TRIBUNAL MARÍTIMO JP//MDG PROCESSO Nº /07 ACORDÃO
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1 TRIBUNAL MARÍTIMO JP//MDG PROCESSO Nº /07 ACORDÃO Catamarã TURISMANDO. Avaria deixando a embarcação à deriva. Deficiência de manutenção. Condenação. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. No dia 09/01/07, cerca de 16h15min, houve o rompimento do gualdrope, deixando à deriva o catamarã TURISMANDO, por cerca de três horas, até ser rebocado à praia da Ponta da Areia, onde os passageiros desembarcaram. No inquérito, realizado pela CPMA, foram ouvidas 3 testemunhas, realizado laudo pericial e juntada a documentação de praxe. Dos depoimentos tem-se que: Lindolfo Gourdard Neto declarou que no momento do acidente da navegação se encontrava na popa governando a embarcação; em 09/01/07, por volta de 16h20min, suspenderam do porto de Alcântara, MA, conduzindo 35 turistas com destino à praia Ponta da Areia, São Luís, MA. Por volta de 16h30min, e quando já se encontravam navegando próximo da bóia 24 do canal de acesso ao terminal marítimo da Ponta da Madeira, o cabo componente do sistema de governo (gualdrope) rompeu-se e o chicote da corrente que faz parte do sistema caiu na água, fato este que impossibilitou o reparo do gualdrope. Logo em seguida tentou contato com a Capitania dos Portos, via rádio VHF, não obtendo resposta, então contactou a lancha BAHIA STAR que navegava nas proximidades que entrou em contato com a Capitania dos Portos e pediu permissão para rebocar a embarcação, mas não conseguiu porque ela tem muita força nos motores e a sua embarcação estava sem leme e o cabo não agüentou e partiu, foi tentado novamente, mas o cabo partiu outra vez e os passageiros da lancha começaram a passar mal devido às circunstâncias. Então a lancha prosseguiu a sua viagem e depois de mais ou menos 30 minutos o catamarã TURISMAR se aproximou, depois que solicitou o seu socorro, fui rebocado até nas proximidades da praia da Guia. Nesse momento a lancha BAHIA STAR retornou e rebocou os dois catamarãs para a praia da Ponta da Areia, porque o catamarã TURISMAR já estava com pouca gasolina pelo gasto excessivo. Os passageiros ficaram abalados devido às circunstâncias do local e também porque o socorro demorou demais; na segunda quinzena de dezembro fez uma manutenção geral no catamarã, inclusive foi feita a troca dos cabos do sistema de 1/7
2 governo por cabo novo de 6mm e no dia 28 de dezembro os cabos foram inspecionados pela Capitania dos Portos. Depois do acidente fez a troca do cabo de 6mm por um de 12mm para que nada semelhante volte a acontecer, foi uma fatalidade que acontece e também porque o mar estava muito agitado e a corrente do sistema de governo cortou o cabo que unia esta aos gualdropes. João Lucas Sousa, mestre na lancha BAHIA STAR que navegava nas proximidades do acidente da navegação, declarou que no dia 9 de janeiro de 2007, por volta de 16h30min, ao navegar em frente da ilha do Medo com destino à praia da Ponta da Areia, recebeu um chamado pelo canal 16 VHF do catamarã TURISMANDO, pedindo socorro, dizendo que estava à deriva e se podia rebocá-lo até a praia da Ponta da Areia. Então, solicitou pelo rádio autorização da Capitania dos Portos para rebocá-lo que imediatamente autorizou, retornou e eles passaram o cabo para a embarcação e iniciaram a manobra de reboque da lancha BAHIA STAR só que o cabo partiu com vinte minutos de manobra, como os passageiros estavam passando mal, participou à Capitania dos Portos que ia desembarcá-los na Ponta da Areia e retornaria para recomeçar a manobra. Quando chegou no local encontrou o catamarã TURISMAR tentando rebocar o catamarã TURISMANDO, só que ele não tinha força suficiente para rebocá-lo, e os passageiros já estavam apavorados e gritando, rebocou as duas embarcações para a praia da Ponta da Areia, atracando por volta de 19h e desembarcou os passageiros sãos e salvos e a Capitania dos Portos já estava no local aguardando a chegada da lancha BAHIA STAR com o reboque; antes de atender o chamado de pedido de socorro do catamarã TURISMANDO, o depoente não ouviu a referida embarcação pedindo socorro à CP, porque estava o tempo todo ligado no canal 16 do VHF e não ouvia nada; os passageiros e tripulantes da embarcação acidentada foram resgatados e desembarcados na praia da Ponta da Areia sem nenhum ferimento; o mar estava agitado, ventava forte, a maré estava enchendo, a correnteza estava muito forte, e a visibilidade era boa; eu estava ligado no canal 16 de não ouvi ninguém pedindo socorro à Capitania dos Portos. O laudo pericial concluiu que a causa do acidente deveu-se a negligência do armador pela falta de manutenção no sistema de governo da embarcação. No relatório o encarregado do inquérito concluiu que: 1) Fatores que contribuíram para o acidente da navegação; a) Fator humano: não contribuiu; b) Fator material: contribuiu. O cabo que unia o sistema de governo do catamarã TURISMANDO, além de ser de material e de bitola inadequado, estava ligado diretamente na corrente, fato este que, pela ação da ferrugem desta provocou o seu rompimento. 2/7
3 c) Fator operacional: não contribuiu. Conclui-se, portanto, que o acidente da navegação foi causado pela falta de manutenção no sistema de governo da embarcação. II) Aponto, por oportuno, a infração às normas decorrente da LESTA, a qual não guarda nexo de causalidade com o acidente da navegação, cometida pelo mestre e armador do catamarã TURISMANDO : deixou de comunicar o acidente da navegação à CP, em tempo hábil, colocando em risco a embarcação, as vidas e as fazendas de bordo, causando com isso embaraços a Administração Naval. III) O armador e mestre do catamarã TURISMANDO, o Sr. Lindolfo Goudard Neto, é o possível responsável pelo acidente da navegação, por negligência no exercício de suas funções. A Procuradoria Especial da Marinha, em uniformidade de entendimento com o relatório, ofereceu representação em face do indiciado, com fulcro no art. 14, letra b, e art. 15, letra e, ambos da Lei nº 2.180/54. Citados, os representados foram regularmente defendidos. A defesa conjunta alega que: Na verdade, não há qualquer vedação nesse sentido pelo fato de não haver regulamentação acerca de qual deve ser a bitola para os cabos desse sistema, seja lei, normativo, dispositivo ou convenção que assim ateste, em outras palavras, não há restrição para uso de tal equipamento. Aliás, nas águas do MA, é de grande utilização e muito comum que embarcações do mesmo porte da TURISMANDO utilizem essas referências para o sistema de governo, sendo esse fato de pleno conhecimento dessa CP. Da mesma forma, não pode se firmar a alegação de negligência, que se fundamentou na falta de manutenção do cabo do sistema de governo. Como se disse anteriormente, houve a troca do cabo na mesma semana de sua compra, 20/12/2006, para isso se juntou o comprovante da compra dos cabos; o acidente ocorreu cerca de vinte dias depois da colocação do cabo, logo, não há como prosperar a acusação de falta de manutenção. O próprio defendente faz vistoria diária, buscando prevenir-se do desgaste do sistema. O rompimento prematuro foi ocasionado por eventualidade não previsível, já que 20 dias de utilização não leva a presumir que os cabos do sistema de governo já pudessem estar comprometidos a ponto de prejudicar a navegação. Negligência, segundo o consagrado conceito é agir com descuido, desídia, desleixo, ou então, faltar com o cuidado devido, capaz de determinar responsabilidade por culpa. O que a denúncia sugere é que o defendente deixou de agir da forma como se 3/7
4 esperava no que diz respeito à manutenção da embarcação, em especial, quanto à vistoria do sistema de governo. Apenas para ilustrar, o defendente procede a revisão diária do sistema de governo bem como dos demais sistemas da embarcação; a troca do cabo é feita em média de três em três meses, mas no presente caso observe que em menos de um mês houve o rompimento, fato que se atribui a completa fatalidade, pois, absolutamente fora da previsão normal e razoável para o sistema. Já quanto às responsabilidades, entendeu o denunciante que houve culpa de Pollyana Sousa da Silva, ora 1ª representada, na medida em que esta, por ser proprietária da embarcação, tinha a obrigação de zelar pela manutenção das condições de segurança do catamarã TURISMANDO, motivo pelo qual imputou-lhe conduta negligente. Do fato, inexiste controvérsia quanto ao fato da Sra. Pollyana Sousa da Silva ser proprietária da embarcação, porém, cumpre-nos trazer à baila os motivos que justificam não se poder atribuir a ela culpa por qualquer fato ocorrido com a embarcação, senão vejamos: A Sra. Pollyana Sousa da Silva, ora 1ª representada, celebrou com o Sr. Lindolfo Goudard Neto, ora 1º representado, contrato de arrendamento cujo objeto foi a locação do catamarã TURISMANDO no qual ficou estipulado que o arrendatário, Sr. Lindolfo Goudard Neto, pessoa devidamente habilitada na CP para conduzir e conservar o catamarã, ficaria na posse do bem móvel, exclusivamente responsável não só pela sua manutenção como também zelar pelas condições de segurança, além de ser o responsável por qualquer dano eventualmente causado a terceiro. As cláusulas do contrato, cuja cópia será juntada aos presentes autos oportunamente, deixam claro que o 2º representado, na qualidade de locatório do bem, assumiu todas as responsabilidades inerentes ao uso e gozo da embarcação, bem como pela sua guarda e manutenção. Assim sendo, é insustentável atribuir a primeira representada qualquer conduta culposa por fato praticado por terceiro que detinha a posse do bem na qualidade de locatário da embarcação, assumindo este a responsabilidade pela guarda e conservação do catamarã. No caso trazido a lume, inexiste conduta negligente praticada pela Sra. Pollyana Sousa, na medida em que esta tomou todos os cuidados necessários quando da celebração do contrato de locação, agindo de forma absolutamente prudente, vale dizer, contratando com pessoa devidamente habilitada junto à CP, com larga experiência em armação e navegação nas águas da baía de São Marcos. Além disso, a 1ª representada entregou a embarcação em excelentes condições de conservação e segurança para os passageiros, exigindo do locatário 4/7
5 providências para manter o catamarã em perfeitas condições de uso e segurança, em conformidade com as normas de segurança prevista na legislação marítima. Frise-se, também, que o mestre e arrendatário da embarcação, utilizava-a como instrumento de trabalho em empreendimento turístico também de sua inteira responsabilidade, sendo ele, unicamente, quem auferia lucros advindos deste empreendimento, o que justifica ser da exclusiva responsabilidade do mestre a segurança dos seus passageiros. Repise-se que o substrato jurídico do pedido assenta-se em conduta negligente da 1ª representada, posto que esta tinha a obrigação de zelar pela manutenção das condições de segurança do catamarã TURISMANDO, dando a entender que a 1ª representada também participava diretamente do empreendimento de transportes de passageiros e por conseqüência tinha a responsabilidade na manutenção do catamarã, o que não é verdade. Patente está que a 1ª representada ao celebrar um contrato com o 2º representado, transferiu todas as obrigações legais para este, tomando o devido cuidado necessário imbuída da plena convicção de estar agindo certo e de acordo com a lei, no exercício de uma atividade legal. Na lição do mestre Antonio José Miguel Feu Rosa (in Curso-Parte Geral, 1995, p. 327), por todos, fulmina: Revela-se negligente o agente que omite, que deixa de tomar os cuidados necessários à preservação da saúde e dos bens alheios. Tem consciência do perigo de sua conduta, mas não adota as providências acauteladoras que lhe competia. Com efeito, no presente caso a 1ª representada nunca poderia ser tratada como negligente já que sequer teve participação no evento. Ademais, como dito alhures, quando da transferência da posse do catamarã para terceiro, adotou todas providências necessárias para eximir sua responsabilidade em qualquer evento relacionado com a embarcação, razão pela qual impõe-se seja excluída do pólo passivo da demanda, por absoluta falta de culpabilidade no evento. Quanto à responsabilidade do 2º representado, Sr. Lindolfo Goudard Neto, temos também que não ocorreu conduta negligente de sua parte já que este também não deixou de tomar as medidas que as normas e a prudência lhe impõem. Mesmo sendo ele mestre e possuidor da embarcação, responsável direto pela conservação e condução do catamarã, tomou a devida precaução ao fazer manutenção geral e submeteu a mesma a vistoria anual na segunda quinzena de dezembro de 2006, ocasião em que foi realizada a troca dos cabos do sistema de governo por outro novo, ou seja, a menos de um mês antes do acidente, bem como diariamente procedia à vigilância no sistema de governo da embarcação. 5/7
6 Logo, não há como se sustentar a acusação de que tenha havido a falta de manutenção do sistema de governo que caracteriza a negligência dita na denúncia se o representado procede a vistoria diária dos equipamentos da embarcação. Repise-se, o rompimento do cabo naquelas circunstâncias se deve a mais completa fatalidade, já que sua troca havia sido feito a menos de 30 dias. No presente caso nos parece que um caso fortuito provocou o acidente, já se trata de um acontecimento possível, mas estranho à ação e a vontade humana. Na fase de instrução nenhuma prova foi produzida. Em alegações finais, manifestaram-se as partes. De tudo quanto contém nos presentes autos, verifica-se que a causa determinante do rompimento do gualdrope, deixando a embarcação à deriva foi a utilização de cabo inadequado e subdimensionado no sistema de governo do catamarã. A unanimidade da prova produzida nos autos demonstrou que o cabo que unia o sistema de governo do catamarã foi confeccionado com material inadequado e possuía uma bitola insuficiente diante das características da embarcação. E mais, o laudo pericial comprovou que o cabo rompido encontrava-se ligado diretamente na corrente o que, pela ação da ferrugem, provocou o seu rompimento, diante da fadiga do material. Assim, restou apurado que os representados, mestre e armadora proprietária, negligenciaram quanto a elementar necessidade de efetuar-se uma manutenção preventiva em todo o sistema de governo, razão pela qual deve ser julgada integralmente procedente a representação, responsabilizando-se os representados pelo acidente em apreciação. Em tempo, deve ser oficiado à DPC diante das infrações cometidas pela proprietária ao não comunicar o acidente da navegação à Capitania dos Portos no prazo oportuno. Assim, A C O R D A M os Juízes do Tribunal Marítimo, por unanimidade: a) quanto à natureza e extensão do acidente: avaria em catamarã, deixando-o à deriva; b) quanto à causa determinante: rompimento do cabo do gualdrope; c) decisão: julgar o acidente da navegação, previsto no art. 14, letra b, da Lei nº /54, como decorrente da negligência dos representados, condenando a 1ª representada, Pollyanna Sousa da Silva, à pena de multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) e custas e o 2º representado, Lindolfo Goudard Neto, à pena de repreensão. Oficiar a Diretoria de Portos e Costas quanto à infração cometida pela proprietária ao não comunicar o acidente à Capitania dos Portos no prazo oportuno. Publique-se. Comunique-se. Registre-se. 6/7
7 Rio de Janeiro, RJ, em 3 de junho de MARCELO DAVID GONÇALVES Juiz-Relator LUIZ AUGUSTO CORREIA Vice-Almirante (RM1) Juiz-Presidente DINÉIA DA SILVA Diretora da Divisão Judiciária AUTENTICADO DIGITALMENTE 7/7
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