Experiências de Formação de Nutricionistas para o Sistema Único de Saúde
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- Lídia Camilo Caires
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1 Experiências de Formação de Nutricionistas para o Sistema Único de Saúde NOTA PEDAGÓGICA - CASO 1: A EDUCAÇÃO INTERPROFISSIONAL PARA O DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS PARA O TRABALHO EM EQUIPE E PARA A INTEGRALIDADE NO CUIDADO Para refletir... Educação interprofissional... é uma oportunidade não só de mudar o nosso modo de pensar sobre a educação dos futuros profissionais da saúde, mas também uma oportunidade de dar um passo atrás e reconsiderar os métodos tradicionais de prestação de assistência à saúde. Acredito que não estamos falando somente de mudanças de práticas educativas, mas também de mudanças na cultura da medicina e assistência à saúde (Líder estudantil in: OMS, 2010). Aprender junto para trabalhar junto: a formação interprofissional como caminho para mudança nas práticas de cuidado no Sistema Único de Saúde A construção de um novo modelo assistencial se coloca como prioridade no contexto das mudanças e desafios provocados pelo processo de consolidação, de manutenção e de aprimoramento do Sistema Único de Saúde (SUS). A proposta de um novo modo de ofertar a atenção à saúde surge da crítica ao modelo biomédico, caracterizado pela predominância da natureza biológica da doença, pelas abordagens mecanicista e fragmentada do corpo e pela ênfase na medicina curativa, tecnicista e especializada. Observa-se que essas características ainda continuam hegemônicas na formação e na prática dos diferentes profissionais de saúde, inclusive do nutricionista, e constituem-se como barreiras para a implementação da atenção integral à saúde. Elaboração da primeira versão: Alice Cristina Medeiros Melo - OPSAN/UnB Revisão e elaboração da versão final: Kelly Poliany de Souza Alves PPGSC- IMS UERJ. Revisão: Elisabetta Recine OPSAN NUT-UnB; Estelamaris Monego - FANUT UFG; Andrea Sugai - FANUT UFG.
2 Apesar de já existirem muitas experiências desenvolvidas em contextos de redes locais do SUS com esforço na formulação e no desenvolvimento do trabalho em equipe, orientado pelas necessidades dos usuários e não mais na fragmentação das ações técnicas específicas de cada profissão, ainda prevalece, na maior parte dos cenários assistenciais, a reprodução de relações tradicionais entre os serviços, os profissionais e os usuários. O trabalho em equipe multiprofissional, a atuação interdisciplinar e o cuidado integral têm sido atitudes cada vez mais exigidas dos profissionais do SUS, sobretudo na Atenção Básica. Essas atitudes surgem a partir da definição da Estratégia Saúde da Família como a sua forma prioritária de organização, bem como nos demais âmbitos de atenção à saúde. Nesse contexto, a formação profissional se coloca como sendo central e imprescindível. As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) dos cursos de graduação em saúde, publicadas entre 2001 e 2002, afirmam, em sua maioria, que a formação do profissional de saúde deve contemplar o sistema de saúde vigente no país, o trabalho em equipe e a atenção integral à saúde. No caso da formação de nutricionistas, consta ainda que a formação do profissional deve atender às necessidades sociais da saúde, com ênfase no SUS (BRASIL, 2001). Ceccim e Feuerwerker (2004, p.1402) lembram que as DCN, no entanto, constituem-se apenas como uma indicação ou uma recomendação, já que, no Brasil, as universidades possuem autonomia. Esta autonomia está apontada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) como prerrogativa de criação, expansão, modificação e extinção de cursos e programas de educação superior; fixação dos currículos de seus cursos e programas; planificação e programação de pesquisa científica e de atividades de extensão, além da elaboração da programação dos cursos. Os autores ressaltam que novos passos, para além das DCN, serão necessários para que as mudanças na formação ocorram amplamente nas graduações em saúde. O projeto curricular dos cursos ofertados pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) Campus Baixada Santista, apresentado no Caso Didático, assume como princípios orientadores a formação do profissional da área da saúde melhor preparado para o trabalho em equipe, com ênfase na integralidade do cuidado, não se afastando de uma formação técnico-científica e humana de excelência em cada área específica de atuação profissional. Para tanto, assume como direcionador das ações os princípios da Educação Interprofissional, 2
3 partindo do pressuposto de que para fazer junto no cotidiano do cuidado em saúde é preciso aprender junto sobre o trabalho em saúde. Nessa proposta investe-se na potencialidade de questionar a cultura universitária que tem sua centralidade nas especializações científicas, disciplinares e profissionais (BATISTA et al, 2013, p.2). A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece, há bastante tempo, a importância da educação multiprofissional como componente fundamental do cuidado primário em saúde. Neste contexto, em 1988 apresentou o documento Learning Together to work together for health (Aprender junto para trabalhar junto em saúde), que desencadeou e impulsionou uma série de iniciativas e articulações voltadas para essa problemática (OMS, 1988). Mais recentemente, a OMS sugere que o termo multiprofissional seja substituído por interprofissional para enfatizar a importância de se pensar sobre as estruturas de aprendizado, com, para e sobre as diferentes profissões e refletir inclusive sobre a simples divisão do ambiente de aprendizagem (OMS, 2010). Em 2010, a OMS publicou o Marco para Ação em Educação Interprofissional e Prática Colaborativa, no qual reconhece que muitos sistemas de saúde no mundo estão fragmentados e com dificuldades para gerenciar as necessidades não atendidas de saúde fazendo com que a força de trabalho de saúde atual e futura seja desafiada a prestar serviços frente a problemas cada vez mais complexos. Nesse cenário, a OMS aponta a educação interprofissional e a prática colaborativa em saúde como sendo passos fundamentais na transição de sistemas de saúde fragmentados para alcançar uma posição mais fortalecida: Ao entender como trabalhar de forma interprofissional, os estudantes estão prontos para entrar no local de trabalho como membro da equipe de prática colaborativa. As equipes de assistência de saúde interprofissional compreendem como otimizar as habilidades de seus membros, compartilhar o gerenciamento de casos e prestar serviços de saúde de melhor qualidade a pacientes e à comunidade. Os sistemas de saúde fortalecidos levam à melhores resultados na saúde (OMS, 2010, p. 10). É importante ressaltar que os princípios da educação interprofissional se aplicam tanto na graduação das diferentes profissões de saúde como para a educação permanente dos profissionais de uma equipe de trabalho. Segundo a OMS (2010, p.10), evidências mostram que, conforme esses profissionais de 3
4 saúde percorrem o sistema, oportunidades para eles adquirirem experiência interprofissional os ajudam a aprender habilidades necessárias para se tornarem parte da força de trabalho de saúde colaborativa preparada para a prática. Principais Conceitos do Marco para Ação em Educação Interprofissional e Prática Colaborativa OMS, 2010 Educação Interprofissional: aprendizado que ocorre quando duas ou mais profissões aprendem sobre os outros, com os outros e entre si para a efetiva colaboração e melhora dos resultados em saúde. Prática Colaborativa: na atenção à saúde ocorre quando profissionais de saúde de diferentes áreas prestam serviços com base na integralidade da saúde, envolvendo os pacientes e as suas famílias, os cuidadores e a comunidade para a atenção à saúde da mais alta qualidade, em todos os níveis da rede de serviços. A prática inclui o trabalho clínico e o não clínico relacionados à saúde, tais como o diagnóstico, o tratamento, a vigilância e a comunicação em saúde, a administração e a engenharia sanitária. Rossit et al (2013) destacam como traço central da experiência apresentada no Caso Didático da UNIFESP, Campus Baixada Santista,, a composição de turmas mescladas com estudantes dos seis cursos desse Campus, onde se fundamentam a compreensão e a apropriação sobre o que um profissional de saúde deve saber, independentemente de sua especificidade profissional. Os autores esclarecem que nesta proposta, os estudantes têm, em todos os anos do curso, momentos de aprendizagem compartilhada (80% no primeiro ano, 40% no segundo, 20% no terceiro e reuniões semanais no quarto ano). Ao realizarem uma pesquisa envolvendo 107 dos 223 egressos do Campus Baixada Santista da UNIFESP, provenientes dos cursos de graduação em educação física, fisioterapia, nutrição e terapia ocupacional, concluintes em 2009 e 2010, com intervalo de dois anos entre o término da graduação e a coleta de dados, Rossit et al (2013) verificaram que 84% deles manifestaram estar satisfeitos com a formação recebida. Os mesmos ressaltam como satisfatórias as 4
5 contribuições da formação no desenvolvimento das competências colaborativas para o trabalho em equipe e a integralidade do cuidado. Resultados positivos da implementação de uma proposta da educação interprofissional também foram encontrados por Aguilar-da-Silva et al (2011) em pesquisa junto a egressos dos cursos de medicina, enfermagem, fisioterapia, farmácia e odontologia da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde de Juiz de Fora (FCMS/JF), Minas Gerais. A formação interprofissional em saúde faz parte do currículo da FCMS/JF, por meio da realização do Programa Integrador, junto a Atenção Primária à Saúde e objetiva contribuir para a formação integrada de profissionais de saúde e para a melhoria do Sistema de Saúde do município de Juiz de Fora. O Programa acontece nos seis semestres iniciais dos cursos e tem como núcleos: a) a integração entre o ensino, a pesquisa/práticas investigativas e a extensão; b) a estreita articulação entre a teoria e a prática; c) o desenvolvimento das atividades por equipes interprofissionais sob supervisão docente e com a orientação da equipe de Saúde da Família; c) a participação, em nível crescente de complexidade, do atendimento ambulatorial de nível primário e secundário, em atividades de promoção de saúde da criança, do adolescente, do adulto, da mulher e do idoso. Aguilar-da-Silva et al (2011, p.170) ressaltam que para a efetivação da proposta de educação interprofissional [...] é necessário mais do que reunir estudantes de cursos diferentes em atividades conjuntas. Devem ser desenvolvidos recursos cognitivos, afetivos e psicomotores dos estudantes, tendo em mente que a identificação e o atendimento das necessidades de saúde das pessoas em questão, nas situações apresentadas, respeita o grau de autonomia e domínio de cada profissão. Sendo assim, torna-se possível entender como as múltiplas dimensões de qualquer problema de saúde e a sua abordagem por distintas profissões se apresentam e se articulam na determinação do processo saúde-doença. Nesse sentido, há a necessidade de se preparar, cuidadosamente, todos os educadores para o desafio da educação interprofissional. Este tem sido um desafio no Campus Baixada Santista da UNIFESP, como apontado no Caso Didático, pois contrapõe o modelo tradicional de formação e produtividade reconhecido uma vez que exige grande dedicação de carga horária e valorização do trabalho docente. 5
6 A proposta de formação de nutricionistas desenvolvida na experiência relatada no Caso Didático referente ao Campus Baixada Santista da UNIFESP aponta para um caminho promissor de qualificação da prática desse profissional junto a outros profissionais de saúde e aos usuários do SUS. Esta experiência contribui para o cuidado integral à saúde, do qual a atenção nutricional faz parte, superando as práticas de caráter interventivo e restritivo, que caracterizam fortemente a atuação do nutricionista e que corroboram para manter a hegemonia do modelo biomédico. Referências Aguilar-da-Silva, RH et al. Avaliação da formação interprofissional no ensino superior em saúde: aspectos da colaboração e do trabalho em equipe. Avaliação: Revista da Avaliação da Educação Superior (Campinas); Sorocaba, SP, v. 16, n. 1, p , mar Disponível em: < Batista, SHSS et al. A interdisciplinaridade como princípio educativo em uma proposta de educação interprofissional em saúde: olhares docentes. Atas do IX Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências IX ENPEC, Águas de Lindóia, SP 10 a 14 de Novembro de Disponível em: < Acesso Brasil. Ministério da Educação e Cultura. Resolução CNE/CES nº 5, de 7 de novembro de Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Nutrição. Diário Oficial da União. 2001, Seção 1; 9 nov, p.39. Disponível em: < Acesso Ceccim, RB; Feuerwerker, LCM. Mudança na graduação das profissões de saúde sob o eixo da integralidade. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(5): , set-out, Organização Mundial da Saúde. Departamento de Recursos Humanos para a Saúde. Marco para Ação em Educação Interprofissional e Prática Colaborativa. Genebra: OMS, Disponível em: < marco-acao-educacao-interprofissional-pratica-colaborativa&itemid=381> Acesso Rossit, RAS et al. Formação interprofissional em saúde: percepção de egressos de cursos de graduação da UNIFESP-Baixada Santista. Atas do IX Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências IX ENPEC, Águas de Lindóia, SP 10 a 14 de Novembro de Disponível em: < 6
7 World Health Organization. Learning together to work together for health: Report of a WHO Study Group on Multiprofessional Education for Health Personnel. The Team Approach. Genebra: Série de Relatórios Técnicos da OMS, Nº. 769, Disponível em: < Acesso PARA SABER MAIS Sobre o tema Formação do Nutricionista : acesse a Biblioteca da RedeNutri no endereço eletrônico: Sobre o tema Educação interprofissional: The network towards unity for health: Aguilar-da-Silva, RH. Educação interprofissional na graduação em saúde: aspectos avaliativos da implantação. Educar em Revista, Curitiba, n. 39, p , jan./abr Disponível em: < Peduzzi, M. et al. Educação interprofissional: formação de profissionais de saúde para o trabalho em equipe com foco nos usuários. Rev. Esc. Enferm. USP 2013; 47(4): Disponível em:< 7
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