BOLETIM DE SOCIOLOGIA MILITAR

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2 Ficha Técnica BOLETIM DE SOCIOLOGIA MILITAR Diretor: Coronel de Infantaria Fernando Manuel Oliveira da Cruz Periodicidade: Anual Conselho Científico: Maria de Lurdes Fonseca, Helena Carreiras, António Teixeira Fernandes, António Firmino da Costa, Gen Silvestre Porto, Francisco Moita Flores, João Sedas Nunes, Maria da Saudade Baltazar. Chefe da Redação: Tenente-Coronel de Artilharia Amílcar José Teixeira da Cunha Redação: Alferes RC Hélder Rafael dos Santos Moreira, Alferes RC Vítor Miguel Silva Gonçalves, Rui Farelo Autores: Alexandre Moura, Helena Carreiras, Isabel Ribeiro, Pedro Pinheiro, Adelino Costa Cabral, Thiago Moraes, Rui Eusébio, Andreia Filipa Duarte Pires, Cândido Peixoto Fernandes. Edição: Centro de Psicologia Aplicada do Exército ISSN:

3 BOLETIM DE SOCIOLOGIA MILITAR N.º 3 CENTRO DE PSICOLOGIA APLICADA DO EXÉRCITO CPAE 2012

4 INSTRUÇÕES AOS AUTORES O Boletim de Sociologia Militar publica artigos e notas de investigação, revisão ou discussão teórica, nos domínios da Sociologia e de outras Ciências Sociais, Humanas e do Comportamento, que de alguma forma contribuam para o estudo ou desenvolvimento da Instituição Militar. Os artigos recebidos estão sujeitos à apreciação do Conselho Científico e da Redação, sendo o seu conteúdo da inteira responsabilidade dos autores. Na apresentação dos artigos os autores devem seguir as seguintes instruções: 1. Os artigos não deverão ultrapassar as 25 páginas incluindo notas, bibliografia e quadros. 2. Os originais deverão ser enviados num ficheiro Word, Arial, tamanho 11 (espaço 1,5 cm), para o Centro de Psicologia Aplicada do Exército, Praça do Comércio, Lisboa, dirigido aos Coordenadores de Redação, ou através de cpae.sociologia@mail.exercito.pt. 3. Os artigos devem ser acompanhados de um resumo em português e outro em inglês não devendo ocupar mais que 10 linhas, cada um, dessa mesma página. Deverá ser feito em letra Arial, tamanho 9, com espaçamento de 1 linha. As palavras- chave (Keywords) são obrigatórias e colocadas a seguir ao Resumo (Abstract), (mínimo 3 palavras e máximo 7 palavras). 4. Todos os artigos entregues deverão já conter o título definitivo e a referência ao(s) seu(s) autore(s) (instituição, categoria, área de especialização e elementos de contacto). 5. Os quadros e as figuras devem ser usados apenas se contribuírem fortemente para a clarificação do artigo. Devem ser representados em folhas, devidamente numerados e acompanhados de breves legendas. A sua localização no texto deve ser claramente indicada. As figuras devem possuir elevada qualidade gráfica, de modo a permitir a sua reprodução sem perda apreciável de nitidez e a sua eventual redução. 6. As referências e autores de obras devem obedecer ao seguinte: (Robinson, 1978); (Piaget & Szeminka, 1941); (Bronckart, Papandropoulou & Kilcker, 1976); (Van der Pligt et al., 1982); Freud (1924 a; 1924 b), devendo ser listadas alfabeticamente, no final do artigo, as referências bibliográficas (apenas as obras referidas no texto), obedecendo ao seguinte formato: Andersen, N. & Schalk, R. (1998). The psychological contract in retrospect and prospect. Journal of Organizational Behavior, 19, pp Chambel, M.J. (2005). Stress e Bem-Estar nas Organizações. In A., Marques Pinto & A. Lopes da Silva (2005). Stress e Bem-Estar. Lisboa: Climepsi Editores. Lazarus, R., & Folkman, S. (1984). Stress, appraisal and copping. New York: Srpinger. CENTRO DE PSICOLOGIA APLICADA DO EXÉRCITO (CPAE) Contatos: , , Correio Eletrónico: cpae.sociologia@mail.exercito.pt Sítio da Internet:

5 ÍNDICE Gestão do desempenho dos militares do Exército: Uma proposta de mudança... 3 Alexandre Moura, Isabel Ribeiro e Pedro Pinheiro Do Uniforme Militar ao Desvio e à Reclusão Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar Alexandre Moura e Helena Carreiras Gestão de Carreiras no Exército Português: Uma proposta de modelo aplicado Isabel Ribeiro e Helena Mateus Jerónimo Gestão e desenvolvimento de carreiras- O caso da Marinha Portuguesa Adelino Costa Cabral Porque os homens apresentam maior comportamento agressivo do que mulheres? Por uma antropologia evolucionária do comportamento agressivo Thiago Moraes A Incerteza do Risco: Ensaio relativamente ao tema Sociedade de Risco de acordo com Ulrich Beck e Anthony Giddens Rui Eusébio Dois olhares sobre a mesma perspectiva sociedade do risco - Ulrich Beck e Anthony Giddens Andreia Filipa Duarte Pires O Desemprego Estrutural em Portugal ( ): dois conceitos em conflito, devido às mudanças da economia política Cândido Peixoto Fernandes

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7 Editorial Coronel de Infantaria Fernando Manuel Oliveira da Cruz Caros leitores, Trazemos até vós o número 3 do Boletim de Sociologia Militar. O terceiro número de uma publicação anual que procura reunir o que de qualidade se realiza numa área que é cada vez mais desafiante, intensa e motivadora. Tendo em conta as dificuldades financeiras que o País, o Exército e o Centro de Psicologia Aplicada atravessam, foi tomada a decisão de se efetuar a presente publicação em suporte informático. Não quisemos deixar de publicar os trabalhos que, no último ano, foram sendo realizados no âmbito da investigação em Sociologia neste Centro e noutros com os quais temos excelentes relações de amizade e cooperação. O Boletim de Sociologia Militar pretende ser um espaço de encontro e de partilha. É nossa intenção cumprir um desígnio científico e cultural no meio civil e militar, dando um contributo epistemologicamente humilde mas esforçado e honesto. A ligação à sociedade, designadamente através das Instituições de Ensino Superior e Centros de Investigação, é um desígnio e uma realidade deste Centro. Queremos cada vez mais mostrar a nossa Instituição à comunidade e interagir com ela, contribuindo, na nossa área de atividade, com tudo aquilo que estiver ao nosso alcance. É disso exemplo este Boletim de Sociologia. Termino, agradecendo a todos os Militares e Civis que tornaram possível a concretização deste Boletim de Sociologia. Aos leitores, desejamos uma agradável e proveitosa leitura. O Diretor Fernando Manuel Oliveira da Cruz Coronel de Infantaria

8 Boletim de Sociologia Militar N.º PP. 3 a 21 GESTÃO DO DESEMPENHO DOS MILITARES DO EXÉRCITO: UMA PROPOSTA DE MUDANÇA Alexandre Moura *, Isabel Ribeiro ** e Pedro Pinheiro *** RESUMO Este artigo faz parte de uma investigação desenvolvida no Centro de Psicologia Aplicada do Exército. A investigação tem como principal objetivo constituir um contributo para um sistema de avaliação e gestão do desempenho que seja adequado à especificidade militar, procurando reter a filosofia e o paradigma subjacente ao Sistema Integrado de Gestão e Avaliação do Desempenho da Administração Pública (SIADAP). Palavras-chave: Avaliação de desempenho; Gestão de desempenho; Competências; SIADAP; Exército ABSTRACT This article makes part of an investigation developed in Centro de Psicologia Aplicada do Exército. The research have the main goal of constitute a contribution towards an evaluation system and performance management that suits to the military specificity, seeking retain the philosophy and the underlying paradigm of Sistema de Gestão e Avaliação do Desempenho da Administração Pública (SIADAP). Keywords: Performance evaluation; Performance management; Skills; SIADAP; Army INTRODUÇÃO Em qualquer organização, a procura da excelência e do mérito devem estar sempre presentes. Neste contexto, a avaliação e gestão do desempenho constituem um suporte essencial para a gestão dos recursos humanos, contribuindo para a validação do recrutamento e da seleção, em sintonia com os objetivos organizacionais e estratégicos da Organização, possibilitando a identificação da evolução dos colaboradores, diagnosticar necessidades de formação e melhoria dos postos e processos de trabalho, tendo sempre em vista dinâmicas de evolução profissional numa perspetiva de distinção do mérito e da excelência. Todavia, estes processos não poderão ser efetuados sem o reforço da intervenção dos colaboradores no processo de avaliação dos serviços e das suas ações. A Avaliação do Desempenho (AD) é uma necessidade imperiosa em qualquer instituição. Deve ser justa, ponderada e baseada num modelo válido e actual. Deve privilegiar a excelência, a qualidade e o mérito, visando contribuir para a coerência e harmonia dos serviços/acções dos * Major de Cavalaria, Centro de Psicologia Aplicada, Sociólogo ** Alferes RC, Centro de Psicologia Aplicada, Socióloga *** Alferes RC, Centro de Psicologia Aplicada, Sociólogo 3

9 Gestão do Desempenho dos Militares do Exército Comandantes/Dirigentes e demais colaboradores, promover a motivação e o desenvolvimento de competências. A satisfação, a motivação organizacional, o desenvolvimento de competências, o interesse, a pró-actividade, o cumprimento rigoroso dos objectivos da Organização, podem ser mais facilmente atingíveis se o Exército conseguir antecipadamente percepcionar os problemas, as aspirações, expectativas de carreira e motivações, tendo em vista a definição de um modelo de gestão de desempenho que consiga aliar as perspectivas organizacionais/institucionais, definidas pela Instituição e a carreira individual desenvolvida pelo próprio militar, promovendo-se a compatibilização dos interesses institucionais e individuais. Com a avaliação dos colaboradores procurar-se-á contribuir para a melhoria da gestão dos Recursos Humanos, desenvolver e consolidar práticas de avaliação, identificar as necessidades de formação e desenvolvimento pessoal adequados à melhoria do desempenho dos serviços, dos dirigentes e dos trabalhadores. A promoção da motivação, o desenvolvimento de competências e qualificações, a formação ao longo da vida, são factores que também não devem ser descurados. Neste contexto, procuramos investigar, discutir e propor um sistema de Gestão do Desempenho adaptado ao Exército Português e à sua especificidade, que comungue das orientações, perspectivas e filosofia do Sistema Integrado de Gestão e Avaliação do Desempenho na Administração Pública (SIADAP). Este foi de uma forma sucinta, o objecto de estudo da nossa investigação, contribuindo para a constituição de um sistema que motive, avalie e desenvolva os militares na Organização. Neste sentido apresentaremos um modelo conceptual, assente na gestão por objectivos e num modelo por competências, permitindo o desenvolvimento dos recursos humanos em conjugação com os objectivos gerais e estratégicos do Exército. Esta investigação, autorizada por despacho de 24 de Maio de 2010 de S. Ex. General CEME, pretende constituir, assim, um contributo para um sistema de avaliação e gestão do desempenho. Vamos, aqui, apresentar uma proposta de um modelo conceptual, assente na gestão por objetivos e num modelo por competências, permitindo o desenvolvimento dos recursos humanos em conjugação com os objetivos organizacionais, estratégicos, de gestão e operacionais do Exército. Pretendemos um sistema de avaliação de desempenho contextualizado com a Missão e a Visão da Organização e interligado com todas as práticas de Recursos Humanos da Organização (Formação, Recompensas, Recrutamento e Selecção, Desenvolvimento de Carreiras, Gestão de Competências). 4

10 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO E/OU GESTÃO DO DESEMPENHO Na perspetiva de alguns autores, o desempenho pode ser concebido enquanto comportamento (meios) ou enquanto resultados (fins) (Caetano, 2007: 74), ou como um ato de cumprir ( ) uma determinada missão ou tarefa aprioristicamente delineada (Chiavenato, 2004: 98). Na perfectiva destes autores, o desempenho está intimamente relacionado com a motivação e com os conhecimentos, capacidades e habilidades demonstradas. Marras (2000) define desempenho como o acto ou efeito de cumprir ou executar determinada missão ou meta previamente traçada. Para António Caetano (1998), o desempenho pode, por um lado, ser entendido como um comportamento, sendo que nesta perspetiva de ação centra-se nas exigências das funções. Por outro lado, na perspetiva dos resultados, focaliza-se nos resultados que derivam das atividades levadas a cabo pelos colaboradores num determinado período de tempo. A avaliação de desempenho profissional constitui certamente um dos fenómenos que maior perturbação introduz no funcionamento regular de qualquer organização (Caetano, 2008). Ainda assim, vários autores têm evidenciado esta prática dos recursos humanos como um agente de sucesso nas organizações e da qual depende tanto o seu sucesso estratégico como a sua capacidade competitiva, pressupondo-se que o desempenho da organização deriva da confluência do desempenho individual de todos os seus colaboradores. O conceito de avaliação de desempenho pode ser entendido como um processo de análise metódica pelo qual uma organização identifica em que medida o desempenho de cada trabalhador contribui para atingir os objectivos estratégicos e alcançar os resultados, a fim de se identificar quais os aspectos positivos e negativos, tentando, simultaneamente, encontrar oportunidades de evolução, proporcionando ao avaliado a possibilidade de tomar conhecimento acerca do desempenho que é espectável. Quando bem conduzida, a avaliação de desempenho, pode representar mais-valias tanto para a organização, como para o avaliador, como ainda para o avaliado, uma vez que, em conjunto, as diferentes partes envolvidas podem estabelecer processos e procedimentos mais eficazes que conduzam a níveis de desempenho superior, adaptados aos diferentes departamentos e funções. Permite, também, definir objectivos claros para o futuro, avaliar o potencial de desenvolvimento e estabelecer os meios apropriados para motivar os indivíduos (Yemm, 2005). Assim, torna-se imperioso determinar como qualificar/medir/quantificar o desempenho, sendo esta uma das questões mais críticas de qualquer gestor de recursos humanos. A quantificação/medição do desempenho, segundo Rui Gonçalves (2008), é um acto de avaliação que obriga a uma comparação que aferirá o grau de concordância entre as partes em avaliação, exigindo uma recolha de indicadores que permitam realizar comparações com níveis de 5

11 Gestão do Desempenho dos Militares do Exército desempenhos anteriores e desempenhos pretendidos. Nesta sequência, podem-se utilizar inúmeros critérios de comparação para efeitos de avaliação de desempenho numa determinada organização. Os mais frequentes alicerçam-se em objetivos e em competências. Todavia, existem situações em que é muito difícil encontrar critérios ou medidas objetivas, pelo que tem de se optar por indicadores qualitativos, os quais, na maioria das vezes, são avaliados de uma forma mais subjetiva. Consequentemente, julgamos ser consensual admitir que a componente subjetiva na medição do desempenho é difícil de excluir totalmente. De acordo com inúmeros autores, a Avaliação do Desempenho (AD) tende a ser inserida num conceito mais abrangente denominado de Gestão do Desempenho (GD). A Gestão do Desempenho poderá ser entendida como um processo societal de influência, comunicação e negociação entre avaliador e avaliado, que ocorre no âmbito de uma qualquer atividade com o objetivo de estabelecer entendimentos mútuos em relação às tarefas que o avaliado tem de efetuar, aos resultados esperados, ao contributo desses resultados para os objetivos da organização, à forma como vai ser medido o desempenho e à identificação e correção de desvios no desempenho efetivo. As componentes de um sistema de gestão do desempenho são as que se enumeram: O planeamento do desempenho; o feedback/comunicação contínua sobre o desempenho; a(s) reunião(ões) de desempenho propriamente ditas; a diferenciação; a harmonização; o diagnóstico de ensino e desempenho e, cumulativamente a todas as anteriores, o registo/observação contínua e recolha de dados. Não podemos considerar a avaliação de desempenho, conforme argumentam Cascão & Cunha (1998), um fim, mas antes um meio para melhorar os resultados dos recursos humanos na organização. Nesta perspectiva, não pode restringir-se ao julgamento superficial e unilateral das chefias a respeito do comportamento funcional dos subordinados. Consequentemente, emerge a necessidade de estabelecer perspectivas de comum acordo com o avaliado. Independentemente do que está em causa, terá de se considerar, sempre, a cultura organizacional e o contexto enquanto fatores delimitadores do desempenho, uma vez que o sujeito adota determinados comportamentos na execução de tarefas, num contexto particular, com vista na obtenção de resultados específicos (Caetano, 2008) MÉTODOS PARA A AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO O desenvolvimento de um processo de avaliação do desempenho deve ter em conta os intervenientes, internos e externos, importantes para a organização, bem como o contexto que influencia a tomada de decisão. Neste sentido, podemos identificar diferentes métodos para a avaliação de desempenho de desempenho, dos quais Caetano (2008) destaca os que se focalizam na pessoa, no comportamento, no contexto e nos resultados. 6

12 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 Os sistemas tradicionalistas procuram avaliar o desempenho focalizando-se nas pessoas, nas suas características ou traços de personalidade. No entanto, a validação do sistema, a sua praticabilidade e a investigação demonstraram fragilidades e alguma perversidade, pois a avaliação baseava-se em julgamentos acerca dos atributos da personalidade do avaliado, não estando alicerçado em qualquer critério relacionado com o desempenho na função. Todavia, a avaliação do desempenho através do julgamento destes atributos voltou a surgir nos últimos anos, agora sob a designação de avaliação por competências, interessando não a avaliação da competência em si mas a demonstração efetiva e indubitável dessa competência no desempenho das tarefas que estão atribuídas avaliado. Como alternativa ao sistema mencionado anteriormente, surgiu o sistema focalizado nos comportamentos. As escalas de observação comportamental consistem em descrições precisas de comportamentos a adotar ou adotados pelos colaboradores, os quais podem ser adequadas em certo tipo de funções pouco complexas e relativamente padronizados. Um outro sistema de avaliação e gestão do desempenho preocupa-se com a comparação de pessoas no contexto social. Consiste num método de avaliação que compara pessoas com cargos semelhantes para apurar quem são os melhores, procedendo-se a ordenações de avaliados. É um método que acarreta uma grande dose de subjetividade, pelo que acreditamos que apenas deve ser tomado em consideração em conjugação com outros métodos. O sistema de medição do desempenho focalizado nos resultados, também conhecido por avaliação por objetivos, é o que se encontra mais generalizado no presente momento. Diversos autores consideram-no como a melhor forma de avaliar o desempenho. A avaliação por objetivos mede o desempenho do colaborador de acordo com uma série de objetivos/resultados/metas negociadas individualmente para cada colaborador. Os objetivos e os resultados são definidos durante a fase de planeamento da avaliação e assumidos de forma a serem medidos objetivamente. A organização comunica ao colaborador quais são as expectativas relativas ao seu desempenho para o ciclo avaliativo que e vai seguir. O conhecimento destas metas, resultados e expectativas pode permitir ao colaborador regular a sua própria atividade, organizar o seu trabalho e estabelecer prioridades, aumentando assim a sua autonomia e responsabilidade. O conhecimento das metas a atingir possibilita-lhe a identificação dos desvios que está a cometer e, eventualmente, identificar os fatores que o determinaram e as medidas de correção a concretizar, ficando mais predisposto para aceitar feedback e/ou aconselhamento por parte do avaliador As nossas propostas, de acordo com o praticado na maioria das organizações atuais, focaliza-se em mais do que um aspeto do desempenho pelo que se pode designar de sistema de gestão misto. Na verdade, as propostas que mais à frente apresentaremos, combinam essencialmente dois métodos de avaliação (desempenho focalizado nos resultados e demonstração efetiva de um certo número de competências obrigatórias e complementares) e, 7

13 Gestão do Desempenho dos Militares do Exército marginalmente, um terceiro método (comparação em contexto laboral) ao procedermos à comparação de pares. METODOLOGIA Um trabalho de investigação visa acima de tudo, compreender melhor os significados de um acontecimento ou de uma conduta, fazer inteligentemente o ponto da situação, captar com maior perspicácia as lógicas de funcionamento de uma organização, reflectir acertadamente sobre as implicações de uma decisão política, ou ainda compreender com mais nitidez como determinadas pessoas apreendem um problema e a tornar visíveis alguns dos fundamentos das suas representações (Quivy, 1992). Em termos metodológicos, efectuamos um estudo de carácter exploratório de natureza essencialmente qualitativa, utilizando técnicas documentais modernas - segundo a visão de António Firmino da Costa (1986) - recorrendo à análise de conteúdo e a revisões bibliográficas e documentais específicas quer nacionais quer estrangeiras, sobretudo na área da gestão dos Recursos Humanos, com incidência na Gestão do Desempenho. A análise documental caracteriza-se por ser uma fonte rica e segura de informação, tem um baixo custo e trata-se de um excelente utensílio para estimular o espírito crítico ajudando a perceber algumas questões. Note-se que a análise documental é uma técnica muito utilizada na maioria das investigações em Ciências Sociais, o que revela ser uma boa técnica, sempre em mudança e muito precisa (Quivy, 1992). Convém, porém, referir que nem tudo se apresenta como vantagem, dado que pode trazer alguns constrangimentos, como a falta de objectividade dos documentos ou a omissão de informação relevante. Com o intuito de sustentar ainda mais o nosso trabalho, captámos determinadas representações e narrativas, utilizando técnicas não documentais como a observação não participante, realizando entrevistas semi-directivas e directivas a Informantes Privilegiados, designadamente: ao Exmo. Chefe da Divisão de Recursos do Estado Maior do Exército, ao Exmo. Director da Direcção de Administração de Recursos Humanos, ao Exmo. Chefe da Repartição de Pessoal Militar/DARH, aos Exmos. Comandantes e Oficiais de Pessoal das três Brigadas do Exército, ao Exmo. 2º Cmdt AM e ao Exmo. Coordenador Área Ensino Específico do Exército (IESM) A deslocação de uma equipa de investigadores a outros Exércitos -Espanhol e Holandês - possibilitou o contacto com a realidade avaliativa destes, permitindo obter uma maior riqueza de informação. A escolha dos referidos Exércitos deveu-se fundamentalmente a aspectos relacionados com a proximidade geográfica e a alguma comunhão/partilha de valores e modos de actuação (Exército Espanhol) e o número aproximado de efectivos (Exército Holandês). 8

14 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 PROPOSTA DE INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO APLICADO AO EXÉRCITO De seguida, gostaríamos de salientar alguns aspetos que, de acordo com Adalberto Chiavenato (2004), são fundamentais durante a investigação e eventual implementação de um sistema de avaliação do desempenho e que nortearam a nossa ação. O primeiro aspeto que tivemos em consideração consistiu em verificar se a organização necessitaria, efetivamente, de um novo método/sistema de avaliação. Tendo em conta as intenções do Comando do Exército, e análise das entrevistas exploratórias, julgamos que a resposta é positiva. Neste caso, passa a existir a obrigatoriedade de clarificar qual a relação do sistema de avaliação com a estratégia global da organização e com os valores organizacionais/estratégicos pretendidos, tornando-se necessário que a alta direção da organização (neste caso o Comando do Exército) esteja envolvida neste processo. O segundo aspeto que pretendemos clarificar, foi os objetivos da avaliação. Tentámos definir com alguma clareza qual a finalidade do sistema de avaliação a criar, uma vez que não nos foram transmitidas essas intenções. Apesar disso, acreditamos que o Exército Português terá este pormenor equacionado. De facto, julga Chiavenato (2004), é importante definir se o sistema de avaliação do desempenho se destina a justificar/fundamentar decisões sobre gestão de carreiras, escolhas, nomeações; a identificar as necessidades de formação; a promover os mais aptos; a recompensar monetariamente os que se distinguem. Os objetivos equacionados para o sistema de avaliação condicionam e influenciam o tipo de sistema a criar, nomeadamente no que se refere aos critérios e processos de medição, aos seus intervenientes, aos procedimentos e aos processos de comunicação. Neste aspeto, julgamos que existe a necessidade de definir como é que este sistema de avaliação vai interagir com os outros sistemas de gestão em uso, de forma a implementar as necessárias alterações ou ajustamentos em cada um deles. Este é um trabalho que necessitará de ser iniciado e complementado futuramente e que não mereceu a nossa atenção. Como qualquer sistema de avaliação é um meio para se gerirem os trabalhadores de uma qualquer organização de modo promover-se a sua coordenação e desenvolvimento, só se atingirá esta premissa se o sistema de avaliação e gestão do desempenho for aceite, bem conhecido e assumido como adequado pelas diversas hierarquias. Este é um facto que necessitará de uma especial atenção no caso do Exército Português. Outro aspeto que tivemos em consideração foi o que avaliar. Como já foi referido, existem diversos aspetos relacionados com o desempenho que podem ser, ou não, utilizados. Referimo-nos a resultados/objetivos, comportamentos, atitudes, conhecimentos, habilidades, atributos de personalidade. Após decidir o que avaliar, tivemos de decidir o que medir. Decidimos que a avaliação contemplaria critérios mistos objetivos e competências sendo necessário 9

15 Gestão do Desempenho dos Militares do Exército definir eventuais combinações e respetivas ponderações para a avaliação global. Sobre estes dois pontos falaremos mais à frente. Quem deve estar envolvido na avaliação foi o aspeto seguinte que mereceu a nossa atenção. Usualmente, a conceção de um sistema de avaliação e gestão do desempenho deve ser liderado pelo seu departamento de recursos humanos e formado por uma equipa multidisciplinar que envolva representantes de outras unidades orgânicas na maioria das vezes recebendo a apoio de investigadores/consultores externos à organização de modo a acompanharem todo o processo, contribuindo-se assim para a diminuição das desconfianças e promovendo-se a adaptação do futuro sistema de avaliação às efetivas necessidades e objetivos da organização. Com esta participação multidisciplinar e universal de todos os departamentos estimula-se e motiva-se os colaboradores para a mudança e facilita-se a difusão e aceitação do sistema. O Comando do exército não entendeu, devido a critérios de privacidade e descrição, alargar a grupo de trabalho a mais intervenientes, apesar da nossa proposta mencionar essa intenção. Assim, o grupo de trabalho ficou apenas constituído por elementos pertencentes ao CPAE. Outro aspeto que mereceu a nossa atenção foi quais os alvos da avaliação. Sabendo que a filosofia do SIADAP 1, subsistema de avaliação do desempenho dos serviços da Administração pública e SIADAP 2, avaliação dos dirigentes superiores e intermédios, contribuem para o reconhecimento de que as equipas e as organizações devem ser também avaliadas, sentimos a necessidade de determinar até onde iria o nosso trabalho. Com efeito, tentámos efetuar duas Fichas de Avaliação do Desempenho (FAD para Oficiais e Sargentos e FAD para Praças) que se preocupam fundamentalmente com a avaliação do desempenho dos militares (equivalente à filosofia subjacente ao SIADAP 2 Oficias e Sargentos e SIADAP 3 - Praças) e não tanto sobre a organização, pois seria efetuar um trabalho que não nos foi pedido. Depois preocupámo-nos com a decisão de quem avalia, quais os avaliadores. Para esta decisão tivemos em consideração a cultura organizacional da nossa instituição, a sua história e valores, os custos associados, a burocracia a criar, a sua futura eficácia e eficiência. Alguns destes aspetos necessitarão de ser esclarecidos futuramente, caso a nossa proposta seja aceite. Usualmente, a principal fonte de informação na nossa instituição é o chefe imediato do avaliado, apesar do RAMME apenas admitir como primeiro avaliador um Capitão. Julgamos que na avaliação dos postos mais baixos da hierarquia militar Cabos e Soldados o primeiro avaliador possa ser Oficial Subalterno, o Sargento de Pelotão ou mesmo um dos demais Sargentos do Pelotão, desde que tenha a maturidade organizacional para o fazer. Todavia, tendo em consideração as alterações organizacionais que têm ocorrido, é usual o próprio avaliado ser fonte de informação, o que se designa por auto-avaliação. Assim, na generalidade dos sistemas em uso são consideradas três fontes de informação: O avaliado, o chefe imediato e o chefe seguinte. Na nossa proposta, tendo em consideração a cultura 10

16 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 organizacional da Instituição, adicionámos o Comandante/Diretor/Chefe ao conjunto de avaliadores. Após as definições anteriores, tentámos criar o(s) documento(s) que registará(ão) o processo de avaliação o formulário(s) de avaliação que designámos por FAD. Tentámos manter o formulário o mais simples possível, tomando como referência vários formulários como o do SIADAP, FAI da Marinha Portuguesa, do Exército Português, da Força Aérea Portuguesa, do Exército dos Estados Unidos da América, do Exército Espanhol, das Forças Armadas dos Países Baixos, do Exército Brasileiro, international evaluation report usado em ambiente OTAN, entre outros formulários como o do Banco Santander Totta e da Caixa geral de Depósitos. CRITÉRIOS DE ESCOLHA DAS COMPETÊNCIAS A definição de uma linha estratégica a que uma organização se compromete para levar a cabo a sua missão, permite a identificação de um conjunto de actividades e tarefas indispensáveis para a concretizar. Essas actividades são agrupadas em cargos e funções com determinada complexidade e grau de responsabilidade. É então, preocupação de qualquer organização, que os seus colaboradores detenham um conjunto de conhecimentos, capacidades, atitudes e comportamentos que permitam atingir um bom desempenho. Este conjunto de conhecimentos e comportamentos denominam-se competências. A identificação das competências numa organização deve assentar em diversos tipos de metodologias de análise e descrição de funções. Como exemplos podem ser identificados os incidentes críticos, os questionários estruturados, a observação, as descrições de funções anteriores, as entrevistas, os formulários de avaliação de desempenho, etc. (Cunha, M.P, et al, 2010, p.558). Desta forma, teremos que assumir, que para fazer correctamente o levantamento das competências seria necessário uma análise e descrição de funções de todos os cargos do Exército, que permitiria identificar o conjunto de actividades e tarefas que o integram, bem como os factores críticos do seu sucesso. No entanto, devido a limitações temporais, para a realização do presente Estudo, não foi utilizada essa metodologia. Para a identificação das competências tivemos como ponto de partida o modelo utilizado no estudo realizado sobre o Perfil do Oficial do Exército oriundo da AM no qual os autores consideraram que o modelo que o Exército Português poderia adoptar, deveria por um lado sustentar-se nos valores e características, qualidades pessoais, e incluir competências definidas como acções, mas também como processos, o que vem de acordo com Spencer e Spencer (1993), referido anteriormente, uma vez que procura representar a totalidade do iceberg. Levando em conta Cascão (2004), o autor define três aspectos essenciais em relação ao tratamento a dar às competências: 11

17 Gestão do Desempenho dos Militares do Exército - Uma orientação prioritária para o trabalho e para as suas exigências funcionais; - Uma orientação, que embora parta das exigências do trabalho, se concentre na interacção constante entre o sujeito e a função no sentido de mobilizar as características individuais para a construção de desempenhos; - Uma orientação centrada essencialmente na pessoa e nos comportamentos evidenciados, nomeadamente os baseados em desempenhos superiores; - A necessidade de um modelo de competências, aparece na maior parte das organizações ligada à gestão e por isso muito centrada nas acções e nos desempenhos, porém o Exército como escola empresa, quando pensa em acções, pensa em simultâneo em formação e selecção. O modo de descrição das competências no Exército, deve por isso incluir as descrições comportamentais, acções concretas, mas também os processos, uma vez que é a partir destes que se podem desenhar curricula ou desenvolver requisitos para a selecção de pessoal (in Silva, et al, 2006, p.31). As competências podem ser transversais às organizações, sendo uma ferramenta poderosa ao serviço de outras práticas e políticas de gestão de pessoas. Segundo esta perspectiva procuramos identificar um conjunto de competências para os militares do Exército Português compatíveis com os valores, a missão e a estratégia da Organização combinado com outros modelos. Para tentarmos obter uma seleção o mais rigorosa e o mais criteriosa possível procuramos fazer uma análise e uma comparação entre: - As competências identificadas nos vários ramos das Forças Armadas, Exército, Marinha e Força Aérea; -As competências avaliadas no Exército Espanhol, Exército Holandês e na Ficha de Avaliação Internacional (Nato); - O perfil de competências para cada um dos grupos profissionais da Administração Pública definidos no SIADAP. - As competências requisitadas, actualmente, por outras organizações (por exemplo, resiliência e adaptabilidade). Tendo em conta a conjectura económica e social que o País atravessa, as empresas procuram-se adaptar às constantes mudanças para que possam continuar a manterem-se competitivas, as Forças Armadas também têm essa necessidade de procurar novas respostas e de se adaptar às crescentes exigências. Após o estudo, a comparação e a discussão para chegarmos ao Perfil de competências que propomos para Oficiais/Sargentos e para as Praças tivemos em consideração os seguintes aspectos: - Os valores e as atitudes por que, Oficiais, Sargentos e Praças, pautam a sua acção; - As actividades desempenhadas bem como o grau de exigência; - As competências que mobilizam na realização dessas actividades; - Os conhecimentos que necessitam de possuir; 12

18 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 - Em que condições ambientais ou outras e sob que exigências físicas, sensoriais ou Psico-motoras desenvolvem a sua actividade profissional. Procurámos definir um número de competências que torne possível a sua observação eficaz e objectiva. Em regra, o perfil de uma função deve ter entre 8 e 12 competências, no somatório das genéricas e específicas (Camara, P, 2007, p.359). Através da análise referida em cima, construímos um modelo de desempenho que define critérios de competências a diferentes níveis tendo em conta o grau de complexidade das tarefas e o nível de responsabilidade. Debruçamo-nos, então, sobre a identificação de competências específicas de alguns postos e as competências comuns a todos - competências transversais. As competências transversais a todos os militares (Oficiais, Sargentos e Praças) estão sobretudo, ligadas à cultura da Organização: missão, objectivos e valores, como já referimos. Para Oficiais e Sargentos identificamos o seguinte conjunto de competências comuns: resiliência, inteligência prática, trabalho em equipa e cooperação, conhecimento técnicoprofissional, comunicação, adaptabilidade, relações interpessoais, sentido de responsabilidade e autonomia e iniciativa. Contudo, as funções do Sargento e do Oficial requerem, por vezes, exigências diferentes. Desta forma definimos algumas competências específicas, complementares, que só serão observados em determinados casos e por isso escolhidas e negociadas (duas das cinco) entre avaliador e avaliado. Assim foram definidas: liderança, planeamento e organização, negociação e persuasão, capacidade de decisão, desenvolvimento pessoal. No caso das Praças foram identificadas as seguintes competências transversais: resiliência, trabalho em equipa, conhecimento técnico-profissional, relações interpessoais, adaptabilidade, sentido de responsabilidade, disponibilidade, apresentação pessoal. Também aqui, tendo em consideração algumas funções mais exigentes que outras, foram definidas as seguintes competências complementares: iniciativa, capacidade de decisão e desenvolvimento pessoal. Ainda que algumas competências sejam comuns entre Oficiais/Sargentos e as Praças, as descrições são diferentes, variando segundo o nível de responsabilidade. Diferencia-se, também, a descrição dos indicadores comportamentais observáveis para cada nível. Chegámos a um perfil de competências que deverá ser observado em todos os militares das respectivas categorias. No entanto, alguns deverão, tendencialmente, ser apoiados para conseguir o desenvolvimento pretendido: formação on the job, acompanhamento e aconselhamento pela chefia (coaching), etc. A avaliação das competências será feita numa escala de um (1) a cinco (5): 1- Competência não demonstrada ou inexistente, 3- Competência demonstrada, 5- Competência demonstrada a um nível elevado. 13

19 Gestão do Desempenho dos Militares do Exército O processo de desenvolvimento de competências é um processo de aprendizagem organizacional que pedirá um certo tempo até ser interiorizado pelos seus destinatários (Câmara,P., 2007, p.359). É importante referir que o Perfil de competências não é estático e definitivo, terá que ser reformulado e actualizado. CICLO DE GESTÃO DE DESEMPENHO: ADAPTAÇÃO DO SIADAP AO EXÉRCITO O novo sistema de avaliação de desempenho na função pública apresenta alguns pressupostos que poderiam ser úteis à instituição militar, no entanto, não podemos esquecer que o Exército não é um serviço público comum. Vimos que a carreira militar assenta em princípios e critérios que não são equiparáveis aos definidos para a Administração Pública comum. No entanto, não quer dizer que o Exército não se deva reger por princípios idênticos aos serviços do Estado, embora adaptados à sua medida. Aqui os princípios da transparência, da diferenciação do mérito por resultados devem ser analisados. O Exército desde cedo desenvolveu e implementou um sistema de avaliação dos seus militares (RAMME), que já contempla algumas especificidades mencionadas. No entanto, de acordo com o Comando do Exército, a precisar de uma revisão. Entende-se que a revisão do actual Sistema de Avaliação dos Militares do Exército (avaliação individual) deverá ter como referência o modelo de avaliação utilizado na administração pública, o SIADAP. De acordo com o mencionado anteriormente, podemos aludir que apenas um sistema que se baseie na GPO, modelo por competências e orientação para resultados permitirá seguir o modelo conceptual do SIADAP e, simultaneamente responder às necessidades de garantir um sistema de gestão do desempenho moderno, focado no desenvolvimento dos recursos humanos e no progresso organizacional. O SIADAP assenta numa concepção de gestão dos serviços públicos centrada em objectivos previamente fixados. Este sistema define objectivos como o parâmetro de avaliação que traduz a previsão dos resultados que se pretendem alcançar no tempo, em regra quantificáveis (Art.4º,alínea e). Também no RAMME, está explícito que a avaliação deve ter como principal preocupação os objectivos propostos, ou seja, deve assentar na avaliação dos resultados. Deveremos ter em conta que os objectivos a que se propõe medir devem ser flexíveis, claros e adequados aos meios disponíveis. Neste sentido, tanto a avaliação da administração pública como a avaliação militar estão em harmonia. Desta forma, insistimos num sistema de gestão do desempenho que desenvolva uma cultura de confiança e que estimule a participação de todos. Assim, consideramos essencial uma 14

20 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 avaliação de desempenho que envolva superiores hierárquicos, subordinados e a própria organização em todo o processo. Apresentamos um modelo misto que combine resultados do desempenho e indicadores comportamentais. Os modelos mistos avaliam e recompensam o desempenho e a competência: aquilo que efectivamente os colaboradores fizeram no último ano e como fizeram; as características mostradas que predizem um desempenho superior no trabalho actual ou no futuro (Cascão, F, 2005, p.93). Sabemos que o tema avaliação de desempenho é bastante delicado pelo que temos que ter cuidado para que o programa de avaliação não se torne mais prejudicial que benéfico, procurando não cair no erro de em vez de motivar os colaboradores, contribuir para a desmotivação e consequente quebra de rendimento. PROPOSTA DE CICLO DE GESTÃO DE DESEMPENHO DO EXÉRCITO A avaliação de desempenho individual deve estar integrada no ciclo de gestão de uma organização. Tal como se encontra previsto no SIADAP, o sistema de avaliação no Exército deve funcionar de uma forma integrada, em que os objectivos individuais resultam do desdobramento dos objectivos da organização. A literatura atribui a este método a definição de cascata onde os objectivos vão sendo decompostos do topo até à base. É importante que toda a organização se envolva no processo de gestão do desempenho. Cada individuo deve ter presente que para que a organização cumpra os seus objectivos é necessário que cada um, individualmente e/ou em equipa cumpra os objectivos que lhe estão atribuídos. Assim, a definição dos objectivos e resultados a atingir pelas unidades orgânicas deve envolver superiores hierárquicos e subordinados, assegurando as prioridades e o alinhamento interno da actividade de serviço. A planificação em cascata deve evidenciar o contributo de cada unidade orgânica para os resultados finais pretendidos. Podemos dizer, que neste sentido, já existe uma adaptação do Exército materializada na directiva do Exército para o Biénio apresentada por Sua Ex.ª o General CEME. A partir dos objectivos operacionais, os organismos ou serviços, elaboram o seu plano de actividades para o ano seguinte, incluindo os objectivos, actividades, indicadores de desempenho do serviço e de cada unidade orgânica (UO). Com a elaboração do plano de actividades, inicia-se o ciclo de gestão do serviço, que para além do plano de actividades, e conforme o art.º 8º do SIADAP, inclui a fixação dos objectivos do serviço para o ano seguinte, elaboração e aprovação do mapa de pessoal, elaboração e aprovação da proposta de orçamento, monitorização e revisão dos objectivos do serviço e das UO e elaboração do relatório de actividades (Saraiva, 2010, p.75). 15

21 Gestão do Desempenho dos Militares do Exército Propomos uma GD que contemple o alinhamento entre os resultados individuais e os objectivos organizacionais a par dos valores, da missão e da estratégia da organização. A avaliação do desempenho pode ajudar a perceber essa relação entre desempenho organizacional e desempenho individual. Numa organização é difícil assegurar que todos avaliem com o mesmo rigor e equidade. Desta forma, antes de partirmos para a avaliação individual devemos ter em conta uma das principais etapas do processo de avaliação, o planeamento, onde serão uniformizados e definidos os critérios de avaliação. Após todo o planeamento, o ciclo de desempenho deve, então, iniciar com a reunião de contratualização dos objetivos onde se procede à fixação, entre avaliador e avaliado, do conjunto de objectivos a atingir. Deve ainda ser acordado entre as partes o conjunto de meios de apoio de que o avaliado possa necessitar para poder atingir os objectivos. Iniciado o ciclo de desempenho, o superior hierárquico deve fazer o acompanhamento do seu colaborador, dando-lhe aconselhamento e orientação (coaching) e, pelo menos, duas vezes durante esse ciclo, através das entrevistas de feedback, fazer o ponto de situação com o colaborador acerca do seu desempenho (feedback), calibrando os objectivos, se necessário, e corrigindo desvios que tenham surgido, de forma a optimizar a contribuição do colaborador para que os objectivos sejam atingidos. O sistema de avaliação por objectivos permite que estes sejam reajustados, por diversos motivos que impeçam a concretização dos mesmos. A reformulação dos objectivos, no entanto, deve ser evitada pelo que será importante ter em conta em que circunstancias devem ocorrer. A reformulação dos objectivos decorre do processo de acompanhamento e feedback consistindo na alteração dos objectivos ou mesmo na eliminação dos mesmos. O avaliado deverá proceder à sua auto-avaliação, onde este deve indicar os seus pontos fortes e as suas necessidades de desenvolvimento. Esta realiza-se através do preenchimento de uma ficha a ser analisada pelo avaliador conjuntamente com o avaliado. Servirá apenas de apoio para a avaliação não se constituindo como um critério vinculativo na avaliação. A harmonização é outro passo a ter em conta. É difícil assegurar que, numa organização com a dimensão do Exército, todas as chefias utilizem os mesmos critérios com o rigor a que procedem. Assim, a calibragem das classificações deve ser feita por quem tenha uma visão global da instituição. O ciclo de desempenho é encerrado com a entrevista de avaliação que, agendada com antecedência e preparada com o devido cuidado, conduzirá à avaliação global do desempenho do avaliado. Esta etapa poderá revelar-se bastante útil para aumentar o grau de envolvimento entre avaliador e avaliado. 16

22 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 RECOMPENSAS No final do ciclo avaliativo não nos podemos esquecer de recompensar os melhores desempenhos. Quando discutimos um sistema de avaliação e de gestão do desempenho dos colaboradores não podemos deixar de falar do sistema de recompensas. A avaliação de desempenho tem que ter consequências. Os colaboradores devem saber que o seu comportamento será recompensado, ou punido, de acordo com seu bom ou mau desempenho. Consideramos que as recompensas intrínsecas serão as que mais se adequarão à realidade militar. Apesar de algumas já existirem como é o caso dos louvores, e outras, como já vimos anteriormente, estas devem ser atribuídas pelo desempenho meritório e digno de referência do militar e não pelo tempo de serviço que este detém. Os mecanismos de reconhecimento do mérito consistem essencialmente em formas de dar visibilidade ao contributo dos colaboradores, prestigiando, distinguindo e premiando comportamentos e acções que contribuíram para atingir os objectivos, constituindo um reforço positivo na motivação. Julgámos que o desempenho relevante (nota superior ou igual a 4) deveria ser recompensado. As recompensas poderão materializar-se em: Quadros informativos nos espaços físicos comuns da organização onde se podem incluir menções honrosas para os melhores desempenhos; Informações na intranet ou no site da internet da Organização; recompensas de carácter temporal, onde em função do desempenho, correspondem a regalias traduzidas, por exemplo, em dias suplementares de férias, isenções de horário, dias de mérito, condecorações, etc. CONCLUSÕES E PROPOSTAS A implementação de um novo sistema de avaliação não será uma tarefa fácil e exigirá o consumo de uma grande quantidade de recursos financeiros, formativos, temporais e espaciais, por parte de avaliadores e avaliados. Todavia, julgamos ser indispensável a sua execução. Desenvolver e implementar um novo sistema de gestão de desempenho implicará uma mudança nas rotinas e susceptibilidades, promovendo a adequação das acções às novas dinâmicas avaliativas. Adoptar um modelo ainda que válido e desafiante, tendo em consideração práticas anteriores, poderá ser um processo moroso necessitando de algum tempo para interiorizar os seus efeitos, exigindo-se uma nova postura para avaliados e avaliadores, induzida ou não por acções de formação que desenvolvam as necessárias competências nos intervenientes no processo. Afigura-se como primordial a consciencialização real da importância da avaliação de desempenho no percurso do militar. Esta deverá ser encarada como uma forma de medir e diferenciar o desempenho e, sobretudo, deverá ter um objectivo pedagógico. Através da avaliação pretende-se analisar a competência do indivíduo no exercício do cargo. O objectivo será o de 17

23 Gestão do Desempenho dos Militares do Exército aferir os pontos fracos e fortes, as áreas passíveis de melhoria e as necessidades de formação prioritárias, promovendo, por um lado, o contínuo desenvolvimento pessoal e profissional, e, por outro, o progresso institucional. Deverá ter-se em consideração um requisito basilar para um sistema de avaliação de desempenho eficaz: os objectivos. Afigura-se como imprescindível a fixação clara de objectivos de desempenho. Esses objectivos deverão ser quantificáveis através de indicadores simples e fáceis de medir, devidamente calendarizados. Para que a avaliação seja o mais pormenorizada possível, os objectivos terão de ser formulados de forma individualizada para cada cargo/função - o que pressupõe, desde logo, a elaboração da análise de funções para todos os cargos do Exército. Da forma como se processa a avaliação actualmente assiste-se, em determinados casos, a um distanciamento entre avaliador e avaliado. O modelo ora proposto promove a aproximação entre avaliador e avaliado. Este facto proporciona objectividade avaliativa, e o conhecimento mais incisivo acerca do desempenho e do potencial do avaliado. Para que o distanciamento diminua, principalmente no caso concreto das Praças, deveria ser formalizado na prática o que acontece informalmente: a avaliação por parte do Sargento. Tal situação permitirá uma proximidade real e efectiva entre avaliador e avaliado. A avaliação deverá ser feita por um militar com, pelo menos, 5 anos na categoria de Sargento. No sentido da uniformização/estandardização da avaliação será de todo imprescindível facultar aos avaliadores uma formação de base. Essa formação permitirá diminuir as discrepâncias avaliativas não só entre diferentes avaliadores como entre U/E/O distintas. Tal formação deverá ser ministrada ao longo da formação de Oficiais na Academia Militar e Sargentos na Escola de Sargentos do Exército. Seria importante, também, proceder a sucessivas actualizações ministrando módulos de Avaliação de Desempenho nas diferentes etapas da carreira, nomeadamente nos cursos de promoção. O CPAE está dotado de meios humanos que permitem dar o apoio técnico que se julgue necessário. A problemática das quotas que existe no SIADAP não deverá ser indiscriminadamente aplicada ao Exército, pois determinadas áreas ou cargos/funções, pela sua especificidade, implicam previamente uma escolha alicerçada no mérito e em elevados índices de motivação e realização, sendo estas características incongruentes e incompatíveis com a filosofia das percentagens e quotas. A Educação Física Militar deveria constituir-se como elemento fundamental durante toda a carreira militar e não apenas nos processos de formação. É algo inerente à dinâmica institucional e é, entre outros, um aspecto que estabelece a distinção entre o meio castrense e a sociedade civil. A aptidão física afigura-se como indispensável para o cumprimento das missões atribuídas a qualquer militar. Esta consciencialização da importância da actividade física terá de ser 18

24 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 assumida e valorizada, consubstanciando-se numa avaliação (com atribuição de uma nota ) em oposição do sistema go/no go existente. Para facilitar o registo e a gestão da avaliação de desempenho propomos a aplicação de uma ferramenta informática para que o preenchimento das fichas de avaliação, bem como todo o processo, seja feito electronicamente. As propostas supracitadas e as que foram sendo lançadas no decorrer da investigação influenciarão, de forma marcante, a cultura e as práticas de gestão do Exército, podendo contribuir para o surgimento de determinadas resistências senão for assumida pelos líderes estratégicos, implicando que esta integração seja comunicada, assumida e interiorizada como uma ferramenta de desenvolvimento individual e, por consequência, colectivo e organizacional. Através deste estudo foi-nos possível investigar, discutir e propor um sistema de Gestão do Desempenho adaptado ao Exército Português e à sua especificidade, que, de uma forma sintética, comungue das orientações, perspectivas e filosofia do SIADAP. Procurámos contribuir para a constituição de um sistema que motive, avalie e desenvolva os militares na Organização. Julgamos que todo o conhecimento inerente a esta investigação é imprescindível para se poder constituir uma base de trabalho para a gestão, formação, selecção, recompensas e deve ser objecto de posterior actualização. BIBLIOGRAFIA Behn, R. (2003). Why measure performance? Different purposes require different measures. Public Administration Review, 63, 5: pp Bilhim, João (1997) Gestão por Objectivos na Administração Pública. Lisboa: ISCSP. Caetano, A. (1998). Avaliação de Desempenho: Metáforas, Conceitos e Práticas. Lisboa: Editora RH. Caetano, A. & Vala, J. (2002). Gestão de Recursos Humanos: Contextos, Processos e Técnicas. Lisboa: Editora RH. Caetano, António (2007) Avaliação do Desempenho. Lisboa: Oeiras: Celta Editora. Caetano, A. (2008). Avaliação de Desempenho: O Essencial que Avaliadores e Avaliados precisam de saber. Lisboa: Livros Horizonte. Câmara, Pedro B., Guerra, Paulo.B, Rodrigues, Joaquim, V., 2007, Novo Humanator: Recursos Humanos e Sucesso Empresarial, 3ª edição, Lisboa, Publicações Dom Quixote. Cascão, F. & Cunha, N. (1998). Gestão de Competências: Novas perspectivas na Gestão de Recursos Humanos. Porto: Edições IPAM. Cascão, Ferreira (2004) Entre a Gestão de Competências e a Gestão do Conhecimento: Um Estudo Exploratório de Inovações na Gestão das Pessoas. Lisboa: Editorial Presença. Ceitil, Mário, 2006, Gestão e Desenvolvimento de Competências, Lisboa, Edições Sílabo. 19

25 Gestão do Desempenho dos Militares do Exército Chiavenato, Idalberto (2003) Desempenho Humano nas Empresas: Como Desempenhar Cargos e Avaliar o Desempenho. São Paulo: Editora Atlas. Chiavenato, Idalberto (2004) Gestão de Pessoas: O Papel dos Recursos Humanos nas Organizações. Rio de Janeiro: Editora Campus. ISBN Costa, António Firmino da (1986) A Pesquisa de Terreno em Sociologia, em SILVA, Augusto Santos; PINTO, José Madureira (orgs.) (1986) Metodologia das Ciências Sociais. Porto: Edições Afrontamento. Cunha, M., P.; Rego, A.; Gomes, J.F; Cabral-Cardoso, C.; Marques,C.,A.; Cunha,R.C, 2010, Manual de Gestão de Pessoas e do Capital Humano, 2ªEdição, Lisboa, Edições Sílabo. Dooren, W. (2005). What Makes Organizations Measure? Hypotheses on the Causes and Conditions for Performance Measurement. Financial Accountability & Management, 21, 3: pp Drucker, P. F. (1954). The Practice of Management. Oxford: Elsevier Butterworth Heinemann. Fernandes, (2007). Avaliação de Desempenho por Objectivos. Recursos Humanos Magazine, Jan-Fev, 48: pp Gonçalves, Rui (2008) Entre a Avaliação e o Desempenho Considerações Adaptativas. Coimbra: Quarteto Editora. Marras, J. 2000, Administração de Recursos Humanos: do estratégico ao estratégico. Futura. São Paulo. Mintzberg, Henry, (2010) Estrutura e Dinâmica das Organizações, 4.ª Edição, Publicações D. Quixote, Lisboa. Peretti, J. (2001). Recursos Humanos. 3ª Edição. Lisboa: Edições Sílabo. Quivy, R, Campenhoudt, I (1992) Manual de Investigação em Ciências Sociais, Lisboa: Gradiva. Rocha, J. Oliveira (1999) Gestão de Recursos Humanos. Lisboa: Editorial Presença. Rocha, J.A, Oliveira, Dantas, J.Costa, 2007, Avaliação de Desempenho e Gestão por Objectivos, Editora Rei dos Livros, Lisboa Silva.A., Lavado, Cruz, P. Silva, Bastos, Rosinha, Antão, 2006, Estudo do Modelo De Competências Do Oficial Do Exército Oriundo Da Academia Militar, Centro de Psicologia Aplicada do Exército. Sousa, M. T.; Duarte, T.; Sanches, P. G. e Gomes, J., (2006), Gestão de Recursos Métodos e Práticas, Lidel, Lisboa. Vaz, Rui Pedro Ferreira Vaz, Subsistema de Avaliação do Desempenho dos Trabalhadores da Administração Pública (SIADAP3): da teoria à (boa) prática, Universidade de Coimbra, consultado a 3 de Fevereiro de Yemm, G. (2005). Getting the most from appraisals: from both sides of the desk. Management Services, Spring 2005: pp

26 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 LEGISLAÇÃO Decreto-Lei n.º 236/99 de 25 de Junho de 1999, Estatuto Dos Militares Das Forças Armadas (EMFAR). Decreto-Lei nº 66-B/2007, 28 de Dezembro de 2007, sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na Administração Pública (SIADAP). Portaria n.º 1246/2002, 7 de Setembro, Regulamento de Avaliação do Mérito dos Militares do Exército (RAMME). 21

27 Boletim de Sociologia Militar N.º PP. 22 a 65 Do Uniforme Militar ao Desvio e à Reclusão Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar. Alexandre Moura * Helena Carreiras ** RESUMO O Estabelecimento Prisional Militar tem determinadas especificidades que lhe configuram uma singularidade própria no panorama nacional das prisões. Esta "micro-sociedade" possibilita que determinadas identidades exteriores sejam transpostas para o interior da prisão conferindo uma hierarquia formal que é induzida pelas instituições de origem. Por conseguinte, é nosso objetivo determinar quem é o cidadão-recluso que se encontra no EPM, em função de um conjunto de características sócio-demográficas e jurídico-prisionais, designadamente a idade, posto, habilitações literárias, situação na profissão, instituição de origem, duração e tipo de pena. Pretendemos, inclusivamente, perceber quais as condições de vida dos reclusos tipo de tratamento dado pelo staff, horários, fardamento, rotinas, comportamentos, alojamentos e habitabilidade, alimentação. Procurámos analisar, entre outros fatores, as situações penais e prisionais, designadamente as que se inserem em dinâmicas de reincidência criminal, a particularidade de serem indivíduos oriundos de instituições de cariz eminentemente militar, que comungam de orientações semelhantes. Analisámos as preocupações, avaliações, comportamentos, rotinas, horários, condições de vida dos reclusos. Foram objeto de apreciação as condições gerais da prisão, o tratamento dado pelo «staff prisional», o acesso à saúde, as principais reivindicações dos encarcerados. Tentámos perceber se as hierarquias internas decorrem das patentes que cada um possui e se os diferentes estatutos, papéis ou posições prévias ao encarceramento orientam as posições e as interações locais. Palavras Chave: Reclusão Militar, Preso Militar, Comportamentos a Atitudes. ABSTRACT The Portuguese Army Prisoner Facility has certain aspects that makes it unique in the national prisons environment. This imprisoned micro-society with military uniforms allows that certain exterior aspects appear inside prison walls. The present study aimed to explore and describe the military prisoners regarding their socio-demographic and juridical characteristics such as rank, age, unit, sentences and type of crime committed. We wanted to understand the military prisoner s daily routine kind of treatment given by Staff, internal schedules, routines, concerns, behaviors, food quality, facility conditions, criminal and imprisoned dynamics. Keywords: Military Prison, Military Prisoner, Behaviors and Attitudes. * Major de Cavalaria, Mestre em Sociologia, Chefe do Gabinete de Estudos e Formação do Centro de Psicologia Aplicada do Exército. ** Ph.D., Professora do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE). 22

28 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 NOTA INTRODUTÓRIA O presente Artigo surge como corolário de um Mestrado em Sociologia efetuado no Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), especialidade em Família, Educação e Políticas Sociais e incide sobre a população prisional encarcerada no único Estabelecimento Prisional Militar (EPM) nacional - sendo, por conseguinte, um estudo de caso. Decorre da actividade profissional desenvolvida pelo autor no meio castrense desde há alguns anos a esta parte, cruzando-se com o seu interesse pelas instituições totais (em termos Goffmanianos), tendo consciência que falar de punições e encarceramentos são temas que, sobretudo no meio militar, se evitam abordar, discutir e comentar. É nossa intenção caracterizar sociologicamente o cidadão-recluso-militar que se encontra no EPM. Perceber quais as suas condições de vida, rotinas, comportamentos, o que pensam, que aspectos mais os preocupam e qual o tipo de tratamento dado pelo «Staff». Constituem o «Staff Prisional» o comando do estabelecimento e o seu estado-maior, os técnicos de saúde e reeducação, elementos constituintes do pelotão de guarnição e segurança (PGS) (não são designados de guardas pois, efectivamente, não o são. São militares com o curso de Polícia do Exército (PE), pessoal administrativo e de manutenção. A reclusão é muitas vezes entendida como um intervalo na vida dos indivíduos sendo encarada como uma suspensão, um parênteses ou uma fragmentação no tempo, representada como se de uma outra vida paralela se tratasse e que terminará dentro de algum tempo mais ou menos longo. Além de procurar responder a estas questões, a nossa pesquisa procurou conhecer a realidade de outras prisões portuguesas, de forma a comparar e tornar mais inteligíveis os resultados obtidos. São estes factores específicos e as suas interconexões que se procuram evidenciar neste trabalho. O artigo é constituído por uma nota introdutória, quatro capítulos e a conclusão. No primeiro capítulo, faremos alusão a algumas referências teóricas fundamentais que enquadram este estudo. No segundo, a par de uma explicitação metodológica sobre os procedimentos, métodos e técnicas utilizados, procederemos a uma contextualização e caracterização do objecto de estudo. No terceiro capítulo, inicia-se a apresentação dos resultados através da caracterização demográfica e social dos reclusos. Analisa-se, entre outros factores, as situações penais e prisionais, designadamente as que se inserem em dinâmicas de reincidência criminal, a particularidade de serem indivíduos oriundos de instituições de cariz eminentemente 23

29 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar militar 1, que comungam de orientações semelhantes. No quarto capítulo, são analisadas as preocupações, avaliações, comportamentos, rotinas, horários, condições de vida dos reclusos militares. São objecto de apreciação as condições gerais da prisão, o tratamento dado pelo «Staff» prisional, o acesso à saúde, as principais reivindicações dos encarcerados. Tentámos perceber se as hierarquias internas decorrem das patentes que cada um possui e se os diferentes estatutos, papéis ou posições prévias ao encarceramento orientam as posições e as interacções locais. Tendo consciência da estigmatização social provocada pela prisão, das vulnerabilidades societais que estes cidadãos-reclusos apresentam, exponenciadas pelo uniforme que usam e poderão continuar (apenas alguns, dependendo da natureza do crime) a envergar, torna-se imprescindível determinar como os internos se relacionam com estas questões, que noções orientam as suas atitudes, comportamentos e emoções. Apresenta-se, ainda, algumas notas conclusivas. 1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO PRINCIPAL 1.1. Dos Cárceres à Prisão As prisões são, de acordo com alguns teóricos, os locais que, por excelência, permitem aliar o sofrimento que a perda da liberdade implica com a possibilidade de regeneração do delinquente pelo trabalho/ocupação, pela educação e pela autoreflexão e auto-crítica. Porém, vozes discordantes afirmam o contrário, defendendo que as prisões propiciam outros riscos e ameaças. Os abolicionistas imaginam uma sociedade sem prisões, sem privação da liberdade, sem exclusões institucionais, considerando que os cárceres podem não ser a forma...institucional ideal para cumprir os desígnios modernizadores desejados... (Dores, 2003: 80). Desde sempre, houve registos de torturas, abusos e desrespeito pelos direitos humanos mais elementares no interior destes locais. Com efeito, mesmo no século XIX, adverte Maria João Vaz (2003), a prisão não executava o papel que lhe era atribuído e...em vez de contribuir para a regeneração dos que eram condenados pela prática do crime, ela era antes de mais considerada como uma verdadeira escola do crime... (Vaz, 2003 : 12). Foi essencialmente durante os últimos trinta anos do século XIX que se começaram a procurar concretizar as principais medidas reformadoras do sistema penal Português, transformações estas que procuraram respeitar as formulações teóricas defendidas desde o iluminismo 2. Nos finais do século XIX, os principais estabelecimentos prisionais existentes na cidade de Lisboa eram as cadeias do Aljube 1 Forças Armadas (Marinha, Exército, Força Aérea) e Guarda Nacional Republicana. 2 Confiança nas capacidades da razão acreditando-se que era possível a regeneração dos indivíduos desviantes através do pensamento, meditação, reflexão interna, ajudado com as benéficas influências da educação e do trabalho, forças disciplinadoras de corpos e mentes. 24

30 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 e do Limoeiro. Maria João Vaz (2003) salienta que no distrito de Lisboa existiam cerca de 40 cadeias, tratando-se na sua grande maioria de pequenos cárceres e não de prisões adequadas para o cumprimento de penas de longa duração. Apenas em 1885 surgiu o primeiro estabelecimento prisional - a Cadeia Geral Penitenciária do Distrito da Relação de Lisboa - considerada como o modelo mais adequado para se alcançarem os objectivos essenciais das penas - a recuperação dos indivíduos delinquentes para o convívio em sociedade. As prisões impuseram-se, por inerência, como elementos centrais dos sistemas penais. Surgiram, neste contexto, problemas por demais conhecidos, como a sobrelotação, a falta de higiene, corrupção, promiscuidade, exploração de uns sobre os outros, inexistência de separação por idade, grau de perigosidade, tipo e duração da pena. Surgem também revoltas prisionais como a do Limoeiro em 1891, a obrigatoriedade do uso de capuz que cobria o rosto dos condenados de modo a não serem identificados nem haver diálogo entre pares, surgindo a loucura e a tuberculose como principais doenças, dando a impressão de que se contribuía mais, segundo cronistas da época, para o desarranjo mental e enfraquecimento dos reclusos do que para a sua regeneração. Quando acabavam de cumprir a suas penas (...) não pareciam mais do que cadáveres galvanizados que se restituem à sociedade, que se colocam além do portão e se mandam caminhar para a cidade... (Vaz, 2003: 18). No virar para o século XX, pouco se tinha alterado no débil estado das prisões nacionais, até que em 6 de Fevereiro de 1913 foi alterado o regime penitenciário, passando os reclusos a trabalhar em comum durante o dia, mantendo-se em isolamento nas suas celas durante a noite. Mais recentemente, no período do Estado Novo, era frequente haver a aplicação de uma outra pena denominada de transportação - o chamado «degredo» - para as colónias Portuguesas em África, fundamentalmente, para o Tarrafal em Cabo Verde. Esta ocorria ora como alternativa ao insuficiente número de estabelecimentos prisionais que não conseguiam acolher toda a «população condenada», ora como complemento após o cumprimento do período da pena de prisão em território nacional A Prisão A investigação sobre prisões não é um campo desenvolvido das ciências sociais, em parte causada pela dificuldade no acesso a estas instituições por parte do público. Os estudos realizados por Michel Foucault proporcionaram uma maior visibilidade do panorama prisional, aliado aos inúmeros problemas mediáticos que, nas últimas décadas, têm surgido no interior e em torno destes estabelecimentos. Como salienta Pedro Dores (2003), a persistência de queixas sobre atentados aos direitos dos reclusos em todos os sistemas prisionais conhecidos, a selectividade 25

31 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar social que acolhe nas prisões fundamentalmente os indivíduos das classes sociais mais baixas e os mais desprotegidos socialmente - o acesso à justiça é, ele próprio, fortemente condicionado pela situação socio-económica do cidadão - os mecanismos de estigmatização eficazes e inflexíveis, as maiores taxas de doenças e mortes nas prisões do que no seu exterior, a idade precoce da população encarcerada, as elevadas taxas de reincidência, permite-nos retirar, segundo este autor, algumas ilações: a necessidade de estudos científicos mais aprofundados e alargados, o facto das prisões limitarem fortemente as condições de habitabilidade dos reclusos, não se devendo esperar que sejam elas a resolver eventuais conflitos sociais. No década de 60 do século passado, Erving Goffman debruçou-se sobre as instituições totais 3 (onde os estabelecimentos prisionais se incluem) e salientou que nestes universos isolados se encontram removidas as barreiras que habitualmente separam as várias esferas da vida do indivíduo lúdica, familiar, residencial, ocupacional, privada, íntima estando estas submetidas a uma autoridade e a uma gestão comuns e onde existem outros participantes que partilham destas condições. Daí a faceta totalizante que contrasta com as sociedades urbanas e complexas, dotadas de diferenciação social e espacial nos mais variados domínios de relações, de pertenças e de identidades. Efectivamente, todos os aspectos da vida dos indivíduos reclusos são conduzidos no mesmo local, sob a mesma vigilância e autoridade. As rotinas diárias de cada interno são realizadas em co-execução com todos os demais companheiros de reclusão, submetidos a idêntico tratamento e exigência. As tarefas são rigidamente escalonadas, estruturadas, impostas, suportadas por um sistema rígido de normas formais (e informais, como veremos mais adiante), cujo cumprimento é legalmente fiscalizado por agentes dotados de autoridade. A iniciativa, o livre-arbítrio, a criatividade são balizadas, reguladas e delimitadas. Apesar de supostamente estas considerações pretenderem ser factos incontestáveis, o tratamento prisional é, defende Pedro Dores (2003), marcadamente diferenciado consoante o estatuto de cada cidadão. Este autor recorre a Pierre Bourdieu ao afirmar que as prisões não foram concebidas para acolher outras classes sociais que não as menos desfavorecidas a dos marginais marginalizados. Goffman afirma que os actores sociais na qualidade de actuantes e de seres racionais dotados de razão, preocupam-se em manter a impressão de que cumprem as normas intrínsecas pelas quais são julgados (até pelo que os seus maiores ou menores «direitos reclusos», dependem desta aceitação e do cumprimento latente das 3...lugar de residência e trabalho, onde um grande número de indivíduos, separados do mundo exterior por um período relativamente longo, levam em conjunto uma vida reclusa cujas modalidades são explícita e minuciosamente reguladas. (Goffman, 1987: 62) 26

32 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 regras internas, enfim, para alcançarem o «almejado bom comportamento» que é decisivo para se implementarem as saídas precárias, o RAVI, o RAVE 4, a liberdade condicional). Reiterando estas considerações, a acção social, no sentido Weberiano, pode ser racional por relação a fins, condicionado pelas expectativas dos comportamentos de outrém, utilizando estas mesmas expectativas como condições ou meios para a prossecução de objectivos próprios, racionalmente estruturados e reflexivos, o que demonstra que, não poucas vezes, os reclusos «actuam no palco dos comportamentos», realizando acções, cumprindo normas, regras que, na ausência de controlo institucional, seriam incumpridas. Parafraseando mais uma vez Erving Goffman (1987), os actores sociais estão despreocupados com a questão moral de cumprir as normas, focalizando-se, em vez disso, com o...o problema amoral de construir a impressão convincente de que satisfazem as normas... (Goffman, 1987: 221). Na mesma linha de pensamento, Tom Burns (2000) salienta que toda a actividade humana é gerida, em grande parte, por sistemas de regras sociais. Todavia, os actores sociais, dada a sua inteligibilidade, interpretam e accionam essas mesmas regras de acordo com os seus intuitos. Além de um constrangimento, as regras sociais normativas são também oportunidades de acção. Articulando o pensamento à acção, o indivíduo pode permitir-se alterar as regras já existentes. De facto, é inegável que os actores sociais, no âmbito da sua acção, tentam manter ou modificar as normas que encontram estabelecidas nas instituições. Na opinião de Tom Burns (2000), se os indivíduos não tentassem adaptar ou transformar as regras com que se deparam nas instituições, não haveria possibilidade de existir inovação normativa e institucional. As prisões não constituem excepção. O intuito dos estabelecimentos prisionais é, em última análise, o da punição com o encarceramento das pessoas, garantindo a protecção dos bens jurídicos ameaçados, entendidos como essenciais à vida em sociedade dos que estão em liberdade e com a finalidade, sempre reiterada mas quase nunca cumprida, de regeneração e reinserção dos delinquentes após a pena. A prisão pretende evitar os contactos funestos dos condenados com os modos de vida social degradados que sustentaram a sua delinquência... (Dores, 2003: 63), procurando reunir todos os condenados em espaços de execução de penas de cariz industrializado, afastando-os de todas as tentações que a situação em liberdade estimulava, controlando-se os custos orçamentais que provêm dos impostos públicos. A prisão apresenta-se, por inerência das suas condições, como uma instituição invulgarmente abrangente, dotada de dinâmicas específicas que a constituem como 4 RAVI Regime Aberto Virado para o Interior; RAVE Regime Aberto Virado para o Exterior. 27

33 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar uma «micro-sociedade». É uma tecnologia social feita por medida, com uma finalidade delimitada e delineada. Por conseguinte, uma prisão constitui uma comunidade artificial, dada a separação que impõe à pessoa-reclusa, privando-a do seu meio natural e obrigando-a a permanecer nesse ambiente ao qual terá de se adaptar. Neste novo meio, o cidadão é submetido a um rigoroso controlo formal e informal do tempo e do espaço, onde a maioria das actividades se transformam em rotinas e se igualizam. Espaço e tempo confundem-se em adjectivações locais que restringem a autonomia individual dos internos. Anthony Guiddens (1994) refere-nos que em instituições do tipo prisional, as esferas de competência e os níveis de autoridade do Staff, além de se desenvolverem numa base regular, encontram-se claramente demarcadas e delimitadas por uma hierarquia de funções. Todavia, como o reconheceu Goffman (1987), as dinâmicas recriadas na prisão não anulam nem substituem as exteriores, permanecendo estas como referências para os internados. As cadeias não existem isoladas e, de algum modo, as lógicas internas reenviarão para dinâmicas extra-prisionais, quer nos preocupemos apenas com o núcleo recluso, quer abrangendo a instituição como um todo. Michel Foucault (2004), por seu turno, transmite-nos que...se conhecem todos os inconvenientes das prisões e sabe-se o quanto são perigosas quando não inúteis. E entretanto não vemos o que pôr no seu lugar. Elas são a detestável solução de que não se pode abrir mão... (Foucault, 2004: 191). Em termos Durkheimianos, o aumento do número de prisões e prisioneiros numa determinada sociedade é um sintoma de «Anomia». A instituição prisional, segundo Pedro Dores (2003), poderá ser um refúgio de ressocialização para os actores sociais que coloquem em causa as normas societais que possibilitam a vida quotidiana. É a garantia da igualdade formal como resposta às...transgressões e aos transgressores, através de um sistema de transformação em tempo de prisão da culpa abstracta dos crimes cometidos em concreto; (...) espaço de investimento filantrópico e de espírito de solidariedade para com os seres humanos caídos... (Dores, 2003: 77). Loic Wacquant (2000), fala de uma sub-cultura prisional que se desenvolveria no interior das prisões e que permitiria o crescimento de ideologias desviantes, enaltecendo o tema recorrente de «prisão como escola do crime». Menciona inúmeras vezes D. Clemmer que introduziu o conceito de Prisonization (teoria da prisionização retomada por S. Messinger e G. Sykes em 1960), no qual todos os reclusos seriam afectados pelas influências criminosas inerentes à própria cultura prisional, ainda que este processo não ocorra de modo uniforme. Factores como a solidariedade entre 28

34 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 reclusos, a oposição ao Staff, a duração da pena, os laços de convivialidade afectiva com o meio exterior, a inclusão em determinados grupos desviantes, originam diferenças neste processo tanto mais ténues e tardias quanto menos intenso e exclusivo se revele o contacto com os valores desviantes da sub-cultura penitenciária... (Wacquant, 2000: 28). Os membros da população reclusa não constituem um mero agregado de indivíduos. Comunicam, interagem, reflectem, num quadro temporário de vida comunitário distinto do anterior. Esta sub-cultura tenderia a desenvolver-se como reacção às «pains of imprisonment» (dores da prisão), designadamente privações de ordem material, afectiva, autonómica, sexual, degradação do estatuto e papel do cidadão. A cultura penitenciária surgiria como uma adaptação às novas condições do internamento, funcionando como uma plataforma para a recuperação da auto-estima e da auto-imagem que constituiria um entrave à reintegração e regeneração societal dos delinquentes. Todavia, trabalhos posteriores como os de Stanton Weeler (1961), demonstram que no período inicial o recluso conforma-se com as normas e valores do estabelecimento prisional. No intermédio, constata-se uma adopção sustentada, voluntária e estruturada da sub-cultura prisional. Porém, nas etapas que antecedem a libertação iniciar-se-ia uma «desprisionação», abandonado-se gradualmente os valores do código-recluso, procurando retomar-se as regras, atitudes, práticas em uso no exterior. Estas três fases descreveriam uma trajectória em «U», tendo ficado conhecido como o Padrão U (Teoria U ou da privação). Outros autores colocaram em causa a ideologia de Weeler, afirmando que os comportamentos em U» apenas foram verificados em instituições cuja tónica se baseava na segurança e disciplina, sendo diminutos nas que privilegiavam o tratamento e a regeneração. Contudo, é inegável a importância dos seus estudos para aclarar as teorias sobre as prisões. Posteriormente, surgiram várias outras perspectivas salientando-se a que ficou conhecida como o «modelo da importação directa», onde o prévio estilo de vida dos internos (em pré-reclusão) constituiria um factor fundamental para se poder compreender os comportamentos durante a reclusão, os quais seriam reflexos de várias conjugações, práticas e representações antes da condenação. Enquanto no «modelo da privação» as representações e valores dos reclusos surgiam como reacção às privações de vária ordem originadas pelo cárcere, na perspectiva do «modelo da importação directa», as atitudes e condutas dos reclusos são transpostas do meio extra-prisional para intra-muros, devendo olhar-se também para os factores extrínsecos nas abordagens institucionais sobre a prisão. 29

35 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar Procurámos evidenciar nas páginas anteriores algumas correntes de pensamento sobre as instituições prisionais que suportaram teoricamente o nosso trabalho. 2. O ESTABELECIMENTO PRISIONAL MILITAR 2.1. Breve Contextualização Histórica 5 O EPM foi criado pelo despacho n.º 12555/2006 de 24 de Maio do Ministro da Defesa Nacional que determinou a mudança de designação de Presídio Militar para a actual designação. Assume-se o EPM, deste modo, como herdeiro do Presídio Militar criado por Decreto-Real de 7 de Fevereiro de 1895, em Santarém, numa Cadeia Penitenciária do Ministério da Justiça então cedida à Secretaria de Estado dos Negócios da Guerra para o cumprimento de pena de presídio militar, medida coerciva inovadora criada pelo Código de Justiça Militar, a qual obrigava a um regime penitenciário que envolvia segregação celular durante a noite e comunidade de trabalho durante o dia. No dia 8 de Maio de 1895 assumiu o Comando do Presídio Militar, o General de Brigada João Batista da Silva e em 25 de Maio desse mesmo ano deu entrada o primeiro condenado o Soldado António de Campos, aprendiz de músico. O Presídio Militar funcionou em Santarém durante 105 anos, ao longo dos quais cumpriram pena presos, sendo 484 da Marinha, do Exército, 328 da Força Aérea e 86 da Guarda Nacional Republicana (GNR). Em 1998, as instalações foram desafectadas do domínio Militar e restituídas ao Ministério da Justiça. Por consequência, em Janeiro de 2001, o Presídio Militar foi transferido de Santarém para Tomar, instalando-se definitivamente nas instalações da Casa de Reclusão desta cidade, desactivada para possibilitar a realização de obras de remodelação e ampliação. Este facto, obrigou a que os reclusos da Casa de Reclusão de Tomar e do Presídio Militar fossem transferidos para a Casa de Reclusão de Elvas, de onde viriam sucessivamente a ser transferidos entre 2002 e 2005, ano em que também foi desactivada aquela Casa de Reclusão. Extintas as Casa de Reclusão de Elvas e de Tomar, o EPM passou a ser o único Estabelecimento Prisional Militar em Portugal. 5 Adaptado de Estado Maior do Exército (1997) História do Encarceramento Militar Português. Lisboa: Estado Maior do Exército. 30

36 Boletim de Sociologia Militar n.º A Singularidade do EPM O Estabelecimento Prisional Militar tem determinadas especificidades que lhe configuram uma singularidade própria no panorama nacional das prisões. É dirigido e controlado única e exclusivamente por militares do Exército - e não por civis ou por militares de outro qualquer ramo - está na dependência do Ministério da Defesa apesar de alguns reclusos serem da GNR que é tutelada pelo Ministério da Administração Interna. Os presos são exclusivamente militares das Forças Armadas ou da GNR, já que a Polícia de Segurança Pública, a Polícia Judiciária, os Guardas Prisionais, Florestais ou membros de outras instituições policiais de cariz civil" são encaminhados para outros estabelecimentos. Por conseguinte, esta "micro-sociedade" dotada de uma faceta específica e totalizante, induz a que determinadas identidades exteriores sejam transpostas para o interior da prisão até pelo que os reclusos continuam a envergar os seus uniformes 6 com as patentes militares explícitas que todos conhecem e são obrigados a continuar a aceitar conferindo uma hierarquia formal que é induzida pelas instituições extraprisionais de origem. É interessante verificar que esta hierarquia formal é aparentemente respeitada, na maioria das ocasiões, apesar de todos terem consciência que muitos dos guardas são soldados cuja função é vigiar, controlar, estabelecer regras e emanar ordens que têm de ser seguidas e cumpridas por reclusos Sargentos ou Oficiais 7 (portanto, com um posto mais elevado na hierarquia formal militar). Deste modo, as lógicas internas reenviam (como veremos mais adiante) para realidades extra-prisionais que constrangem a diminuta liberdade dos reclusos e o seu livre-arbítrio. Do ponto de vista institucional, o universo em questão faz constantemente apelo a um referente que pode ser considerado como identitário, no qual se funda desde o início a componente militar. Mais propriamente, uma ideologia militarista de virtudes e de honra, que se acentua e polariza quando conjugamos o desvio, a delinquência com o uso de uniforme representativo de uma qualquer instituição ou país. A relação da prisão com esta ideologia, que se manifesta em inúmeros sentidos materiais, simbólicos e organizacionais (desde as formaturas, o cabelo aparado, a barba escanhoada, os sapatos engraxados, o uso de símbolos militares, a prática da continência e da ordem-unida), nem sempre é pacífica e apaziguadora. Como afirma Pedro Dores (2003), as prisões seriam melhor...observadas se fossem tratadas 6 Continuam a usar o seu uniforme se estiverem no activo, o que abrange a quase totalidade dos reclusos. Se os militares estiverem na situação de reserva ou reforma, trajam à civil. 7 Ver hierarquia formal militar no anexo C. 31

37 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar através de uma análise institucional, (...) observando os detidos mas também todos os outros agentes sociais envolvidos, como guardas, funcionários, técnicos, autoridades judiciais e penitenciárias, agentes sociais exteriores, familiares e amigos, organizações não governamentais. Observando-os não como quem observa um aquário ou uma jaula de jardim zoológico... (Dores, 2003: 84). Deste modo, as relações de pertença, a estratificação social, os diferentes papéis e estatutos sociais, a patente e a classe militar a que cada um pertence, a reduzida ou elevada formação académica, originam clivagens e demarcações que se acentuam com a ideologia e cultura militar. Para estes homens militares para os quais a ordem, a disciplina, o respeito, a hierarquia, os deveres cívicos sociais e militares são (ou foram em tempos) primordiais e respeitados acima de qualquer outro sentimento, é difícil aceitar e compreender o seu novo estatuto social que lhe configura um inovador papel e uma nova posição na sociedade. Com efeito, esta prisão apresenta particularidades que a demarca das demais. Não só pelos reclusos que não pertencem ao universo generalista prisional onde as fracas qualificações abundam e a taxa de reincidência é enorme como também eles não pertencem a profissões ou estratos da sociedade económica e socialmente pouco valorizados, nem a classes sociais mais desfavorecidas normalmente situadas na base da estrutura social. Efectivamente, há um afastamento dos padrões da população reclusa. Até a própria prisão militar não compadece de sobrelotação. Por outro lado, como se trata do único estabelecimento prisional central para militares (não existe outro local para onde se possa pedir transferência), muitos dos reclusos encontram-se demasiado afastados dos locais de residência e dos parentes o que fragiliza, ainda mais, a ligação com o meio familiar e social. Para preencher os dias e as horas, os reclusos podem efectuar, caso assim o desejem, algumas tarefas que estão ao seu dispor. Como não podem ser obrigados a trabalhar, aderem voluntariamente a serviços na lavandaria, na cozinha, jardinagem, carpintaria, mecânica automóvel, biblioteca (e outros inopinados e expontâneos). A este pseudo-voluntarismo, não será alheio o facto de contribuir para acesso a saídas precárias (evidentemente, após decisão do conselho técnico, formado pelo núcleo de apoio ao Comandante 8 (NAC), pelo Juiz responsável do Tribunal de Execução Penal 9 (TEP) e por Técnicos da Direcção Regional de Inserção Social). Todos sabem para que locais se devem dirigir após o pequeno-almoço e a formatura de início de trabalhos pelas nove da manhã, à excepção de um interno que optou por não efectuar 8 O NAC é constituído pelo Comandante, 2º Comandante, Chefe da Secção de Pessoal, Oficial de Justiça, Psicólogo, Comandante da Companhia de Comando e Serviços (em representação do Comandante do PGS) e o Sargento-mor do Estabelecimento. 9 Existem Tribunais de Execução Penal em Lisboa, Porto, Évora e Coimbra. 32

38 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 quaisquer actividades. Estão permanentemente acompanhados por um militar PE do PGS, caso se encontrem em Grau de Confiança limitado 10 ou se estiverem em locais que possuam materiais perigosos (contudo, todos os reclusos, por decisão do actual Comandante, são acompanhados permanentemente quando se encontram no exterior do bloco prisional). Todavia, estas tarefas efectuadas pelos internos contribuem, fundamentalmente, para a manutenção e reprodução do sistema prisional assumindo apenas uma dimensão mecânica e elementar, não se revestindo de um carácter formativo e qualificativo que seja facilitador de uma futura reinserção ou ressocialização profissional, aumentando as hipóteses de empregabilidade (para os internos que não possam ser re-inseridos nas suas instituições profissionais de origem). Deste modo, num contexto desta natureza torna-se difícil a um cidadãorecluso, dadas as vulnerabilidades sociais de que é detentor, exponenciadas pela estigmatização que a prisão confere, garantir a sua empregabilidade se, na prisão, não existir uma dinâmica direccionada para esse objectivo. Esta é uma temática que poderá gerar futuras investigações e que não será abordada no decorrer desta dissertação. O EPM está fisicamente dividido em dois grandes sectores: o bloco Prisional, onde co-habitam os reclusos e a ala do Comando, Estado-Maior e Serviços, onde funcionam todas as áreas de apoio, suporte e sustentabilidade do estabelecimento. Estas duas alas apenas têm comunicação através de uma enorme porta que se encontra vigiada presencialmente por um militar do PGS vinte e quatro horas por dia (apenas a ala do Comando, Estado-Maior e dos Serviços tem ligação aos pátios exteriores). Curiosamente, o comandante e o 2º comandante não podem estar simultaneamente no interior do bloco prisional, devido a condicionalismos de segurança. O EPM tem capacidade para 78 reclusos sem, contudo, haver qualquer sobrelotação, dividido em ala prisional para reclusos condenados e ala prisional para preventivos. Nestas duas áreas existem alojamentos específicos para Oficiais, Sargentos e Praças e, dentro destes, separação entre militares masculinos e femininos 11. A dimensão das celas, os materiais utilizados, as camas e os armários mudam conforme visitamos cada um destes locais. Passamos de camas de ferro para 10 Os reclusos envergam junto ao galão ou divisa do ombro direito uma braçadeira com uma cor específica. Reclusos com grau de confiança reservado cor vermelha; não podem sair do bloco prisional; grau de confiança limitado cor amarela; estão autorizados a sair do bloco prisional com vigilância física permanente; grau de confiança pleno verde; estão autorizados a circular sozinhos, dentro de determinados locais que não possuem materiais considerados perigosos. A alteração do grau de confiança é da responsabilidade do NAC, é proposto à consideração do Comandante e, em caso afirmativo, é publicado em Ordem de Serviço Interna. 11 A Constituição Portuguesa obriga a que haja separação física entre reclusos preventivos e condenados. Não existem militares femininos em situação de reclusão. Porém, os alojamentos destinados para este efeito estão libertos e prontos a serem ocupados a qualquer momento. Também existe uma cela preparada para receber um Oficial-general. 33

39 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar camas de madeira. O chão deixa de ser mosaico para passar a ser também de madeira. A alimentação, todavia, é igual para todas as pessoas, sejam elas reclusas ou funcionários do estabelecimento. É confeccionada pelos mesmos indivíduos (com auxílio de alguns reclusos), utilizando-se os mesmos géneros alimentícios e os mesmos utensílios e quantidades. Como não há necessidade de aumentar a lotação de cada cela que deverá estar sempre pronta para inspecção (pronta para revista), cada preso tem o seu próprio quarto com casa de banho, não havendo necessidade de partilha de quaisquer bens desta natureza....as camas devem estar sempre feitas e a área da casa de banho limpa e agradável.(...) Os reclusos devem deixar a porta da cela fechada quando se ausentam por qualquer motivo. Pode ser efectuada revista a qualquer hora do dia ou da noite... (Estabelecimento Prisional Militar - Normas de Execução Permanente, 2004: 3). O convívio deverá fazer-se no bar dos reclusos ou nos corredores, devendo evitar-se a entrada na cela de outros internos. Encontrámos dispositivos organizacionais que marcam de maneira recorrente o seu quadro de vivência. Por um lado, há a constante preocupação com o bem-estar físico e mental dos reclusos. Consultas médicas com periodicidade no local ou no hospital militar (existe ainda a possibilidade de haver deslocamentos a clínicas privadas na área da cidade, desde que seja o recluso a suportar os seus custos), um enfermeiro que faz parte do quadro orgânico, possibilidade diária da prática de desporto, acompanhamento psicológico e jurídico. Desta forma, existiam indícios que o estabelecimento, aparentemente, tinha adoptado um modelo que se orienta por aspectos terapêuticos, tendo por objectivo o tratamento dos delinquentes, como salienta Stanton Wheeler (1991), relegando para segundo plano outra tendência que se centra na disciplina, controle e segurança. O EPM estaria mais próximo do denominado modelo terapêutico, em declínio desde os anos setenta do século passado dado não haver produzido os resultados esperados. Contudo, à medida que se desenvolvia a observação 12 e fomos notando um aumento considerável na quantidade e qualidade de informação contida nas pequenas conversas informais, concluímos que seria inevitável não haver uma componente de segurança, controle e disciplina que não se sobrepusesse ao teor terapêutico, ainda mais sabendo que se trata de um estabelecimento de cariz essencialmente militar. Estes argumentos servem de base a que um vasto leque de actividades quotidianas sejam sujeitas a uma gestão minuciosa que estabelece formalmente a restrição da autonomia individual dos reclusos. Mesmo no meio exterior, a fronteira que delimita o domínio privado do público é flexível e não se estabelece de maneira 12 Passagem da fase de identificação e de adaptação, à fase de integração, segundo António Firmino da Costa (1986). 34

40 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 idêntica para todos os indivíduos. Na prisão, ela é institucionalmente diluída e legitimada pelo argumento da segurança. A regulamentação variada e minuciosa através de normas de execução permanente (NEP) é um destes dispositivos que contribui para que outros regulamentos vão aparecendo a um nível inferior, procurando responder a novas situações da vida prisional. No EPM conseguimos encontrar certos aspectos apontados na literatura sobre a sub-cultura prisional de que falámos nas primeiras páginas deste trabalho. Porém, apresentam-se mais fluídos e sem organizar os quadros extremos que foram apresentados. Existe alguma coesão e formação de grupos entre alguns reclusos, havendo uma nítida demarcação de uns para com outros. Julgamos que a aproximação é fundamentalmente baseada no interesse e não induzem à constituição de grupos com grande intensidade (excepção feita a um pequeno grupo de três elementos de que falaremos mais adiante), providos de alguma identidade colectiva e funcionando em regra de forma coesa. Neste sentido, existe um fenómeno de ausência de solidariedade generalizada já que os reclusos pouco mais têm em comum do que serem militares e estarem recluídos. E no EPM, esta circunstância não se manifesta no sentido de os unir. Ela significa o facto de terem delinquido, avaliado de modo diverso consoante seja questão do próprio recluso ou dos restantes (todos os reclusos são sabedores, por via directa ou indirecta, do crime dos outros e da sua extensão). A desqualificação mútua é modulada pela gravidade do tipo de crimes que varia com o ponto de vista de quem os avalia (excepto pedofilia e violação que reúne a reprovação geral, não existindo nenhum recluso a cumprir pena desta natureza). Vinculado ao tipo de acto desviante cometido pela pessoa que se pronuncia sobre os de outrém, os modos de hierarquização são múltiplos e por isso nem sempre coincidem com a hierarquia formal militar ou a ordenação jurídico-penal (contudo, quando pretendem fazer chegar algum pedido especial ao comandante é respeitada a hierarquia militar e é o recluso com patente mais elevada que dirige esse pedido em nome de todos os outros). No capítulo quatro, teremos oportunidade de abordar estes condicionalismos de maneira mais pormenorizada. De seguida, iremos debruçar-nos sobre questões de índole metodológico Explicitação Metodológica A finalidade deste capítulo reside na justificação do caminho percorrido no âmbito dos métodos e técnicas utilizadas no decorrer da investigação. Por conseguinte, é nosso objectivo determinar quem é o cidadão-recluso que se encontra no EPM, em função de um conjunto de características sócio-demográficas e jurídicoprisionais, designadamente a idade, posto, habilitações literárias, situação na 35

41 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar profissão, instituição de origem, duração e tipo de pena. Pretendemos, inclusivamente, perceber quais as condições de vida dos reclusos tipo de tratamento dado pelo staff/guardas, horários, fardamento, rotinas, comportamentos, alojamentos e habitabilidade, alimentação. Procurámos analisar, entre outros factores, as situações penais e prisionais, designadamente as que se inserem em dinâmicas de reincidência criminal, a particularidade de serem indivíduos oriundos de instituições de cariz eminentemente militar, que comungam de orientações semelhantes. Analisámos as preocupações, avaliações, comportamentos, rotinas, horários, condições de vida dos reclusos. Foram objecto de apreciação as condições gerais da prisão, o tratamento dado pelo «staff prisional», o acesso à saúde, as principais reivindicações dos encarcerados. Tentámos perceber se as hierarquias internas decorrem das patentes que cada um possui e se os diferentes estatutos, papéis ou posições prévias ao encarceramento orientam as posições e as interacções locais. Tendo consciência da estigmatização social provocada pela prisão, das vulnerabilidades societais que estes cidadãos-reclusos apresentam, exponenciada pelo uniforme que usam e poderão ou não continuar a envergar, torna-se imprescindível determinar quem é o cidadão-recluso-militar. Quais as vulnerabilidades a que estão sujeitos? Como são tratados pelo staff prisional? Quais as condições em que co-habitam? Que direitos e deveres possuem? Serão reclusos com especificidades próprias? A natureza dos seus crimes é singular? Que noções orientam as suas atitudes, comportamentos e emoções?o estudo visa a população do EPM, sendo portanto, um estudo de caso. Salientamos o facto de termos optado por uma estratégia metodológica traduzida numa pesquisa de carácter quantitativo, recorrendo fundamentalmente a técnicas de pesquisa não documentais como a observação participante. Apenas desta forma conseguimos alguma profundidade de análise ao observar os locais, os objectos, símbolos, as pessoas, actividades, comportamentos e interacções, acontecimentos, situações, ritmos e dinâmicas sociais. Assim, conseguimos alguma flexibilidade e permitiu-nos alternar de estratégia e seguir novas pistas que entretanto apareceram. Apenas deste modo conseguimos ter acesso oportuno a determinados espaços sociais que se revelaram de extrema pertinência. Procurámos sempre ter presente o risco de envolvimento do observador que algumas vezes se tornou excessivo, não se salvaguardando o necessário distanciamento científico-metodológico. Admitimos que nem sempre conseguimos manter esse distanciamento. Todavia, julgamos que as desvantagens e os riscos desta estratégia metodológica foram superados face aos resultados obtidos. 36

42 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 Utilizámos também a observação não participante recorrendo à entrevista não directiva, semi-directiva e directiva e ao inquérito por questionário de modo a aumentar a intensidade de análise. Efectuámos, inicialmente, uma entrevista nãodirectiva ao Comandante do Estabelecimento quando ainda nos encontrávamos numa fase exploratória. Posteriormente, à medida que o conhecimento se foi intensificando, realizámos entrevistas semi-directivas ao Comandante do Pelotão de Guarnição e Segurança, ao Sargento deste Pelotão e à Psicóloga do Estabelecimento. Numa fase mais avançada da investigação, voltámos a entrevistar estes três últimos intervenientes, recorrendo à entrevista directiva, onde se intensificou o grau de directividade das questões, procurando-se estruturar e descodificar alguns sentidos. Pareceu-nos igualmente útil, para o melhor conhecimento da realidade prisional, inquirir todos os reclusos, apesar de termos consciência, como nos adverte Pedro Dores (2003), que também deveríamos inquirir outros protagonistas como o estado-maior, os elementos do posto de socorros e outros agentes sociais envolvidos como os familiares e amigos, técnicos do instituto de reinserção social e organizações não governamentais, de modo a poder compreender os comportamentos e a especificidade reclusa de uma forma mais abrangente e completa, tendo por base também factores extrínsecos que não podem ser dissociados das abordagens institucionais sobre as prisões. Todavia, tivemos consciência, desde a primeira hora, que não conseguiríamos ser tão ambiciosos. Não houve recusas, em parte devido à acção do comandante que, pessoalmente, explicou aos reclusos os objectivos que se pretendiam alcançar. Formulámos algumas hipóteses, nomeadamente: H1 - O tratamento dado pelos guardas/staff aos reclusos-militares terá especificações e orientações diferentes, tornando-se mais respeitoso, formal e cordial à medida que se sobe na hierarquia militar. Este factor será preponderante relativamente aos demais, designadamente a duração da pena e tipo de crime; H2 - as rotinas, fardamentos, alimentação, horários serão idênticos para todos os reclusos. Admitimos, contudo, que a hierarquia militar formal corresponderá à hierarquia informal/subterrânea no relacionamento entre pares; H3 - partimos do pressuposto que a quantidade de reclusos será inversamente proporcional ao seu escalão etário, ou seja, haverá uma maior percentagem de reclusos jovens e solteiros; H4 - acreditamos que os reclusos apresentam habilitações literárias baixas, sendo maioritariamente pertencentes à classe de praças. Procurámos desenvolver conversas informais com praticamente todos os reclusos em variadíssimas situações e em distintas horas do dia. Ouvimos as suas 37

43 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar histórias de vida, apesar de alguns não quererem abordar nem a sua vida pessoal nem a da sua família, refugiando-se na evasão e no silêncio. Alguns destes indivíduos possuem grandes conhecimentos ainda que a maioria não tenha frequentado mais do que os primeiros ciclos do ensino básico - conhecimentos que não foram aprendidos nem nas escolas nem nas bibliotecas e que nem sempre são positivos ou benéficos. As habituais preocupações de fiabilidade e validade dos dados obtidos na realização de inquéritos tiveram de ser reforçadas, garantindo de forma especialmente cuidadosa a total confidencialidade das condições de inquérito e o anonimato das respostas, bem como prevenir a utilização da informação para outros fins que não o meio académico. De realçar a fuga quase sistemática a questões abertas que requeriam a opinião dos internos, especialmente quando se referiam aos co-reclusos, ao PGS e ao comando do EPM. O meio prisional é, com efeito, um contexto muito específico, contribuindo para situações de fechamento e de defesa, a começar pelo próprio acesso a esta realidade. Todos, porém, não se inibiram de dar a sua opinião sincera, honesta, de uma forma directa ou não, sobre as instalações, comida, injustiças, mágoas, ressentimentos, resignações, meditações. 3. ANÁLISE SOCIO-DEMOGRÁFICA DOS RECLUSOS 3.1. Feminilidade Ausente, Escalão Etário Mediano A amostra é composta pela totalidade dos reclusos do EPM à data da aplicação do questionário, não tendo havido quaisquer recusas. A análise da figura 1 permite observar a dimensão verdadeiramente assimétrica que existe entre os dois sexos. De facto, a população é totalmente composta por homens não tendo havido, na Figura 1 Sexo dos Inquiridos história das prisões militares portuguesas, a N=26 Sexo Masculino ocorrência de quaisquer encarceramentos de militares do sexo feminino. A esta ausência de mulheres militares encarceradas ao longo da história nacional não será alheio o facto do seu ingresso nas FA ter ocorrido praticamente na última década do século passado 13. De facto, as FA têm secularmente desempenhado um papel normativo de masculinidade que tem 13 A primeira experiência militar de mulheres portuguesas ocorreu com as enfermeiras paraquedistas da Força Aérea Portuguesa (FAP) em 1961, apesar desta colaboração ter sido circunscrita ao desempenho de tarefas fundamentalmente de apoio. 38

44 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 Figura 2 Escalões etários dos inquiridos Anos Anos Anos 17 Mais de 55 Anos Frequências vindo a sofrer alterações nos últimos anos. Com efeito,... a presença da mulher (...)tem vindo a constituir um elemento estruturante do universo simbólico-cultural sobre o qual se desenham, em contexto militar, valores e representações sobre os papéis socialmente adequados a homens e mulheres... (Carreiras, 1997: 49). Esta é uma matéria aliciante que poderá ser desenvolvida em futuros trabalhos. A idade dos inquiridos está compreendida entre os 26 e os 56 anos e a média de idades é de aproximadamente 46. Como podemos depreender pela análise da figura 2, a maioria dos internos situase no escalão etário dos anos (17 indivíduos), enquanto os restantes dividem-se, sensivelmente, por categorias mais jovens (4 elementos em cada), havendo apenas um interno que possui mais de 55 anos. Ao compararmos estes dados com os da população reclusa masculina portuguesa 14 que ocupa as prisões civis, verificamos que a maioria situa-se no escalão etário dos anos (38,0%) enquanto apenas 8,7% se encontra no grupo dos anos. Deste modo, assistimos a uma diferenciação entre os reclusos militares e os civis. Os primeiros são, de uma forma geral, mais velhos que os segundos. Esta evidência coloca em causa uma das nossas hipóteses de partida, uma vez que pressupúnhamos a existência de uma maior percentagem de reclusos militares jovens, o que não se verifica. A população do EPM apresenta baixos níveis de escolarização, apesar de todos terem completado o 1º ciclo do ensino básico. Porém, ter o 1º ciclo incompleto ou não saber ler e escrever eram factores de exclusão, mesmo na altura em que os indivíduos mais velhos passaram pelo processo de admissão na instituição respectiva. Se somarmos os que possuem o 1º e o 2º ciclos, a frequência aumenta para 13 indivíduos (50,0%). À medida que vamos subindo no escalão etário, vamos tendo uma maior frequência de indivíduos que apenas possuem o 1 o ou 2º ciclos do ensino básico. Inversamente, nos reclusos mais jovens verificámos uma subida da escolarização que se situa, todavia, ao nível do secundário, havendo apenas um recluso que possui frequência universitária (pós-graduação). O facto da frequência escolar variar na razão inversa da idade, traduz o incremento da escolarização na sociedade portuguesa dos últimos anos. Estas baixas qualificações têm uma intima 14 Para mais informações consultar TORRES, Anália; GOMES, Maria do Carmo (2002) Droga e Prisões em Portugal. Lisboa: CIES/ISCTE. p

45 Frequência Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar relação com a predominância das patentes que se situam nos postos mais baixos da hierarquia militar. Apenas dois elementos não pertencem à classe de praças (1 oficial superior e um sargento). Os restantes vinte e quatro internos apresentam o posto de soldado (dezasseis), marinheiro (três) e cabo (cinco). Por consequência, uma das nossas hipóteses de partida foi corroborada, ou seja, os reclusos apresentam habilitações literárias baixas pertencendo maioritariamente à classe de praças. Quando comparamos as habilitações Figura 3 Classe Social de ascendência literárias dos presos militares com as da população reclusa civil, temos consciência que existem cerca de 11,7% de presos civis que nunca frequentaram a escola, apesar de 4,6% destes saberem ler e escrever. Como mencionado anteriormente, os militares não podem ser admitidos nestas condições, pelo que, à partida, estamos a efectuar paralelismos com condições prévias dissemelhantes. Todavia, excepção feita a estes, cerca de 27,3% têm o 1 o ciclo e 29,3% o 2º ciclo do ensino básico (somam 56,6% EDL TI EE OO Classe social de ascendência enquanto os militares se situam nos 50%), não existindo uma clara demarcação neste ponto. No que se refere ao secundário, assistimos a uma nítida desvantagem dos reclusos civis (7,5%) contra os 30,8% dos militares que possuem este nível de ensino. Os baixos níveis de escolarização atingidos pela população reclusa aproximam-se dos valores existentes na generalidade da população residente. Este reduzido capital escolar característico da população reclusa permite antecipar algumas dificuldades de re-integração social - pelo menos para aqueles que não serão re-incluídos nas suas instituições de origem - tendo em consideração as exigentes condições do mercado de trabalho em termos de competências e qualificações. A maioria dos internos militares pertence à GNR (19 elementos), seguido da Marinha (4 internos) e do Exército (3 reclusos). A Força Aérea, presentemente, não está representada neste universo recluso Classe Social, Nacionalidade, Residência O agregado familiar de ascendência dos reclusos pertence maioritariamente ao «Operariado» 15, como podemos verificar na figura 4.o que se refere à nacionalidade, 15 Segundo António Firmino da Costa (1999), existem variáveis primárias de categorização de classe (profissão e situação na profissão), as variáveis primárias complementares de categorização de classe (meios de vida, situação perante o trabalho, 20 40

46 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 dezoito internos nasceram em Portugal, o que perfaz a grande maioria, tal como verificado nas prisões civis. Seis reclusos declararam nascer nas ex-colónias portuguesas - Angola, Moçambique e Guiné-Bissau com três, dois e um elemento respectivamente e dois inquiridos nasceram em países da União Europeia. De salientar que por exigência de admissão às respectivas instituições, todos os militares possuem nacionalidade portuguesa. Por outro lado, relativamente ao distrito de nascimento e residência, assistimos a uma distribuição geográfica relativamente assimétrica, não havendo indícios de estarmos em presença de uma tipologia que relacione o sujeito ou acto desviante a determinada região do país. O distrito de residência mais representado é Faro com cerca de cinco indivíduos, seguido de Lisboa e Leiria, ambos com quatro e Setúbal com três internos. Esta especificidade contraria o que observamos nas penitenciárias civis, onde existe uma sobrerepresentação das regiões de Lisboa, Vale do Tejo, Porto e Algarve. Os recluídos militares não residem, de uma forma geral, em grandes centros urbanos devido à grande dispersão geográfica das unidades e postos militares, o que lhes proporciona outras alternativas de residência que não as grandes metrópoles. Neste pressuposto, as características sociais, culturais, económicas, típicas dos grandes centros urbanos e que normalmente se constituem como catalisadores para a prática de actos desviantes não parecem, neste universo militar, contribuir de forma directa para o aumento do número de prevaricadores. Outro pormenor que necessita de realce é o elevado número de presos preventivos, sendo cerca de doze num universo reduzido de reclusos militares. Esta situação penal incerta, indefinida, origina situações de alguma ansiedade pois reflecte uma indefinição jurídico-penal que poderá levar a uma eventual condenação ou libertação. Esta angústia da incerteza leva a que muitos dos preventivos se mantenham pseudo-ausentes, pensativos, abstraídos nos seus pensamentos e tarefas, preocupando-se quase exclusivamente com a sua defesa jurídica. Nas prisões civis, de acordo com Anália Torres e Maria do Carmo Gomes (2002), o número de preventivos ronda os 28% enquanto o de condenados situa-se nos 72%, havendo um grupo residual de 0,3% que acumula as duas situações. O número de condenados é substancialmente superior ao de preventivos, o que não acontece no EPM, havendo quase uma sobreposição ou replicação destas duas quantidades. escolaridade, posição hierárquica, dimensão da empresa, ramo de actividade) e as variáveis adicionais de categorização de classe (idade, sexo, residência, naturalidade, composição e dimensão do agregado doméstico). Na construção do indicador socioprofissional de análise (Costa, 1999: 276), levou-se em linha de conta as variáveis primárias situação na profissão e profissão tendo-se chegado a uma matriz de construção do indicador socioprofissional individual (ISPI) e familiar de classe (ISPF). Com efeito, no primeiro caso temos cerca de sete lugares de classe distintos: EDL (empresários, dirigentes e profissionais liberais), PTE (profissionais técnicos e de enquadramento), TI (trabalhadores independentes), AI (agricultores independentes), EE (empregados executantes), O (operários), AA (assalariados agrícolas); no segundo caso, temos a acrescentar mais três lugares de classe: os TIpl (trabalhadores independentes pluri-activos), AIpl (agricultores independentes pluri-activos) e os AEpl (assalariados executantes pluri-activos). 41

47 Frequência Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar Os casados representam a quase totalidade da amostra com cerca de dezanove indivíduos, seguido dos divorciados/separados com cinco, dos solteiros e viúvos, ambos com apenas um caso (não existem casos de vivência em «união de facto/juntos»). Esta singularidade distancia-se da predominância de solteiros que representam quase 51% da amostra de reclusos que se encontram a cumprir pena em estabelecimentos prisionais civis. Mesmo que somemos aos casados (20,0%) a percentagem dos que declaram viver em união de facto/juntos (14,4%) obtemos apenas 34,4% diferindo substancialmente do valor percentual dos solteiros. O que sobressai de forma mais evidente é o facto dos laços formais, como o casamento, ter uma expressão elevada no EPM, o que não será alheio ao facto dos reclusos terem a vida relativamente estável, sólida e organizada, apresentando idades superiores aos 46 anos e mais de vinte e um anos de trabalho desenvolvidos na instituição respectiva. Efectivamente, dezassete internos declaram estar na instituição há mais de vinte e um anos, havendo três reclusos, inclusivamente, que ultrapassam os trinta e um anos de serviço. Por conseguinte, a realidade Figura 4. Tipo de agregado familiar família nuclear Fam.nuclear alargada Família monoparental outr modelo familiar Agregado familiar reclusa militar difere da civil na medida em que no EPM predominam os casados, enquanto nas prisões civis os solteiros estão substancialmente em maior quantidade. Tendo em consideração o tipo de agregado familiar, cerca de quatorze internos declaram viver em família nuclear e seis numa família nuclear alargada; doze assumem ter apenas um filho enquanto nove têm dois. A grande maioria habita em casa própria (vinte e um internos), apesar de dois pernoitarem na unidade onde prestam serviço e outros dois viverem em casa dos progenitores. Em termos do número de elementos que compõem o agregado familiar, dezoito indivíduos estão incluídos em agregados compostos por duas ou três pessoas (nove internos quer no primeiro quer no segundo caso). De destacar a elevada frequência de indivíduos (dezanove) que declaram viver com a sua companheira/esposa antes da reclusão. Por conseguinte, podemos concluir que a maioria dos reclusos estava inserida em redes familiares e sociais relativamente próximas e estáveis. Tal facto não difere substancialmente do que encontramos nas penitenciárias civis. Efectivamente, de acordo com Anália Torres e Maria do Carmo 42

48 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 Gomes (2002), apenas 21,6% dos reclusos civis admitem viver sozinhos ou com terceiras pessoas não afectivas, 46% vivia em casa própria e 39% na companhia dos pais. O tempo médio de permanência na prisão militar é de 1 ano e três meses. Nove elementos encontram-se entre o primeiro e o segundo ano de reclusão, enquanto seis internos situam-se no segundo semestre da pena. Apenas um elemento se encontra no estabelecimento há mais de três anos (mais concretamente há quatro anos e um mês). Nas prisões civis, o tempo médio de permanência é 29 meses e meio, encontrando-se 38,9% entre o primeiro e o terceiro ano da pena e 31,9% recluídos há menos de um ano, perfazendo quase 71% dos internos que se encontram encarcerados há menos de três anos. No EPM, se somarmos todos os militares com menos de três anos de permanência atingimos os 96% (cerca de vinte e cinco elementos), o que comprova que as duas realidades apresentam algumas diferenças neste pormenor Avaliação do EPM, Adaptação, Diferenciação de Tratamento Vejamos então, como se distribuem as opiniões sobre o EPM relativamente a vários domínios. Ao serem convidados a posicionarem-se numa escala de «Mau, insuficiente, razoável» até ao «bom» 16, verificamos pela análise das figuras que a alimentação, a saúde, o relacionamento entre reclusos, a relação com o PGS e com o comando do estabelecimento reúnem o maior desagrado por parte dos internos. Deste conjunto, destaca-se a relação com Figuras 5 e 6. Como avalia cada um dos aspectos sobre o EPM? Aliment ação 5 21 Desport o 20 5 Act ividades 22 4 Bom/ razoável Saúde 7 19 Insuf icient e/ mau Visit as 26 0 Higiene 26 0 o comando que reúne a opinião de vinte e três internos que a classificam como «insuficiente ou má». O mesmo poderá ser dito em relação à alimentação com um rácio de vinte e um para cinco. Em contraposição, o sistema de visitas, as condições de higiene gerais, a sala de convívio e o alojamento reúnem o consenso em torno do «razoável/bom». Ao serem interrogados sobre se estariam ou não adaptados à vida prisional, apenas três elementos responderam afirmativamente. Praticamente todos admitem ter saudades da família e não ter acesso a determinados bens materiais que lhe causam alguma necessidade, 16 Esta variável foi recodificada e aglutinou-se as respostas em «insuficiente/mau e razoável/bom». 43

49 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar o que seria de esperar. Todos, sem excepção, afirmam não sofrer qualquer tipo de maltrato. Contudo, é de ressalvar o elevado número que declaram «não se dar bem com outros reclusos», o que nos permite antever o ambiente vivido em co-reclusão. No capítulo seguinte falaremos mais em pormenor deste assunto. Procurámos saber se, na opinião dos reclusos, haveria diferenças de Relacão com Comando 3 23 Relacão com PGS Relacão entre reclusos Bom/razoável Insuficiente/mau Sala convívio 24 2 Alojamento 24 2 tratamento institucional no EPM. Cerca de vinte e três responderam afirmativamente. Uma análise de conteúdo dos questionários permitiu concluir, curiosamente, que dois dos três internos que declararam «não haver diferenças de tratamento» possuem os postos mais elevados, o que poderá proporcionar uma falsa percepção dos favorecimentos a que eventualmente estejam sujeitos. A patente e «ser graxista» são os dois factores que, na opinião dos reclusos, mais contribuem para a diferença de tratamento (ambos com vinte e três respostas afirmativas e três não-respostas), seguido da familiaridade com o PGS (dezanove) e o bom comportamento (dezassete). Em oposição, o tempo de pena, a instituição de origem e a idade, são os pontos que menos contribuem para alterações no tratamento institucional. Parece ser claro que, tendencialmente, estamos em presença de uma inequívoca analogia entre os postos dos reclusos, o modo como reagem às ordens e solicitações do PGS e as relações sociais e institucionais que daí resultam. Ao serem interrogados sobre a sua percepção de actividade/inactividade apenas um elemento se assumiu como «inactivo». Com efeito, vinte reclusos classificam-se como «activos» e dois assumem-se mesmo como «muito activos». Nas actividades de livre iniciativa desenvolvidas pelos reclusos nas horas livres, destacam-se tarefas como a leitura, a prática do desporto e a visualização de programas televisivos. O coleccionismo, o estudo e a escrita são as actividades que menor adesão têm entre os recluídos, seguido das práticas religiosas e do uso do computador. 4. SITUAÇÕES PRISIONAIS PRÁTICAS E REPRESENTAÇÕES 4.1. Modos de Vida Encarcerados a Chegada As fronteiras materiais e imateriais da prisão delimitam um quadro temporário de vida específico dotado de relativa autonomia e, cumulativamente, um corolário de relações sociais com dinâmicas próprias. A nossa própria permanência no interior dos locais de lazer e de habitabilidade causava alguns constrangimentos que foram 44

50 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 sofrendo alterações ao longo das semanas. Da desconfiança inicial silenciosa e quase absoluta, onde os reclusos procuraram por à prova a nossa fiabilidade, supondo que trabalhávamos de acordo com orientações do Staff, dada a nossa razoável liberdade de circulação, deparámo-nos com alguns relatos (muitas vezes próximos da calunia que na maioria das vezes, sabemo-lo agora, eram infundados) de actividades ilícitas quer de militares do PGS quer de alguns co-reclusos. Fomos ouvindo uma série de lamentos e argumentações contra a má alimentação, a falta de actividades ocupacionais mais dinâmicas, a ausência de reinserção social, saídas precárias para uns e não para outros, a repressão, o tipo de desvio de uns e de outros, as injustiças do PGS, as diferenças de tratamento e de condições, as excessivas formaturas, o desmesurado atavio, as horas de desporto insuficientes. Deste modo, as primeiras situações mais formais de entrevista foram algo desapontantes. A permanência no terreno e as sucessivas conversas individuais (ou em grupo) foram contribuindo para que a deambulação inicial, onde pouco se apurou e produziu, desse lugar a uma maior precisão das questões (e também das respostas), demonstrando algum interesse subreptício de que as suas queixas chegassem além-muros ou fossem, efectivamente, escutadas. Em praticamente todos os momentos que estivemos mais próximos, sentimos uma necessidade premente de afirmação de uma identidade não desviante e de clara demarcação face aos demais co-internos. Apesar de não se falar abertamente do teor e da duração das penas, denotámos uma inequívoca tentativa de recomposição de um carácter ou de uma identidade positiva (porventura, perdida ou enfraquecida) e de requalificação da sua ordem social legítima em que se pretendem re-inscrever. Uma das facetas preponderantes do dispositivo estigmatizante que encontrámos no interior da cadeia foi, precisamente, este processo de demarcação individual face ao conjunto de co-internados, a par de outros aspectos como o repúdio e a condenação dos crimes alheios. Quando um cidadão militar entra no EPM e se «transforma» em recluso, após decisão do TEP, é recebido pelo graduado de serviço e inicia um período de «quarentena» (que poderá durar, no máximo, até 72 horas) numa cela individual e específica para esse fim. Ali, afastado dos demais reclusos e despojado dos seus pertences que ficam à guarda do PGS, recebe apoio psicológico e médico (pela psicóloga e pelo médico do estabelecimento), tendo em vista avaliar o estado físico e mental do indivíduo. Nesse período, são-lhe transmitidas as regras básicas que lhe balizarão os próximos tempos. Horas de formaturas, refeições, fardamentos, enfim, restrições e liberdades. São lidas e relidas as NEP do EPM. 45

51 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar Após algum tempo de observação e de conversas informais, chegámos à conclusão que houve alguns casos em que o período de 72 horas se alargou por vários dias a mais, sob justificação de que os outros reclusos não gostavam do tipo de desvio que tinha sido cometido pelo novo interno. Com receio de algumas represálias, os responsáveis alargaram este período de clausura individual. Outros casos houve em que, devido ao mau comportamento, à revolta interior que se materializava em injúrias contra os militares do PGS e a algumas acções, porventura, irreflectidas - como o próprio veio a admitir - foi tomada a decisão de perpetuar esta condição até que os ânimos esfriassem. De realçar que nesta «quarentena» inicial, é permitido ao novo recluso apenas algumas horas no pátio interior. Algumas queixas contradiziam, contudo, aquilo que me tinha sido assegurado, apesar de, no início, não se revelaram como tendo muita credibilidade. Porém, com a insistência vindo de diferentes internos, resolvi não negligenciar estas considerações:...assim que entramos, tiram-nos tudo e põem-nos no buraco. Estive lá 5 dias e uma noite. Já estava farto. Não via ninguém, só o soldado da guarda. Queria ir-me embora, mas não podia. Chamei alguns nomes aos soldados vinha com a cabeça perdida. Estava lixado. Nunca vi o médico nesses dias. A Alferes Drª. [referindo-se à psicóloga] vinha muitas vezes falar comigo. É boa pessoa e ajuda-nos. Só falei com o sargento-enfermeiro na 2ª ou 3ª manhã (já não me lembro bem). Só queria saber se consumia drogas ou se era alcoólico. Disse que não, que só fumava tabaco, mas ele continuava a perguntar o mesmo e a olhar-me de cima para baixo.... Confirmámos presencialmente que o médico deveria vir ao estabelecimento um dia por semana e sempre que chegam novos reclusos. Muitas vezes não o faz. Aparece quando tem indicações do staff para o fazer. É um médico civil que exerce a profissão na cidade e que, por avença, ministra consultas na prisão. Quanto às funções de enfermeiro, previstas como permanentes no EPM, são asseguradas pelo sargentoenfermeiro de uma unidade militar das proximidades, fazendo, por inerência e em acumulação, também serviço no estabelecimento. Após o período de quarentena, é colocada a todos os novos reclusos a braçadeira vermelha no ombro direito (símbolo do grau de confiança reservado), sendo alojados na parte do bloco prisional que se adequa à sua situação jurídica-penal e à sua patente. Presos preventivos separados dos condenados e ala prisional respectiva consoante se trate de um Oficial, Sargento ou Praça. Fala-se de um caso que, todavia, já não se encontra no EPM, em que um sargento manifestou o desejo de ser alojado junto dos seus camaradas soldados, pois o desvio tinha sido consumado em conjunto. Apesar dos pedidos verbais e escritos, o comandante em exercício não autorizou a mudança de instalações, afirmando que...não ajudaria na manutenção da 46

52 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 auto-imagem, postura e conduta-militar do sargento e que iria abrir um precedente que a meu ver [no do comandante] seria injustificável e imprudente... (retirado do dossier de despachos do antigos comandantes). As alas destinadas a condenados e preventivos não diferem substancialmente uma da outra. O mesmo não poderá ser dito quando comparamos as celas de Oficiais, Sargentos e Praças. Enquanto que as destinadas a estes últimos têm camas de ferro, chão em mosaico e, caso a lotação seja máxima, poderão alojar seis reclusos dividindo a utilização da casa de banho, as clausuras destinadas a Sargentos e Oficiais possuem o chão, camas e armários de madeira. Um interno, comparando as instalações, salientava:...o chão deles é em madeira. Eles deviam por os pés neste chão durante o inverno. A humidade é tanta que o chão nunca seca. O meu armário está empenado e não fecha há um ano. Ainda não o vieram consertar. Mas o armário do... foi logo arranjado.... Em caso de lotação máxima, as celas destinadas a Oficiais e Sargentos ocupam, no máximo, dois internos 17, diferindo apenas no seu tamanho a de oficiais é ligeiramente maior. A ala feminina que se encontra vazia por inexistência de reclusas, é sensivelmente semelhante à destinada aos Oficiais. O bloco de Oficiais-Generais possui apenas uma cela que é composta por um quarto e uma pequena sala de estar. De salientar que as celas de praças ocupam todo o rés de chão, enquanto os restantes blocos situam-se no primeiro andar:...é impossível não ter humidade aqui em baixo. O sol não bate aqui. Até nisso eles pensaram. O sol apenas bate nas celas deles. Porque é que não nos deixam ocupar as celas que estão vazias no 1º andar? Se entrar alguém, nós descemos. Todas as celas, sem excepção, têm televisão por cabo. Porém, queixavam-se alguns, não podem ligar qualquer tipo de aquecimento sendo difícil aquecer nos dias de inverno. Acusavam o PGS de deixar ligar aquecedores no bloco dos graduados 18 :...eles fecham os olhos. Fazem que não vêm. Mas para nós estão sempre com má cara e não permitem nada. Os graduados têm as celas sempre quentes e nós temos de vir para a sala de convívio, se queremos aquecer... Esta proibição, como outras, não se encontra escrita em lado algum. As NEP são omissas relativamente a este ponto. Todavia, é do conhecimento de todos que é estritamente proibido utilizar aquecedores que não seja nas salas de convívio. Apurámos junto do PGS e do estado-maior a razão de tal proibição. Disseram-nos que, antigamente (não se sabendo bem quando), alguns reclusos teriam deixado o aquecimento ligado vinte e quatro horas por dia, estando ou não na cela, originando-se gastos exagerados de electricidade. Um dos militares do PGS dizia 17 Para evitar situações do foro homossexual, é evitado a colocação de apenas dois elementos numa mesma cela. Deste modo, as clausuras são ocupadas por um só indivíduo ou por três ou mais. 18 Oficiais e Sargentos. 47

53 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar...trabalho aqui há seis anos e já existia essa proibição. Eu não deixo ligar os aquecedores mas nunca ninguém me disse para fazer isso. Eu faço aquilo que ouço dizer e não quero problemas com ninguém. Ao princípio, eu perguntava e os meus colegas não me diziam nada. Brincavam comigo. Agora já sei como é que isto funciona. São os outros que me vêm perguntar a mim. Depois de constatarmos que um dos aquecedores estava muitas vezes ligado na cela do recluso mais graduado, questionámos o PGS sobre esta alegada irregularidade:...não queremos arranjar problemas com o...ele fala muitas vezes com o comandante e não sabemos do que falam. Como ele está noutra ala, os outros presos não sabem disso. Ninguém deles lá pode ir. É melhor assim. Ninguém sabe e não há problemas com ninguém. Para além das normas e regulamentações reunidas nas NEP e das inúmeras ordens de serviço interno que anulam outras ordens anteriores, são produzidas outras proibições a outros escalões inferiores que vão reduzindo o livre-arbítrio e as liberdades individuais dos reclusos. Assim, por exemplo, a existência de um recluso com uma doença terminal obrigou a que a quantidade de medicamentos consumidos fosse exponencialmente maior do que até então. Havendo a necessidade de se tomar mais medicamentos, a quantidade de dinheiro semanal gasto por este interno foi maior. Foi dada autorização para se aumentar a cedência de dinheiro para este indivíduo. O sentido desta ordem é claro para todos mas o mesmo não acontece quando é descoberto um telemóvel no interior de uma cela (é proibida a posse de equipamentos desta natureza pois os internos têm cabinas telefónicas no interior do bloco prisional que funcionam com cartões pré pagos) o que justificou o aumento exponencial de revistas exaustivas a todas as clausuras, especialmente aos internos que não adquiriram cartão pré-pago. A interdição de dispor de um telemóvel é também objecto de especulação, dividindo-se as opiniões quanto ao seu sentido: impedir que a bateria e fios sejam utilizados para outros fins ou que seja usado para comércio interno e favorecimentos. Estas e outras especificações não constam das normas internas, fazendo com que os reclusos (e também os militares mais novos do PGS) se vão inteirando das normas à medida que as infringem. Em contrapartida, o conhecimento da rotina, a antiguidade, a velhice, proporcionam estratégias para contornar algumas delas. Por conseguinte, a proliferação de normas e regulamentos constrangem tanto os internos como os militares do PGS, ainda que de forma distinta. Para estes, a margem de conhecimento dos regulamentos, as ilações que retiram deles e a própria experiência pessoal aliada à maior ou menor capacidade de improvisação e decisão, originam situações de alguma imprevisibilidade e flexibilidade, de modo a que se cumpra o que está escrito e não se contradiga o que não está. A inexistência de um código ou regulamento que descreva todas as regras e normas em 48

54 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 uso, faz depender do «costume e do hábito» a gestão, decisão e resolução de muitos dos problemas diários, pelo que a autoridade dos militares do PGS mais antigos e «com mais tempo de casa» é inequivocamente superior A Cadeia de Comando e os Grupos Sabendo das diferenças de atitude e de resposta às solicitações, os internos dirigem-se a determinados militares da vigilância para fazerem alguns pedidos ou aguardam que certa pessoa esteja de serviço para executar determinadas acções que não fariam com outros. Por conseguinte, a tradição, o hábito e o costume não uniformizam os métodos utilizados, havendo discrepâncias entre diferentes militares do PGS que, desconhecendo uma ordem prévia de um colega, permitem o que anteriormente já havia sido interditado. Para os pedidos de maior envergadura, que englobam o bem estar de todos (ou pelo menos o da maioria), os reclusos utilizam a cadeia de comando formal e dirigem-se verbalmente e numa primeira fase ao comandante do PGS que, por norma, consulta o comando do estabelecimento. Se as intenções não forem satisfeitas, procuram comunicar directamente com o comandante (muitas vezes modificando o teor do pedido ainda que o produto final seja o mesmo) que, de uma forma geral, sempre se mostrou comunicativo e receptivo. Nas alturas em que houve necessidade de dar resposta a estes pedidos mais formais, o comandante utilizou sempre a cadeia de comando reclusa: solicitou a presença do interno com maior patente ao seu gabinete, na companhia do estado maior e do comandante do PGS e transmitiu-lhe as considerações que julgou pertinentes, sabendo que seriam relatadas aos demais. Contudo, verificámos que a cadeia de comando entre os presos era quase sempre desrespeitada, apesar dos reclusos o negarem e não o assumirem abertamente É um facto que eles encontram-se sujeitos ao Código de justiça Militar (CJM) e ao Regulamento de Disciplina Militar (RDM), como se permanecessem no serviço activo. E eles sabem-no perfeitamente. Como tal, para evitar problemas do foro disciplinar, afirmam respeitar a hierarquia esquecendo que os seus actos não estão em sintonia com as afirmações. Em primeiro lugar, existem pequenas conversas, mexericos, relatos, novidades que não são transmitidas entre ramos das Forças Armadas e, mais especificamente entre os diferentes grupos, o que contraria a lealdade e a frontalidade que deve existir entre militares quer da mesma patente, quer de patentes distintas. Os elementos da GNR guardam para si algumas informações e não as transmitem aos militares da marinha. O mesmo se passa com os do exército e vice-versa. Um pequeno sub-grupo de 3 fuzileiros que prevaricaram em conjunto e que 49

55 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar se encontram no estabelecimento há apenas dois meses, evitam mesmo falar com todos os restantes - inclusive com o interno mais graduado que pertence ao mesmo ramo - apenas executam os cordiais cumprimentos «obrigatórios». Um destes três elementos dizia: não tenho vontade de falar com ninguém. Aqui somos todos iguais. Somos todos presos. Apenas confio nos meus dois amigos. Fiz a recruta com eles. Sei quem são e o que valem. O...[referindo-se ao interno mais antigo 19 ] está na sua cela a ler e eu estou aqui a ver televisão. Ele é intelectual [sorriso em tom jocoso] e eu sou do povo. Não gosto dele. Já o conheço do Alfeite. Tem a mania; mas aqui somos iguais. Não tenho de falar com ele. Digo bom dia e mais nada. Um dos fuzileiros destaca-se nitidamente quando o comparamos com os outros dois. É excessivamente educado, cordial e protocolar. Tem habilitações literárias mais elevadas e preocupa-se com a imagem e com as respostas que fornece. Reflecte muito, mede as suas palavras ao milímetro, sabendo o que deve e não deve dizer. Os outros dois estão dependentes do que este decide sendo facilmente manipuláveis, o que os leva a aceder às suas orientações. Antevemos uma eventual competição com o recluso considerado como líder. Seria interessante, caso o tempo disponível o permitisse, verificar a alteração de identidades, representações, rotinas, diálogos e os focos de tensão que certamente se processarão entre estes dois protagonistas. Outros elementos deixaram transparecer que não confiam no interno mais graduado para defender os seus interesses junto do comando do estabelecimento, afirmando que este apenas está preocupado em defender a sua imagem junto do comando e do estado maior, não se preocupando com os outros. Realçam que preferiam que fosse o... a dirigir-se ao comando em nome de todos eles mas o comandante não permite, pois só recebe o mais antigo. Referem-se a um elemento da GNR que já havia sido referenciado pela psicóloga e pelos militares do PGS, como sendo o recluso que domina todos os outros. Calmo, sereno, ponderado, reservado, perspicaz, observador, confiante, foram alguns dos termos utilizados para o descrever. A este propósito, a psicóloga salientava: ele é meticuloso, frio, calculista e os outros seguem-no quase inconscientemente. Ele é o verdadeiro porta-voz do grupo pelo à- vontade e pela maneira como se exprime. Consegue manipulá-los e eles, cordeirinhos, seguem-no. De facto, apurámos que os outros elementos, de uma forma geral, aceitam as suas ideias à excepção do recluso mais antigo que se mantém neutro, refugiando-se nas leituras e na meditação no interior da sua cela. O nível de habilitações do recluso considerado como líder situa-se ao nível do secundário, sendo superior à média da classe de praças. Tem um negócio legal, na área hoteleira, que gere à distância através do telefone, sendo alvo de alguns comentários que envolvem 19 Militar com patente mais elevada. 50

56 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 um misto de admiração e inveja. Não se expõe demasiadamente. Conversa com os outros internos, sobretudo nas áreas de lazer e em períodos de actividade reduzida 20, quando o estabelecimento tem menos militares de serviço e poucos «olhares indiscretos», mantendo o silêncio quando subitamente aparecem elementos do PGS em redor. Esta atitude, juntamente com outras, levou a que um outro recluso o apelidasse de cobarde, originando-se algumas agressões verbais (e alguns empurrões) que foram interrompidos pela entrada do graduado de serviço. Transmite as suas opiniões, procura convencê-los através da persuasão e da argumentação e geralmente consegue-o. Porém, na hora de se empregarem medidas que envolvam a consciência colectiva, ele permanece calado na retaguarda deixando que os outros se envolvam, a não ser que os motivos sejam remuneradores para a conservação do status e do poder acumulado. Por conseguinte, podemos assumir que a hierarquia formal militar é respeitada pelo comando do estabelecimento. Porém, o mesmo não acontece com os reclusos que preferem, ainda que de uma forma não assumida e camuflada, valorizar uma outra hierarquia informal e subterrânea no relacionamento entre pares, privilegiando outros valores que não a antiguidade ou o posto. Após uma observação mais cuidada, conseguimos apercebermo-nos de alguns grupos que se mantém a uma «distância de segurança» dos outros. Não partilham informação (a não ser que ela seja desprovida de qualquer valor de troca), praticamente não dialogam e evitam permanecer muito tempo sem estar na companhia dos que têm afinidades. Julgamos que não se sentem seguros quando estão isolados e não há outro elemento do grupo à vista, apesar de não se conhecerem episódios de agressões violentas no EPM. Os três fuzileiros são os que mais se isolam, não procurando esconder essas intenções solitárias mesmo na altura das refeições em que o espaço é exíguo e há a necessidade obrigatória de partilha de mesas. Os militares da GNR, enquanto grupo mais numeroso e provavelmente o menos coeso, não procuram problemas tentando, de uma forma geral, apaziguar certos focos de tensão. Assim, por exemplo, um dos elementos deste grupo está a ser acompanhado clinicamente no sentido de deixar de consumir álcool, estando autorizado a beber apenas uma pequena porção a cada refeição. Ao princípio verificámos que essa proibição não era cumprida e que procuravam esconder esse facto da nossa observação. Porém, quando finalmente concluíram que não trabalhávamos ao serviço do estabelecimento, multiplicaram por três ou quatro o número de copos permitidos, chegando mesmo a oferecer-nos uma garrafa de vinho 20 Nas Unidades Militares e relativamente ao teor das tarefas, existem dois períodos, designadamente os de actividade plena (normalmente coincidente com os dias úteis) e os de actividade reduzida (fins de semana e feriados). 51

57 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar do estabelecimento que se encontrava sub-repticiamente escondida no interior de um blusão do uniforme. A embriaguez originou alguns desacatos envolvendo, especialmente, o interno que se encontrava em recuperação alcoólica, chegando a haver injúrias e empurrões contra elementos de outros grupos. Alguns reclusos da GNR separaram os militares em disputa e pediram prontamente desculpa aos demais em nome do seu camarada que não se encontrava nas «melhores condições», não necessitando de haver intervenção formal do PGS. Este incidente originou que todas as celas fossem inspeccionadas minuciosamente e todos os presos consumissem apenas um copo a cada refeição, estando ou não em abstinência alcoólica. Este facto contribuiu para esfriar, ainda mais, as fracas relações entre grupos. No interior dos internos da GNR, há um relacionamento relativamente forte entre aqueles que provêm do Algarve (cerca de cinco elementos), chegando mesmo a haver algumas famílias que trazem alimentos e outros bens para entregar a terceiros. Este pormenor apenas acontece neste sub-grupo. Não é algo que seja considerado usual, já que os internos não partilham os artigos que são trazidos pelas famílias, nem mesmo dentro de cada grupo. Um dos reclusos é, de certa maneira, discriminado pelos outros, não por ser o mais velho ou ter a pena com maior duração mas por ter cometido um «crime de sangue», como alguns resolveram denominar. Este interno vive para ser reconhecido socialmente pelo staff prisional. Deseja ser visto como um elemento apaziguador, respeitador das normas e regulamentos. Aparenta ser educado, cordial, simpático, formal, humilde, muitas vezes aproximando-se do exagero. É voluntário para tudo o que é sugerido, desde pintar alguns compartimentos do estabelecimento até cuidar dos animais e das plantas que preenchem os espaços tornando-os mais aprazíveis e acolhedores. Por estas razões é apelidado de «graxista e lambe-botas» pelos coreclusos. É um indivíduo excessivamente meticuloso apresentando, segundo a psicóloga, elevados índices de psicopatia. É apontado como tendo a «mania das limpezas». Tem a cela sempre arrumada e ordenada, sendo dos poucos que tem a roupa da cama impecavelmente esticada e engomada, chegando a tomar vários banhos por dia. Não cria conflitos com os restantes internos nem com o staff. Procura dar igual atenção a todos os que o rodeiam. Respeita as ordens sem murmurar e apresenta-se sempre com um dinamismo e uma energia interior que incomoda os internos que o observam. Cumprimenta todos com igual consideração, apesar de poucos lhe devolverem igual sinergia. É um dos principais denunciantes. Comenta com o staff que os outros internos não limpam convenientemente os corredores e as celas, discriminando os nomes de quem prevarica. Numa ocasião, ao ver passar o comandante e após pedir para falar em particular, queixou-se que não suportava tanto 52

58 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 fumo nas salas e nos corredores, o que ia contra as normas internas (só se pode fumar no pátio). Esta faceta denunciante é sobejamente conhecida pelos demais, o que lhe exponencia o abandono a que é sujeito. Porém, com o passar do tempo não demonstrou indícios de estar afectado por este pseudo-isolamento, mantendo-se convicto nas suas decisões. No interior do estabelecimento, desaparecer um pouco de manteiga ou algumas bolachas é motivo para zangas e amuos. Ali dentro, os mais pequeno incidente assume proporções gigantescas e não é esquecido com facilidade. A diminuição da autonomia individual, tendo em consideração as restrições directas de determinados bens por imposição do sistema (restrições que não existem além-muros) originam perturbações e obsessões por pequenos pormenores. Um dos militares mais novos do PGS dizia-nos: não sei porque é que eles são tão invejosos. Não partilham nada uns com os outros. Contam as bolachas que têm no pacote, põem marcas na manteiga para saberem se alguém a utilizou. Estão sempre a ver o que cada um tem; o que as visitas trouxeram. Não percebo... Acreditamos que a pseudo aproximação entre indivíduos não é desprovida de interesse, a não ser a do pequeno sub-grupo de três fuzileiros que confiam e protegem-se mutuamente. Julgamos que estamos perante um fenómeno de «ausência de solidariedade generalizada e abrangente» já que os reclusos pouco mais têm em comum do que envergarem um uniforme - que até difere consoante o ramo das FA a que pertencem - e estarem recluídos. Paradoxalmente, esta ausência de camaradagem e solidariedade viola um dos princípios militares. À medida que os reclusos interiorizam os limites e os detalhes da rotina, zelam por ela de maneira minuciosa. Qualquer facto susceptível de a alterar gera perturbação e ganha uma importância inusitada, produzindo comentários para vários dias. O anúncio de mudanças nos modos de vida - como a alteração da hora das formaturas e do uniforme são recebidas com desconfiança e receio, pondo em risco a «segurança e a previsibilidade» que a rotina proporciona Os objectos, as Visitas, a Correspondência Existem dois bares e duas salas de estar onde os reclusos podem conviver (bar e sala para preventivos e condenados). Nestes locais, existe uma convivência, à primeira vista, salutar entre reclusos. Nos primeiros dias, chegámos a pensar que não haveria quaisquer atritos ou diferenças de opinião e que estes reclusos seriam um exemplo de tolerância e de gratidão. Alguns viam televisão, outros liam os jornais, jogavam às cartas ou às damas. Um deles bordava e mostrou-nos, prontamente, alguns trabalhos que já havia concluído. O bar e a sala são geridos pelos próprios 53

59 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar presos, exceptuando os materiais à responsabilidade do estabelecimento (móveis, cadeiras, jogos, computador sem acesso à internet, aquecedores). Os jornais, o leite, o café, as revistas, as bolachas, enfim, tudo o que é material de consumo, é comprado com o dinheiro dos reclusos ou então trazido pelas visitas. Como já foi referido, os internos não mexem nos artigos de outros, apesar de estarem reunidos no interior do mesmo armário ou frigorífico. Verificámos que durante alguns períodos de actividade reduzida havia uma completa convivência entre preventivos e condenados. O «muro» que separa os dois bares podia, afinal, ser «facilmente transposto», bastando para isso que os militares de serviço o permitissem. E esta permissão era dada quase todas as noites. Um dos graduados de serviço do PGS dizia-nos:...é melhor deixá-los estar assim. Falam uns com os outros e aliviam a cabeça. Dão-nos menos problemas, andam mais calmos... As visitas decorrem no horário fixado para o efeito, havendo uma diferenciação entre os preventivos e os condenados. Dizem as NEP que os primeiros podem ter visitas todos os dias das 10h00 às 12h00 e das 14h00 às 16h00, enquanto os segundos apenas recebem familiares e amigos às quartas-feiras, sábados, domingos e feriados no mesmo horário. Porém, constatámos que esta diferenciação não se efectua na realidade. Todos os presos estão autorizados a receber visitas todos os dias, mesmo fora destes horários. Algumas vezes verificámos que era permitido aos reclusos almoçar com os familiares numa sala para o efeito, desde que a refeição ficasse a seu cargo e fosse solicitada autorização nesse sentido. Todos os visitantes estão sujeitos a uma revista pessoal efectuada através de um detector de metais, de palpação ou, no limite, por desnudação. A sua não colaboração inviabiliza a concretização da visita. Os seus objectos pessoais ficam guardados num cacifo próprio existente na sala de revista cuja chave apenas é manuseada pelo próprio. Todos os produtos oferecidos pelos familiares (existe uma lista que discrimina os alimentos autorizados e a sua quantidade ver anexo E) não podem ser entregues directamente ao recluso, pois necessitam de ser inspeccionados pelos militares do PGS. Alguns presos manifestaram o seu desagrado ao lhes serem entregues, alegadamente, alguns artigos completamente destruídos após a inspecção. Um deles afirmava:...eles fazem de propósito. Se um queijo tem bom aspecto, eles amassamno e cortam-no. (...) Desaparece metade dos bolos. O mel fica com um sabor estranho. Não vale a pena dizer nada... Ao ser confrontado com estas acusações, o comandante do PGS, mostrando-se indignado, transmitiu-nos que antigamente teriam havido alguns abusos. Disse-nos que as revistas aos alimentos passaram a ser feitas na presença dos reclusos que observam o modo como são inspeccionados. Frisou que não tem havido queixas, não percebendo como essa informação teria chegado até 54

60 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 nós. Presenciamos as inspecções aos alimentos e, efectivamente, os reclusos estavam presentes e verificavam in loco, o que era efectuado. Após algum tempo, soubemos que o recluso que se tinha lamentado sobre o mau tratamento dos alimentos, tinha tentado que entrasse, algumas semanas antes da nossa conversa, uma quantidade de alimentos superior ao permitido. Por consequência, tiveram que diminuir as quantidades recorrendo ao corte de bolos e de queijos pela metade, tendo o resto sido devolvido às visitas, o que deixou o interno profundamente revoltado. Após a revista pessoal, os visitantes são dirigidos à sala de visitas. Sala ampla, arrumada, com mesas e cadeiras de madeira onde as famílias podem conversar com alguma privacidade. Os soldados do PGS aguardam no exterior, apesar de poderem visualizar e controlar as interacções através dos vidros. Nesta sala também existem alguns brinquedos e um pequeno escorrega (material oferecido pelos militares que ali prestam serviço) para que as crianças, durante o período da visita, possam brincar e divertir-se, tornando o ambiente mais descontraído e relaxante. Se o recluso assim o entender, pode solicitar autorização para dar um passeio nos jardins do estabelecimento, apesar da vigilância, neste caso, passar a ser mais estreita e rígida. Se o interno for casado ou viver em união de facto, pode receber a sua companheira numa «visita íntima», havendo um alojamento para esse efeito. Namoradas, «ligações extra-conjugais 21» ou outro tipo de conquistas não estão autorizadas a ser consideradas como «íntimas». A este propósito, um dos internos dizia-nos:...nunca colocarei a minha esposa numa situação deste género. Não há intimidade nenhuma. Os soldados olham para as mulheres dos reclusos e sabem para o que vêm. Falam, comentam. Não quero que a minha mulher se sujeite a isso... Como se trata do único estabelecimento prisional para militares, muitos reclusos encontram-se afastados dos seus locais de residência e dos seus familiares para que possam receber, com regularidade, a sua visita. Este constrangimento de ordem geográfica foi largamente mencionado no decorrer das entrevistas e das conversas informais. Todos os reclusos que não recebem visitas regulares encontramse privados de um fundamental suporte afectivo e material. A inexistência de visitas repercute-se nas relações sociais internas e na maior ou menor dependência de uns reclusos em relação a outros. A própria reinserção social é enfraquecida por este afastamento familiar e comunitário. As visitas trazem produtos que, de outro modo, teriam de ser comprados com dinheiro de cada recluso que é administrado por um graduado do PGS. Os internos estão autorizados a levantar da instituição de crédito onde têm dinheiro depositado, 21 Entende-se por relações extra-conjugais como sendo as ligações amorosas que são mantidas em paralelo com a da esposa ou da companheira com quem se vive. 55

61 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar cerca de 50 por mês 22. São levados sob escolta a um multibanco, levantam a quantia autorizada e entregam-na na totalidade à guarda de um graduado do PGS que anota num registo a quantidade de dinheiro que cada preso possui. É estritamente proibido a posse de qualquer tipo de valores no interior do bloco prisional (dinheiro, ouro, anéis excepto aliança fios, etc). Quando o interno pretende adquirir um jornal, tabaco, um medicamento que não seja da responsabilidade do posto de socorros ou comprar alimentos para saborear entre refeições, solicita estes préstimos ao PGS que, numa primeira oportunidade, adquire esses produtos, descontando o seu valor à quantia que estava amealhada. Quando o dinheiro atinge os 10, os reclusos são informados da situação e, no mês seguinte (caso assim o decidam), repete-se a operação no multibanco com o levantamento de mais 50. Se esta quantia não for suficiente, terão de solicitar por escrito a razão de tal insuficiência e apenas o comando do estabelecimento tem autoridade para alterar esta rotina. De um modo geral, aplica-se à correspondência controlo idêntico ao dos visitantes. As cartas são fechadas e abertas pelo PGS na presença do recluso respectivo, salvo as que se destinam e provenham do seu advogado ou de outras entidades previstas na lei. Não existe interdição de destinatários, podendo o interno receber e enviar cartas a quem desejar. Todavia, o conteúdo da correspondência é examinado em ambos os sentidos. Esta tarefa é executada unicamente pelo sargento e pelo comandante de PGS, tendo em vista a preservação da segurança do estabelecimento e questões de reinserção social, uma vez que esta acção não visa apenas controlar determinados projectos de fuga, exercendo-se igualmente sobre queixas várias a respeito do estabelecimento. Comentários sobre o tratamento dado pelo staff, a qualidade da comida ou das celas, rotinas ou comportamentos de terceiros são alvo de censura, obrigando a uma reformulação dos conteúdos. Alguns reclusos mantêm uma relação de influência, fundamentalmente, devido ao seu posto, facto que lhes proporciona uma examinação menos cuidada e um controlo mais fraco (algumas vezes mesmo inexistente). Por este e outros acontecimentos, onde a diferença de alojamentos e de condições entre categorias assume um ponto fulcral, acreditamos que o tratamento dado pelos staff aos reclusos tem especificações e orientações diferentes, tornando-se mais respeitoso, distante, receoso à medida que se sobe na hierarquia militar. Este factor é preponderante relativamente a outros como a duração da pena e tipo de crime, tal como mencionámos numa das nossas hipóteses. 22 Este valor foi alterado para o recluso que se encontra com uma doença terminal, tendo sido acrescido aos 50 o valor dos medicamentos. Os reclusos em prisão preventiva têm direito à totalidade do vencimento. Os condenados recebem um quarto do vencimento, conjuntamente com os descontos decididos em tribunal. 56

62 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 Julgamos que esta censura não se limita apenas aos princípios defendidos pela instituição, designadamente a segurança e a reinserção social. Defendemos que por detrás destas acções, existe uma tentativa mais lata e abrangente, ainda que subreptícia e camuflada, de promover a disciplina, a moralização para as boas práticas e o encaminhamento para escolhas e decisões onde predomine o legal em detrimento do desviante. As sucessivas censuras, inspecções e revistas onde tudo é observado cuidadosamente, induz a uma descaracterização da personalidade, procurando originar seres desprovidos de iniciativa que acatem as ordens de um modo inconsciente, sem recorrer a contestações, murmúrios ou reivindicações O Fardamento e o Atavio Quando um interno se encontra no período de «quarentena», é-lhe transmitido que deverá usar uniforme e manter hábitos de higiene que promovam a auto-imagem do militar e da instituição que representa. Os reclusos não devem usar, em qualquer circunstância, roupas de índole civil como calças de ganga ou outro vestuário similar. A limpeza e a correcta apresentação dos uniformes (tal como do seu alojamento, do bar e da sala de convívio, excepto a roupa da cama) é da sua directa responsabilidade. O uso obrigatório de uniforme é defendido como medida preventiva destinada a facilitar a sua identificação no interior e no exterior do estabelecimento, como factor personalizador e uniformizador, como recondução dos desviantes à sua normalidade e como continuidade da sua condição militar. Todavia, independentemente da sua patente, os reclusos perdem a acção de comando, mesmo se tiverem um posto superior ao do comandante do estabelecimento. Como já foi mencionado, os reclusos em situação de reserva ou reforma trajam à civil, havendo apenas um nestas condições. Esta indumentária civil obedece a algumas considerações:...deve ser discreta, sóbria, respeitosa e adequar-se às situações respectivas... (Estabelecimento Prisional Militar - Normas de Execução Permanente, 2004: 19). Existem formaturas nas quais devem comparecer todos os reclusos. Formatura do pequeno-almoço (7h30), início de trabalhos da manhã (9h00), almoço (12h30), início de trabalhos da tarde (14h00), jantar (19h00) e recolher (21h30), salvo outras entendidas como pertinentes. Às 22h00 recolhem às celas que são fechadas pelo PGS, permanecendo nesta situação até às 7h00 do dia seguinte. Às 02h00 todas as luzes são apagadas no interruptor central ficando apenas as de emergência no interior das clausuras, permitindo o controlo visual através da janela de vigia das portas. 57

63 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar Os internos devem apresentar-se com os uniformes engomados 23, limpos, botas ou sapatos devidamente engraxados, cabelo e barba aparados. Esta é uma situação que, salvo casos pontuais, não origina qualquer atrito pois não constituem novidade, tratando-se apenas de um prolongamento da sua atividade laboral, embora noutra situação e com constrangimentos diferentes. Às terças e quintas-feiras, dias em que têm educação física, podem comparecer à formatura do pequeno-almoço e da manhã com o fato de treino em uso em cada instituição. Nas alturas em que se encontram a executar tarefas ocupacionais voluntárias, podem vestir uma bata protectora ou despir algum tipo de fardamento que dificulte estas acções. Quando nos deslocámos no primeiro fim-de-semana ao estabelecimento, verificámos que alguns dos reclusos envergavam roupa civil, outros encontravam-se meio uniformizados, envergando chinelos, sapatilhas, etc. O nivelamento dos reclusos estabelecido pelo carácter estereotipado do uso do uniforme e pela estandardização do corpo a que estávamos sobejamente habituados durante a semana, contrastava agora com esta imagem aparentemente desordenada e desorganizada, fazendo relembrar, ainda que por breves momentos, o teor e o carácter das penas. Após o nosso espanto inicial, tentámos descortinar a razão de tal desiderato ao que nos foi dito pelo graduado de serviço que ao fim de semana os reclusos têm autorização para andar assim e aliviar o fardamento. Podem lavar e passar a ferro as fardas para que não hajam desculpas durante a semana... Os reclusos não podem ser obrigados a trabalhar. Aderem voluntariamente a serviços na lavandaria, jardinagem, na cozinha, carpintaria, mecânica, biblioteca. A esta voluntariedade, não será alheio o facto de contribuir para o acesso a saídas precárias. A psicóloga argumentava que... se um interno não coopera, não se mostra interessado nas actividades ocupacionais, é um foco de tensão e de ansiedade, o que resulta numa informação negativa... O recluso identificado como líder é o único que se recusa a desempenhar qualquer tarefa. Este é um facto que contribui para o aumento da sua credibilidade junto dos co-reclusos, ao verem nele um indivíduo que não tem problemas em assumir as suas escolhas mesmo quando essa situação lhe pode trazer profundas desvantagens pessoais. Ao ser questionado sobre a razão de tal escolha, retorquiu em tom irónico...pensei que vinha para a prisão apanhar sol e dormir. Não quero trabalhar. Isso é uma segunda pena... Após autorização do conselho técnico e do NAC, o comandante tem autoridade para conceder duas saídas precárias por trimestre para a sua área de residência, com 23 Existe uma máquina de lavar e outra de secar roupa, com os respectivos detergentes cedidos pelo estabelecimento e algumas tábuas de passar a ferro, para que não haja impedimentos ao bom estado e conservação dos uniformes. 58

64 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 a duração de um fim de semana 24. Se a situação o justificar, o comandante pode autorizar um recluso condenado a ausentar-se do estabelecimento até 12 horas - não o pode fazer para os preventivos que apenas podem ser autorizados pelo Juiz do TEP. Dois reclusos encontram-se matriculados em estabelecimentos de ensino próximos do EPM, na esperança de poder assistir às aulas tendo em conta essa possibilidade de ausência. A este propósito, o comandante afirmou que, além das saídas precárias que são fundamentais para a reinserção familiar e social, não concedia outro tipo de autorização a nenhum recluso, defraudando as expectativas de assistência das aulas e futuro aproveitamento escolar, originando alguma frustração e irritação que se materializa em constantes amuos e desabafos entre pares. É dado aos reclusos a possibilidade de personalizarem as suas celas, tornando-as lugares mais acolhedores e familiares, estando longe de constituir um espaço próprio e reservado. Podem colocar cachecóis, fotografias, posters, desde que não perfurem a parede nem danifiquem o material que se encontra à carga de cada cela. Evidentemente que não poderá constituir um espaço privado dado as constantes entradas de soldados do PGS e as revistas inopinadas que são efectuadas como rotina de segurança. É, inclusivamente, um espaço inseguro, tendo em conta uma potencial transferência de cela por ordem superior. A autonomia individual é reduzida, havendo uma fragilização das fronteiras individuais dadas as restrições de tempo e de espaço impostas pela rotina do estabelecimento, aliadas aos condicionalismos monetários e à privação do livre-arbítrio nas mais variadíssimas ocasiões. Estas regulações integram um processo de Mortificação do Eu de que nos fala Erving Goffman (1987), em favor de uma consciência colectiva de obediência que tende para o servilismo, ainda que a instituição defenda que se enquadram em objectivos puramente institucionais auto-disciplinares que visam uma futura reinserção societal sólida e adequada. 5. PONTO DE CHEGADA - NOTAS CONCLUSIVAS A reclusão militar tem particularidades distintivas e específicas que a distingue das demais. Esta é uma das principais conclusões da pesquisa. Conclusão também relevante é a que identifica, claramente, uma tentativa premente de afirmação de uma identidade não desviante e de diferenciação face aos co-internos. Em todas as conversas, esteve sempre presente uma tentativa, poucas vezes sub-reptícia, de recomposição de uma identidade positiva e de reposicionamento numa ordem social legítima onde se pretendem re-inscrever. Trata-se de procurar convencer que não 24 Cumulativamente, o Juiz do TEP pode conceder até dezasseis dias por ano e o General Director do Serviço de Justiça e Disciplina pode conceder até seis dias. 59

65 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar houve prevaricação, que se cometeram injustiças, tentando-se revisitar, ainda que por breves momentos, situações e episódios vividos de modo a originar-se um afastamento ou desvinculação do seu novo papel social. Identidades e sociabilidades que se articulam em oposição a um carácter desviante que a grande maioria procura afastar. O sentido improvisado em que evitam uma solidariedade e uma consciência colectiva é disso um sinal inequívoco, alicerçado num conjunto de práticas, representações e rotinas quotidianas que se antagonizam com o estigma desviante que os une e contratualiza. A cooperação quando existe é estratégica, não sendo isenta de favorecimentos e intenções. Outro factor a ter em consideração é o afastamento dos padrões hierárquicos formais entre os reclusos. Foi inequivocamente identificado que os internos não são fiéis à cadeia de comando imposta pelos vínculos institucionais exteriores e preferem seguir, ainda que não o assumam claramente, ideias, opiniões, ideologias, opções que lhes forneçam confiança, mesmo que para isso tenham que reformular determinados valores militares como a lealdade, a camaradagem, o espírito de corpo, a frontalidade. Identificam e seguem quem lhes pareça proporcionar melhores condições de sucesso, independentemente de patentes ou escalão etário. Aliás, o recluso identificado como líder é dos que possui patente e idade mais reduzida, contrariando certas ideologias de senso comum que procuram aliar a uma maior idade, uma maior capacidade de persuasão e maiores conhecimentos e experiência. Consequentemente, umas das minhas hipóteses não foi corroborada, isto é, a hierarquia militar formal não corresponde à hierarquia informal subterrânea no relacionamento entre co-internados. Apenas funciona de maneira irrepreensível no sentido comando-reclusos. Outro pormenor a ter em consideração é a proliferação de ordens e proibições escritas ou não, que originam zonas dúbias de decisão, quer para os reclusos quer para os elementos do PGS, constituindo-se o hábito, a rotina, a antiguidade e o costume como factores decisores na conduta e livre-arbítrio dos actores sociais em causa. O tratamento institucional dado pelo staff aos reclusos não é idêntico. A começar pelas condições de alojamento que são distintas consoante a classe a que se pertence, a conivência do PGS para com os reclusos-graduados ao deixar passar algumas proibições que são impostas a outros, são indícios que possibilitam a confirmação de uma das hipótese de partida. A diferença nas condições dos alojamentos é um factor, por si só, perturbante e causador de afastamento entre os internos. O respeito e o receio dos militares do PGS pela graduação dos reclusos é inequívoca, diminuindo a sua exigência e rigor à medida que se sobe na hierarquia militar. Em suma, o tratamento dado pelo staff tem orientações e especificações 60

66 Boletim de Sociologia Militar n.º 3 diferentes, tornando-se mais permissivo, benevolente, respeitoso à medida que se sobe na hierarquia formal militar, sendo um factor preponderante relativamente aos demais. Em traços gerais foi ainda possível identificar outras características dos reclusos. A grande maioria pertence à classe de Praças e apresentam qualificações escolares relativamente baixas ao nível do 1º e 2º ciclos do ensino básico, o que confirma uma das hipótese de partida. Trata-se de uma população de indivíduos masculinos a rondar os 47 anos de idade e casados, o que a distingue das populações maioritariamente jovens e solteiras que se encontram recluídas nas penitenciárias civis nacionais. A esmagadora maioria está presa pela primeira vez, sendo quase marginal o número de reincidentes. O tempo médio de permanência na prisão é de um ano e três meses havendo apenas um indivíduo que se encontra detido há mais de três anos. Não se encontram indícios da tríade «homossexualidade, drogas, violência», contrapondo-se aos números que encontramos mencionados na literatura sobre as prisões civis. A inexistente presença de mulheres, corresponde também à diminuta quantidade de elementos do sexo feminino que, percentualmente e em comparação com os homens, se encontram recluídas em Portugal. Este facto não poderá ser dissociado dos modelos de construção da identidade masculina e feminina. A socialização dos rapazes tende a ser mais desregrada, mais afirmativa e identitária, apelando a uma maior consciencialização de aspectos exteriores ao domicílio - como os grupos ou a violência física entre pares - e a um menor controlo dos progenitores como meio de expressão da masculinidade. O género feminino tende a ser socializado em torno de práticas que favorecem a organização, as regras, a obediência, o retraimento, a docilidade e o fechamento doméstico. A maioria dos crimes está relacionado com o roubo e o furto, seguido do tráfico de droga, havendo quase uma replicação com o tipo de crimes que prevalecem na sociedade civil. A instituição mais representada é a GNR, não sendo irrelevante a sua proximidade a actos e acções desviantes devido à natureza da sua missão, factores que contribuem para a permeabilidade e susceptibilidade dos agentes a situações marginais. As tarefas ocupacionais efectuadas pelos internos, apesar de se constituírem como actividades facilitadoras de interacções sociais e relacionais, não são verdadeiros espaços de aquisição de competências profissionais com vista a uma futura reinserção laboral. Elas contribuem, essencialmente, para a manutenção e reprodução do sistema prisional, assumindo apenas uma dimensão mecânica e repetitiva. Este poderia ser um ponto de partida para novos e futuros trabalhos. 61

67 Um Olhar sobre o Estabelecimento Prisional Militar Com efeito, a especificidade do papel social desempenhado pelos reclusos é ainda agravado por estarem em causa longos anos de encarceramento e de, não raro, as visitas dos familiares serem pouco assíduas uma vez que se trata da única cadeia para militares. Os poucos pedidos de transferência ou são indeferidos pelo general director de justiça e disciplina ou são interrompidos pelos próprios ao se aperceberam das condições de habitabilidade que os esperariam, caso fosse aceite a transferência. Os relatos pouco abonatórios dos que perderam a «condição militar» e foram transferidos para estabelecimentos civis e o próprio conhecimento destas realidades pelos internos da GNR, configuram e auxiliam a formulação de imagens que os levam a reflectir sobre as boas condições de habitabilidade que usufruem no EPM. A cadeia militar parece ser um meio particular dotado de códigos e papéis sociais constituintes de uma micro sociedade que potencia diferenças e distâncias sociais, não contribuindo para a união, reforço ou solidariedade entre os recluídos que não se revêm nesta micro cultura encarcerada, enfatizando sentimentos de estranheza e ausência. Sobre os internos recai um estigma que se intensifica quer pelo uso de uniforme quer pelo peso das estruturas sociais militares que continuam a organizar a vida intra-muros. A este propósito não esqueçamos, como salienta Pedro Dores (2003), que...os sistemas prisionais não são entidades estranhas às sociedades a que estão associados. (Dores, 2003: 9) e como tal, a vida na prisão militar não pode ser dissociada das realidades que continuam a ocorrer nas instituições de origem dos reclusos. BIBLIOGRAFIA Almeida, João Ferreira de (1986) Classes Sociais nos Campos. Camponeses Parciais numa Região do Noroeste. Lisboa: Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Barreto, António (2000) A Situação Social em Portugal. Lisboa: Instituto de Ciências Sociais. Beleza, Teresa Pizarro (1993) A Reinserção Social dos Delinquentes: Recuperação da Utopia ou Utopia da Recuperação?, em Cidadão Delinquente, Reinserção Social? Lisboa: Instituto de Reinserção Social. p Bell, Judith (1997) Como Realizar um Projecto e Investigação. Lisboa: Gradiva Editora. Biscaia, Pedro Tenreiro (2001) Prisões Muito Preventivas. In Boletim da Ordem dos Advogados. Lisboa: Centro Editor Livreiro da Ordem dos Advogados. N.º 17. p. 50, 51 e

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70 Boletim de Sociologia Militar n.º Marinha Portuguesa - Ministério da Defesa nacional 65

71 Boletim de Sociologia Militar N.º PP.66 a 83 Gestão de Carreiras no Exército Português: Uma Proposta de Modelo Aplicado 1 Isabel Ribeiro * Helena Mateus Jerónimo ** RESUMO O presente artigo tem como objetivo principal compreender a forma como as carreiras militares são geridas no Exército Português. Em termos metodológicos, realizámos entrevistas semiestruturadas a interlocutores-chave. Com base na análise de conteúdo a essas entrevistas, é apresentada uma proposta de modelo de intervenção passível de ser implementado no Exército Português. Palavras-chave: Exército Português, Carreiras Militares, Gestão de Carreiras, Planeamento de Carreiras. ABSTRACT The aim of this article is to understand how military careers are managed in the Portuguese Army. In methodological terms, we have conducted semi-structured interviews with key interlocutors. Based on the content analysis of these interviews, we offer a suggested intervention model which could be implemented in the Portuguese Army. Keywords: Portuguese Army, Military Careers, Career Management, Career Planning. INTRODUÇÃO As mudanças nas relações de trabalho ocorridas nas últimas décadas, pautadas genericamente por um envolvimento precário, de curto prazo e transacional, e a incerteza, turbulência e volatilidade das envolventes organizacionais, têm vindo a colocar novos desafios às práticas de gestão de carreiras. A carreira, tal como era tradicionalmente concebida enquanto movimento ascendente associado a aumentos de salário, status e segurança, conjuga-se hoje com outros formatos e preenche necessidades e exigências diferentes, quer por parte das organizações, quer dos trabalhadores, quer ainda dos decorrentes dos desequilíbrios entre mercado de recursos humanos e mercado de trabalho 2. 1 Este artigo constitui uma súmula dos eixos principais da dissertação de mestrado em Gestão de Recursos Humanos, realizada por Isabel Ribeiro, no ISEG-UTL, sob a orientação científica de Helena Mateus Jerónimo. * Centro de Psicologia Aplicada do Exército ** ISEG-UTL e SOCIUS 2 O mercado de recursos humanos é constituído pelo conjunto de indivíduos munidos de capacidades e de aptidões que se encontram aptos para o trabalho num determinado tempo e lugar, ao passo que o mercado de trabalho se refere ao conjunto das oportunidades de trabalho existentes em certos períodos e contextos espaciais (Chiavenato, 2002). 66

72 Boletim de Sociologia Militar n.º3 Não obstante as suas especificidades próprias, a Instituição Militar enquadra-se neste contexto geral (Nunes, 2004). Ainda que a missão das Unidades Orgânicas não tenha paralelo com a da generalidade das organizações, a estratégia e os desafios que diariamente se lhe colocam possuem grandes similaridades. À semelhança do que acontece noutro tipo de organizações, a gestão de recursos humanos (RH) numa Unidade, Estabelecimento ou Órgão (U/E/O) assume cada vez mais os militares como clientes internos, atentando nas suas necessidades e aspirações com vista a identificar uma resposta adequada para os atrair, reter e desenvolver (Câmara, Rodrigues e Guerra, 2010). O Exército Português, que sempre teve a gestão dos recursos humanos como uma das suas funções centrais, procura agora desenvolverse e adaptar-se às novas exigências e condicionalismos civis e militares. O modelo de gestão de carreiras existente no Exército Português corresponde ao chamado modelo tradicional que tem por base o princípio da ascensão vertical e automática na estrutura da organização com base na antiguidade (Câmara et al., 2010) e que visa premiar a lealdade, a dedicação e a defesa da pátria, em troca de um emprego para toda a vida. Este modelo é hoje bastante questionado. Enquanto colaboradores do Centro de Psicologia Aplicada do Exército como é o caso de uma das autoras deste estudo apercebemo-nos quer da importância que o item carreira tem para os militares, quer da ausência de uma estrutura específica que se ocupe de uma gestão de carreiras ancorada na análise e descrição das funções, e que permita identificar o potencial dos militares, garantir a sua adaptação a novas funções e assegurar a sua motivação e satisfação. No presente artigo pretendemos compreender a forma como as carreiras militares são geridas no Exército Português e, do mesmo passo, como é que a instituição desenvolve e retém os seus RH. O objetivo é contribuir, sem qualquer pretensão de exaustividade, para um maior conhecimento da realidade do Exército e propor um modelo de gestão de carreiras para os Oficiais do Quadro Permanente. CARREIRAS: UMA SEMÂNTICA PLURAL O conceito de carreira tem vindo a ser usado de forma muito diversificada e ampla, sendo, por isso, objeto de diferentes conceções. Tal diversidade conceptual, a que se junta um novo léxico e novos modelos de carreira 3, complexifica o campo de estudos e dificulta a sua exposição em termos simples. A carreira contempla, em geral, quatro sentidos diferentes: (a) carreira como avanço, que integra a noção de 3 Existe hoje todo um novo léxico de carreiras, cuja explicitação e desenvolvimento não cabem no âmbito deste artigo. Refira-se, a titulo de exemplo, as carreiras proteanas, carreiras sem fronteiras, carreira caleidoscópio, entre outras designações. 67

73 Gestão de Carreiras no Exército Português mobilidade vertical numa organização; (b) carreira como profissão, que se liga a determinadas profissões de prestígio e estatuto na sociedade (e.g., médicos, advogados); (c) carreira como sequência de trabalhos realizados, referente a todas as atividades profissionais desempenhadas pelo indivíduo; (d) carreira como sequência de experiências relativas a uma função, tida como a forma como a pessoa experimenta uma série de trabalhos e funções que constituem o seu percurso profissional (Hall, 2002). Esta última conceção inclui os sentimentos e atitudes dos indivíduos face às suas carreiras e vida profissional. Integra, por isso, uma dimensão subjetiva de carreira, ao passo que a penúltima definição dá corpo a uma dimensão objetiva. Adotamos aqui a definição proposta por Douglas T. Hall (2002), que remete para uma sequência de atitudes e de comportamentos, associados às experiências e aprendizagens do indivíduo ao longo da sua vida laboral. Esta definição descreve a carreira como um processo, um conjunto de experiências relacionadas com o trabalho, experiências essas que são influenciadas pelas expectativas, orientações, valores e necessidades dos indivíduos e que dependem, por sua vez, da sua faixa etária e do estádio de desenvolvimento da carreira em que se encontram. Neste quadro de pensamento, é importante direcionar também a análise para a experiência subjetiva de carreira do indivíduo, a forma como este constrói a sua carreira, as relações que estabelece com cada trabalho que vai executando ao longo da vida, observando conjuntamente os aspetos subjetivos e objetivos, e a forma como assume os movimentos up and down como parte natural do processo de carreira. Em geral, uma carreira desenvolve-se em função de dois prismas de análise: por um lado, das expectativas e motivações pessoais do indivíduo e, por outro, da organização (Dutra, 1996). É sabido que o indivíduo não é estático e que se desenvolve em função das necessidades de adaptação aos contextos e situações. As organizações operam do mesmo modo, ajustando-se continuamente às contingências sociais, económicas, políticas e tecnológicas. Neste sentido, o conceito de carreira, ao nascer da interação entre indivíduo e organização, acaba por admitir a noção de movimento, já que perspetiva não só o ponto de vista do indivíduo e da organização, como também o da relação entre eles (Tieppo Gomes, Sala e Trevisan, 2011). Compreender o tema das carreiras implica, portanto, analisar a parceria entre processos individuais e organizacionais, ou seja, entre a forma como os trabalhadores planeiam e desenvolvem os seus objetivos de carreira (o planeamento de carreira ) e o modo como as organizações desenham e implementam os programas de carreira (a gestão de carreira ). 68

74 Boletim de Sociologia Militar n.º3 A CARREIRA MILITAR E O SEU ENQUADRAMENTO LEGAL O conceito de carreira militar encontra-se definido no art.º 27 do Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR), gizado no Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho. A carreira militar é o conjunto hierarquizado de postos, desenvolvida por categorias, que se concretiza em quadros especiais e a que corresponde o desempenho de cargos e o exercício de funções diferenciadas entre si. O art.º 28 determina que os militares se agrupam, por ordem decrescente de hierarquia, nas categorias de Oficiais, Sargentos e Praças. As subcategorias referem-se ao subconjunto de postos que se diferenciam em função da autonomia, da complexidade funcional e da responsabilidade (art.º 28). O posto refere-se à posição que, na respetiva categoria, o militar ocupa no âmbito da carreira militar fixada de acordo com o conteúdo e qualificação da função ou funções. Os cargos militares são entendidos como lugares fixados na estrutura orgânica das Forças Armadas, a que correspondem as funções legalmente definidas e também os lugares existentes em qualquer departamento do Estado ou em organismos internacionais a que correspondem funções de natureza militar (art.º 33). As funções militares são as que implicam o exercício de competências legalmente estabelecidas para os militares, agrupando-se estas em Comando, Direção ou Chefia; Estado-Maior; e Execução (art.º 34). O EMFAR, originalmente aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34-A/90, de 24 de Janeiro, já sofreu diversas alterações e aplica-se a todos os militares das Forças Armadas (art.º 2), independentemente do posto, da carreira, da forma de prestação de serviço, do ramo ou da situação administrativa em que se encontram. Este é o documento que regula a gestão das carreiras militares. No seu Preâmbulo, o EMFAR define o seguinte objetivo fundamental: Reequacionar o desenvolvimento da carreira militar através da introdução de mecanismos reguladores que permitam dar satisfação às legítimas expectativas individuais e assegurem um adequado equilíbrio da estrutura de pessoal das Forças Armadas. Alguns desses mecanismos são o estabelecimento de tempos máximos de permanência em alguns dos postos da hierarquia militar, a exclusão da promoção por efeitos de ultrapassagens, durante certo período, por um ou mais militares da mesma antiguidade, a possibilidade de passagem à reserva por declaração do militar ao ter completado 55 anos de idade e ainda a adoção da norma de aumento geral de serviço em 25% para efeitos de passagem à reserva ou à reforma. As formas de prestação do serviço efetivo subdividem-se em quatro modalidades: serviço efetivo nos quadros permanentes (QP); serviço efetivo em regime de contrato (RC); serviço efetivo em regime de voluntariado (RV); e serviço 69

75 Gestão de Carreiras no Exército Português efetivo decorrente de convocação ou mobilização (art.º 3). O serviço efetivo nos QP compreende a prestação de serviço pelos cidadãos que, tendo ingressado voluntariamente na carreira militar, adquirem vínculo definitivo às Forças Armadas (art.º 4). O serviço efetivo em RC compreende a prestação de serviço voluntário por um período de tempo limitado, com vista à satisfação das necessidades das Forças Armadas ou ao seu eventual ingresso nos QP. Também o serviço efetivo em RV compreende a prestação de serviço militar voluntário por um período de 12 meses, com vista à satisfação das necessidades das Forças Armadas, ao ingresso ao RC ou ao eventual recrutamento para os QP (art.º 5). Já o serviço efetivo decorrente de convocação ou mobilização compreende o serviço militar prestado na sequência do recrutamento excecional, nos termos previstos na Lei do Serviço Militar, sendo que o conteúdo e a forma de prestação do serviço efetivo por convocação ou mobilização são regulados por diploma próprio (art.º 6). As Bases Gerais do Estatuto da Condição Militar foram instituídas pela Lei n.º 11/89, de 1 de Junho. Aí são estabelecidos os direitos e os deveres dos militares dos quadros permanentes em qualquer situação e dos restantes militares enquanto na efetividade de serviço, bem como a definição dos princípios orientadores das respetivas carreiras. O art.º 2 desse documento legislativo determina que a condição militar se carateriza pela subordinação ao interesse nacional; pela permanente disponibilidade para lutar em defesa da Pátria, se necessário com o sacrifício da própria vida; pela sujeição aos riscos inerentes ao cumprimento das missões militares, bem como à formação, instrução e treino que as mesmas exigem, quer em tempo de paz quer em tempo de guerra; pela subordinação à hierarquia militar, nos termos da lei; pela aplicação de um regime disciplinar próprio; pela permanente disponibilidade para o serviço, ainda que com sacrifício dos interesses pessoais; pela restrição, constitucionalmente prevista, do exercício de alguns direitos e liberdades; pela adoção, em todas as situações, de uma conduta conforme com a ética militar, por forma a contribuir para o prestígio e valorização moral das Forças Armadas; pela consagração de especiais direitos, compensações e regalias, designadamente nos campos da Segurança Social, assistência, remunerações, cobertura de riscos, carreiras e formação. Nesse documento, o art.º 11 torna explícito que é garantido a todos os militares o direito de progressão na carreira, nos termos fixados nas leis e orientando-se o desenvolvimento das carreiras em função dos seguintes princípios básicos: relevância de valorização da formação militar; aproveitamento da capacidade profissional, avaliada em função da competência revelada e da experiência; adaptação à inovação e transformação decorrentes do progresso científico, técnico e operacional; e 70

76 Boletim de Sociologia Militar n.º3 harmonização das aptidões e interesses individuais com os interesses das Forças Armadas. O articulado seguinte (art.º 12) estipula que os militares têm o direito e o dever de receber formação de atualização, reciclagem e progressão, com vista à valorização humana e profissional e à sua progressão na carreira. PLANEAMENTO DAS CARREIRAS MILITARES O desenvolvimento de carreiras implica necessariamente o planeamento de recursos humanos. A organização tem de prever que movimentos poderão ocorrer, que funções serão necessárias, quantas vagas existirão ao longo do tempo e quais os recursos humanos disponíveis para as ocupar. Para tal, é fundamental que a organização tenha uma perspetiva integrada dos recursos humanos, uma visão estratégia e proactiva, e seja capaz de adaptar as melhores práticas de gestão de RH às suas condições particulares. O Plano de RH (PRH) de uma Unidade Orgânica pretende contribuir para o desenvolvimento dos militares que se encontram ao serviço, traçando-lhes planos de carreira, reconvertendo-os ou dando-lhes formação para que possam adquirir as competências que se anteveem como fundamentais. Trata-se de um exercício complexo, mas fundamental para o desenvolvimento estratégico da instituição militar. O PRH pode ser visto como um palco no qual contracenam os interesses e perspetivas organizacionais e as aspirações e desejos de desenvolvimento dos militares, com o objetivo de articular os dois polos e compatibilizar objetivos individuais e organizacionais (Nunes, 2004). Considera-se que só concedendo aos militares uma perspetiva de desenvolvimento pessoal e profissional é que uma U/E/O pode aspirar a construir uma relação de permanência mais ou menos prolongada com os seus quadros. No fundo, revela a sua capacidade para reter e desenvolver os RH (Câmara et al., 2010). Se o PRH for desajustado, terá repercussões nos planos de carreira dos quadros. Do mesmo modo, se esses planos não forem ao encontro dos desejos e aspirações dos militares, existe uma forte probabilidade de estes abandonarem a sua U/E/O ou até mesmo a instituição (Ribeiro, 2010). Dado que um dos objetivos das U/E/O é projetar as necessidades futuras de RH, a sua calendarização, o perfil, o número e a sua localização nessa estrutura, a responsabilidade pela construção de um PRH tem que ser centralizada na Secção de Pessoal, para permitir um desenvolvimento equilibrado e harmonioso, e garantir coordenação e sinergias interfuncionais. Trata-se, pois, de um processo dinâmico e em constante aperfeiçoamento de identificação antecipada dos pontos críticos em que 71

77 Gestão de Carreiras no Exército Português é mais provável que ocorram falhas, excessos ou uso ineficiente de militares (Ribeiro, 2010). O planeamento das carreiras operacionaliza o princípio do recrutamento interno, ao procurar identificar no interior de uma U/E/O pessoas capazes de preencherem as necessidades projetadas. Esse planeamento deve permitir a satisfação das necessidades da U/E/O pela cooptação e desenvolvimento das pessoas que a compõem. São, no fundo, um conjunto de ações programadas que têm por objetivo permitir o desenvolvimento pessoal e profissional do militar, de modo a que o mesmo consiga concretizar o potencial que lhe foi detetado (Oliveira, 2009). Por outro lado, quando um militar se candidata a uma nova função na organização está a manifestar o desejo de mudança do lugar que naquele momento ocupa. Neste sentido, o recrutamento interno no Exército alberga três soluções: escolha direta, concurso interno ou método do tipo recomendar um amigo 4. A escolha direta é aquela que tem normalmente mais reações negativas dentro da organização, pelo facto de ser percecionada como uma ação de favoritismo, em detrimento de outras candidaturas igualmente valiosas (Ribeiro, 2010). A principal vantagem do processo de recrutamento interno é o facto de permitir o desenvolvimento das pessoas que já pertencem à organização e de lhes proporcionar perspetivas de carreira. Este tipo de recrutamento autoriza o cumprimento dos planos de carreira, a utilização do talento disponível na organização e a retenção dos elementos-chave, concedendo-lhes oportunidades de progredirem na organização (Chiavenato, 2002; Nunes, 2004). Por conseguinte, neste processo, todas as candidaturas deveriam ser consideradas de forma igual, procurando-se que a seleção fosse feita da forma mais transparente possível para não haver distorções ou emergência de sentimentos de injustiça. Para além da oferta de oportunidades e planos de carreira, existem outras vantagens, como a diminuição dos custos (de tempo, financeiros e logísticos) associados ao processo de recrutamento externo; um maior índice de validade e de segurança, já que se conhece os militares e as suas competências; um aproveitamento dos investimentos em formação efetuados pela organização; e o desenvolvimento de um espírito saudável de competição (Cherrington, 1995; Torrington et al., 2011). Não obstante as vantagens, este procedimento não é isento de potenciais pontos fracos. Destaca-se o facto deste tipo de recrutamento poder constituir-se como uma fonte de conflito entre os colaboradores e o facto de não permitir a entrada de novos saberes e competências na instituição; de existirem questões éticas que se 4 Correspondente ao método Referências na literatura sobre Recrutamento e Seleção. 72

78 Boletim de Sociologia Militar n.º3 prendem com a transmissão do potencial individual atribuído a um militar, o que poderá criar expectativas impossíveis de satisfazer, levando à desmotivação; a necessidade de existirem colaboradores com potencial de desenvolvimento e que possam ser movimentados (Cherrington, 1995; Nunes, 2004). O planeamento de carreiras é um exercício limitado na medida em que depende da estrutura da própria U/E/O e da pequena percentagem de militares que esta pode acolher. Para além deste aspeto, sublinham-se ainda os custos associados e a complexidade relativa a determinadas necessidades das U/E/O. Se não se transmite essa informação, pode-se também perder um argumento que permite reter e motivar um militar, e, por outro lado, a justiça face ao facto de se ter que excluir uma parte elevada de militares das oportunidades de carreira (Nunes, 2004). Um dos fatores condicionantes do PRH é precisamente a taxa de rotação dos militares. A literatura revela que a rotação de pessoal constitui um fenómeno complexo e com múltiplas causas, onde se incluem as salariais. Na instituição militar, a solicitação voluntária de rotação encontra-se associada a fatores de desmotivação, más condições de trabalho, insatisfação na função, elevado nível de stress, estilo de gestão inapropriado, falta de reconhecimento ou oportunidades de desenvolvimento pessoal e desejo de maior acesso a ações de formação (Nunes, 2004). A rotação pode ainda dever-se a causas naturais, tais como a incapacidade para o trabalho, morte, atingir a idade da reserva, término do contrato e por iniciativa da U/E/O (geralmente por questões disciplinares) ou do próprio militar. Pode também decorrer de causas endógenas, relativas a aspetos particulares da vida da unidade (e.g., motivos de promoção, formação), ou causas exógenas (e.g., desenvolvimento natural da carreira dos militares). A rotação dos militares baixa à medida que a idade ou antiguidade aumentam, sendo mais significativa nos militares com nível de qualificação mais baixo (Ribeiro, 2010). A rotação de efetivos nas U/E/O é sempre um problema para o Comandante/Diretor/Chefe e para o seu conselheiro na área de pessoal (Chefe da Seção de Pessoal ou equivalente), pois têm de tentar conciliar as necessidades de serviço e os interesses individuais dos militares. Se é verdade que o grau de exigência dos militares é cada vez maior, quer para com a instituição, esperando que esta lhes proporcione os direitos que estão consignados na Lei, quer para com as U/E/O a que pertencem, que se encontram condicionadas pelas missões que têm de cumprir (Nunes, 2004), também é preciso reconhecer o aumento da multiplicidade e polivalência de funções dos militares, procurando-se assim fazer face às restrições orçamentais e aos condicionamentos relacionados com a falta de RH (Nunes, 2004). 73

79 Gestão de Carreiras no Exército Português PROPOSTA DE INTERVENÇÃO O principal objetivo do presente trabalho era, como já se deixou explícito, compreender a forma como as carreiras militares são geridas no Exército Português, com o intuito final de desenvolver um plano de carreiras, onde se compatibilize os objetivos e expetativas de carreira dos militares e os interesses da própria instituição. O diagnóstico de natureza qualitativa, que serviu de base ao estudo, assentou em entrevistas semiestruturadas, conduzidas a três colaboradores do Exército: Major General, Coronel e Tenente Coronel. A sua escolha justifica-se pelo facto de serem interlocutores-chave e fontes de informação privilegiadas ao nível da Gestão de Recursos Humanos 5. A análise de conteúdo realizada às respostas dos entrevistados permitiu efetuar uma análise SWOT 6 da situação do Exército Português no que concerne à gestão de carreiras. Os pontos fortes e os pontos fracos, bem como as oportunidades e ameaças existentes, encontram-se sistematizados na Figura 1. 5 Inicialmente estava previsto a realização de um maior número de entrevistas (a três Generais e a três Coronéis), no entanto, devido a constrangimentos temporais, e a alguma burocracia, fomos forçadas a conduzir apenas três entrevistas. 6 A análise SWOT (Strengths, Weaknesses, Opportunities, Threats) consiste no estudo da envolvente interna (forças e fraquezas) e externa (ameaças e oportunidades) de uma organização. 74

80 Ambiente Externo Ambiente Interno Boletim de Sociologia Militar n.º3 Figura 1. Análise SWOT Forças Modelo atual é um modelo simples que permite a promoção do máximo de oficiais aos postos mais elevados da hierarquia Modelo legislado ao pormenor (cf. detalhe normativo do EMFAR), transmite uma ideia de grande transparência e objetividade Oportunidades Abertura à sociedade civil e às práticas de gestão de carreiras realizadas em outras instituições Protocolos com centros de formação; Pressão externa poderá proporcionar uma implementação de um novo sistema com menor resistência à mudança Fraquezas Ausência de um sistema eficaz de gestão de carreiras Escassez de RH Ausência de perfis funcionais totais, de um sistema de avaliação de potencial e de análise de funções Antiguidade inibe as pessoas de serem escolhidas em função das competências; Limitação geográfica economia financeira. Oficiais escolhidos conforme a área geográfica Financeira Quebra de expetativas Ameaças Conjuntura económica (congelamento das promoções). Crescente constrição orçamental poderá originar uma diminuição dos postos superiores Fonte: Análise das Entrevistas O modelo de intervenção proposto divide-se em dois eixos de análise: (i) o ponto de vista da instituição e (ii) o ponto de vista do militar. A separação destes dois eixos só é possível analiticamente, pois, na realidade, são interdependentes e o desenvolvimento de um está intimamente condicionado pelo desenvolvimento do outro. A Figura 2 apresenta, de forma esquemática, o modelo de Gestão de Carreiras proposto. 75

81 Carreira Vertical (Modelo existente atualmente) ~ M Gestão de Carreiras no Exército Português Figura 2. Modelo Proposto Objetivos da Organização Necessidades e oportunidades da Organização Gabinete de apoio às carreiras: Gestor de Carreiras Focus on Growth Objetivos do militar Desejos e expetativas do militar Funções Vagas Análise dos recursos humanos disponíveis Questionário de expetativas de carreira Mentoring e Coaching Manager as career coach Competências Desempenho e performance do militar Identificar o potencial do colaborador - Recrutamento e Seleção; - Análise de Funções Planos de evolução na carreira - Avaliação de desempenho - Formação Candidato Fase de admissão/entrada na AM Testes Psicológicos; conhecer o potencial de cada candidato General Tenente-General Major-General Brigadeiro-general Coronel Tenente-Coronel Major Capitão Carreira Horizontal Durante o 4º ano da AM Âncoras de carreira Tenente Alferes Aspirante a Oficial Soldado Cadete 76

82 Boletim de Sociologia Militar n.º3 O modelo de gestão de carreiras que se encontra em vigor no Exército recordemo-lo é um modelo tradicional, onde a tónica é colocada na carreira vertical. Este modelo encontra-se hoje algo ultrapassado, já que os imperativos e as necessidades emergentes sublinham aspirações e expectativas de carreira congruentes com as motivações individuais dos colaboradores, impelindo à necessidade de harmonização entre interesses individuais e organizacionais. Apesar da necessidade de compatibilização entre estes dois interesses, não existe ainda um consenso relativamente a quem pertence a responsabilidade da gestão da carreira, se ao indivíduo, se à organização. De acordo com a literatura, parece razoável propor que a gestão de carreiras seja uma responsabilidade partilhada por ambos. O desenvolvimento da carreira por parte da organização não morreu, parecendo antes assistir-se a uma espécie de dança organizacional, um processo de influência mútua entre indivíduos e organizações, em que cada parte é simultaneamente agente e alvo de influência (Cunha et al., 2010, p. 616). Neste sentido, sob o ponto de vista organizacional, emergem os objetivos, as oportunidades e as necessidades da organização, na sua relação estreita com o meio envolvente. Do ponto de vista individual, sobressaem os objetivos dos militares, as suas expectativas e desejos ao nível da carreira, em função dos contextos onde se inserem. Entre estas duas lógicas de ação, aparentemente contraditórias, é necessário estabelecer-se uma ponte que permita a troca de sinergias entre as partes. Tal troca pode ser realizada por intermédio de uma figura mediadora, cuja missão se insere não só na defesa dos objetivos organizacionais, mas também na orientação dos objetivos individuais face às oportunidades existentes na instituição. Essa figura é assumida por nós como Gestor de Carreiras, que deverá exercer a sua função dentro do Gabinete de Apoio às Carreiras, a ser criado para o efeito. No Exército, já existe a Repartição do Pessoal Militar onde se gerem as carreiras militares, mas esse apoio é meramente administrativo. A gestão de carreiras em contexto militar deverá assentar numa perspetiva integrada de RH, socorrendo-se dos subsistemas de gestão de RH ao dispor, nomeadamente o recrutamento interno e a descrição de funções. Enquanto o recrutamento exige a identificação das vagas e a análise dos RH disponíveis, a descrição de funções permite delinear previamente um perfil que inclui as hard e as soft skills necessárias ao desenvolvimento do cargo em análise. Por outro lado, a organização deve também atender aos objetivos pessoais de carreira dos militares e, para tal, é necessário recolher informação relativa à sua avaliação de desempenho e ao plano de formação. Estes indicadores permitem recolher informações sobre as competências e sobre o desempenho do militar, identificando o seu potencial. 77

83 Gestão de Carreiras no Exército Português Tendo estes aspetos em consideração, entendemos que a gestão de carreira deve constituir uma preocupação desde o início da admissão na Academia Militar. A instituição deve registar, em base de dados, e de forma regular, os resultados dos testes psicológicos que permitem dar a conhecer o estado cognitivo atual do militar e o seu potencial de desenvolvimento. Já vimos que o trajeto de carreira no Exército é vertical, caraterizando-se pela sucessão de postos. No entanto, devemos ter em conta que os militares não se regem todos pelas mesmas motivações, aspirações ou desejos de carreira. Daí que haver igualmente um trajeto horizontal possa ser uma proposta válida e eficaz. Este trajeto teria início a partir do posto de Capitão. Aí, o militar, juntamente com o seu aconselhador ou gestor de carreira, poderia escolher o seu percurso. A carreira horizontal implicaria uma progressão mais lenta nos postos, até à posição de Tenente-Coronel mas, em contrapartida, o militar estaria a desempenhar funções do seu agrado, sem mobilidades geográficas. O militar poderia escolher o que mais o motiva: a componente operacional ou a estabilidade emocional, familiar e geográfica. O desenvolvimento de uma carreira horizontal encontra-se intimamente relacionada com a aquisição e aprofundamento de competências que devem ser transversais a toda a organização. Por esse motivo, consideramos aqui fundamental o papel da formação profissional e dos development centres, com o objetivo de potenciar skills nos militares que possam ser uma mais-valia no desenvolvimento de uma carreira horizontal. Durante o 4.º ano da Academia Militar, propomos a administração de um questionário para aferir as chamadas Âncoras de Carreira, dada a importância de, antes do início da carreira propriamente dita, militares e instituição conhecerem as orientações de carreira daqueles. O conceito Âncora de Carreira foi desenvolvido a partir dos estudos de Edgar H. Schein (1990a), que explorou o conjunto de autoperceções relativas a talentos e habilidades, motivações e atitudes, necessidades e valores, baseadas nas experiências efetivas de cada sujeito e que norteiam as suas escolhas profissionais. Existem várias Âncoras de Carreira (Schein, 1990b): Competência Técnica/Funcional nesta âncora, o profissional adquire sentido de identidade através da aplicação das suas habilidades técnicas. A realização profissional decorre da possibilidade de enfrentar desafios; Competência de Gestão Geral o profissional orientado para a gestão global possui a capacidade de realizar um contrato psicológico com a organização, para que o sucesso da organização seja o seu sucesso; Autonomia/Independência aqui encontram-se as pessoas que possuem um nível reduzido de tolerância pelas regras estabelecidas por outras pessoas, por 78

84 Boletim de Sociologia Militar n.º3 procedimentos e outros tipos de controlo que venham a cercear a sua autonomia; Segurança/Estabilidade a principal preocupação é a sensação de bem-estar gerada pela baixa volatilidade na sua carreira. Para isso, o profissional aqui ancorado irá guiar as suas decisões de carreira na segurança e estabilidade oferecidas; Criatividade Empreendedora esta âncora carateriza os profissionais focados na criação de novas organizações, serviços ou produtos; Serviço/Dedicação a uma causa integra os indivíduos que não estão dispostos a renunciar, em hipótese alguma, aos seus valores pessoais. Executam, assim, atividades profissionais que possam integrar esses valores; Desafio a superação de obstáculos aparentemente impossíveis e a solução de problemas insolúveis definem o sucesso para os profissionais aqui ancorados. Estilo de Vida nesta âncora, o profissional procura encontrar uma forma de integrar as necessidades individuais/familiares e as exigências de carreira. Grande parte das pessoas preocupa-se com várias destas questões, mas em diferentes graus. Exercer um trabalho que se ajuste às suas âncoras permite ao indivíduo ser mais produtivo e estar mais satisfeito. O reconhecimento das âncoras possibilita-lhe o desenvolvimento de estratégias de carreira que combinem os seus talentos e valores com as oportunidades existentes na organização. Por estas razões, consideramos que a figura do Gestor de Carreiras, tal como propusemos, seria benéfica para o Exército Português, na medida em que preocupar-se-ia essencialmente com três procedimentos de intervenção: 79

85 Gestão de Carreiras no Exército Português Figura 3: Procedimentos de intervenção Focus on growth Preocupações de carreira Mentoring e Coaching As pretensões e objetivos Coaching consiste no de carreira alteram-se desenvolvimento de constantemente, por isso a competências e de gestão das habilidades para que preocupações/expectativas resultados planeados de carreira deve ser possam ser alcançados realizada em vários com êxito. Um coach auxilia momentos ao longo da vida e apoia o coachee militar: na avaliação de (colaborador) a atingir uma desempenho; questionários performance desejada. e inquéritos de motivação, clima e satisfação no trabalho. A focalização deve ser nos valores, aspirações e interesses pessoais, com vista ao crescimento; É necessário identificar as competências pessoais e as oportunidades de desenvolvimento e de melhoria; Consolidar a informação recolhida num plano de desenvolvimento de carreira estruturado e em coerência com as orientações estratégicas da organização; Implementação de uma entrevista anual de avaliação dos projetos de carreira. Mentoring é uma espécie de tutoria onde um profissional mais experiente orienta e partilha com profissionais mais jovens, experiências e conhecimentos no sentido de dar-lhes orientações e conselhos para o desenvolvimento das suas carreiras. Fonte: Baseado em van de Ven (2007). A atuação do Gestor de Carreiras deverá ser vista como um manager as career coach, atuando como um coach, realizando discussões construtivas com o militar e atuando como seu advogado de carreira, tal como sugere Frans van de Ven (2007). Para tal, deverá preconizar papéis tão diversos como: (a) desafiar e ajudar o militar a concretizar as suas aspirações e interesses em matéria da carreira, testando se são robustos e realistas; (b) proporcionar feedback ao militar e discutir com ele o desempenho, o potencial, as forças e as oportunidades de melhoria; (c) comunicar aberta e de forma franca com o militar sobre o facto de as suas expectativas serem ou não realistas; (d) motivar e ajudar o militar a gerar opções e a traduzi-las num plano de ação exequível (van de Ven, 2007). Após esta análise individual, é necessária uma reunião de revisão global do desenvolvimento de carreira, a ser preconizada pelos diversos Gestores de Carreira, com o intuito de combinar as oportunidades de desenvolvimento (e.g., vagas em aberto, rotação das funções, missões especiais, etc.) com as aspirações e necessidades dos militares. Desta reunião deverá resultar um plano de desenvolvimento integrado, que contém as ações a realizar para cada militar, as suas responsabilidades e a orientação necessária. As decisões inicialmente tomadas nesta reunião devem ser comunicadas ao militar, procurando que este expresse a sua 80

86 Boletim de Sociologia Militar n.º3 opinião sobre a solução encontrada. Todos os procedimentos devem ser claramente expostos e os colaboradores devem ter acesso a toda a informação. A Figura 4 apresenta, em síntese, os instrumentos que podem ser utilizados na gestão de carreiras dos militares do Exército Português. Figura 4. Instrumentos de Gestão de Carreiras Instrumentos de Ação Avaliação das Expectativas Avaliação de desempenho Questionário/Inventário das preocupações de carreira Âncoras de Carreira Planos de Carreira Mentoring Coaching Planos de desenvolvimento pessoal Mobilidade Horizontal Mobilidade Vertical Recrutamento Interno Desenvolvimento de Competências Formação Development Centres CONSIDERAÇÕES FINAIS CONSIDERAÇÕES FINAIS O estudo que está na base do presente artigo teve como principal objetivo compreender a forma como as carreiras militares são geridas no Exército Português. As entrevistas realizadas a interlocutores-chave permitiram concluir que: (i) a gestão de carreiras no Exército não é realizada com base numa análise de funções, por forma a orientar melhor os desempenhos dos militares para funções de maior responsabilidade e adequação; (ii) o Exército Português carece de uma estrutura específica que se dedique à gestão de carreira dos militares; (iii) durante o processo de gestão de carreiras (entendido pelo Exército como uma movimentação vertical decorrente da antiguidade) não são auscultadas as expectativas, aspirações e motivações dos militares quanto à sua carreira. Atendendo a estas conclusões, julgámos ser pertinente avançar com a proposta de um modelo de gestão de carreiras, passível de ser implementado no Exército Português. Este modelo coloca a tónica na existência de um Gestor de Carreiras e de um Departamento para o efeito, com a preocupação de conciliação e compatibilização dos interesses individuais dos militares e os da organização. Neste processo, serão auscultadas as expectativas, aspirações e motivações dos militares, e 81

87 Gestão de Carreiras no Exército Português será considerada uma movimentação horizontal de carreira que permita desenvolver competências transversais a toda instituição. É nossa expectativa que este trabalho venha a constituir um contributo válido para o Exército Português ao nível da gestão de carreiras. O desafio que empreendemos levou-nos a refletir e a sistematizar as informações recolhidas num modelo de carreiras que possa ser útil e aplicável. Como na maioria das investigações, surgiram vários obstáculos (dificuldades na obtenção das entrevistas ou no acesso a determinados documentos do Exército, entre outros), cujos efeitos tentámos minimizar sem prejuízo para o trabalho final. As propostas que aqui foram avançadas podem servir igualmente de ponto de partida para novas investigações relativas à avaliação da implementação deste modelo de gestão de carreiras. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Câmara, P.B., Rodrigues, J.V. e Guerra, P.B. (2010). Novo Humanator: Recursos Humanos e Sucesso Empresarial. Lisboa: Dom Quixote. Carvalho, J. (2003). Sistema de Avaliação do Mérito do Pessoal Militar: Suporte do Sistema de Promoções. Sintra: Instituto de Altos Estudos da Força Aérea. Cherrington, D.J. (1995). The Management of Human Resources (4th ed.). New Jersey: Prentice Hall. Chiavenato, I. (2002). Recursos Humanos (7ª ed.). S. Paulo: Editora Atlas. Cunha, M. P., Rego, A., Cunha, R. C., Cabral-Cardoso, C., Marques, C. A. & Gomes, J. F. S. (2010). Manual de Gestão de Pessoas e do Capital Humano (2.ª ed.). Lisboa: Sílabo. Dutra, J. (1996). Administração de Carreiras: Uma Proposta para Repensar a Gestão de Pessoas. São Paulo: Atlas. Hall, D. (2002). Careers In and Out of Organizations. London: Sage. Mintzberg, H. (2011). Managing. San Francisco: Berrett-Koehler Publishers. Nunes, P. (2004). O Dia-a-Dia de uma Unidade Regimental. Dificuldades e Desafios da Gestão de Recursos Humanos. Lisboa: Revista da Academia Militar. Oliveira, U. (2009). Institucionalização de um Sistema de Acompanhamento e Aconselhamento Permanente das Carreiras Militares, com Previsão de Pontos de Aferição e Eventual Saída da Organização. Lisboa: Instituto de Estudos Superiores Militares (IESM). Ribeiro, J. (2010). A Gestão de Recursos Humanos na Força Aérea. Lisboa: Instituto de Estudos Superiores Militares (IESM). 82

88 Boletim de Sociologia Militar n.º3 Schein, E.H. (1990a). Career Anchors and Job Planning: The Links between Career Pathing and Career Development. Cambridge: MIT Review. Schein, E.H. (1990b). Career Anchors (revised edition). San Diego: University Associates. Tieppo, C., Gomes, D., Sala, O. e Trevisan, L. (2011). Seriam as âncoras de carreira aderentes às carreiras inteligentes? Estudo comparativo entre alunos formandos do curso de administração de empresas e turismo. Revista Gestão Organizacional, 4 (2), Torrington, D., Hall, L., Taylor, S. e Atkinson, C. (2011). Human Resource Management (8th ed.). Pearson. van de Ven, F. (2007). Fulfilling the promise of career development: Getting to the heart of the matter. Organization Development Journal, 25(3), Fontes jurídicas Decreto-Lei n.º 236/99 de 25 de Junho, Diário da República, I Série, n.º 146 Decreto-Lei n.º 34-A/90, de 24 de Janeiro, Diário da República, I Série, n.º 20 Lei n.º 11/89 de 1 de Junho, Diário da República, I Série, n.º 125 Portaria n.º 1246/2002 de 7 de Setembro, Diário da República, I Série, n.º

89 Boletim de Sociologia Militar N.º PP.84 a 118 GESTÃO E DESENVOLVIMENTO DE CARREIRAS - O caso da Marinha Portuguesa - 1 Adelino Costa Cabral * RESUMO A Gestão e Desenvolvimento de Carreiras assumem, numa sociedade em constante mutação, onde o paradigma deslocou o centro da acção da organização para o indivíduo, papel preponderante na sustentação e desenvolvimento das organizações. As pessoas, ao longo do último século, preponderaram como charneira dinamizadora do acto organizacional e principal factor de competência a uma adaptação, consequente, às alterações da envolvente, assumindo, progressivamente, uma gestão individual da carreira. A Marinha Portuguesa, como instituição inserida numa sociedade global, não pode estar desatenta perante as melhores práticas, de modo a manter competitividade num mercado de trabalho onde todos querem conservar, nas suas fileiras, indivíduos satisfeitos e motivados, que concorram de forma indelével para o cumprimento da missão. O propósito deste estudo referenciou-se numa aspiração da Marinha de conceber um sistema generalizado e sistemático para o acompanhamento individualizado dos Recursos Humanos e o aconselhamento de percursos funcionais coerentes, motivadores e com potencial de carreira. Para esse fim, adoptou-se a metodologia Estudo de Caso, ajustada a uma situação em contexto real, tendo-se recorrido, para um eficaz diagnóstico, a diferentes técnicas de recolha e análise de dados. Para responder à questão base, desenhou-se um plano de intervenção, assente no evidenciado e consubstanciado num conjunto de acções que perfilhem a edificação de um programa de Gestão e Desenvolvimento de Carreiras participado e cooperativo, onde a conciliação de interesses, individuais e organizacionais, seja um desiderato a alcançar. Palavras-Chave: carreiras; acompanhamento; evolução; sucesso ABSTRACT The career s management and development, inside a constantly moving society, where the paradigm have changed the organizational action centre to the individual, assume a preponderant role in the organization s maintenance and development. During the last century the people has the dynamic strength of the organization s activity and was the main factor of a skilled adaptation to the environment changes. Furthermore, they assumed, in a progressive way, the management career as an individual task. The Portuguese Navy, as an institution integrated in a global society, have to to maintain the competitiveness level in the labour market where all (institutions/organizations/enterprises) want to have motivated and satisfied collaborators who guarantee the accomplishment of the mission. Because of that, the Portuguese Navy could not have an attitude of inattention to the best practises. This study took as reference the Portuguese Navy s ambition of creating a generalized and methodical system to allow the human resources individualized attendance and the specialized career consulting. The adopted methodology was the Case Study, adjusted to a real context, and to efficacy diagnostic, different techniques of analyses and gathering data were used. The structure of the conceptual framework was essentially based on the literature s review, which sustained all the study. In order to answer to the central question, it was elaborated a plan of action to implement an interactive management and development career s program. The proposal of action assumes the organizational and individual interest s conciliation as a goal to achieve during the program implementation. Key-words: careers; monitoring; evolution; success 1 Este artigo é baseado num projeto, defendido pelo autor, em 23 de janeiro de 2012, no ISCTE, no âmbito do Mestrado em Gestão de Recursos Humanos. * Capitão-de-fragata da Marinha. 84

90 Boletim de Sociologia Militar n.º3 1. INTRODUÇÃO A sustentação das organizações, na sociedade contemporânea, torna premente a adopção e edificação de políticas, modelos e práticas de Gestão de Recursos Humanos (GRH) potenciadores na atracção, manutenção e desenvolvimento dos activos humanos mais bem preparados, tendo em conta que são os únicos actores capazes de responder, em tempo e de forma eficiente, a qualquer alteração da envolvente. Com a globalização e evolução tecnológica, as organizações adaptaram-se à realidade da sociedade económica e posteriormente do conhecimento, ficando mais flexíveis e permeáveis à entrada e saída dos colaboradores (Hall, 1996; Sullivan, 1999; King, 2004; Baruch, 2004a e 2004b). Este fenómeno tem vindo a passar a responsabilidade da gestão da carreira da organização para o trabalhador, que hoje procura no trabalho motivações e recompensas distintas do passado. O trabalho para a vida já não é uma ambição de todos, o importante será, a título de exemplo, a realização pessoal, o desenvolvimento de aptidões e competências e o equilíbrio entre o trabalho e a família (Baruch, 2004b e 2006; Ng et al., 2005) Se a capacidade de gestão de carreiras passou da organização para o indivíduo, a responsabilidade também. Contudo, as organizações continuam a necessitar de pessoas que lhe permitam alcançar os objectivos estratégicos e a potenciação da sua imagem e implementação de produtos num mercado, que advindo da globalização, apresenta níveis de incerteza bastante elevados, onde existem cada vez mais actores e concorrência. Desta forma, a gestão e desenvolvimento de carreiras que respondam a essas questões base são práticas de extrema relevância para o progresso das organizações e para o alcançar do sucesso de cada um e de todos, num principio colectivista em que a organização é a potenciação da soma do valor dos seus membros. Não existe satisfação individual separada do sucesso organizacional (Greenhaus, Callagan e Godshalk, 2010; Tams e Arthur, 2010). No contexto militar essa necessidade é premente e contínua, devido ao fim do serviço militar obrigatório, no final do século passado. Essa alteração fez diminuir o número de elementos disponíveis, que levou a que as Forças Armadas fossem para o mercado de trabalho recrutar os seus activos em concorrência directa com os restantes intervenientes do tecido empresarial. Mas o fenómeno de trazer as pessoas para o contexto castrense é apenas o inicio do processo de atrair, manter e desenvolver pessoas. Após a contratação dos indivíduos torna-se necessário 85

91 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa consagrar uma cativante opção de carreira, de forma a manter os melhores nas fileiras. A realidade tecnológica que hoje constituí as plataformas militares carece de especificidades, comportamentos e competências exigentes, tornando necessárias práticas de gestão de desenvolvimento de carreira que acomodem os interesses individuais, numa conciliação, na maior expressão possível, com os da organização. A evolução das carreiras militares assente em dois eixos progressão horizontal e promoção vertical, conforme estatuído no Estatutos dos Militares das Forças Armadas (EMFAR), carece de ser contemplada de forma a permitir uma clareza de definição na responsabilidade e participação de cada elemento na definição da sua carreira que poderá progredir de forma mais ou menos linear, considerando a participação do indivíduo e as circunstâncias de oportunidade. Nestes pressupostos, um processo efectivo de gestão de carreiras, no âmbito da Marinha, é algo a prosseguir e fortalecer de modo a permitir manter e desenvolver os que evidenciem melhores capacidades e valências, num enquadramento dos valores e cultura organizacional vigentes e objectivos estratégicos projectados. Podemos aferir que todas as organizações necessitam de indivíduos para a sua actividade. Em contrapartida, a maioria dos indivíduos necessitam das organizações para desenvolverem o seu trabalho. O desafio nesta interacção emerge na procura do equilíbrio entre as solicitações individuais e a oferta institucional. As organizações querem os melhores para os seus quadros e os indivíduos pretendem integrar as organizações mais conceituadas. O cruzamento destas aspirações será o factor crucial para o sucesso das carreiras e para o êxito das actividades organizacionais. A carreira é um percurso de vida e cada um é construtor do seu caminho. Como proferia Peter Drucker A melhor maneira de prever o futuro é criá-lo. As carreiras dos militares regem-se por normativo legislativo, determinado superiormente, que enquadra formalmente e com alguma rigidez a sua gestão e desenvolvimento. Nessa decorrência, torna-se necessário proceder a alguma agilização deste processo com vista a torná-lo mais participado e efectivo, nomeadamente por recurso às novas tecnologias de informação e comunicação. Partindo deste pressuposto, que existe necessidade de uma avaliação e reestruturação, importa identificar os factores críticos do actual sistema de gestão de carreiras na estrutura castrense da Marinha, com o propósito de debelar as falhas identificadas, visando uma gestão mais eficiente do desenvolvimento de carreiras, que propicie um desempenho ajustado do potencial humano e articulado acréscimo de valor em sentido biunívoco. 86

92 Boletim de Sociologia Militar n.º3 Conforme relevado, torna-se necessário intervir ao nível das práticas de Gestão de Carreiras da Marinha, de modo a ir ao encontro do propósito traçado superiormente, através dos documentos estruturantes, de determinação interna para a execução das políticas de Recursos Humanos perspectivadas para esta matéria, e que se materializa em Conceber um sistema generalizado e sistemático para o acompanhamento individualizado dos RH da Marinha e o aconselhamento de percursos funcionais coerentes, motivadores e com potencial de carreira (DSRH). É com este objectivo que iniciámos o desenho do presente projecto numa perspectiva de colmatar uma necessidade da organização numa dimensão de adaptação das políticas instituídas às boas práticas organizacionais. Desta forma, propusemo-nos desenhar um modelo aplicado, no âmbito da gestão e desenvolvimento de carreiras, na estrutura da Marinha Portuguesa, assente numa perspectiva de sucesso individual e organizacional, numa participação colectiva e com a maior conciliação de interesses possível. O trabalho desenvolvido estrutura-se a partir de uma revisão de literatura sobre a temática em causa de gestão e desenvolvimento de carreiras, que permite conhecer a grandeza teórica enquadrante desta matéria e as práticas preconizadas para a envolvente contemporânea na perspectiva pessoal e da organização. Para se atuar é necessário conhecer a realidade vigente de forma a gizar um eficiente e eficaz rumo da intervenção. Assim, procedeu-se a um estudo de caso, cujo método e técnicas de recolha de dados necessários ao diagnóstico se evidenciam e explanam no capítulo três deste trabalho. Para que uma intervenção seja efectiva, é fundamental analisar o diagnosticado, a fim de projectar um plano baseado no patenteado e contribuinte para a resolução da questão evidenciada. Assim, estruturou-se o plano de intervenção que se pretende adequado na forma, aceitável na estrutura e exequível na dimensão. Em suma, a estruturação do trabalho assenta numa metodologia de identificação do problema através de um diagnóstico ajuizado nos dados evidenciados no estudo de satisfação efectuado aos elementos da Marinha, complementado por uma análise de conteúdo às contribuições abertas que os respondentes poderiam colocar no âmbito do questionário elaborado. Finalmente, compôs-se o caminho que poderia colmatar a necessidade patenteada, propondo-se um plano de intervenção que vá de encontro à política da organização para este área funcional e tenha o patrocínio do vértice estratégico para a sua implementação, contribuindo para essa factor a entrevista efectuada ao vicealmirante superintendente dos serviços do pessoal, que permitiu ter presente a vontade para a acção, numa perspectiva que enquadrasse todos os parâmetros da 87

93 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa questão, tendo em conta a dimensão da instituição, cultura organizacional vigente e capacidade de implementação do plano, na conjuntura atual. 2. ENQUADRAMENTO TEMÁTICO 2.1. Definição e caracterização de carreira As questões sobre a definição de carreira têm obtido resposta, pelos estudiosos desta matéria, de acordo com várias perspectivas. Em alguns campos de estudo, a carreira é tida como o conjunto de experiências, relacionadas com o trabalho, ocorridas ao longo da vida de uma pessoa (Greenhaus, Callanan e Godshalk, 2010). Outras ópticas atribuem como significado de carreira uma sequência evolutiva da experiência do trabalho ao longo do tempo (Arthur, Hall e Lawrence, 1989). Podemos, no entanto, considerar que uma carreira é a sequência de papéis e experiências, em ambiente de trabalho, na vida das pessoas, que ocorrem numa envolvente social específica, nomeadamente em organizações (Baruch, 2004a). Logramos então aferir que a carreira pode ser olhada sob quatro referenciais distintos (Hall, 2002): a) Como desenvolvimento profissional, numa mobilidade interna que possibilita uma ascensão hierárquica na organização; b) Como ocupação profissional, que pressupõe uma série de movimentos verticais ascendentes, ao longo do tempo de trabalho, independentemente da organização em que ocorrem; c) Como uma sequência de empregos e funções ao longo da vida, em que todas as pessoas com uma história de trabalho, possuem uma carreira; d) Como uma sequência de experiências profissionais ao longo da vida, cuja carreira representa um conjunto de vivências nos empregos e actividades que constituem a sua história de trabalho. Neste desígnio, o desenvolvimento de carreiras constitui-se em dois patamares indissociáveis (Hall, 1996): a) Planeamento de carreira: numa auto-consciência individual, das oportunidades com que se deparam, das escolhas que efectua, dos condicionamentos e consequências que daí advêm; da definição dos objectivos de carreira e do planeamento que giza do trabalho, da formação e outras experiências vivenciadas para parametrizar o sentido, oportunidade e a sucessão das acções a adoptar para atingir os objectivos de carreira; 88

94 Boletim de Sociologia Militar n.º3 b) Gestão da carreira: método de preparação, promoção e monitorização do planeado para a carreira de forma individual ou em conjunto com os sistemas de carreiras da organização em que se insere. Para Greenhaus, Callanan e Godshalk (2010), a gestão da carreira de um sujeito pressupõe um conjunto de acções que passam por diversos estádios e que facilitam observar a complexidade dos actos que concorrem para a carreira individual: Também a evolução do conceito de carreira, tem vindo a ajustar-se ao longo dos tempos. No passado a imagem era de as organizações possuírem estruturas hierárquicas rígidas que operavam num ambiente estável. O plano de carreiras, neste contexto, era previsível, seguro e linear. Em contraste, o actual sistema organizacional está caracterizado num modo de total mudança, dinamismo e fluidez. As carreiras são imprevisíveis, vulneráveis e multidimensionais. Estes dois cenários estão em extremos opostos. No entanto nenhum reflecte uma representação completa, verdadeira e justa do estado vigente (Baruch, 2006). Deste modo, alguns autores definem modelos que habilitam uma abordagem plural no conceito de carreira, Brousseau, Driver e Eneroth (1996) enunciaram quatros hipóteses fundamentais de experiências de carreira. Os padrões definidos diferem, basicamente, em termos de direcção e frequência do movimento dentro e entre diversos tipos de trabalho ao longo do tempo. Ainda segundo os mesmos autores, os indivíduos que adoptem carreiras de perito ou lineares têm vantagem em organizações burocráticas com estruturas mecanicistas. Enquanto que os indivíduos que desenvolvam carreiras em espiral ou transitórias não se enquadrarão neste tipo de organizações. A caracterização dos modelos de carreiras emergentes distingue-se pelas competências de cada elemento, necessárias no contexto de trabalho em que se insere ou num incremento da sua empregabilidade. As valências conseguidas pela passagem em várias organizações, a identificação com o trabalho que desenvolve, a aprendizagem em ambiente organizacional, o estabelecimento de redes sociais de suporte e a responsabilidade individual de gestão da sua carreira (Sullivan, 1999). A escolha, da actividade ocupacional e decorrentes resultados, têm como principal factor os valores culturais e de trabalho de cada indivíduo (Brown, 2002). Todavia, só uma decisão intuitiva não é efectiva, carecendo do acompanhamento de uma decisão racional. Por outras palavras, os indivíduos necessitam de usar a sua cabeça (racionalidade) e o seu coração (intuição) para tomarem uma decisão de carreira efectiva. Esta conjunção tende a produzir diferentes tipos de percepções complementares entre si (Singh e Greenhaus, 2004). 89

95 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa O compromisso que um individuo desenvolve no seio da empresa e que pode ser: afectivo, reflectindo um desejo de continuar membro da organização, desenvolvido em grande parte como resultado de experiências de trabalho que criam sentimentos de conforto e competência pessoal; de continuidade, espelhando uma necessidade de se manter na organização, devido aos custos associados à saída (e.g. falta de alternativas); ou normativo no sentido de uma obrigação de permanecer, resultante da interiorização de uma preceito de fidelidade ou o recepção de favores que exigem um determinado reembolso. A intenção de sair da organização diminui em correlação com o aumento do factor compromisso. Contudo, o comportamento do indivíduo será distinto em função da componente compromisso mais evidenciada (Meyer e Allen, 1991) O desenvolvimento desta temática, tem mostrado que o controlo da carreira se presencia, cada vez mais, sobre a influência do individuo do que da organização (Baruch, 2004b e 2006). Esta tendência para a gestão de carreiras individualizada pode decorrer em vantagens para as organizações e para os sujeitos. Para os elementos identifica-se na hipótese de poderem ter um leque alargado de opções de carreira. As organizações concentram-se na possibilidade de externalizar serviços, em vez de efectuarem despedimentos, contratando ex-colaboradores como consultores (Baruch, 2004b). Mas deve-se ter sempre como principio a criação de compromisso nos indivíduos que potencie um bem-estar pessoal e uma vontade de trabalhar em conjunção de critérios com os objetivos organizacionais (Meyer e Allen, 1991). Como se observou, existe no contexto actual uma necessária auto-gestão da carreira que se relaciona com os comportamentos dos indivíduos e que de acordo com King (2004) se dividem em três grandes grupos: de posicionamento, focados no alcançar dos objectivos de carreira através da uma escolha criteriosa nas oportunidades de mobilidade, num investimento estratégico no desenvolvimento do seu capital humano e numa rede social desenvolvida e activa; de influência, no sentido de influenciar as decisões dos elementos chave, para alcançar os resultados desejados; de gestão de fronteiras, num balanço de solicitações entre o domínio laboral e a vida extra-trabalho. Em contraste com as anteriores gerações, actualmente os membros das organizações são responsáveis pelas suas próprias carreiras, não considerando qualquer hipótese de uma carreira para a vida numa só organização (Kuijpers, Schyns e Scheerens, 2006). Existindo, possibilidade, de em conjunto com a ambição e astúcia individual, alcançar o topo da carreira, independentemente de onde se começa. Com a oportunidade vem a responsabilidade, sendo que o sucesso, na actual sociedade, baseada na economia, é induzido pelo conhecimento que cada um tem de si mesmo, 90

96 Boletim de Sociologia Militar n.º3 os seus factores de competitividade, valores e forma de alcançar bons resultados (Drucker, 2005). Muito do que se apelida de desenvolvimento de carreira deveria, com mais acuidade, ser caracterizado como comportamento vocacional, as escolhas individuais são mais do foro educacional e vocacional do que, efectivamente, uma escolha de carreira, onde a interacção coma envolvente está, permanentemente, presente (Savickas, 2002). A abertura dos mercados e da competição à escala global, à beira do século XXI, criou a necessidade de organizações em rede e consequentemente carreiras muito mais flexíveis (Hall, 1996). A principal modificação verifica-se na mudança de carreiras que ofereciam emprego seguro para todos, para carreiras que proporcionam oportunidades de desenvolvimento (Baruch, 2004a). Contudo, no presente, as perspectivas profissionais parecem ser muito menos definíveis e previsíveis, sendo a transição entre empregos mais frequente e difícil. Estas mudanças requerem dos trabalhadores o desenvolvimento de aptidões e competências, substancialmente, diferentes das requeridas no século XX, necessitando as pessoas de enfatizar a capacidade de flexibilidade humana, a adaptabilidade e a aprendizagem ao longo da vida (Savickas et al., 2009). Entre estas novas carreiras podemos identificar as proteanas, autodeterminadas e definidas pelos valores do indivíduo em contraposição às recompensas organizacionais, servindo a pessoa, a família e o propósito de vida (Hall, 2004). Este padrão de carreira assente na individualidade enfatiza a adaptabilidade do próprio e a definição da direcção que deseja seguir surgindo em contraposição à carreira sem fronteiras (boundaryless) que se encontra numa perspectiva organizacional de maior permeabilidade à entrada e saída dos colaboradores (Sullivan, 1999). A predisposição individual para uma carreira tipo proteana é um antecedente significativo para uma carreira de sucesso (Vos e Soens, 2008). Mas não devemos descurar, que as pessoas permanecem mais tempo nas firmas que apresentam boa reputação, num princípio de identidade interna (Chun, 2005) Sucesso na carreira De acordo com Baruch (2004b), a organização deve ser capaz de proporcionar aos seus colaboradores opções que lhes permitam ter sucesso nas suas carreiras. No entanto, se a essência das carreiras tem vindo a mudar, também o significado de sucesso têm evoluído, diferenciando-se conforme o referencial: O factor satisfação na carreira, assim como o relacionado com benefícios tangíveis, como altos salários e promoções frequentes estão relacionados com uma postura proactiva (Seilbert, Crant e Kraimer, 1999). Os comportamentos de 91

97 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa proactividade que contribuem de forma intrínseca e extrínseca para criar condições para uma carreira de sucesso consubstanciam-se: em ser inovador, em vez de manter uma orientação para o status-quo; em assumir princípios de astúcia política e empenho activo no planeamento de carreira, procurando um retorno. Estas acções específicas aumentarão a probabilidade de uma maior recompensa extrínseca e intrínseca (Seibert, Kraimer e Crant, 2001). Os indivíduos, que se mobilizam numa perspectiva de mudança de carreira, aumentam as suas possibilidades se construírem relações em variados contextos sociais. Devendo edificar uma alargada matriz de relações de aconselhamento. Incrementando dessa forma o grau de acesso à informação, mas mais importante, a flexibilidade cognitiva e a capacidade para ponderar de forma alargada e criativa um amplo campo de possibilidades (Higgins, 2001). A relação entre satisfação na carreira e conflito trabalho-família é uma mediação que poderá evidenciar-se como moderador negativo, devendo ter em conta diversos factores como são o género, o estado parental e marital, as fontes de suporte, a comunidade em que se está inserido e os recursos financeiros. Sendo a retenção de talentos um importante objecto para as organizações, compreender os factores que influenciam a satisfação individual com a carreira é de extrema importância (Martins, Eddleston e Veiga, 2002). A questão de como efectuar o balanceamento das actividades e interacções trabalho-família, torna-se saliente na reflexão sobre as competências e aspirações de cada indivíduo. Gerir as interacções entre os diferentes domínios da vida tornou-se uma preocupação primordial para os trabalhadores periféricos, cujo trabalho é contingencial, free-lance, temporário, externo, part-time ou casual (Savickas et al., 2009). O modo como sempre foi pedido o incremento de capacidades, competências e enfrentar estratégias para estar num mercado de trabalho flexível, é agora suplementado por um entendimento profundo e alargado de como as pessoas devem agir de forma a serem as escolhidas. O pensamento do novo século deve entender a carreira como uma questão de autonomia pessoal num mercado de trabalho livre (Law, Meijers e Wijers, 2002). As pessoas podem recorrer a múltiplos pontos de referência para avaliarem o seu sucesso na carreira, medindo-o relativamente às expectativas que têm com o seu trabalho e em relação ao resultado das outras pessoas (Heslin, 2003). Sendo as variáveis de reconhecimento de sucesso distintas para cada indivíduo (Ng et al., 2005). 92

98 Boletim de Sociologia Militar n.º3 Podemos então notar que, o sucesso na carreira é resultado das práticas individuais interiorizadas de forma subjectiva, podendo ser definido como o alcançar dos resultados desejados ao longo da experiência de uma pessoa, no tempo dedicado ao trabalho. As pessoas têm diferentes aspirações de carreira, considerando distintos factores de realização, como são exemplo, a segurança no trabalho, a localização do trabalho, o status, a progressão através de diferentes funções, acesso à formação, a importância do trabalho versus tempo para si e para a família. Por outro lado, encontra-se a perspectiva externa que considera, em maior ou menor dimensão, indicadores tangíveis de forma objectiva e reflecte o entendimento social partilhado em contraposição ao sentimento individual (Arthur, Khapova e Wilderom, 2005). Considera-se, então, que, existe uma grande divisão entre factores subjectivos e objectivos no evidenciar do sucesso de carreira. Os objectivos podem verificar-se através de manifestações exteriores de sucesso, como por exemplo: a remuneração; a posição hierárquica que a pessoa atingiu com uma determinada idade, ou que quantidade de recursos a pessoa tem sobre a sua coordenação. Alternativamente, podemo-nos concentrar nas questões subjectivas como as pessoas sentem a sua experiência de trabalho ao longo da vida profissional (Gunz e Heslin, 2005). Na mesma linha de pensamento Seibert e Kraimer (2001) definem sucesso extrínseco como o aferido em termos de salário e promoções, associados a resultados de recompensas instrumentais que advêm do trabalho ou ocupação e que são objectivamente observáveis. O sucesso extrínseco é então o medido em termos de satisfação no âmbito dos factores que estão inerentes no trabalho ou ocupação e dependem de uma avaliação subjectiva, do próprio relativamente aos seus objectivos e expectativas. No entanto, ter uma personalidade proactiva contribui para o sucesso na carreira, com um efeito significativo na satisfação, no salário auferido e no número de promoções conseguidas ao longo da carreira (Seibert, Crant e Kraimer, 1999) Acompanhamento e aconselhamento Na forma de as organizações ajudarem os seus colaboradores a terem sucesso na carreira, é crucial considerar os seus desejos e planos. Embora as carreiras estejam, presentemente, nas mãos dos colaboradores, as organizações podem ter como objectivo aconselhar os seus elementos no desenvolvimento de carreira, com incidência nos factores associados às características pessoais como a motivação, reflexão e redes sociais em que se inserem, atendendo à situação no trabalho e à dinâmica do ambiente em correlação com os factores de sucesso interno e externo da carreira (Kuijpers, Schyns e Scheerens, 2006). Todavia, a tutoria poderá 93

99 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa não ser directamente relacionável com o sucesso ao longo da carreira, no respeitante ao sucesso objectivo, os profissionais com aconselhamento relevam altos índices de produtividade no início e no fim da carreira, sendo assim positiva a intervenção nessas fases, já no estádio intermédio da carreira, não é tão evidente. Relativamente ao sucesso subjectivo, os colaboradores com tutores apresentam sentimentos de sucesso ao longo de toda a carreira (Peluchette e Jeanquart, 2000). Afirmar às pessoas que são os responsáveis pelas sua carreira, pode ser mais fácil de dizer do que de fazer. As pessoas precisam de suporte, e nem sempre têm o conhecimento e a força mental para se dirigirem sem aconselhamento e orientação. É aqui que entra o aconselhamento de carreira, que pode ajudar as pessoas a identificar a sua vocação e percurso, assim como o contexto em que a pessoa está mais preparada para prosperar. O aconselhamento é um canal de comunicação de dois sentidos com o empregado e pode ocorrer de duas formas. A primeira é através do seu supervisor directo, ou de um elemento hierarquicamente superior que conheça as atitudes, comportamentos e aptidões do colaborador, a segunda é pelo responsável pela Gestão dos Recursos Humanos. Dependente da complexidade da organização e dos seus recursos financeiros, o aconselhamento externo pode ser uma opção (Baruch, 2004a). Nas organizações onde os colaboradores são orientados para alcançarem objectivos ambiciosos, atingem mais facilmente esses propósitos do que aqueles que têm tutores que não compartilham um elevado nível de ambição. Esses princípios potenciam os factores de motivação, a interligação entre o orientado e o orientador e o sucesso na carreira (Godshalk e Sosik, 2003), devendo existir um reconhecimento da alargada matriz dos pontos referenciais que se podem adoptar para avaliar as carreiras, por recurso a um elevado grau de controlo das experiências relacionadas com a falha e com o sucesso (Heslin, 2003). O aconselhamento de carreira pode acontecer, de forma mais comum, através de quatro métodos: aconselhamento individual; aconselhamento de grupo; orientação de grupo; em interactividade através de ferramentas informáticas e através de páginas electrónicas via internet. O primeiro é o mais dispendioso, mas é igualmente o mais utilizado, estando implantado na tradição de potenciação de apetências. O contexto destas entrevistas inclui tópicos como auto-conceito, interesses, valências, valores, regras de vida e objectivos. O aconselhamento de grupo está, normalmente, mais limitado às questões da carreira. A orientação de grupo está mais interligada ao encontrar de uma vocação de carreira. As ferramentas informáticas e o recurso à internet, pressupõe uma utilização individual, sendo efectivos quando é efectuado um registo das interacções e das expectativas do colaborador ou se torna necessário um 94

100 Boletim de Sociologia Militar n.º3 apoio profissional à distância. No futuro deve-se ter em conta a realidade tecnológica existente, conhecendo que colaboradores podem ser aconselhados desta forma, que tópicos podem ser endereçados e que eficiência tem este método (Bowlsbey, 2003). Para Eby (1997) o aconselhamento será uma valiosa fonte de informação para os indivíduos sobre as mudanças na natureza das carreiras (e.g. menor segurança no trabalho; necessidade de ser mais proactivo no desenvolvimento da sua carreira). Na posse desta informação, os colaboradores estarão mais aptos para participar e encontrarem o apoio necessário para o desenvolvimento da sua carreira O futuro O pandemónio que, presentemente, se vive nas carreiras, cria alguma confusão e frustração para muitas pessoas, mas pode ser gerador de um ímpeto de oportunidades para desenvolver sistemas de carreiras inovadores, que vão além dos do passado, motivando comportamentos estratégicos que correspondam às necessidades da maioria e não só de alguns (Brosseau, Driver e Eneroth, 1996). As organizações e os indivíduos desempenharão um papel relevante na gestão de carreira, devendo partilhar informação sobre oportunidades e possibilidades, contribuintes para o benefício comum (Baruch e Peiperl, 2000). As carreiras contemporâneas são bastante diferentes das carreiras tradicionais, mas nem tudo mudou. Os padrões desenvolveram-se, de sistemas de carreiras estáveis e lineares para sistemas transaccionais e dinâmicos. Todavia, a mudança nem sempre fez evoluir para melhor. Um sistema de carreiras deve estar balanceado entre o instrumentalismo do sucesso dos indivíduos e das organizações onde trabalham (Baruch, 2006). Contudo, há muito a ganhar se tivermos, sempre, presente a expansão do conceito de carreira para além dos modelos tradicionais (Sullivan, 1999). Devem-se projectar trajectórias nas quais os indivíduos progressivamente desenham e constroem as suas próprias vidas, incluindo a carreira (Savickas et al., 2009). Mas não podemos escamotear os efeitos directos e os de longo termo, que o actual estado da economia mundial tem sobre o desenvolvimento das carreiras dos indivíduos e concomitantemente nas suas vidas, podendo tornar a definição de progressão de carreira, ao longo de diversos estágios, um conceito obsoleto. Mas ao longo do século XXI, iremos manter a premência de carreiras estruturadas e evolutivas, porque as experiências, necessidades e situações dos indivíduos mudam com o tempo em correspondência como a sua idade. O que pode tornar apropriado ver a carreira como uma série de estágios ou fases únicos. É facilmente aceitável que as questões e expectativas de um indivíduo de 25 anos, em inicio de carreira, sejam 95

101 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa diferentes de um colaborador com 45 anos, a meio da sua carreira ou com 65 anos no fim da sua vida activa. Os indivíduos encaram ao longo da vida um conjunto de diversas e múltiplas situações, tarefas e factores de motivação. O entendimento desta evolução e associadas necessidades e implicações nos diferentes estágios da carreira pode contribuir para uma gestão mais efectiva da carreira pelo indivíduo, ajudando, igualmente, as organizações a gerirem e desenvolverem os seus recursos humanos (Greenhaus, Callanan e Godshalk, 2010). É impossível antecipar como irão evoluir as carreiras nos próximos anos. Os desafios, tais como os riscos sistémicos dos mercados financeiros globais, as mudanças na provisão dos serviços sociais e a delapidação dos recursos naturais, aumentam a vulnerabilidade das carreiras, que estão incorporadas nos modelos de produção económica estabelecidos. No entanto, emergem oportunidades para carreiras associadas à inovação social (incluindo a sustentabilidade no uso dos recursos). Estes desenvolvimentos podem tornar algumas áreas de especialização profissional obsoletas, mas criam possibilidades para novas valências e colaborações. Existem bastantes questões sobre a adaptabilidade individual e organizacional em resposta a estas transições (Tams e Arthur, 2010). Como disse Drucker (2005), se os bulldozers movem montanhas, as ideias mostram onde é que as máquinas devem actuar. O importante, são as mentes brilhantes A particularidade das carreiras militares o caso da Marinha A definição, nacional, de carreira militar encontra-se no artigo 27.º do Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR), sendo definido como o conjunto hierarquizado de postos, desenvolvida por categorias, que se concretiza em quadros especiais e a que corresponde o desempenho de cargos e o exercício de funções diferenciadas entre si. A descrição do desenvolvimento da carreira militar encontra-se estatuído nos artigos 125.º e 126.º do EMFAR, orientando-se pelos seguintes princípios: primado da valorização militar; universalidade; profissionalismo; igualdade de oportunidades; equilíbrio; flexibilidade; mobilidade; credibilidade. Traduzindo-se, em cada categoria, na promoção dos militares aos diferentes postos, de acordo com as respectivas condições gerais e especiais, tendo em conta as qualificações, a antiguidade e o mérito revelados no desempenho profissional e as necessidades estruturais das Forças Armadas. Deve possibilitar uma permanência significativa e funcionalmente eficaz nos diferentes postos que a constituem. 96

102 Boletim de Sociologia Militar n.º3 No inerente aos direitos dos militares o EMFAR no seu artigo 25.º refere que O militar tem, nomeadamente, direito: A ascender na carreira, atentos os condicionalismos previstos no presente Estatuto, e à progressão no posto, nos termos do respectivo estatuto remuneratório. Temos assim, uma perspectiva de evolução horizontal e vertical que conforme Baruch (2004a) as pessoas têm que evidenciar o seu melhor para uma progressão na carreira. Na sociedade anteriormente vigente a promoção era um acto administrativo, hoje é uma recompensa de desempenho. Ao nível da Marinha, o documento estruturante da estratégia de topo, a Diretiva de Política Naval de 2011 (DPN), define como prioridade para a gestão: a valorização permanente dos recursos humanos, em especial ao nível da liderança, da formação académica dos quadros superiores e da qualificação e certificação técnico-profissional, promovendo um ensino de qualidade e reforçando a individualidade dos órgãos de base com essa missão, para dispor de quadros mais bem preparados, elevar os níveis de motivação e influenciando positivamente o recrutamento e a retenção; o envolvimento dos escalões intermédios de chefia nos processos de tomada de decisão utilização dos sistemas e das competências, para optimizar o emprego dos recursos humanos e das respectivas competências, numa lógica de desconcentração criteriosa dos processos, como factores contribuintes para uma carreira de sucesso numa instituição que conhece o valor dos seus membros e defende o seu desenvolvimento e reconhece a particularidade dos seus activos humanos. No inerente à política de gestão de pessoal, nomeadamente, no relativo à informação de carreira de todos os indivíduos, militares, militarizados e civis, que prestam serviço na Marinha, o Despacho do vice-almirante superintendente dos Serviços do Pessoal n.º 09/2006, de 19 de Abril, determina que tendo presente os princípios estatutários da carreira militar e os gerais da gestão do pessoal cria o Gabinete de Gestão de Carreiras, a que incumbe, particularmente, a promoção de sessões de atendimento e aconselhamento do pessoal no âmbito do desenvolvimento das respectivas carreiras. A acção deste Gabinete será proporcionar informação, com o objectivo de os elementos da Marinha obterem, em tempo oportuno, um melhor conhecimento acerca das respectivas carreiras, em termos de oportunidades prováveis de desenvolvimento. Estas indicações devem, em regra, ser prestadas uma vez em cada posto e/ou sempre que julgado conveniente. Os militares que prestam serviço na Marinha têm, ainda, a capacidade de aquando do processo inerente à sua Avaliação Individual, de acordo com o normativo constante na Portaria n.º 502/95 de 26 de Maio, de opinar sobre a forma como gostariam que fosse orientada a sua carreira, referindo a área funcional onde 97

103 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa gostariam de desempenhar funções, tais como: Estado-Maior; Gestão de Pessoal; Navios; Instrução; Autoridade Marítima; Manutenção/Reparação; Abastecimento/Logística. Na Directiva Sectorial de Recursos Humanos, que se assume como um documento estruturante da estratégia da organização, considera-se a evolução de um ambiente externo cada vez mais exigente e dos novos desafios emergentes nos planos internos e externos, com incidência nos Recursos Humanos (RH) e na sua gestão. Constituindo-se, esta diretiva, como um elemento central da definição do desenvolvimento e da concretização da política de RH da Marinha, referenciando-se que gestão dos RH, deve assumir-se como um referencial no domínio das Forças Armadas e no universo da Administração Pública, refletindo elevadíssimos níveis de comprometimento e satisfação, por parte dos militares e dos comandos, direcções e chefias das unidades e organismos aos quais aqueles estão alocados, definindo, ainda, que a GRH, na Marinha deve pautar-se por elevados padrões de qualidade e por uma melhoria contínua, na conciliação e consecução, permanentes, dos requisitos estratégicos da Instituição e das necessidades e dos objectivos individuais do seu pessoal. No contexto dos objetivos estratégicos sectoriais para a área funcional do pessoal é identificada como prioridade: Proporcionar ao pessoal da Marinha carreiras equilibradas, atrativas e motivadoras. Tornando-se necessário desenvolver um trabalho que responda a esta questão de forma organizada e metódica. 3. MÉTODO E TÉCNICAS DE RECOLHA E ANÁLISE DE DADOS 3.1. Método O método a perseguir neste projecto é o estudo de caso, relevando-se nos seguintes pontos, de acordo com a definição de Yin (2003) o estudo de caso baseia-se nas características do fenómeno em estudo e num conjunto de características associadas ao processo de recolha de dados e às estratégias de análise dos mesmos. Foi neste conceito que baseamos o nosso estudo num princípio de parametrização da informação que nos diagnosticasse de forma precisa a situação que carecia de intervenção, para desenharmos, com os alicerces do quadro teórico de referência evidenciado um projecto de intervenção capaz de debelar a necessidade patenteada População/Amostra Para realização do presente estudo, e considerando a população de todos os indivíduos que prestam serviço na Marinha (cerca de 12500), tomou-se como amostra 98

104 Boletim de Sociologia Militar n.º3 o conjunto restrito de oficiais com o posto de primeiro-tenente (1TEN); capitão-tenente (CTEN) e capitão-de-fragata (CFR), cuja carreira média expressa-se em cerca de dezoito anos no conjunto dos três postos, com diversas progressões horizontais e promoções verticais, sendo desse modo representativo da carreira organizacional em estudo e cujas conclusões obtidas podem ser transportadas para outros postos e categorias. A amostra, em causa, foi constituída por 746 elementos, distribuídos por 279 1TEN, 254 CTEN e 213 CFR. De acordo com as tabelas de Arkin e Colton ( Tables for Statisticians ), para esta população finita (abaixo de 15000), assumindo uma margem de erro de 5% e um intervalo de confiança de 95,5%, a amostra requerida fixa-se em 390, pelo que a de 746 indivíduos é adequada para o objectivo em causa. Obtiveram-se 501 respostas (193 1TEN; 183 CTEN; 116 CFR; 9 NR), representando 67,16% do universo. Dos respondentes, 21 elementos são do género feminino e 448 do género masculino (32 NR). Encontram-se, igualmente, representadas todas as classes de oficiais existentes na amostra. Relativamente ao tempo de permanência nos quadros da Marinha, estamos perante indivíduos entre os dez anos e os quarenta anos de serviço, com idades entre os 28 e os 61 anos, com uma média de 40,06 anos (s.d. 6,628). As habilitações literárias evidenciadas encontram-se num espectro abrangente do ensino básico (1) ao mestrado (25), com maior frequência ao nível da licenciatura (347). A amostra advém de diversas áreas funcionais da Marinha 2, com maior incidência nas áreas do Material (78), Pessoal (99) e Operacional (139) Técnica de recolha de dados Questionário A base para o diagnóstico da situação vigente na Marinha ao nível da dimensão da Gestão e Desenvolvimento de Carreiras, assenta num estudo efectuado aos militares que prestavam serviço na organização e decorreu nos anos de 2008/2009, por aplicação de um questionário de satisfação, desenvolvido no âmbito do projecto de Certificação do Sistema de Gestão de Recursos Humanos da Marinha de acordo com a Norma Portuguesa (NP) 4427:2004 3, que estabelece na sua cláusula normativa Satisfação interna, que A organização deve medir, periodicamente, 2 Autoridade Marítima (47); Cultura (6); Estado-Maior (45); Financeira (28); Formação (1); Instituto Hidrográfico (1); Material (78); Operacional (139); Pessoal (99); Tecnologias da Informação (38); Fora da matriz interna da Marinha (1); NR (18). 3 O Sistema de Gestão de Recursos Humanos da Marinha (SGRHM), encontra-se certificado pela APCER (Associação Portuguesa de Certificação) desde 31 de Agosto de

105 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa o nível de satisfação interna, estabelecendo a metodologia e os instrumentos adequados. Para esse fim foi elaborado um questionário, que medisse a satisfação interna em várias dimensões, a partir da definição de satisfação de Locke (1976: 1304) um estado emocional positivo ou de prazer, resultante da avaliação do trabalho ou das experiências proporcionadas pelo trabalho. Podendo as facetas da satisfação serem agrupadas de forma lógica, proporcionando uma compreensão das suas causas e natureza, permitindo entender como e porquê certos eventos/agentes assumem um carácter positivo ou negativo. As questões foram elaboradas de forma que fossem claras e percebidas correctamente pela população a inquirir e fossem ao encontro do que se pretendia averiguar, tendo sido construída uma versão preliminar do Questionário. Esta versão preliminar foi pré-testada, visando verificar as seguintes proposições: todas as questões são compreendidas da mesma forma pelos inquiridos? As listas de respostas abrangem todas as respostas possíveis? Há alguma questão que origina recusa na resposta? A ordem das questões é aceitável? Qual a reacção dos inquiridos relativamente à extensão do questionário e nível de dificuldade? Qual a duração do tempo de resposta ao questionário? Da análise das sugestões apresentadas foi elaborada a versão definitiva. O questionário apresenta dez dimensões de observação, sendo que para o presente projecto centramo-nos na correspondente ao desenvolvimento de carreira que se consubstancia nos seguintes cinco itens: I 1. As oportunidades para progressão na carreira; I 2. Os requisitos e exigências para progressão na carreira; I 3. As possibilidades que tem de intervir na progressão de carreira; I 4. A forma como tem progredido na carreira; I 5. A utilização do mérito relativo na progressão da carreira. Foi utilizada uma escala de Likert de quatro níveis (Nada Satisfeito; Pouco Satisfeito; Satisfeito; Muito Satisfeito), existindo, ainda, a possibilidade de resposta de não aplicável. Em cada dimensão foi, ainda, solicitado aos respondentes que indicassem algumas sugestões para que a Marinha pudesse melhorar a satisfação nesta área Entrevista à Gestão de Topo De forma a aferir a aceitação da gestão de topo para acomodar a intervenção que se preconizava, e cumulativamente recolher uma opinião, sobre esta matéria, abalizada pela experiência de algumas dezenas de anos de Marinha, em diversos 100

106 Boletim de Sociologia Militar n.º3 cargos de relevo, em unidades em terra e navios no mar, solicitou-se uma entrevista situacional ao vice-almirante António José Bonifácio Lopes que desempenha, actualmente, o cargo de superintendente dos Serviços do Pessoal, responsável máximo pela esta área funcional na organização Análise Documental Para um conhecimento mais adequado do normativo enquadrante deste processo, na Marinha, procedeu-se a uma análise de todos os documentos estruturantes desta matéria Técnica de tratamento de dados Para o tratamento dos dados obtidos, no âmbito das questões fechadas procedeu-se a uma análise estatística descritiva com recurso à ferramenta informática SPSS 4, para determinação das médias e desvio padrão dos itens em questão, e índices de satisfação evidenciados. Na decorrência do solicitado na questão aberta do questionário de satisfação interna, no inerente aos itens relativos à Gestão e Desenvolvimento de carreira, no sentido da melhoria contínua do sistema em concordância com as melhores práticas. No inerente à entrevista à Gestão de Topo, procedeu-se a uma análise de conteúdo, que permitiu enquadrar os aspectos mais relevantes que poderão ser objecto de uma estratégia de intervenção que os diminua ou elimine. Nesse sentido, procedeu-se de acordo com o método de inferições sequenciais expresso por Bardin (2008), tendo-se agrupado os contributos obtidos por parâmetros correlacionáveis com os itens associados às questões fechadas, modelando-se numa desconstrução da unidade de análise inicial (frase) para um indicador de tema (expressão ou palavra) que permitisse, por discriminação quantitativa, aferir áreas de intervenção preferencial. 4. RESULTADOS 4.1. Questionário Questões fechadas Os resultados apurados no questionário são os abaixo explanados (Tabela 1), relevando-se que numa escala de quatro níveis, se consideram positivos os valores superiores a 2,5 de média, que correspondem a 50% de satisfação absoluta: 4 Statistical Package for the Social Sciences 101

107 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa Tabela 1 - Resultados da dimensão satisfação com as promoções/carreira Item Média Desvio Padrão I 1. As oportunidades que lhe são oferecidas para progressão na carreira 2,43 0,80 I 2. Os requisitos e exigências para progressão na carreira 2,60 0,71 I 3. As possibilidades que tem para intervir na progressão na carreira 2,09 0,75 I 4. A forma como tem progredido na carreira 2,72 0,82 I 5. A utilização do mérito relativo na progressão da carreira 2,39 0,86 No entanto, importa referir, que foi considerado, superiormente, avaliar como valor mínimo aceitável um índice de satisfação - IS = (n.º de satisfeitos + n.º de muito satisfeitos) / n.º de respondentes), adequado aos objetivos estratégicos da organização, aquele que se apresentasse igual ou superior a 70%. Este nível de ambição, que desloca a distribuição normal para a direita, intenta que a maioria dos elementos se encontre numa faixa de satisfação superior. Tabela 2 - Índice de Satisfação da Dimensão Satisfação com as promoções/carreira (em %) Itens I 1. As oportunidades que lhe são oferecidas para progressão na carreira IS 50,6 I 2. Os requisitos e exigências para progressão na carreira 62,4 I 3. As possibilidades que tem para intervir na progressão na carreira 29,6 I 4. A forma como tem progredido na carreira 67,5 I 5. A utilização do mérito relativo na progressão da carreira 49,2 Pela análise dos dados obtidos e presentes na Tabela 2, não se verificam índices de satisfação superiores a 70% em relação aos itens analisados. Pelo que todos são identificados como críticos e com potencial de análise e intervenção. Os itens com mais baixo nível de satisfação - o item I 3., inerente à satisfação para com as possibilidades que tem para intervir na progressão na carreira (29,6%), deverá ser alvo de uma, mais aturada, análise. Não se podendo, ainda, descurar como factores de análise, nesta dimensão, o Item I 1. e I 5., que apresentam resultados inferiores a 60%. 102

108 Boletim de Sociologia Militar n.º3 Neste articulado, afere-se a necessidade de elaborar um projecto que eleve o índice de satisfação nesta dimensão, o qual deverá incidir na possibilidade de as pessoas intervirem de forma mais dilatada na sua progressão de carreira, utilizando o mérito como factor de diferenciação e criando oportunidades de carreira multidisciplinares e preditoras de sucesso, evidenciando-se que os indivíduos com posto mais elevado na hierarquia (CFR) apresentam maiores índices de satisfação, com excepção do I 4. A forma como tem progredido na carreira Questionário Questão Aberta Da análise de conteúdo efectuada à questão aberta de sugestões para elevar o nível de satisfação nesta dimensão, releva-se, em correlação com o parâmetro aferido em cada item das questões I. 1 a I. 5, o seguinte (Tabela 3): Tabela 3 - Análise de Conteúdo às Questões Abertas Parâmetro Oportunidades para Promoção/Progressão Requisitos e exigências Possibilidade de intervir Indicador (expressão ou palavra) Não atendimento de pretensão de diversificar a carreira; Comandos no mar, quem necessita de horas de navegação; Diferença de carreiras; Nivelar condições de progressão; Classe, factor impeditivo; Carreiras planeadas no médio/longo prazo; Requisitos não claramente identificados; Divulgação dos critérios usados, e do peso relativo; Divulgar as possibilidades de carreira; Definir "Carreira ; Regras transparentes, objectivas; Comandos no mar a quem necessita de horas de navegação; Homogeneizar os quadros; Equilibrar os diversos quadros; Estabilidade de regras; Quadros alterados; Aumentar o tempo de permanência nos postos, subindo os vencimentos e incrementando a diferenciação para o mesmo posto; Intervenção na carreira casuística e fruto da oportunidade; Carreiras discutidas com cada um; Envolvidos os elementos; Escolhas passar pelo próprio; O próprio tem de ter capacidade de intervir; 103

109 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa Parâmetro Promoção/Progressão na carreira Mérito demonstrado Indicador (expressão ou palavra) Uniformizar o acesso a cargos por nomeação, escolha; Não à simples antiguidade na carreira. Promoções por escolha todos os postos; Progressão não por antiguidade; Promoção para a função; Promoções nos períodos de tempo previstos; Classe, factor impeditivo de progressão na carreira; Minimizar a discrepância promoções diferentes classes; Clarificação das regras; Atraso na progressão das carreiras; Progressão na carreira mais célere; Aumentar o tempo de permanência nos postos, subindo os vencimentos e incrementando a diferenciação para o mesmo posto; Normalização nas promoções das classes; A classificação da EN, não deveria perdurar para toda a vida; Concorre a um lugar do posto acima; Valorização do mérito relativo; Mais importância ao desempenho de mérito; Maior peso ao mérito relativo; Mais aptos e capazes, acelerada a sua progressão; Progressão por mérito; Mérito sobrepor; Mérito relativo não é usado; Promover o mérito relativo; O não mérito não é usualmente reprovado; Considerando o desempenho individual dos militares; Podemos, assim, apreciar um conjunto de factores contribuintes para o projecto de intervenção, no sentido de incrementar o Índice de Satisfação nesta dimensão. O modelo a estruturar deverá evidenciar as acções necessárias para responder às questões levantadas Entrevista à Gestão de Topo Da entrevista realizada à gestão de topo da Marinha, na pessoa do superintendente dos Serviços do Pessoal, vice-almirante António José Bonifácio Lopes, que consistiu num conjunto de 16 questões, podemos evidenciar alguns factores que cimentam o diagnóstico preconizado pelos restantes instrumentos de recolha de dados, assim como um levantamento indicadores de acção passíveis de implementação e suportados pelo vértice estratégico da organização, cujas grandes áreas evidenciadas se consubstanciam no quadro seguinte (Tabela 4): 104

110 Boletim de Sociologia Militar n.º3 Tabela 4 - Análise de Conteúdo à Entrevista à Gestão de Topo Parâmetro Oportunidades para Promoção/Progressão Requisitos e exigências Possibilidade de intervir Promoção/Progressão na carreira Mérito demonstrado Indicador de acção Incrementar o processo de comunicação sobre as oportunidades de carreira, informando o individuo sobre as suas possibilidades, num contexto de caracterização e posicionamento na sua categoria e classe; Potenciar a identidade organizacional, num princípio de envolvimento individual. Desenvolver processos de comunicação, nomeadamente, no referente ao planeamento perspectivado; Alicerçar as melhores práticas de forma transparente e cooperativa; Elaborar um estudo que permita avaliar a ampliação do actualmente implementado. Estruturar um sistema de Aconselhamento e Acompanhamento que permita uma orientação sistémica dos indivíduos, através da criação de um Órgão de Acompanhamento e Aconselhamento de Carreira (OAAC); Instituir a figura do tutor de carreira; Incrementar as acções de participação das pessoas, no processo de carreira. Parametrizar uma ferramenta informática para interacção pessoa/organização; Desenvolver estratégias de conciliação entre os interesses pessoais e organizacionais, de forma a permitir pontos de avaliação e, eventual, saída da organização. Estruturar carreiras diversificadas que permitam uma superior empregabilidade, ao nível interno e externo; Divulgar o exemplo como factor de motivação conjunta. Avaliar as actuais regras de promoção e progressão, centradas na meritocracia. Perspectivar canais de promoção, progressão e desenvolvimento de carreira que permitam valorizar o mérito. Desta forma, aprecia-se um conjunto de acções que poderão ser implementadas na organização em convergência com a questão base de implementação de um modelo sistémico de gestão e desenvolvimento de carreiras sustentadas e motivantes que permita um envolvimento de todos os meios humanos e pondere uma definição de objectivos comuns e tendentes para um rumo único de todos os intervenientes nesta acção. A convergência de interesses será o fator chave, para um aumento do índice de satisfação percebido de modo a atingir valores consentâneos com o nível de ambição desejado pela organização. 105

111 Gestão e Desenvolvimento de Carreiras: O caso da Marinha Portuguesa 5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Tendo-se concluído o levantamento dos dados definidores do diagnóstico organizacional vigente, através dos índices de satisfação evidenciados, assim como as hipóteses de intervenção patenteadas por recurso à questão aberta de sugestões, para potenciação do índice de satisfação, torna-se necessário sistematizar um plano de intervenção, consistente e enlevado de níveis de eficiência e eficácia, que permita desenvolver as acções de intervenção de forma substantiva e contribuintes para o propósito traçado, com base numa análise sistematizada e progressiva do evidenciado. Este processo encontra-se devidamente sustentado pelo vértice estratégico da organização, conforme verificado através da Entrevista à Gestão de Topo, de onde se infere um conjunto de acções passíveis de serem promovidas no sentido do objectivo macro de obtenção de elevados padrões de satisfação, transversais a todas as categorias dos militares da Marinha Áreas/Acções de Intervenção Da análise de conteúdo, efectuada à questão aberta, das sugestões para elevar o nível de satisfação nesta dimensão, releva-se abaixo exposto em interligação com cada item das questões I. 1 a I. 5, permitindo um levantamento das hipotéticas áreas de intervenção para inclusão no plano de implementação, que habilite como referiram Greenhaus, Callanan e Godshalk (2010) uma gestão da carreira com um conjunto de acções que passam por diversos estádios e que facilitam observar a complexidade dos actos que concorrem para a carreira individual Podemos, assim, considerar um conjunto de factores que deverão ser alvo do projecto de intervenção, com o objectivo de incrementar o Índice de Satisfação nesta dimensão. Num significado de desenvolvimento profissional e numa mobilidade interna que proporcione uma ascensão hierárquica na organização (Hall, 2002). O modelo de projecto de intervenção a delinear deve estruturar-se a partir das acções evidenciadas que permitam responder, de forma consistente, às questões levantadas. Esta tendência para a gestão de carreiras individualizada decorre em vantagens para as organizações e para os sujeitos (Baruch, 2004b). Da análise efectuada à entrevista à gestão de topo, infere-se um conjunto de Acções de Intervenção, no âmbito do universo definido como Áreas, passíveis, de Intervenção, susceptíveis de sustentação e patrocínio de implementação pelo vértice estratégico da organização. Na forma de as organizações ajudarem os seus 106

112 Boletim de Sociologia Militar n.º3 colaboradores a terem sucesso na carreira, é crucial considerar os seus desejos e planos (Kuijpers, Schyns e Scheerens, 2006). Nesta sequência, parametrizamos, através da evolução do diagnóstico efectuado, um conjunto analítico e evolutivo com origem nos aspectos críticos identificados, áreas de intervenção modeladas pelos respondentes ao Inquérito de Satisfação e decorrentes acções derivantes para o desiderato em causa, em convergência com a vontade estratégica da organização, vertida nos documentos estruturantes da política de Recursos Humanos e demonstrada na entrevista à gestão de topo. Esta estrutura, de resposta, consubstancia-se no arrolado na Tabela 5: Tabela 5 Ações de Intervenção Objetivando-se, nesta configuração, um aumento dos índices de satisfação evidenciados, por recurso a um conjunto de acções que se consideram adequadas, aceitáveis e exequíveis, para alcançar o nível de ambição patenteado para esta área. Considerando que o entendimento da evolução e associadas necessidades e implicações nos diferentes estágios da carreira pode contribuir para uma gestão mais efectiva da carreira pelo indivíduo, ajudando, igualmente, as organizações a gerirem e desenvolverem os seus meios humanos (Greenhaus, Callanan e Godshalk, 2010). 107

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