SBTVD Uma ViSão SoBre a TV DigiTal no BraSil LuCIANO LeONeL MeNdes
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1 ARTIGO SBTVD Uma ViSão SoBre a TV DigiTal no BraSil LuCIANO LeONeL MeNdes 48 Resumo Hoje, a televisão brasileira está passando por uma revolução. A mudança do sistema analógico de televisão para o sistema digital traz enormes benefícios para os telespectadores, além de permitir novos negócios para as emissoras e movimentar o mercado eletroeletrônico nacional. O objetivo deste artigo é apresentar um breve relato sobre a camada física do Sistema Brasileiro de TV Digital, ressaltando as características que permitem a grande flexibilidade desse sistema. Os principais resultados oriundos das pesquisas realizadas no Instituto Nacional de Telecomunicações (INATEL) também serão apresentados de forma resumida, apenas para ilustrar alguns avanços tecnológicos obtidos no Brasil. IntRodução Um padrão de TV digital é dividido em diversas camadas distintas. Em uma divisão macro, podese dizer que um padrão de TV digital é composto pelas seguintes camadas: a) Conteúdo e Aplicação: camada responsável pela captura e formatação dos sinais de áudio e vídeo, bem como o desenvolvimento de aplicativos interativos [1]. b) Compressão: camada responsável pela remoção de redundâncias nos sinais de áudio e vídeo, reduzindo assim a taxa de bits necessária para transmitir essas informações [2]. c) Middleware: camada de software que realiza a integração de todas as subcamadas do sistema. O Middleware permite que os aplicativos gerados pelas emissoras sejam compatíveis com todas as plataformas de recepção desenvolvidas para o padrão de TV digital [3]. d) Multiplexação: camada responsável por gerar um único feixe de dados contendo o vídeo, áudio e aplicações dos diversos programas a serem transmitidos [4]. e) Transmissão/Recepção: também denominada de camada física, é a camada responsável por levar as informações digitais do
2 estúdio da emissora até a casa do telespectador [5]. f) Canal de Interatividade: é o canal por onde o telespectador pode solicitar e receber informações específicas ou enviar dados para a emissora [6]. Diferentemente do que muitos assumem como verdade, um sinal de TV digital não é necessariamente um sinal de alta definição. Na verdade, existem 4 formatos de vídeos possíveis em um sistema de TV digital. São eles [7]: a) LDTV (Low Definition Television) formato de vídeo de baixa definição empregado para transmissão de sinais para dispositivos móveis, como celulares e PDA s. Os sinais de vídeo neste formato possuem 240 linhas, cada uma contendo 320 pontos (ou pixels), resultando em uma relação de aspecto de 4:3. b) SDTV (Standard Definition Television) formato de vídeo de resolução padrão, tem uma resolução equivalente ao sinal de TV analógica. Hoje, esse formato já é empregado pelas operadoras de TV por assinatura via satélite e em DVD s. Este formato possui 480 linhas com 640 pixels por linha, o que também resulta em uma relação de aspecto de 4:3. c) EDTV (Enhanced Definition Television) este formato apresenta um ganho de qualidade de imagem quando comparado com o formato SDTV, mas ainda não representa a máxima resolução possível em um sistema convencional de TV digital terrestre. Esse formato possui 720 linhas, cada uma com 1280 pixels, o que resulta em uma relação de aspecto de 16:9, ou seja, a mesma empregada no cinema. d) HDTV (High Definition Television) o formato HDTV representa, hoje, a melhor qualidade possível de imagem em um sistema de TV digital terrestre. Este formato possui 1080 linhas, cada uma com 1920 pixels, resultando em uma relação de aspecto de 16:9 Qualquer que seja o padrão de TV digital em- pregado, é possível combinar diferentes sinais com diferentes formatos e transmiti-los dentro de um canal de 6 MHz. A Figura 1 ilustra algumas possibilidades de combinação de formatos em um canal de 6 MHz, assumindo o uso da compressão de vídeo H.264. Note que em todos os casos há uma banda reservada para a transmissão de dados, que pode ser empregada, por exemplo, para a transmissão das informações referentes à interatividade carrossel [8]. Figura 1 - Algumas possíveis combinações para o uso do canal de 6 MHz em um sistema de TV digital, assumindo o uso da compressão H.264. O objetivo deste trabalho é apresentar uma breve descrição sobre o padrão de TV digital adotado no Brasil, enfocado a camada física do Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD). Para atingir esse objetivo, este trabalho está organizado da seguinte maneira: a Seção 2 apresenta uma visão geral sobre a camada física, comum a todos os padrões de TV digital existentes. Em seguida, a Seção 3 apresenta as características específicas do padrão adotado no Brasil. A Seção 4 apresenta os principais resultados das pesquisas realizadas pelo INATEL (Instituto Nacional de Telecomunicações) na área da Televisão Digital e, finalmente, a Seção 5 traz as conclusões e os comentários finais deste artigo. 49
3 Sistema de transmissão de TV Digital Atualmente existem três padrões de TV digital comercialmente disponíveis: ATSC (Advanced Television Systems Committee) [9] desenvolvido nos EUA; DVB-T (Digital Video Broadcasting) [10], desenvolvido na Europa e ISDB-T (Integrated Services Digital Broadcasting - Terrestrial) [11], desenvolvido no Japão. Embora cada um desses padrões apresente características e particularidades específicas, todos podem ser representados por um digrama em blocos genérico, mostrado na Figura 2. a codificação de canal, tal como mostra a Figura 3. Note que com o uso do entrelaçador, mesmo que o canal introduza erros em rajada no sinal, esses erros se apresentam para o decodificador de canal de forma dispersa, aumentando a eficiência do código corretor de erro. A função do bloco de codificação interna é similar à função do bloco de codificação externa, ou seja, o objetivo é aumentar a robustez do sistema frente às intempéries do canal através da inclusão de redundâncias. A principal diferença entre o código externo e o código interno é que o primeiro trabalha com bytes, enquanto que o segundo ope- Figura 2. Diagrama em blocos generalizado da camada física de um padrão de TV digital. 50 O bloco de dispersão de energia tem como objetivo distribuir a energia do sinal de entrada em toda a largura de faixa disponível. O bloco de codificação externa introduz redundâncias que permitem ao decodificador no receptor corrigir erros introduzidos pelo canal de comunicação. Nos padrões de TV digital, o código externo é um Reed Solomon [12] que trabalha com pacotes de 188 ou 187 bytes. A função do bloco entrelaçador é evitar que os erros em rajada introduzidos no canal sejam apresentados também em rajada para o decodificador externo. Erros em rajada devem ser evitados porque a capacidade de correção do Reed Solomon é limitada a alguns bytes por palavra-código. Logo, é interessante garantir que a ocorrência de erros em rajada no canal não resulte em erros em rajada na entrada do decodificador Reed Solomon. Isso por ser feito entrelaçando os bytes de informação após ra com bits, sendo este um código convolucional [12]. Da mesma forma que o código externo, a ca- Figura 3. Exemplo de funcionamento de um entrelaçador.
4 pacidade de correção do código interno também é limitada. Assim, é necessário evitar erros de bit em rajada no receptor. Portanto, é necessário empregar um entrelaçador interno (entrelaçador de bit) na saída do codificador interno para garantir um desempenho satisfatório do sistema. A etapa de modulação é a que resulta em maior diferença entre os padrões. O padrão ATSC emprega um sistema de portadora única com modulação vestigial de 8 níveis, chamado de 8-VSB (Vestigial Side Band) [13], enquanto que os padrões DVB- T e ISDB-T empregam um sistema com múltiplas portadoras e modulação M-QAM, denominado de COFDM (Coded Orthogonal Frequency Division Multi-plexing) [14]. A modulação 8-VSB pode ser considerada a versão digital da técnica de modulação empregada nos sistemas analógicos de televisão, sendo de fácil implementação. A desvantagem desse esquema é que seu desempenho em canais seletivos em freqüência é pobre, o que requer o uso de complexos equalizadores temporais no receptor. Já os sistemas COFDM apresentam alta robustez frente aos múltiplos percursos do canal, uma vez que o sinal a ser transmitido é dividido em N subcanais de faixa estreita, que sofrem apenas atenuação plana ao ser transmitido por um canal seletivo em freqüência. Desta forma, o receptor não precisa ter equalizadores complexos, o que simplifica a sua implementação e aumenta o desempenho do sistema. A Figura 4a apresenta o espectro de um sinal 8-VSB, enquanto que a Figura 4b apresenta o espectro de um sinal COFDM. O bloco denominado de transmissor é o responsável por transladar o sinal de banda-base para a freqüência de canal e também por fornecer o ganho de potência para que a cobertura desejada seja alcançada. Sistema Brasileiro de TV Digital O SBTVD foi baseado no padrão de TV digital japonês, com modificações na camada de compressão e na camada de middleware. No caso da compressão de vídeo, todos os padrões de TV Digital Terrestre empregam o MPEG- 2. O Brasil, no entanto, emprega uma técnica de compressão de vídeo mais recente e mais eficiente, denominada de H.264. Com esta técnica de compressão de vídeo, é possível manter a qualidade de imagem, porém reduzindo sensivelmente a taxa de bits. Este ganho de desempenho de compressão resulta em um uso mais eficiente do espectro. Já com relação ao Middleware, o Brasil adotou uma Figura 4. Espectro de sinais de TV digital. (a) 8-VSB. (b) COFDM. 51
5 Figura 5 - Diagrama em blocos de um sistema de transmissão ISDB-T. solução nacional, denominada de Ginga, que foi desenvolvido pela PUC-RJ e pela UFPB. No que se refere à camada física, o SBTVD é exatamente igual ao padrão ISDB-T, cujo diagrama em blocos é apresentado na Figura 5.A complexidade do sistema de transmissão do padrão ISDB-T é maior do que dos demais padrões, porém essa complexidade permite uma maior flexibilidade do sistema, o que o torna tão interessante tanto para as emissoras quanto para os telespectadores. Algumas destas vantagens serão exploradas com mais detalhes a seguir. a 8 bytes. Como código interno, o ISDB-T emprega um código convolucional puncionado, que permite operar com taxas de codificação de 1/2, 2/3, 3/4, 5/6 ou 7/8. Quanto menor for a taxa de codificação maior será a robustez, porém menor será a vazão do sistema. O ISDB-T também emprega um entrelaçador convolucional de bytes como entrelaçador externo e dois entrelaçadores de bits, sendo um no domínio do tempo e outro no domínio da freqüência. A maior profundidade de entrelaçamento obtida no ISDB-T garante a este padrão um desempenho frente aos ruídos impulsivos superior aos demais padrões de TV digital [15]. Codificação de canal O ISDB-T emprega um código Reed Solomon (RS), onde 16 bytes de paridade são inseridos a cada pacote de 188 bytes, resultando em um código RS (204,188) com capacidade de correção igual COFDM A técnica de transmissão empregando múltiplas portadoras ortogonais codificadas (COFDM) aumenta a robustez do sistema frente aos múltiplos Tabela 1. Modos de operação do sistema ISDB-T. 52
6 percursos quando o número de subportadoras é suficientemente elevado. No caso do padrão ISDB- T, existem três modos de operação distintos, denominados de Modos 1, 2 e 3. A Tabela 1 apresenta o número de portadoras empregadas em cada um dos modos de operação. Há uma relação de compromisso entre o número de portadoras empregadas no sistema e a robustez frente aos múltiplos percursos e frente ao efeito Doppler causado pela mobilidade do receptor. Quanto maior for o número de portadoras, maior será a robustez do sistema frente aos múltiplos percursos e mais sensível será o sistema ao desvio de freqüência Doppler [14]. Logo, pode-se concluir que o Modo 1 é indicado para os casos onde a mobilidade do receptor é o fator limitante do sistema, enquanto que o Modo 3 é indicado para os casos onde a seletividade em freqüência do canal é o fator limitante. O Modo 2 é uma solução de compromisso onde a mobilidade a velocidades relativamente baixas estão presentes e o canal apresenta uma seletividade em freqüência do canal moderadamente severa. O símbolo OFDM pode ser visto como a soma de N portadoras complexas moduladas, tal como mostra a Figura 6. Logo, se os dados modulantes não variarem ao longo do tempo, então o sinal COFDM se torna cíclico em um período de T segundos. Essa característica garante que a última amostra do símbolo COFDM será igual a sua primeira amostra, permitindo que uma cópia de parte do fim do símbolo COFDM seja inserida no início do mesmo. Esse procedimento, denominado de prefixo cíclico, introduz um tempo de guarda entre os símbolos, aumentando a robustez do sistema frente aos múltiplos percursos. A Figura 7 ilustra a inserção do tempo de guarda. Esse tempo de guarda também possibilita a criação de redes de freqüência única (SFN Single Frequency Network). No padrão ISDB-T, o tempo de guarda pode ser configurado para T/4, T/8, T/16 ou T/32. Quanto maior for o tempo de guarda, maior é a robustez frente aos múltiplos percursos e menor é a vazão do sistema. Segmentação de Banda A segmentação de banda é um dos principais recursos que torna o padrão ISDB-T mais flexível do que o padrão DVB-T. Um símbolo COFDM do padrão ISDB-T é composto por N subportadoras, onde N depende do modo de operação. Essas N portadoras são divididas em 13 segmentos distintos. Esses segmentos podem ser livremente agrupados para transmitir até 3 programas distintos. Por exemplo, pode-se utilizar apenas segmento número 0 para transmitir um sinal LDTV de baixa taxa para a recepção em um dispositivo móvel, enquanto que os demais segmentos são empregados para transmitir um sinal HDTV para a recepção Figura 6 - Diagrama em blocos de um sistema de geração COFDM. Figura 7 - Inserção do tempo de guarda em um símbolo COFDM. 53
7 a) b) Figura 8 - Exemplos da utilização da segmentação de banda. fixa, conforme ilustra a Figura 8a. Já a Figura 8b apresenta o caso onde a segmentação de banda é utilizada para transmitir sinais de vídeo em LDTV para recepção móvel e dois sinais EDTV distintos para a recepção fixa. Logo, o uso da segmentação de banda permite que a emissora envie sinais de vídeo diretamente para o celular do telespectador, sem a necessidade da operadora de telefonia. Vazão A taxa de bits por camada do padrão ISDB-T depende da configuração dos parâmetros, como taxas de codificação, tempo de guarda e modulação. O fato do padrão ISDB-T prever 4 modulações digitais distintas permite que haja uma grande gama de Tabela 2. Taxa de transmissão por segmento do padrão ISDB-T. 54
8 relação de compromisso entre taxa de transmissão e vazão, conforme apresenta a Tabela 2.Conforme pode-se ver na Tabela 2, tanto a taxa de codificação quanto o tempo de guarda podem ser ajustados para se obter uma taxa de bits desejada para uma dada modulação digital. Por exemplo, assuma que a taxa de 468 kbps por segmento seja desejada. Essa taxa pode ser obtida com duas configurações diferentes: QPSK com r=5/6 e Tg=T/4 ou QPSK com r=3/4 e Tg=T/8. A decisão sobre qual das duas configurações deve ser empregada para obter a taxa desejada depende do tipo de canal de comunicação. A primeira opção apresenta um tempo de guarda maior do que a segunda solução, logo é mais robusta aos múltiplos percursos. No entanto, a taxa de codificação de canal da primeira configuração é maior do que a taxa de codificação da segunda configuração, o que resulta em pior desempenho frente ao ruído branco aditivo. Logo, a primeira configuração é in-dicada se o canal apresentar uma dispersão temporal elevada, enquanto que a segunda configuração é recomendada para o caso onde o canal não é o muito seletivo em freqüência e deseja-se obter uma maior área de cobertura. Desenvolvimento no âmbito do SBTVD O Instituto Nacional de Telecomunicações atua na área de TV Digital desde Ao longo desses anos, o INATEL desenvolveu e desenvolve projetos nas diferentes camadas da TV digital, em parceria com diferentes empresas, universidades e centros de pesquisa. Alguns destes projetos serão brevemente apresentados ao longo desta Seção. Sistemas de Transmissão Em 2003, o INATEL iniciou a execução de um projeto de desenvolvimento de sistemas de transmissão de TV digital, fomentado pela FINEP com recursos do FUNTTEL e em parceria com a Linear Equipamentos Eletrônicos. Como em 2003 as dis- cussões sobre qual padrão deveria ser adotado no Brasil estavam apenas no início, decidiu-se desenvolver um sistema de transmissão para o padrão ATSC, uma vez que a interveniente do projeto já possuía clientes no México, EUA e Canadá interessados neste produto. O projeto deste equipamento foi baseado em uma estrutura denominada de FPGA (Field Programmable Gate Array), que permite o desenvolvimento da lógica do sistema em software para depois sintetizar o hardware [16]. A primeira versão comercial do transmissor ATSC foi finalizada em dezembro de 2004 e as primeiras transmissões abertas de caráter experimental foram realizadas em janeiro de Hoje, este transmissor é comercializado pela interveniente do projeto nos EUA e no México. O segundo produto proveniente desse projeto visou o mercado brasileiro. Já em 2005 havia fortes indícios da preferência das emissoras de televisão pelo padrão japonês. Por esta razão, a coordenação do projeto decidiu investir no desenvolvimento de um transmissor ISDB-T. Esse transmissor foi iniciado em julho de 2005 e em novembro de 2006 o primeiro protótipo já estava funcional. Em julho de 2007 as primeiras versões comerciais estavam disponíveis e, hoje, algumas emissoras de televisão, como a Rede Bandeirantes e a MTV já empregam essa solução nos testes que estão sendo realizados na cidade de São Paulo. O próximo passo desse projeto é fazer com que esse transmissor esteja apto a operar em redes de freqüência única. Sistemas de Recepção O INATEL possui duas grandes participações na área de recepção de sinais de TV digital. O primeiro projeto foi realizado em 2005, em parceria com a empresa Superior Technologies Broadcasting com o fomento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG). O objetivo deste projeto foi desenvolver uma unidade receptora e conversora de sinais digitais em sinais analógicos, que permitisse que um televisor convencional pudesse ser utilizado em um sistema 55
9 56 de TV digital. Como em 2005 ainda não havia definição do padrão a ser empregado no Brasil, decidiu-se pelo desenvolvimento de uma unidade receptora para o padrão DVB-T. Um dos fatores que levou a essa decisão foi o fato do INATEL estar se tornando um centro de excelência em TV digital. Para isso, era necessário ter domínio sobre todas as tecnologias existentes nessa área, e o padrão DVB-T ainda não havia sido estudado. O segundo fator foi econômico, uma vez que a interveniente desse projeto visava o amplo mercado disponível para o DVB-T, que é o padrão mais difundido em todo o mundo. Duas versões desse produto foram desenvolvidas, sendo uma para uso profissional e outra para uso doméstico. Esse projeto foi finalizado em dezembro de 2005 e atualmente o produto é comercializado pela interveniente do projeto em diversos países. Em 2007, o INATEL iniciou o desenvolvimento de uma nova unidade receptora de TV digital, desta vez visando o mercado brasileiro. Esse projeto está sendo realizado em parceria com a Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica (Fucapi), sediada em Manaus e os primeiros protótipos já estão sendo produzidos. Estima-se que até o final deste ano as primeiras unidades comerciais do produto já estarão disponíveis. Inovação Tecnológica Em 2005, o Governo Federal investiu no desenvolvimento de uma nova proposta para o Sistema Brasileiro de Televisão Digital, que apresentasse ganhos expressivos com relação aos padrões já existentes no mercado. Um consórcio de universidades e centros de pesquisas formado pela INATEL, UNICAMP, UFSC e CE-FET/PR ficou responsável por desenvolver uma proposta para o subsistema de modulação. O projeto MI-SBTVD (Modulação Inovadora do SBTVD) teve como ponto de partida a camada física do padrão ISDB-T. No entanto, como esse padrão foi desenvolvido na década de 90, diversas novas tecnologias desenvolvidas no final da década de 90 não foram incorporadas. A proposta do MI-SBTVD foi de incorporar dois grandes avanços na área de comunicação digital que foram apresentados recentemente. São eles: LDPC [17]: todo sistema de TV digital possui dois níveis de códigos corretores de erro. O primeiro nível é denominado de código externo e o segundo nível de código interno. Todos os padrões existentes hoje empregam o código RS encurtado como código externo. Essa solução também foi empregada pelo MI-SBTVD, uma vez que a estrutura de blocos RS(204, 188) facilita o processo de sincronismo do decodificador e apresenta bom desempenho nas condições de canal referentes à radiodifusão de sinais digitais. A inovação proposta pelo MI-SBTVD refere-se ao código interno. A solução clássica, adotada pelos padrões existentes, consiste em utilizar um código convolucional como código interno. Já o MI-SBTVD utiliza um código de blocos denominado de Low Density Parity Check (LDPC) Code. Esse código utiliza blocos de informação extensos que permite ganhos elevados mesmo quando a taxa de codificação é alta. Codificação Espaço-Temporal [18]: a mobilidade e a robustez do sistema frente aos canais variantes no tempo é um requisito que deve ser atendido para que o sistema de TV digital satisfaça as necessidades das operadoras. A maneira clássica de mitigar o problema da variação do canal ao longo do tempo é utilizar duas antenas de recepção espaçadas o suficiente para que os sinais recebidos sejam descorrelacionados, técnica esta denominada de diversidade de recepção. Em seguida, esses de sinais são combinados de maneira adequada a fim de garantir uma qualidade de recepção aceitável. O principal problema com essa solução é o encarecimento do sistema de recepção. Em um sistema de radiodifusão, onde um transmissor atende milhares de
10 receptores é mais interessante utilizar a diversidade na transmissão, uma vez que o custo dessa implementação será dissolvido entre todos os usuários. Nesse cenário, o uso da codificação espaço-temporal é uma solução interessante, uma vez que é possível obter um ganho de diversidade de ordem 2 empregando-se duas antenas no transmissor e apenas uma antena no receptor. O uso da diversidade de transmissão, através da codificação espaço-temporal, traz vantagens em praticamente todos os aspectos. Caso algum fabricante decida empregar um receptor com duas antenas, esse dispositivo pode apresentar ganho de diversidade de ordem 4, sem que haja nenhuma modificação no esquema de transmissão. Da mesma forma, caso a operadora decida empregar apenas uma antena de transmissão, o receptor funciona sem a necessidade de nenhuma modificação, embora não seja possível obter ganho de diversidade. Ambas as inovações apresentadas resultam em pouco ou nenhum aumento na complexidade do sistema. Embora a decodificação interativa do LDPC seja mais complexa do que a decodificação de Viterbi (empregada nos demais padrões), o desenvolvimento de chipsets de alta densidade, a partir de soluções em FPGA, permite que soluções acessíveis do decodificador LDPC sejam obtidas em um curto intervalo de tempo. O uso de duas antenas de transmissão resulta, apenas, na inclusão de um conversor de freqüência e na modificação da estrutura de potência do transmissor, uma vez que são necessárias duas saídas de RF ao invés de apenas uma. Conclusões O desenvolvimento do Sistema Brasileiro de TV Digital é algo de primordial importância para o crescimento tecnológico nacional. Os investimentos do Governo Federal permitiram que, pela primeira vez no Brasil, diversas instituições de ensino e pesquisa pudessem trabalhar em conjunto, formando uma rede de pesquisa com um objetivo em comum. O resultado desse trabalho conjunto foi a concepção de um sistema, baseado em um padrão robusto e flexível que atende as expectativas tanto das emissoras quanto dos telespectadores, mas com importantes evoluções nas camadas de compressão e middleware. Os diversos projetos conduzidos pelo INATEL também mostram que o fomento e financiamento de projetos de pesquisa e desenvolvimento na área de TV Digital tornam possível que o conhecimento e a competência até então limitados aos círculos acadêmicos sejam estendidos para a indústria, formando um elo de desenvolvimento sólido. Essa parceira entre academia e indústria permite que sejam desenvolvidos no Brasil equipamentos de alto valor agregado que podem competir em preço e qualidade com produtos importados. Como exemplo deste tipo de sucesso, pode-se citar os transmissores ATSC que hoje são comercializados nos EUA, que é um grande centro de desenvolvimento de tecnologia. Outro exemplo é o transmissor desenvolvido para o mercado brasileiro, que compete com equipamentos de gigantes como Harris, NEC, Toshiba, entre outros. O projeto do receptor ISDB-T que está em desenvolvimento também vem somar-se a esta lista, uma vez que esse produto irá competir com soluções da Philips, LG, Sony e outras. Todos esses exemplos mostram que o potencial nacional para o desenvolvimento de soluções competitivas pode ser explorado de maneira eficiente, se houver uma interação entre a academia, a iniciativa privada e governo. BIBLIOGRAFIA [1] Interactive TV web: Your source for MHP, OCAP, ACAP, and JavaTV information, [2] Barry G. Haskell, Atul Puri, Arun Netravali, Digital video: An introduction to MPEG- 2, Kluwer Academic Publishers,
11 58 [3] Luiz Fernando Gomes Soares, Rogério Ferreira Rodrigues, Márcio Ferreira Moreno, Ginga-NCL: the Declarative Environment of the Brazilian Digital TV System, Journal of the Brazilian Computer Society, no. 1; Vol. 13; Mar [4] Luciano Volcan Agostini, Arnaldo P. Azevedo Filho, Wagston T. Staehler, Vagner S. Rosa, Bruno Zatt, Ana Cristina M. Pinto, Roger Endrigo Porto, Sergio Bampi, Altamiro A. Susin, Design and FPGA Prototyping of a H.264/ AVC Main Profile, Journal of the Brazilian Computer Society, no. 1; Vol. 13; Mar [5] Luciano L. Mendes, José Marcos C. Brito, Fabbryccio A. Cardoso, Dayan A. Guimarães, Gustavo C. Lima, Dalton S. Arantes, Richard D. Souza, MI- SBTVD: A Proposal for the Brazilian Digital Television System SBTVD, Journal of the Brazilian Computer Society, no. 1; Vol. 13; Mar [6] Luís Geraldo P. Meloni, Return Channel for the Brazilian Digital Television System- Terrestrial, Journal of the Brazilian Computer Society, no. 1; Vol. 13; Mar [7] Luciano Leonel Mendes, Introdução à TV Digital, Semana Internacional de Telecomunicações, INATEL, [8] Jorge Fernandes, Guido Lemos e Gledson Silveira, Introdução à Televisão Digital Interativa: Arquitetura, Protocolo, Padrões e Práticas, JAI-SBC, Salvador BA, [9] ATSC Standard A/53, Digital Television Standard, [10] European Telecommunication Standard ETS , Digital Video Broadcasting (DVB); Framing structure, channel coding and modulation for digital Terrestrial television (DVB-T), ETSI, [11] ITU-R 205/11, Channel Coding, Frame Structure and Modulation Scheme for Terrestrial Integrated Services Digital Broadcasting (ISDB-T), International Telecommunication Union, [12] Geraldo G. R. Gomes, Dayan A. Guimarães, Tarciano Pegoraro, Definição de códigos, entrelaçamento e modulação. In: SBTVD RFP 2004/18.1.4, Santa Rita do Sapucaí: Instituto Nacional de Telecomunicações (INA- TEL), [13] ATSC Standard A/54, Guide to the Use of the ATSC Digital Television Standard, [14] Luciano Leonel Mendes, Modelos Matemáticos para Estimação do Desempenho de Sistemas de Multiplexação em Freqüências Ortogonais, Tese de doutorado, UNICAMP, [15] Mackenzie/Abert/Set, Relatório Final, Testes em Sistemas de TV Digital, Descrição Geral dos Testes de Laboratório (in Portuguese). [16] R. Lipsett, VHDL, Hardware Description and Design, Kluwer Academic Publishers Norwell, MA, USA, [17] T. Pegoraro et al, Design, Simulation and Hardware Implementation of a Digital Television System: LDPC channel coding, IEEE International Symposium on Spread Spectrum Techniques and Applications - ISSSTA-2006, Manaus, Brazil, August, [18] K. F. Lee and D. B. Willians, A Space-Time Coded Transmit Diversity Technique for Frequency Selective Fading Channels, IEEE Sensor Array and Multichannel Signal Processing Workshop, pp Cambridge, MA, March 2000.
12 Luciano Leonel Mendes é graduado em Engenharia Elétrica e mestre em Telecomunicações pelo Instituto Nacional de Telecomunicações em 2001 e 2003, respectivamente. Recebeu em 2007 o título de doutor em Engenharia pela Universidade Estadual de Campinas. E, desde 2001, atua como professor e pesquisador do Instituto Nacional de Telecomunicações. 59
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