Paulo Pimentel: construção e fim do primeiro grande grupo de comunicação do Sul do Brasil 1

Transcrição

1 Paulo Pimentel: construção e fim do primeiro grande grupo de comunicação do Sul do Brasil 1 COSTA, Osmani Ferreira da (Doutor) 2 Universidade Estadual de Londrina/Paraná RESUMO: Esta comunicação de pesquisa descreve, analisa e interpreta, historicamente, a trajetória do Grupo Paulo Pimentel (GPP) de comunicação, sediado em Curitiba, desde o seu início, em 1962, passando pelo seu desenvolvimento e apogeu, em 1975, até o seu desmantelamento e fim, com a venda do que restara dele em Nascido com a compra de dois jornais diários para alavancar a candidatura de Pimentel a governador do Paraná, o conglomerado chegou a possuir simultaneamente três diários, três emissoras de televisão (TV) afiliadas à Rede Globo e uma de rádio, quando era considerado o maior da região Sul do país. Na base e no centro daquela ascensão empresarial bem como, posteriormente, na de sua queda estiveram, principalmente, as relações políticas de Paulo Pimentel com o governo militar ( ). Afinal, foi dos generais-presidentes que o empresário paranaense recebeu três concessões de canais de TV, além de muita verba publicitária e apoio na afiliação à líder nacional Rede Globo. Porém, seria da mesma arena política que Pimentel sofreria ameaças, perseguição e pressões que levariam seu grupo à ruína e quase destruição total. Remontar historicamente este episódio permite uma reflexão a respeito da política de concessões durante a ditadura, além de jogar luzes sobre expedientes que, como a censura oficial, o regime militar usava para controlar o universo televisivo, em particular, e o midiático em geral. PALAVRAS-CHAVE: História; Mídia; Grupo Paulo Pimentel; Sul do Brasil. Em 9 de março de 1975, foi impressa a edição número 1 do jornal Panorama, em Londrina, cidade do norte do Paraná a 400 km de Curitiba. O diário matutino passou a ser, então, o mais novo integrante do conglomerado de comunicação do Grupo Paulo Pimentel (GPP), que já contava com três emissoras de televisão (Iguaçu, Tibagi e Coroados), dois outros jornais (O Estado do Paraná e a Tribuna do Paraná), e uma rádio, a Iguaçu AM, de Curitiba. 1 Trabalho apresentado no GT de Historiografia da Mídia, integrante do 10º Encontro Nacional de História da Mídia, Professor de Jornalismo na Universidade Estadual de Londrina (UEL), mestre em Sociologia e doutor em História; é autor dos livros Rádio e Política (2005) e Televisão e Política (2015), ambos editados pela EDUEL, e diretor geral da Rádio Educativa UEL FM. osmanicosta@uel.br

2 2 Naquela época, em peças publicitárias o GPP se proclamava como o maior complexo de comunicação da região Sul do país. 3 Além disto, as pesquisas do Ibope comprovavam que os canais de TV de Pimentel afiliadas à já líder nacional Rede Globo sustentavam o 1º lugar em audiência nas cidades em que estavam sediadas e respectivas regiões: Curitiba, Apucarana (também no norte do PR, a 60 km de Londrina) e Londrina. Igualmente, a Rádio Iguaçu era líder entre os ouvintes da capital paranaense. O Estado do Paraná (OEPR) destacava em suas páginas e propagandas o fato de ser, em 1975, o único diário do Paraná filiado ao Instituto Verificador de Circulação IVC. 4 A montagem do complexo de comunicação havia sido iniciada em 1962, por assumida motivação político-eleitoral, quando o então secretário estadual de Agricultura, Paulo Pimentel, decidiu que seria candidato a governador do Paraná e adquiriu os jornais curitibanos OEPR e Tribuna do Paraná. O matutino O Estado do Paraná fora lançado em julho de 1951, por um grupo de empresários e jornalistas, a pedido do então governador Bento Munhoz da Rocha Neto (PR), que enfrentava sistemática oposição da imprensa curitibana, liderada pela Gazeta do Povo, muito ligada ao ex-governador Moysés Lupion (PSD). O vespertino Tribuna do Paraná, fundado em outubro de 1956, era um jornal com temas e linguagem mais populares pertencente ao mesmo grupo empresarial de O Estado do Paraná. Ambos tiveram grandes tiragens na década de 1950 e disputavam a liderança, entre os leitores de Curitiba e região, com a Gazeta do Povo e o Diário do Paraná, este pertencente ao conglomerado comunicacional de Assis Chateaubriand, na época o maior do Brasil. Em consequência de uma acirrada disputa por leitores e anunciantes e da chegada da concorrência de dois canais de televisão em Curitiba, no fim de 1960, a direção de OEPR e a Tribuna do Paraná começou 1961 com sérias dificuldades financeiras e delas não mais conseguiria sair. Por isto, os dois diários foram vendidos a Paulo Pimentel, em maio de Rapidamente, a equipe de jornalistas liderada João Feder implantou mudanças e inovações importantes para o objetivo maior de Paulo Pimentel, cujo nome não aparecia 3 O Estado do Paraná, Curitiba, 01. Mar.1975, p Em 1975, a Rede Paranaense de Comunicação (RPC), atual maior grupo de mídia do estado, possuía apenas o jornal Gazeta do Povo e a TV Paranaense, de Curitiba; enquanto que o grupo gaúcho RBS, sediado em Porto Alegre e atual maior conglomerado de comunicação do Sul do país, contava somente com a TV Gaúcha, o diário Zero Hora e duas rádios, a Gaúcha e a Atlântida FM.

3 3 nos expedientes dos diários. A principal delas foi centrar as manchetes, editoriais, reportagens e comentários em elogios ao governador Ney Braga (PDC) e ao secretário Pimentel; além de sempre criticarem com veemência o ex-governador Moysés Lupion, descrito aos leitores como o inimigo número 1 do Paraná. A estratégia de Pimentel em comprar os jornais para auxiliá-lo na campanha ao Palácio Iguaçu se mostrou eleitoralmente correta, como ele próprio comentou mais tarde, de maneira detalhada, em sua biografia autorizada (SANT ANA, 2008, p ). Com apoio de Ney Braga, Pimentel foi eleito em 1965 e cumpriu mandato de governador de 1966 a Naquela eleição, o principal adversário vencido por Pimentel (PTN) foi Bento Munhoz da Rocha Neto (PR), antigo patrono político de Ney Braga e, ironicamente, o idealizador da criação de O Estado do Paraná. A criatura se voltara contra o seu criador, pois ela já estava sob o mando de outro dono e de outros interesses políticos. Durante o exercício daquele mandato, Pimentel 5 filiou-se ao partido situacionista nacional ARENA e ganhou, dos presidentes militares, a concessão de duas emissoras de televisão. A TV Iguaçu, Canal 4 de Curitiba, foi inaugurada em dezembro de Ao contrário da TV Paranaense e da TV Paraná, ambas de 1960, ela foi a primeira de Curitiba a iniciar operação em um prédio especialmente projetado e construído para abrigar as atividades de uma estação televisora, contando com três grandes estúdios. Os equipamentos da TV Iguaçu eram também os melhores e mais modernos disponíveis no mercado internacional e foram importados da Inglaterra e dos Estados Unidos. A TV Iguaçu entrou no ar contando com um contrato de cooperação técnica e para compra de produtos televisivos com a TV Record de São Paulo, em substituição à TV Paranaense. A Record era responsável, naquela época, por cerca de 80% dos programas líderes nacionais de audiência. Na parte da produção local, a emissora do governador Pimentel investiu pesado no telejornalismo, apoiada pelos diários Tribuna do Paraná e OEPR. O sucesso foi imediato e absoluto. Em poucos meses, o Show de Jornal, baseado em linguagem coloquial, era o programa jornalístico de maior audiência na história da televisão brasileira, chegando a marcar o índice de 96%, inédito no país, conforme Jamur Júnior (2001, p.94). 5 Paulo Cruz Pimentel nasceu em Avaré (SP), em 7 de agosto de Formou-se em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), em Em seguida, casou-se com Ivone Aparecida Lunardelli e, em 1955, mudou-se para Porecatu, na região norte do Paraná, onde atuou como diretor financeiro de uma usina transformadora de cana em açúcar e álcool pertencente à família da esposa. Além de governador do Paraná, ele foi eleito deputado federal pela ARENA em 1978 e deputado constituinte pelo PFL, em 1986 (DICIONÁRIO HISTÓRICO-BIOGRÁFICO BRASILEIRO, Pós 1930, 2001, p ).

4 4 Contanto com as principais atrações da paulista TV Record, e pouco tempo a TV Iguaçu 6 assumiu a liderança da audiência geral em Curitiba. Números do Ibope, de fevereiro de 1968, mostravam a TV Iguaçu com 54,1% dos telespectadores, contra 26,9% da TV B e 19,0% da TV C. 7 Confrontando os dados com outras publicações daquela época, sabe-se que a TV B referia-se à TV Paraná (do grupo de Chateaubriand), e que a TV C era a TV Paranaense (do empresário curitibano Nagibe Chede). Segunda emissora do GPP, a TV Tibagi, Canal 11 de Apucarana, entrou no ar em caráter definitivo em julho de Como recursos próprios para investimento e crédito para financiamentos bancários não faltavam às empresas do governador Pimentel, um prédio planejado exclusivamente para a instalação da TV Tibagi foi construído; e equipamentos de última geração foram importados para os estúdios, reportagens externas e antena transmissora dos sinais. Experientes técnicos e engenheiros, responsáveis pelas montagens e operacionalizações, foram contratados em São Paulo. Previa-se que a altitude do local escolhido em Apucarana, a quase mil metros acima do nível do mar, facilitaria a propagação dos sinais. Este conjunto de fatores fez da TV Tibagi a emissora com maior área de cobertura no Paraná, posto que ela ainda mantinha no início do século XXI, quando a imagem e som do Canal 11 chegavam com boa qualidade em 237 das 299 cidades do estado (DALPÍCOLO, 2010, P ). Ao contrário do que ocorrera na solenidade de inauguração da TV Iguaçu, na da TV Tibagi o governador Paulo Pimentel não compareceu. Ele permaneceu em Curitiba para receber, em audiência no Palácio Iguaçu, o ministro do Interior Costa Cavalcanti. A grade de programação da TV Tibagi 8 começou bastante parecida, em sua estrutura e atrações principais, com a colocada no ar pela TV Iguaçu naquela época. De produção própria, o canal de Apucarana contava com 60 minutos diários de uma programação com perto de oito horas e meia de duração dividida em dois telejornais e um programa de informações esportivas. Com as duas primeiras emissoras em pleno funcionamento, o GPP conseguiu uma importante realização, no dia 31 de agosto de 1969: a primeira transmissão, ao vivo 6 A concessão da TV Iguaçu foi a primeira outorgada para empresário do Paraná após o golpe de 1964, pelo presidente marechal Humberto Castelo Branco, certamente com o apoio do então ministro da Agricultura Ney Braga (ARENA), padrinho político de Pimentel. 7 O Estado do Paraná, Curitiba, 03. mar. 1968, p A concessão do Canal 11 de Apucarana foi dada ao GPP pelo segundo presidente do regime militar, o marechal Artur da Costa e Silva.

5 5 e simultânea, em rede da história da televisão no Paraná. Foi a transmissão do jogo Brasil 1 x 0 Paraguai, realizado no Maracanã, no Rio de Janeiro, pelas Eliminatórias da Copa do Mundo de 1970 no México. Ressalte-se que o fato do GPP ocorreu, portanto, no dia anterior ao da noite da estreia do Jornal Nacional, pela Rede Globo. A transmissão pioneira dos canais do GPP só foi possível graças ao tronco sul de micro-ondas da Embratel, que foi oficialmente inaugurado no dia 1º de setembro de Foi através dele, ainda em fase final de testes, que a TV Record transmitiu as imagens e sons daquele jogo de futebol, do Rio de Janeiro para São Paulo, da capital paulista para Curitiba (TV Iguaçu) e, de lá até Apucarana (TV Tibagi). Além de inaugurar suas duas primeiras emissoras, Pimentel conquistou durante o período de seu governo ( ) expressivos investimentos do governo federal por intermédio do Ministério das Comunicações e suas empresas na estruturação de centros repetidores de televisão e na expansão da rede de troncos de micro-ondas. Esta infraestrutura iria possibilitar, a partir de 1970, a formação de redes regionais para transmissões simultâneas entre as emissoras instaladas em Curitiba e outras no interior (COSTA, 2012, p. 221). Embalado pelo discurso desenvolvimentista do milagre econômico e pelo vigente sistema de segurança nacional, o governo militar investiu pesado, naquele período, nos troncos de micro-ondas e nos centros regionais de televisão e telefonia. O titular do Palácio Iguaçu, aliado incondicional do comando de Brasília notadamente dos presidentes Costa e Silva e Emílio Médici construiu e inaugurou os três primeiros destes centros, em Curitiba (1969), Londrina e Maringá (1970). Foi por meio deles e dos serviços da Embratel em parceria com a Telepar, que os paranaenses de Curitiba e do interior puderam assistir, por exemplo, os jogos do Brasil campeão na Copa do México. Entre as inaugurações das TVs Iguaçu e Tibagi, o grupo de Pimentel comprara a Rádio Guairacá de Curitiba, em 1968, do empresário de comunicação Samuel Silveira. A emissora AM, cujo slogan era A voz nativa da terra dos pinheirais, operava desde dezembro de 1947 como a terceira mais antiga da capital paranaense. A concessão fora concedida a um grupo liderado pelo ex-governador Moysés Lupion. Líder em transmissões esportivas durante décadas, em 1972 a Guairacá passou a se chamar Rádio Iguaçu e teve a sua programação mudada para musical e de serviços de utilidade pública. Rapidamente ela assumiu a liderança de audiência entre os ouvintes de Curitiba e região metropolitana.

6 6 Com ótimas condições financeiras e apoio irrestrito em Brasília, foi fácil para o ex-governador Paulo Pimentel que terminara seu mandato em 15 de março de 1971 conseguir afiliação de seus dois canais de TV à Rede Globo de Roberto Marinho, em março de A Rede Globo, então já líder nacional de audiência, substituiu nas emissoras do GPP a decadente TV Record, com sua Rede de Emissoras Independentes (REI). Para a rede de Marinho, a mudança também foi vantajosa porque antes ela tinha parceria apenas com a TV Paranaense, de Curitiba, e não conseguia retransmitir sua programação no interior do estado. Por mera coincidência ou por força de agenda definida no Palácio do Planalto, a estreia dos canais de Pimentel com a programação da Rede Globo aconteceu em 31 de março de 1972, dia em que se comemorava o oitavo aniversário da Revolução de 1964 e no qual foi inaugurada oficialmente, pelo presidente Médici, a TV em cores no país. 9 A mudança de rede pelas emissoras do GPP repercutiu, inclusive, nacionalmente em reportagem publicada na revista semanal Veja, cujo título era Troca de canal. Ilustrava o material uma fotografia do ex-governador, acompanhada da seguinte legenda: Paulo Pimentel: o Ibope político. De acordo com o texto, a troca da programação da Record-REI que havia um ano não conseguia sair do terceiro lugar em audiência no Paraná pela programação da líder Rede Globo poderia significar um negócio empresarial, mas com intenções políticas: [...]. Para o ex-governador poderá ser, entre outras coisas, uma vitória política antecipada. Pelo acordo, firmado em dezembro do ano passado, mas só agora divulgado, a Globo cede a sua programação em troca de uma porcentagem (possivelmente 50%) dos anúncios nacionais veiculados no canal 4. [...]. É possível que, como empresário, Pimentel não tenha feito o melhor dos negócios. Como político, no entanto, ele não poderia desejar mais. Com duas emissoras líderes de audiência no Estado, será candidato respeitável para qualquer cargo eletivo. O Jornal Nacional, diz ele, vai projetar o Paraná no país inteiro e isso é bom para o Estado e para mim, que sou político. [...]. 10 Tudo transcorreu muito bem de 1971 a 1973 para Paulo Pimentel, que tendo deixado o governo do Paraná passou a dedicar-se integralmente à administração de suas 9 Folha de Londrina, Londrina, 31. mar. 1972, p Troca de canal. Veja, São Paulo, 29 mar. 1972, p. 67.

7 7 empresas de comunicação: dois jornais, uma emissora de rádio e dois canais de TV afiliados à Rede Globo. Pela primeira vez, desde 1962, o nome do ex-governador aparecia nos expedientes de seus diários como diretor-presidente. Em todos os seus veículos de comunicação, a linha editorial adotada por Pimentel que escrevia editoriais e artigos assinados nos jornais e fazia comentários políticos nas TVs era de apoio irrestrito ao governo do general Emílio Garrastazu Médici. A terceira emissora televisiva a compor o GPP foi a TV Coroados, Canal 3 de Londrina, comprada de Ronald Stresser, em 21 de outubro de A concessão da emissora, inaugurada em setembro de 1963, havia sido conseguida pelo grupo de Assis Chateaubriand 11 junto ao presidente Jânio Quadros. Com a morte de Chateaubriand (PTN), em abril de 1968, aprofundou-se a crise econômico-financeira dos Diários e Emissoras Associados, levando o principal administrador do espólio, Edmundo Monteiro, a colocar a venda alguns jornais e canais de TV. Seguindo aquele roteiro estabelecido em São Paulo, no final de 1968 o controle acionário da TV Coroados passou aos empresários curitibanos Adherbal Stresser e o filho dele, Ronald Stresser. De acordo com Ronald, a compra do Canal 3 de Londrina fora realizada com recursos próprios de sua família e com uma menor parte financiada junto ao Banco Nacional, que ele negociou pessoalmente com a diretoria em São Paulo. Cinco anos depois da aquisição, com problemas financeiros na empresa, e cinco dias depois da morte de Adherbal, em Curitiba em 16 de outubro de 1973, Ronald Stresser 12 concluiu a negociação de venda da TV Coroados para Pimentel. Do topo ao fundo do poço O ano de 1974 começou melhor do que nunca para o GPP de comunicação, dono de três canais de televisão equivalentes a 50% das emissoras de TV em funcionamento no Paraná afiliados à Rede Globo, que liderava com folga os números do Ibope em todo país. E assim transcorreram, de vento em popa, os negócios de Pimentel até aquele 9 de março de 1975, dia do lançamento do jornal Panorama, em Londrina. 11 O conglomerado de Chateaubriand chegou a possuir, em meados da década e 1960, 36 emissoras de rádio, 34 jornais, 18 revistas, duas agências de notícias e 18 canais de televisão (NEVES, 2008, p. 25). A TV Paraná fora concedida a esse grupo pelo presidente Juscelino Kubitschek (PSD). 12 Ronald Stresser concedeu entrevista gravada na residência dele em Curitiba, em 13 de agosto de 2010, ao autor deste texto.

8 8 O maior conglomerado de mídia do Sul do país contava, então, além das três emissoras de TV, com uma rádio líder de audiência em Curitiba, e três jornais diários com boas tiragens e muitos anunciantes. Porém, os sinais de mudança começaram a ser emitidos do Palácio Iguaçu e tempos difíceis não tardaram a chegar às empresas de Pimentel. Eles foram acionados a partir da posse do governador Jaime Canet Júnior (ARENA), ocorrida em Curitiba em 15 de março de Indicado para o cargo pelo presidente-general Ernesto Geisel ( ) e pelo ministro da Educação e Cultura, Ney Braga, o governador eleito indiretamente, Jaime Canet Júnior, sofreu oposição interna, na ARENA, de Paulo Pimentel. E isto Canet Júnior não perdoaria jamais no comportamento de seu antigo aliado político. Esta desavença, de Pimentel com a dupla Ney Braga e Canet Júnior, começara na disputa pela vaga de candidato ao Senado, na eleição de Pimentel pleiteou ser o candidato da ARENA, mas foi vetado internamente pela dupla, que indicou o nome de João Mansur. Segundo Ney Braga, em resposta ao veto o empresário de comunicação não colaborou politicamente com Canet Júnior e Mansur, em seus jornais e emissoras de rádio e televisão. Ao contrário, Pimentel teria promovido alguns candidatos do partido oposicionista, o MDB. Canet Júnior foi eleito sem dificuldades pelos deputados governistas da Assembleia Legislativa do Paraná, mas Mansur foi derrotado nas urnas pelos eleitores, que preferiram levar ao Senado o emedebista Leite Chaves. Aquela opção de Pimentel causou o rompimento político total com Ney Braga e Canet Júnior. E Braga repassou este seu descontentamento ao presidente Geisel. Todavia, as rusgas políticas entre Paulo Pimentel e Canet Júnior eram anteriores a Ambos tinham sido colegas no secretariado estadual do primeiro governo de Ney Braga ( ). Na disputa pela sucessão de Braga, Canet Júnior foi um dos principais coordenadores da campanha vitoriosa de Pimentel. Como parte do acordo firmado pelo trio, Jaime Canet Júnior assumiu a presidência do Banco do Estado do Paraná (Banestado), no início do governo de Pimentel ( ). Não obstante, Canet Júnior desentendeu-se com o governador e demitiu-se do cargo, ainda no primeiro ano do mandato de Pimentel Somente passados cerca de 40 anos, Pimentel revelou com detalhes o motivo da demissão de Canet Júnior: o presidente do Banestado denunciou ao governador que familiares deste tinham conseguido, na agência do banco em Rolândia, no norte do Paraná, um financiamento que considerava suspeito de

9 9 Desta maneira, parece que quando Canet Júnior assumiu o comando do Palácio Iguaçu, em março de 1975, ele considerou possuir motivos para impetrar uma vingança contra Pimentel. E para concretizar o seu plano, ele buscou em Brasília a colaboração de Ney Braga e do presidente Ernesto Geisel. 14 Foi iniciado um ataque cerrado e sem tréguas às condições financeiras das empresas do GPP. Este ataque era desferido, simultaneamente, em duas frentes principais. Na primeira, com o corte total das verbas publicitárias públicas advindas de órgãos, empresas e bancos estaduais e federais nos jornais, televisões e rádio do conglomerado de Paulo Pimentel. Na segunda, com uma forte pressão sobre Roberto Marinho para que desafiliasse da Rede Globo as emissoras de TV de Pimentel. Esta segunda parte da estratégia foi concretizada mais rapidamente, porque teve a participação especial do presidente Geisel, que não se conformava com a traição de Pimentel nas eleições de O ex-diretor administrativo da TV Globo do Rio, Luiz Eduardo Borgerth (2003, p. 141), comenta que o episódio envolvendo as emissoras de Pimentel e a desfiliação da Rede Globo, por ingerência do regime militar, foi o único no país de conhecimento dele: O fato é que Paulo Pimentel, por nenhuma injunção política, era nosso afiliado no Paraná. Já tinha sido governador, apoiado o golpe de 1964, fundador da Arena etc. [...]. Na eleição de 1974, vetado Pimentel como candidato do governo [ao Senado], Ney aponta outro que perde. Ney culpa o inimigo Pimentel que, preterido, teria ajudado a oposição, e exige que se retire as televisões de Pimentel que, como se sabe, não podiam nem eram usadas politicamente. Se não tirarem as emissoras, que lhe tirem a programação da Globo, não faz por menos. Começa a pressão sobre Roberto Marinho, por meio do ministro da Justiça (até então) amigo dele. As ameaças são mirabolantes, quem avisa amigo é. Geisel odeia Paulo Pimentel, não se deterá diante de nada. De acordo com Borgerth 15, Roberto Marinho solicitou, durante aquele período de crise, a orientação de Walter Clark, sobre a pressão que estava recebendo do ministro irregularidade. Depois, Canet Júnior declarou à imprensa que o Banco Central (BC) investigava aquela operação. Nenhum procedimento fora das normas vigentes foi encontrado pelos funcionários do BC. Canet Júnior e sua equipe, então, pediram demissão coletiva, que foi aceita por Pimentel (SANT ANA, 2008, p ). 14 Ambos se tornaram amigos íntimos quando o general Geisel chefiou a 5ª Divisão de Infantaria, em Curitiba, em , e Ney Braga estava em seu primeiro mandato como governador do Paraná. Depois do golpe de 1964, eles integraram a mesma ala do governo conhecida como a mais moderada ou castelista ; enquanto que Pimentel seguiu para o grupo mais à direita do presidente, sendo por isso identificado como a linha dura do Exército, liderada por Costa e Silva e Médici (DICIONÁRIO HISTÓRICO-BIOGRÁFICO BRASILEIRO, Pós 1930, 2001, p. 1218). 15 Homem de confiança de Roberto Marinho, Luiz Eduardo Borgerth foi o representante da Rede Globo na presidência e na vice-presidência da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e da Associação Internacional de Radiodifusão, algumas vezes entre 1967 e 2000.

10 10 Armando Falcão, a pedido do presidente Geisel, para a imediata desfiliação dos canais de Pimentel: Doutor Roberto consulta Walter, que aconselha a não ceder, não politizar as afiliadas, em pouco seríamos obrigados a afiliar e desafiliar ao sabor dos governos. Doutor Roberto afirma que não tínhamos idéia da pressão que estava sofrendo, que só estava podendo resistir graças ao amigo Falcão. [Walter e eu estávamos viajando aos Estados Unidos] Joe Wallach, o único do nosso lado acompanhando o drama no Rio, junto ao doutor Roberto, dá a entender, pelo telefone, que não há nada a fazer. [...]. Não, não é possível salvar o Paulo; o governo já encaminhou o João Saad para comprar, mas não chegaram a um acordo. Querem que o doutor Roberto tire a programação e se vire com ela, ou compre as estações. E assim foi feito. Doutor Roberto não queria comprar emissora nenhuma, almoçou com o Paulo e o Joe, apresentando uma proposta inaceitável para não dizerem que ele não quis comprar, e, estando o contrato vencido, tirou a programação do Paulo. [...]. 16 O contrato de afiliação, que naquela época era renovado anualmente, venceu em 31 de março de O principal diário de Paulo Pimentel se conformou em publicar, em sua primeira edição após o fim da parceria com a Rede Globo, esta única e lacônica nota aos leitores: COMUNICADO Comunicamos que a programação da Rede Globo deixa de ser transmitida pelas Televisões Iguaçu, Canal 4 de Curitiba, e Tibagi, Canal 11 de Apucarana. O equipamento e o pessoal técnico das emissoras, aliados à programação nacional, levaram à conquista da preferência do público telespectador nos últimos anos, conforme atestam as pesquisas de opinião pública. Motivos inquestionáveis, mas de fácil percepção, em vista dos acontecimentos recentes que envolveram política e empresarialmente figuras deste Estado, culminaram com a atitude acima anunciada. A direção das Empresas de Comunicação presididas pelo Dr. Paulo Pimentel confia em que a nova programação, embora montada em função de fatos inesperados, continuará a merecer a preferência do Povo do Paraná. 17 Como fica evidente, o próprio Pimentel ainda não estava disposto, naquela ocasião, a esclarecer aos leitores de seu jornal e aos telespectadores de suas TVs a verdadeira motivação para o fim de sua parceria de quatro anos com a Rede Globo. Possivelmente, o dono do GPP mantivesse ainda a esperança de reconciliação com Geisel e Ney Braga. Assim, para o povo naquele texto, estranhamente grafado com P maiúsculo do Paraná permaneceram não explicados os tais motivos inquestionáveis, mas de fácil percepção. Chegava ao fim de maneira abrupta e por motivos políticos, uma parceria que por obra da competência da equipe de Walter Clark e dos diretores do GPP alcançou o 16 BORGERTH, 2003, p O Estado do Paraná, Curitiba, 27 abr. 1976, p. 1.

11 11 mérito de estabelecer, no Brasil, os novos e definitivos parâmetros para o sistema de afiliação de emissoras locais e regionais às redes nacionais: O contrato da TV Iguaçu com a TV Globo foi um marco. A partir dele, surgiu a Rede Globo de Televisão, nos padrões que conhecemos hoje. As novas parcerias da Globo passaram a seguir um modelo de comercialização único, e a fazer parte da rede como emissoras afiliadas. As receitas vindas dos anúncios locais ficavam com a afiliada, que partilhava uma fatia do que era vendido nacionalmente. 18 Sem a programação da Rede Globo, sem as verbas publicitárias oficiais, e com a diminuição dos anúncios da iniciativa privada por causa do boicote comandado por Canet Júnior, a situação financeira das empresas do GPP se complicou rapidamente. O quadro também piorou porque as emissoras de Pimentel não encontraram, na sequência imediata, outra rede nacional disposta a afrontar o alto comando de Brasília e aceitar suas propostas de afiliações. 19 Isto levou à queda acentuada na qualidade da programação oferecida aos telespectadores e, ainda mais, no número de anunciantes. Conforme Paulo Pimentel, as TVs Iguaçu e Tibagi deixaram de faturar, só em 1976, depois da desfiliação da Rede Globo, aproximadamente Cr$ 16 milhões. A captação com anúncios havia diminuído, a partir do segundo semestre de 1975 e no ano seguinte, inclusive em outras emissoras de televisão e na imprensa paranaense em geral, ainda que em menor escala, também em consequência da forte geada de julho de 1975, que levou ao quase desaparecimento da cafeicultura no estado e prejudicou profundamente as atividades agrícolas, industriais e comerciais. Sem outra opção, e cada vez mais pressionado por Brasília, Pimentel foi forçado a vender a TV Coroados: A primeira pancada foi me cortarem a Rede Globo. Depois, não deixaram mais ninguém vender a programação para mim. Minhas televisões ficarem sem ter o que colocar no ar. Eram só filmes antigos, desenhos e slides, na maior parte do tempo. Eu comprava a transmissão de futebol da TV Bandeirantes, cortavam com dez minutos de jogo. Comprávamos novelas da Tupi ou da TV do Sílvio Santos, cortavam de novo, no segundo capítulo. Então, a perseguição era essa. Dali um tempo, o governo [federal] mandou que eu vendesse para o grupo do Martinez, porque ele já tinha comprado o Canal 6 em Curitiba, e precisava de uma estação em Londrina. O governo estabeleceu o preço, fechou as condições e me obrigou a vender. Eu vendi [a 18 DALPÍCOLO, 2010, p As TVs Iguaçu e Tibagi só voltaram a ser afiliadas de uma rede nacional em setembro de 1978, acertando parceria com a Rede Tupi, na época já em crise profunda que a levaria à decretação de falência em julho de Depois, a partir de 1981, as emissoras do GPP afiliaram-se ao recém-criado SBT, pertencente ao apresentador e empresário Sílvio Santos.

12 12 TV Coroados] à prestação, mas ele [Oscar Martinez] não me pagou nem o primeiro cheque. 20 A venda do Canal 3 de Londrina ao grupo de Oscar Martinez foi concluída, em São Paulo, no dia 7 de maio de A Folha publicou uma reportagem sob o título Agora está concretizada a venda da TV Coroados dando detalhes da negociação: Foi concretizada ontem [em São Paulo] a transferência do controle acionário da Televisão Coroados, de Londrina, do ex-governador Paulo Pimentel para a organização Martinez. [...]. Anunciou-se que o valor da transação foi de 40 milhões de cruzeiros, importância considerada alta demais, portanto absurda, se verdadeira. Antes de concluir a compra da televisão, o grupo Martinez obteve autorização, por escrito, do Ministério das Comunicações, concordando com a transferência do comando acionário. [...]. Cerca de quatro anos, o Sr. Paulo Pimentel adquiriu [da família Stresser] a maior parte das ações e assumiu o controle da estação, apesar de já possuir duas outras emissoras de televisão o máximo permitido [pelo CBT] num mesmo Estado. [...]. A transferência das ações da Coroados para Pimentel nunca chegou a ser autorizada oficialmente. [...]. 21 O texto da Folha se referia, indiretamente, ao artigo 12 do Código Brasileiro de Telecomunicações, que estabelecia para cada grupo o limite de concessões de emissoras televisivas em dez no país, sendo no máximo cinco em VHF e duas em um mesmo estado. No entanto, neste caso ocorria que, como a própria notícia informava, Paulo Pimentel não havia transferido, legalmente para o seu nome, a concessão da TV Coroados. O que ele tinha firmado com Ronald Stresser era um daqueles documentos de compra e venda conhecidos como contratos de gaveta, tão comuns em diferentes setores de atividades no Brasil. Rádio lacrada, jornal fechado Ainda assim, caso o governo federal tivesse interesse em se utilizar do CBT contra Pimentel, ele poderia tê-lo feito, porque era público que o empresário detinha o poder acionário e posse administrativa da TV Coroados. O que aconteceu, não obstante, foi que o presidente Geisel a exemplo do que ocorrera nos governos de Costa e Silva e Médici, contra o grupo da TV Excelsior optou por prejudicar econômica e financeiramente o GPP, de uma maneira tão intensa, até que Pimentel se submetesse a se desfazer do Canal 3 de Londrina. Consumado o plano arquitetado conjuntamente pelo Palácio Iguaçu e Palácio do Planalto, Paulo Pimentel fez publicar, em seu OEPR, 20 Paulo Pimentel concedeu entrevista gravada ao autor deste texto, na sede de OEPR em Curitiba, em 3 de Junho de Agora está concretizada a venda da TV Coroados. Folha de Londrina, Londrina, 08 maio 1976, p. 3.

13 13 apenas esta curta e pouco informativa Nota ao público, a respeito da venda de sua TV Coroados ao grupo de Martinez: Os Srs. Paulo Pimentel e Oscar Martinez firmaram contrato de compromisso de compra e venda das ações da Televisão Coroados, Canal 3, de Londrina, operação essa que se concretizou ontem, , em São Paulo, pelos dois empresários. 22 Na sequência da crise iniciada em março de 1975, com a posse de Canet Júnior, o GPP sofreria ainda outros dois duros golpes. Por causa do agravamento da situação econômico-financeiro de suas empresas, Pimentel foi obrigado a fechar o seu diário londrinense Panorama, cuja última edição, a de número 515, foi publicada em 12 de outubro de Depois, em 27 de maio de 1977, o grupo teve cassada e lacrada definitivamente a sua Rádio Iguaçu AM, uma das líderes de audiência em Curitiba. A ordem expressa para a operação do Dentel havia sido dada pelo presidente Geisel. Este novo ataque às empresas do ex-governador havia sido previsto pela reportagem Suplício chinês, publicada por Veja. O texto fez um detalhado resumo das dificuldades enfrentadas pelo grupo de Pimentel, desde a desfiliação de suas emissoras pela Rede Globo, passando pela falta de verbas publicitárias oficiais, pela venda da TV Coroados, até a impossibilidade de encontrar outra rede nacional para estabelecer nova parceria. A reportagem do periódico era assim concluída: De fato, as ordens superiores têm há dez meses conseguido atingir as emissoras do grupo do ex-governador com precisas agulhadas que tentam minar sua aparente solidez. [...] a Globo, que então se utilizava das TVs Tibagi e Iguaçu, transferiu toda sua programação para os canais 12, de Curitiba, e 8, de Maringá, propriedades de um grupo que vive em paz com o governo estadual. [...]. Na ausência da novela, as cenas foram devidamente concentradas nos escritórios políticos, como os do Palácio Iguaçu, sede do Executivo paranaense, onde ávidos senhores de gravatas frouxas e paletós pendurados vasculham a vida política e empresarial do ex-governador Paulo Pimentel. [...]. Segundo o que se sussurra no Palácio Iguaçu, falta apenas o famoso sinal verde de Brasília, para que telespectadores e eleitores tomem conhecimento do ato final: punições revolucionárias contra Pimentel. 23 A cassação definitiva da concessão e a consequente retirada do ar da Rádio Iguaçu tiveram uma consequência muito maior do que os golpes anteriormente recebidos pelo proprietário do GPP. Houve protestos de políticos do MDB contra a conduta do governo Geisel na Assembleia Legislativa do Paraná, na Câmara dos Deputados, na Câmara Municipal de Curitiba e de outros municípios paranaenses, 22 Nota ao público. O Estado do Paraná, Curitiba, 08 maio 1976, p Suplício chinês. Veja, São Paulo, 09 fev. 1977, p. 64.

14 14 alguns com repercussão em jornais de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e da capital paranaense. Foi também a primeira vez que O Estado do Paraná informou aos leitores, de forma objetiva e clara, sobre o rompimento político de seu proprietário, Paulo Pimentel, com a dupla Ney Braga e Jaime Canet Júnior; e que este era o real motivo da perseguição e do boicote que as empresas do GPP estavam sofrendo nos últimos meses. Entre a demissão de Canet Júnior da presidência do Banestado, em 1966, e a crise da derrota da ARENA na eleição para o Senado em 1974, outros dois fatos importantes aconteceram e ajudam a entender porque Ernesto Geisel e Ney Braga cometeram tão violenta perseguição ao Grupo Paulo Pimentel. O primeiro ocorreu em 1966, quando as articulações políticas dos generais estavam em andamento para a definição do candidato da ARENA à sucessão de Castelo Branco na Presidência da República. Ney Braga planejava ser o candidato do grupo castelista, com o apoio do presidente, de Geisel e de Goubery do Couto e Silva. Pimentel ficou do lado do ministro da Guerra Artur da Costa e Silva, que tinha o respaldo dos militares da chamada linha dura e foi eleito. O segundo fato protagonizado por Paulo Pimentel, e que o indispôs com o alto comando de Brasília, aconteceu em São Paulo, em 8 de dezembro de 1968, a cinco dias da edição do Ato Institucional número 5 (AI-5). Ao receber na Câmara Municipal paulistana o título de Cidadão Honorário, o jovem governador paranaense se empolgou e fez um discurso inflamado, defendendo a redemocratização do país e a volta das eleições diretas em todos os níveis. Estes foram dois dos motivos que levaram o grupo liderado por Geisel e Ney Braga a considerar Pimentel um político insubordinado e insolente (JAMUR JÚNIOR, 2001, p ). Anos mais tarde, o proprietário do GPP 24 receberia do último presidente-general, João Baptista de Oliveira Figueiredo, a concessão da TV Naipi, inaugurada em Foz do Iguaçu em setembro de Com a Naipi funcionando, estava definitivamente consolidada a primeira rede de emissoras televisivas do Paraná. Depois, Pimentel colocou no ar sua quarta emissora, a TV Cidade, Canal 5 de Londrina, inaugurada em 17 de abril de 1989, e cuja concessão fora outorgada pelo presidente José Sarney (PMDB). 24 O deputado federal Paulo Pimentel reatou politicamente com o governador Ney Braga, durante o segundo mandato deste à frente do Palácio Iguaçu ( ), a pedido do presidente João Figueiredo. Apesar disso, os dois políticos paranaenses nunca mais voltaram a serem amigos, conforme afirmou Pimentel em entrevista ao autor.

15 15 As quatro emissoras do GPP, afiliadas do SBT, foram vendidas ao apresentador de televisão e empresário Carlos Massa, o Ratinho, em Pimentel explicou, com objetividade, mas também já com um pouco de saudade, os motivos empresariais e políticos que levaram à venda de suas emissoras, exatos 40 anos depois de ter colocado no ar a TV Iguaçu: Meus negócios não estavam bem. Meu faturamento havia caído bastante. Como eu não sou candidato a mais nada, o que eu vou fazer com televisão? Nada! Então, pensei em vender. Achei um bom comprador e vendi. Voltei ao ponto onde tudo começou: fiquei apenas com os dois jornais, O Estado e a Tribuna do Paraná. De televisão não sobrou nada, não tenho mais nada. Aliás, restou, como minha herança ao setor, o meu neto Daniel na presidência da Abert. Isto só foi possível porque tenho bons relacionamentos, porque fui muito amigo do doutor Roberto Marinho. Por sinal, como eu ainda sou do João Roberto [Marinho]. Tanto que foram eles que puseram o meu neto lá. Porque, você sabe, quem põe o presidente da Abert é a Rede Globo. E o Daniel está no segundo mandato, foi reeleito. Fico feliz por ele. 25 Considerações finais Declaração mais direta e clara do que esta acima é desnecessária. Desta maneira, chegava ao fim o GPP, proprietário da primeira rede regional de emissoras de televisão do Paraná. Pelo mesmo motivo que havia sido iniciada e desenvolvida, a rede foi desativada por Paulo Pimentel: a política. Concedidas pelo Palácio do Planalto para atender aos interesses da sua relação de poder com o Palácio Iguaçu, as emissoras simplesmente foram vendidas quando o empresário Pimentel, quase 40 anos mais velho, deixou de ter objetivos políticos-eleitorais. Do governo militar que investiu pesado em infra-estrutura de telecomunicações necessária aos ideais de integração, segurança nacional e desenvolvimentismo o GPP ganhou três concessões de TV, o equivalente a exato 1/3 das nove emissoras concedidas a empresários do estado nos 21 anos de ditadura. Em dezembro de 2011, o grupo da Rede Paranaense de Comunicação (RPC), então proprietário da Gazeta do Povo e de oito emissoras afiliadas à Rede Globo, anunciou a compra dos últimos empreendimentos de mídia que pertenciam a Pimentel: os portais de O Estado do Paraná diário que havia deixado de circular impresso em 7 de 25 PIMENTEL, em entrevista gravada concedida ao autor, em 03 jun Daniel Pimentel Slaviero, neto de Paulo Pimentel e diretor-geral do SBT em Brasília, foi presidente da Abert em dois mandatos, de 2006 a Atualmente, ele exerce o cargo pela terceira vez.

16 16 fevereiro de 2011, O Paraná-Online, e o jornal Tribuna do Paraná, ainda diariamente vendido em bancas e por assinaturas. Terminava assim, de modo tão melancólico quanto paradigmático, o Grupo Paulo Pimentel, o primeiro grande conglomerado de veículos de comunicação do Paraná e da região Sul do Brasil. Referências BORGERTH, Luiz Eduardo. Quem e como fizemos a TV Globo. São Paulo: A Girafa Editora, COSTA, Osmani Ferreira da. A Televisão e o Palácio: concessões e desenvolvimento das emissoras e redes televisivas no Paraná ( ). Tese de doutorado em História na Universidade Estadual Paulista (UNESP). Assis (SP): DALPÍCOLO, Sandro. Uma nova luz na sala: histórias da TV Paranaense. Curitiba: Arowak, DICIONÁRIO HISTÓRICO-BIOGRÁFICO BRASILEIRO, Pós Coordenação: ABREU, Alzira Alves de....[et AL.]. Ed. Ver. E atual. Rio de Janeiro: Editora FGV; CPDOC, JAMUR JÚNIOR, José. Pequena História de Grandes Talentos Os primeiros passos da Televisão no Paraná. Curitiba: Edição do autor, NEVES, Flora. Telejornalismo e poder nas eleições presidenciais. São Paulo: Summus, SANT ANA, Hugo. Paulo Pimentel, momentos decisivos. Curitiba: Travessa dos Editores, 2008.