do carro. Tanto ciência quanto tecnologia assumem papeis decisivos, pois possibilitam o desenvolvimento do carro e o envolvimento de ambas com a técnica e a arte do engenheiro mecânico. Fazem desse esporte algo complexo que, integrando arte de pilotagem e design, transforma engenheiros e projetistas em artistas capacitados no desenvolvimento tanto da beleza quanto das inovações tecnológicas. Proporciona, assim, um espetáculo de velocidade, envolvendo o homem e a máquina unidos pela técnica de pilotagem e conhecimento. A arte do engenheiro está concentrada na velocidade entre a necessária precisão dos detalhes, nos protocolos da experiência, na margem do erro tolerável e no controle do produto acabado. O engenheiro cria e recria uma obra de quatro rodas que estará na melhor vitrine do mundo: a Fórmula 1. 7
9 A Fórmula 1 possibilita transpassar limites impostos pela própria condição humana e física. Chega-se a uma velocidade superior a 300km/h, o que teoricamente em uma colisão causaria a morte instantânea do piloto. Justamente, são estes desafios que os pilotos se dispõe a vivenciar (lembrando que eles são bem pagos para fazer tal trabalho). Tenta-se superar recordes de velocidade, através da união do homem e da máquina podemos pensar na fronteira entre humano e não-humano, em sua existência e demarcação. A Fórmula 1 enquanto um veículo de propaganda mundial com telespectadores/consumidores em todo o mundo, é um negócio altamente lucrativo. É o produto sendo mostrado em uso, sendo um ponto de contato direto entre produtor e consumidor. As equipes estão interessadas em patrocinadores lucrativos por isso as grandes montadoras tendem a dominar as equipes pequenas, pois estas precisam de capital e concentração de investimento para serem competitivas. A qualidade técnica está aumentando com a entrada de montadoras, deixando de ser um esporte de apaixonados para ser de empresas privadas logo, concretiza-se a idéia de laboratório experimental de carros e equipamentos automotivo. A competição de motores das ruas invade o esporte, transformando-o numa primeira disputa para essas fábricas. Para a temporada de 2003 temos as seguintes montadoras: Renault, Toyota, Jaguar e a Ferrari, mas existem outras fábricas que não possuem tradição na F1 que querem participar dos benefícios do campeonato, como a Volkswagen, General Motors e Daimler-Chrysler. O patrocínio significa no mínimo milhões de dólares a mais para desenvolver o carro, isto é, significa investimento em Pesquisa e Desenvolvimento do carro, a aerodinâmica, a construção e os testes serão pagos por algum patrocinador. Já que a compra ou o desenvolvimento de uma nova máquina tem custos elevados, o melhor é dividir esses gastos se alguém pagar. Além disso, gastos com Pesquisa e Desenvolvimento dão prestígios a qualquer equipe, visto que denota a confiabilidade e responsabilidade em proporcionar lucros e desenvolvimento para as empresas. Em 1982, temos um exemplo peculiar na Fórmula 1, a equipe Tolemam que era a mais particular/privada entre todas, fora patrocinada e posteriormente comprada pela Benetton para ser um veículo de marketing, que ficaria em evidência a cada 15 dias em alguma parte do mundo, poderia mostrar as suas coleções de roupas usando mecânicos e pilotos como modelos e garotos-propagandas (Martins, 1999). Eles transportaram para as 8
10 pistas a filosofia da indústria. Envolvendo engenheiros e técnicos em marketing, inicia-se o uso do carro como outdoor mundial para a propaganda a todos os tipos de mercadorias. Os carros parecem anúncio de classificados, pois atraem diversos patrocinadores que disputam os lugares de destaque de um Fórmula 1. Sem preconceito, os pilotos divulgam em seus macacões e capacetes de perfume à lingüiça, de automóvel a macarrão. Nesses tempos modernos, um campeão do mundo ganha muito dinheiro e gera fortunas em publicidade. Um logotipo horizontal, de 20 cm², acima da viseira de Michael Schumacher, não sai por menos de três milhões de dólares por ano. (Lemyr Martins, 1999, p. 322) A propaganda e o patrocínio são formas de relações de mercado absolvidas e ajustadas a Fórmula 1. No caso dos cigarros que adentraram nesse esporte no final da década de 60, seus fabricantes tinham como objetivo burlar as leis européias que começavam a restringir as campanhas publicitárias de cigarros. E o automobilismo era o meio no qual essas leis eram menos rigorosas. Assim, nomes de equipes foram incorporados à fabricantes de cigarros, tendo uma propaganda ainda mais intensa visto que a imagem do cigarro estava associada a um esporte de divulgação mundial. Desde 1992 está sendo discutida a influência da publicidade tabagista no automobilismo, Max Mosley (presidente da FIA), tentou amenizar todas as iniciativas governamentais de excluir a indústria tabagista do campeonato de Fórmula 1 de imediato. Desse modo, atualmente não são elas as principais patrocinadoras, estão passando por um processo de mudança. Nos circuitos europeus, desde 2000 estão proibidas as publicidades de cigarro, assim como na Austrália e nos Estados Unidos. Há uma forte corrente de opinião para extinguir a publicidade também no Brasil. A propaganda tabagista foi banida, depois que pesquisas comprovaram a sua influência na iniciativa de fumar, principalmente entre os jovens. Em 2006 será o banimento total das indústrias de tabaco. O crescimento do patrocínio e da comercialização placas de publicidade, patrocínio nos macacões, comerciais de TV e a comercialização de souveniers da equipe impulsionam a indústria cultural e também a transformação dos esportes em ambientes que refletem a lógica capitalista de consumismo, em que as empresas se voltam para esse mercado altamente lucrativo. [...] O consumo, tornado um denominador comum para todos os indivíduos, atribui um papel central ao dinheiro nas suas diferentes manifestações; juntos, o dinheiro e o consumo aparecem como reguladores da vida individual. O novo dinheiro torna- 9
11 se onipresente. Fundado numa ideologia, esse dinheiro sem medida se torna a medida geral, reforçando a vocação para considerar a acumulação como uma meta em si mesma. (Milton Santos, 2000, p. 56) A Fórmula 1 vive num intenso ritmo de mudanças tecnológicas, seja através da adequação dos carros às normas e regras do automobilismo, seja pelo desenvolvimento dos meios comunicacionais ou da eletrônica. Este espaço metamorfoseia um laboratório tecnológico de altíssima qualidade e de controle de qualidade no qual o erro não é perdoado e a perfeição é o objetivo principal para conseguir provar os desafios da pista, da tecnologia e do limite da capacidade humana. Busca-se ser o melhor para que se possa ter uma mercadoria de qualidade a ser vendida, ou seja, o mercado da Fórmula 1 não se restringe a apenas a comercialização nos autódromos ou a merchandising, ela engloba mercadorias como ciência, tecnologia e informação, todas dotadas de valores que serão apropriadas por empresas e distribuídas aos países, em vista de uma produção rentável. A Fórmula 1 sendo um laboratório tecnológico mundial no qual diversas experiências são feitas ao longo do ano e dos diversos países visitados. Isso quer dizer que utilizam as condições extremas das corridas e as condições climáticas para testar equipamentos eletrônicos, motores e pneus. Ela pode ser reconhecida como um laboratório promissor pelo aumento de interesse dos fabricantes de veículos em participar do campeonato, como a Ferrari, Jaguar, Renault e Toyota. Estas já possuem suas próprias equipes e desenvolvem seus carros não só para o campeonato, mas também para o uso convencional: O que não se pode negar é que a Fórmula 1 sempre cumpriu estupendamente a sua função de laboratório do automóvel, pois o câmbio automático, a suspensão ativa e o controle de tração, banidos da Fórmula 1 recentemente, já são equipamentos de série em vários automóveis convencionais. Se não fosse assim tiraríamos da F1 o que ela tem de mais útil, transformando-a numa desinteressante sereia. (Lemyr Martins, 1999, p. 286) Nas equipes, os fabricantes significam, no mínimo, investidores e eles se vêem como tal, pois arcam com as despesas de pesquisa e desenvolvimento, design, construção e teste. Constroem e desenvolvem novos mecanismos muito caros. O dinheiro é utilizado pelo próprio fabricante para desenvolver chassis e outras pesquisas e desenvolvimento (research and development). Tanto a equipe quanto o fabricante de veículos lucram, pois o 10
12 gasto em pesquisa acontece em qualquer laboratório e eles escolheram a F1, como um laboratório experimental. Sendo um laboratório tecnológico, a F1 é um veículo de propaganda mundial com telespectadores em todo o mundo. É o produto sendo mostrado em uso, sendo um ponto de contato direto entre produtor e consumidor. Até mesmo, fabricantes de veículos que não tem tradição nesse esporte estão se interessando, é o caso da Volkswagen, General Motors e Daimler-Crysler, visto que a participação nesse tipo de competição pode efetivar negócios lucrativos e ainda uma publicidade a mais sem um custo adicional. Entretanto, participar desse seleto grupo significa estar em um negócio arriscado que precisa de investimento alto para que dê resultados positivos. Os gastos em desenvolvimento mecânico são legitimados pela tecnologia que associa elementos de prestigio na construção de carros em geral. Há um ditado que diz vença no domingo, venda na segunda ( que pode ser interpretado como a nova idéia que os fabricantes de veículos tem para conseguir expandir seu mercado de consumo e ainda pesquisar novos elementos que possam revolucionar os carros convencionais. Os desenvolvimentos proporcionados pela F1 não se restringem a seu ambiente, eles transcendem barreiras, facilitando o aprimoramento mecânico em geral. A Fórmula 1, enquanto laboratório, não só testa como possibilita o desenvolvimento de cada novo equipamento. Portanto, por trás dos pilotos há uma multidão de engenheiros e técnicos que transformam esse campeonato num verdadeiro espetáculo artístico, tecnológico e publicitário. Dentro desses parâmetros, a F1 se enquadra como um laboratório que transcende fronteiras, antes supostamente bem demarcadas como as fronteiras territoriais, humanas e tecnológicas. As equipes precisam conciliar as ferramentas que possuem com as novas fornecidas pela sociedade, seja as ferramentas de navegação, de orientação ou comunicação que podem ocasionar na pertinência dos conhecimentos, a adequação às singularidades e um funcionamento real nas pistas, para que possa, por conseguinte escapar da catástrofe. Na Fórmula 1, a rotatividade é intensa e as máquinas são sempre superadas por outras mais confiáveis e velozes. Podemos ainda falar em fronteira entre humano e tecnologia, pois mesmo que haja uma distinção, elas também podem ser analisadas de forma análoga. Esta é uma distinção 11
13 antiga, todavia não dá para conceber o humano separado de suas tecnologias, e dos aparatos técnicos. Ora, parece que o corpo humano está revestido de cada inovação tecnológica. Na Fórmula 1, o homem é intimamente ligado à máquina, sendo até mesmo submetido às necessidades dela. Isso não impede que eles sejam visto enquanto sujeito e objeto, e também como parceiros modificáveis: a máquina se humaniza, e o homem incorpora a técnica. A utilização de softwares pelas empresas capacita o computador a ter funções cognitivas de seres humanos como armazenar e pensar. Esses procedimentos são extremamente utilizados na Fórmula 1 para diminuir gastos com testes, pois podem fazê-lo com o uso do computador. Pouca gente sabe e só os privilegiados vêem a guerra cibernética que se oculta na Fórmula 1. Travada dentro dos boxes, ela usa uma tecnologia que é tão aliada dos pilotos quanto indiscreta com eles. Um dedo duro, definia Ayrton Senna. Uma técnica que monitora o piloto todo o tempo em que ele está na pista. Espiona tudo o que acontece com o carro e com o motor e registra nos computadores dos boxes, via telemetria, dados exatos coletados a distância. Quando Ayrton Senna corria pela McLaren-Honda, eram doze computadores instalados no boxe com a função específica de analisar o desempenho de Senna. [...]. Enfim, o piloto incorpora um robô à sua inteligência e, sincronizados, ambos tornam-se parte de um carro com destino a um objetivo até hoje inatingido: a perfeição. (Lemyr Martins, 1996, p 95-6) A revolução digital encontra na F-1 um espaço de desenvolvimento e aprimoramento de seus objetos para chegar ao mercado com maior confiabilidade. O computador é o transmissor de mensagens que pode tanto auxiliar quanto dificultar o trabalho, visto que somente a posse de informação não é o suficiente para desenvolver o carro. A informação técnica é necessária, juntamente com os melhores cientistas e a tecnologia dos patrocinadores, pois esse conjunto pode revolucionar o carro, ou seja, a união entre cientistas e técnicos. Aqui percebemos outra peculiaridade desse esporte global e globalizado em que a tecnologia de ponta encontra um espaço favorável ao desenvolvimento, ou seja, reúne cientistas e técnicos para o melhor aproveitamento das informações disponíveis. A globalização do mundo foi acelerada por meio das inovações da comunicação de massa, como o rádio, o cinema e a televisão. Tais objetos eletrônicos invadem a vida privada transformando-nos em seres individualistas e ausentes de solidariedade. Existe um 12
14 processo de restrição das faculdades humanistas, com diz Weber, o mundo, ou neste caso o esporte está sendo desencantado 2, pela lógica capitalista desenfreada e dominadora. O capitalismo alcançou um grau que extrapola as indústrias, por meio das tecnologias de comunicação, os elementos capitalistas influenciam o modo de pensar e de ser que se concretiza sobre as bases antagônicas das relações sociais desiguais. Há a mercantilização das relações nacionais e mundiais nas quais também são desenvolvidas as contradições de classe 3, entre dominantes e dominados 4 e entre a esfera local e global. 2 Por desencantamento do mundo, Max Weber (Ética protestante e espírito do capitalismo, 2001) descreve como a passagem de um mundo em que a explicação dos fenômenos da vida e da natureza tinha base religiosa, um mundo em que todas as coisas tendem a ser abordado pelo cálculo racional. Neste sentido, a característica básica do mundo ocidental é que os princípios racionais organizam e dotam de gerência as diferentes esferas da organização social. 3 Karl Marx (O 18 Brumário de Luis Bonaparte) tem uma preocupação preponderante com o caráter de classes sócias, isto é, com as condições e conseqüências dos seus antagonismos e lutas na sociedade capitalista. Em última instancia, preocupa-se com a historicidade, ou seja, com a transitoriedade do capitalismo que depende desse antagonismo e das lutas. 4 Esta relação de dominação pode ser entendida como simbólica, como foi analisada por Pierre Bourdieu em Razões Práticas: sobre a teoria da ação. Ele chama de alquimia simbólica s transfiguração das relações de dominação e de exploração. Já que nem sempre as relações se dão entre iguais, e numa relação entre diferentes sempre haverá um em relação de desvantagem. A dominação simbólica apóia-se no desconhecimento, portanto, no reconhecimento, dos princípios as quais se exerce. Essa dominação se dá principalmente em relação ao meio cultural, que nem sempre se reconhece enquanto dominação. 13
15 Conclusão É possível, por meio do estudo do caso da Fórmula 1, visualizar de que maneira ocorre a organização espacial dentro do contexto da globalização. Percebe-se que este esporte vive um momento em que os meios de comunicação reordenam a estrutura a F1, ao mesmo tempo controla o seu incremento. De modo geral, podemos dizer que a informação e a comunicação impõem certos tipos de conduta e pensamento à população em geral, visto que são utilizados pelas classes dominantes para impor seus padrões e costumes. Constatamos que a F1 é um laboratório particular, que não se restringe às inovações mecânicas, mas amplia para a pesquisa, desenvolvimento e teste de inovações em tecnologia informacional, microeletrônica e de equipamentos de segurança. Embora haja uma dissociação entre tecnologia e o homem, não é possível conceber a história dos homens separando a nossa história, da história do desenvolvimento técnico. Sobre o corpo humano podemos perceber cada inovação tecnológica. O homem em si está em compasso com essas mudanças, principalmente neste momento em que as inovações são palpáveis e desejáveis ao interesse de alguns. Podemos dizer que o homem está sem bases humanas para viver, assim como as ciências se apóiam não mais na filosofia e sim na economia, ou seja, tudo se resume a relações comerciais, financeiras e não humanitárias. Deve-se destacar, ainda, que a Fórmula 1 está influenciada pelo imperialismo das empresas européias, que a dominam e que tentam controlá-la e dirigi-la para que proporcione ainda maior lucro para sua empresa. Tal movimento é apresentado, de modo embrionário, pela iniciativa das montadoras quererem criar um campeonato exclusivo, ou seja, desejam obter mais lucros, mas também poder desenvolver motores e equipamentos para carros de passeio, fazendo desse campeonato um laboratório de pesquisa automobilística. A Fórmula 1, assim como a sociedade, vive um intenso movimento de industrialização das relações, sejam elas quais forem. A globalização, acompanhando esse processo, favorece a homogeneização de gostos e capital cultural, as diferenças entre os países tendem a diminuir se esse processo continuar a progredir tão velozmente como está. Cabe, portanto, a cada sociedade preservar os valores nacionais para poder manter ainda, mesmo que infimamente, seu poder nacional, na política, economia e na sociedade. 14
16 Bibliografia utilizada Levantamento em livros BOURDIEU, Pierre. A economia dos bens simbólicos. In: Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, COHN, Gabriel. Weber. São Paulo: Ática, DOMINGUES, Diana (Org.). A Arte do século XXI: a humanização das tecnologias. São Paulo: Ed. UNESP, GUILIANOTTI, Richard. Sociologia do futebol: Dimensões históricas e socioculturais do esporte das multidões. São Paulo: Nova Alexandria, HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: O breve século XX: São Paulo: Companhia das Letras, IANNI, Octávio (Org.). Marx: Sociologia. 6 ed. São Paulo: Ática, IANNI, Octávio. A era do globalismo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, MARCUSE, Herbert. A ideologia da sociedade industrial: o homem unidimensional. Rio de Janeiro: Zahar, MARTINS, Lemyr. Os arquivos da Fórmula 1. São Paulo: Panda, Uma estrela chamada Senna. São Paulo: Panda, MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. Ideologia alemã (Feuerbach). São Paulo: Grijalbo, MATTELART, Armand e Michèle. História das teorias da comunicação. São Paulo: Edições Loyola, 1999 (3ª ed.: 2000). MORAES, Dênis de (Org.). Globalização, mídia e cultura contemporânea. Campo Grande: Letra Livre, SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo. Razão e emoção. São Paulo: Hucitec, Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro: Record, SCHEPS, Ruth (org.). O Império das Técnicas. Campinas: Papirus, SEVCENKO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole: São Paulo sociedade e cultura nos frementes anos 20. São Paulo: Companhia das Letras,
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18 Levantamento em meio eletrônico LAW, Alexander. Get your motors running. Disponível em < >. Acesso em 10 jan O KEEFE, Thomas C. Formula Bernie: tobacco + TV + tracks = $ 2 Billion. Part I, part II, part III e part final. Disponível em < >. Acesso em 15 jan Formula One and Tobacco: The World's most dangerous sport? Disponível em < >. Acesso em 17 ago CARRINGTON, Nigel. The TAG McLaren Group has a consistent record of success within a very competitive environment. Disponível em < >. Acesso em 20 set Folha on line. F-1 se prepara para banir tabaco do circo até Disponível em: < >. Acesso em 25 nov
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