XVIII COBREAP CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA DE AVALIAÇÕES E PERÍCIAS. IBAPE/MG NATUREZA DO TRABALHO: PROFISSIONAL

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1 XVIII COBREAP CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA DE AVALIAÇÕES E PERÍCIAS. IBAPE/MG NATUREZA DO TRABALHO: PROFISSIONAL Pericias relacionadas a impactos de vizinhança Resumo Trata-se da constatação e análise por meio de casos práticos de ações ordinárias oriundas de conflitos gerados por impactos de vizinhança. Atualmente mais de 80% da população brasileira reside em áreas urbanas muito adensadas, e dessa forma todas as interferências geram repercussões muitas vezes negativas que requerem um estudo mais apurado do profissional que milita na área de engenharia legal. Com o crescimento das cidades há uma redução da qualidade de vida, com o agravamento dos ruídos, da poluição atmosférica e visual com perda da paisagem natural e construída, das enchentes, do uso indevido das edificações, da multiplicação de doenças e insetos em função da deficiência de limpeza e de planejamento, além da total falta de segurança. Todos esses temas serão abordados no artigo realizando uma reflexão dos casos em que temos que atuar na análise da legislação pertinente e na verificação dos impactos negativos ou positivos e da forma de minimizá-los. PALAVRAS CHAVE: Estatuto da Cidade Impactos de Vizinhança Ruídos Muros de divisa

2 INTRODUÇÃO Diversos casos pericias estão relacionados as interferências oriundas de impactos de vizinhança, tais como: ruídos indesejados, construções em muros de divisa, abertura de janelas a menos de 1,50m de distância, instalação de coifas e exaustores de restaurantes nas divisas, acréscimos e ampliações com redução da vista, entre outros. O estudo e análise dos impactos de vizinhança tiveram inicio com o Estatuto da Cidade, Lei n /01 que trouxe um novo instrumento de controle da Política Urbana: o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV). O Estatuto estabelece que Munícipios com mais de habitantes necessite apresentar um Plano Diretor e nele deve constar a avaliação dos principais impactos, positivos ou negativos que interferem no meio urbano. O EIV, tal como cita Rocco, é um procedimento obrigatório para a concessão de licença ou autorização para determinadas atividades e empreendimentos urbanísticos. Portanto, sua elaboração está associada à concessão da licença urbanística. 1 Esse artigo pretende abordar a legislação pertinente ao tema, identificando o que consta no Planto Diretor Lei nº 111 de 2011 do Município do Rio de Janeiro, e os artigos do Código Civil que regulamentam vários dos problemas existentes, além de Normas da ABNT que podem servir de base para uma análise mais profunda do tema, principalmente quando se trata de ruído, NBR e NBR DO ESTATUTO DA CIDADE LEI n de 10 de julho de 2001 Os estudos do direito de vizinhança se iniciam no Código Civil de 1916, no qual se verificam várias regras de convivência em função do uso inadequado de propriedade. O uso nocivo pode ser considerado como aquele que gera danos a segurança, sossego e a saúde. Nos conflitos de vizinhança muitas vezes a saúde é abalada, estando a mesma relacionada ao estado físico, psíquico e mental, diminuindo a qualidade de vida. Os impactos são principalmente identificados a partir de 1981 com a Lei nº que versa sobre a Política Nacional do meio ambiente. No artigo 3º da referida lei fica claro que os danos que afetam a saúde, a segurança e o bem estar devem ser evitados, tal como descrito. Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; II - degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meio ambiente; III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; 1 ROCCO, Rogério Estudo de Impacto de Vizinhança: Instrumento de Garantia do Direito às Cidades Sustentáveis 2

3 e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos; IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental; V - recursos ambientais, a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo e os elementos da biosfera. 2 (grifos nossos) As ações judiciais relacionadas ao tema verificam os problemas gerados e que afetam a saúde e consequentemente o meio ambiente de forma geral, ou seja, um estudo do uso nocivo que pode prejudicar de alguma forma o usuário de determinado local. Na análise deste tema é fundamental a compreensão dos instrumentos existentes, tal como o Estatuto da Cidade Lei n /01 que trouxe um novo instrumento de controle da Política Urbana: o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), disciplinado nos artigos 36 a 38 da Seção XII, semelhante ao Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EIA), voltado para questões urbanísticas. O Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) pode ser definido como documento técnico a ser exigido, com base em lei municipal, para a concessão de licenças e autorizações de construção, ampliação ou funcionamento de empreendimentos ou atividades que possam afetar a qualidade de vida da população residente na área ou nas proximidades. Conforme artigos 36 a 38 têm-se: Art. 36. Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou públicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público municipal. Art. 37. O EIV será executado de forma a contemplar os efeitos positivos e negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população residente na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo, das seguintes questões: I adensamento populacional; II equipamentos urbanos e comunitários; III uso e ocupação do solo; IV valorização imobiliária: V geração de tráfego e demanda por transporte público; VI ventilação e iluminação; VII paisagem urbana e patrimônio natural e cultural; Parágrafo único. Dar-se-á publicidade aos documentos integrantes do EIV, que ficarão disponíveis para consulta, no órgão competente do Poder Público municipal, por qualquer interessado. Art. 38. A elaboração do EIV não substitui a elaboração e a aprovação de estudo prévio de impacto ambiental (EIA), requeridas nos termos da legislação ambiental. 2 LEI Nº 6.938, DE 31 DE AGOSTO DE Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências 3

4 Resumidamente o relatório de impacto de vizinhança, por definição da Lei Orgânica, consiste em um instrumento relacionado com as repercussões significativas dos empreendimentos sobre o ambiente urbano. É um instrumento sujeito à regulamentação federal sobre a matéria. Seu conteúdo básico é a caracterização do empreendimento, o diagnóstico da área de influência, e a avaliação de impactos significativos (Decreto Federal /94). Segundo Rocco,... temos no Estudo do Impacto de Vizinhança um instituto de natureza jurídica híbrida, que incide como limitação administrativa, ao mesmo tempo que se caracteriza como direito subjetivo ao exercício da cidadania para a gestão da sustentabilidade das cidades. 3 PLANO DIRETOR No Plano Diretor do Município do Rio de Janeiro, Lei complementar nº 111 de 2011, se estabelece o Relatório de Impacto de Vizinhança (RIV), conforme seção XII, artigos 99 a 102, onde fica claro que para qualquer instalação devem-se observar os impactos positivos ou negativos gerados na vizinhança e as medidas mitigadoras para reparar os prejuízos gerados. O Estudo de Impacto de vizinhança (EIV) se diferencia do relatório (RIV), sendo o primeiro de natureza técnica, executado como uma base para um diagnóstico de uma determinada região potencialmente afetada, e o segundo constitui-se de um documento, no caso pericial, de um laudo, contendo a análise, o estudo e a verificação dos danos eventualmente existentes e reclamados. Da Lei complementar nº 111 de 2011, tem-se: Seção XII Do Relatório de Impacto de Vizinhança - RIV Art. 99. O Relatório de Impacto de Vizinhança RIV é o instrumento destinado à avaliação dos efeitos negativos e positivos decorrentes da implantação ou ampliação de um empreendimento ou de uma atividade econômica em um determinado local e a identificação de medidas para a redução, mitigação ou extinção dos efeitos negativos e terá prazo de validade regulamentada em legislação específica. 1º O instrumento a que se refere o caput abrange execução de obras e concessão de alvarás de funcionamento de atividades, tanto da iniciativa privada quanto pública que, de acordo com as suas características estarão sujeitas à apresentação do RIV, ficando excetuados da referida apresentação os templos religiosos de qualquer culto. 2º Aplica-se o Relatório de Impacto de Vizinhança (RIV) em empreendimentos que importem em substancial aumento na circulação de pessoas e tráfego de veículos, ou em utilização massiva da infraestrutura, ou ainda naqueles que causem incômodos ambientais à população, a exemplo de emissões líquidas, sólidas, sonoras ou condições que impliquem em baixa capacidade de circulação do ar, entre outras, de forma a avaliar a amplitude e importância dos impactos e adequar, se for o caso, o empreendimento à capacidade física e ambiental da região. 3 ROCCO, Rogério Estudo de Impacto de Vizinhança: Instrumento de Garantia do Direito às Cidades Sustentáveis 4

5 Art O Relatório de Impacto de Vizinhança deverá conter: I. definição dos limites da área impactada em função do porte do empreendimento e/ou atividades e das características quanto ao uso e localização e condições de acessibilidade; II. avaliação técnica quanto as interferências que o empreendimento e/ou atividade possa causar na vizinhança; III. descrição das medidas mitigadoras dos impactos negativos decorrentes da implantação do empreendimento e/ou atividade e seus procedimentos de controle; IV análise da intensificação do uso e ocupação do solo, a geração de viagens de pessoas e veículos motorizados ou não, relacionado à demanda por transporte público e tráfego viário. 1º Dar-se-á publicidade aos documentos integrantes do RIV, que ficarão disponíveis para consulta no órgão competente do Poder Público Municipal a qualquer interessado. 2º Em caso de Operação Urbana Consorciada o Estudo de Impacto de Vizinhança-EIV se consolidará em uma Avaliação Técnica Multidisciplinar, conforme consta no art. 90 desta Lei Complementar. 4 Na Lei Complementar, Lei nº 111 de 2011 consta ainda o artigo 58 que é claro sobre os impactos gerados a vizinhança, tal como a seguir descrito. Art. 58. A expedição da licença será condicionada: I. ao atendimento no projeto de adequação do uso, dos índices e parâmetros urbanísticos e edilícios; II. à análise do impacto no sistema viário e no meio ambiente natural e cultural, conforme legislação vigente; III. à audiência dos órgãos públicos estaduais, municipais e federais, quando necessária; IV. à expedição de licença de demolição quando se tratar de lotes anteriormente edificados; 1º O início das obras será caracterizado pela execução das fundações, ficando o interessado obrigado a comunicá-lo ao órgão fiscalizador. 2º O autor do projeto assumirá, ante a Prefeitura e perante terceiros, a responsabilidade do cumprimento no projeto de todas as condições previstas no Código de Obras e Edificações. 3º Caso se verifique o desrespeito às condições do Código de Obras e Edificações será cancelada a licença e serão aplicadas sanções ao profissional. 4º Os proprietários e responsáveis pela execução da obra assumirão, quando da aceitação da obra ou concessão do habite-se, a responsabilidade de ter respeitado o projeto, durante sua execução. 4 Plano Diretor do Município do Rio de Janeiro - Lei Complementar nº 111 de

6 5º O desrespeito ao projeto e à legislação municipal implicará o cancelamento da aceitação ou do habite-se e a aplicação de sanções ao proprietário e ao profissional responsável pela obra. 6º Em caso de achado arqueológico fortuito, a licença será condicionada à elaboração de parecer de pelo menos um órgão de tutela do Patrimônio Histórico e Cultural. 7º A Lei disporá sobre a fiscalização em Áreas de Especial Interesse Social. (grifos nossos) CÓDIGO CIVIL Na análise de AVVAD, o simples uso de um imóvel, mesmo licito, pode produzir ruídos, vapores, fumaça, vibrações e odores que virão prejudicar o uso da propriedade vizinha, causando incômodos, mal estar, desassossego ou mesmo danos à saúde dos que habitam a propriedade vizinha. 5 As restrições de vizinhança são tratadas pelo Código Civil Brasileiro na parte relativa ao direito de construir - Seção VII do capítulo V art a e do direito de vizinhança seção I do capítulo V art a São normas de caráter particular e tratam das relações entre vizinhos decorrentes da proximidade de imóveis. CAPÍTULO V Dos direitos de vizinhança Art O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudicais a segurança, o sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pelas utilização de propriedade vizinha Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança Nesse artigo verifica-se que a lei passou a conceder ao vizinho o direito de impedir o uso que gere interferências prejudiciais relacionadas a segurança, sossego e saúde dos que utilizam a propriedade vizinha. Art O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos. Art É defeso abrir janelas, ou fazer eirado, terraço ou varanda, a menos de metro e meio do terreno vizinho. 1. As janelas cuja visão não incida sobre a linha divisória, bem como as perpendiculares, não poderão ser abertas a menos de 75 centímetros. 6 5 Avvad, Pedro Elias Direito Imobiliário Teoria Geral e Negócios Imobiliários 3ª edição. Editora Forense Código Civil Brasileiro 6

7 2. As disposições deste artigo não abrangem as aberturas para luz ou ventilação, não maiores de 10 centímetros de largura sobre 20 de comprimento e construídas a mais de 2 metros de altura de cada piso. Art Não é permitida a execução de qualquer obra ou serviço suscetível de provocar desmoronamento ou deslocação de terra, ou que comprometa a segurança do prédio vizinho, senão após haverem sido feitas as obras acautelatórias. Art Todo aquele que violar as proibições estabelecidas nesta Seção é obrigado a demolir as construções feitas, respondendo por perdas e danos. 7 DOS IMPACTOS DE VIZINHANÇA As perícias em ações ordinárias ocorrem quando há um impacto negativo de vizinhança, que gera desgaste, perda de qualidade de vida, saúde e prejuízo ao sossego e consequentemente conflito e processo judicial. Os principais impactos negativos que vem sendo observados em causas perícias se referem a: ruídos, odores desagradáveis, ocupações irregulares, muros de divisa, falta de segurança, presença de roedores e baratas, entre outros. No decorrer desse artigo serão listados exemplos de casos em cada tipo de impacto apresentado. DOS RUÍDOS De acordo com a NBR e NBR verifica-se o nível máximo de ruídos permitidos para ambientes externos e internos diurnos e noturnos. Nas Normas constam as seguintes definições: Nível de ruído ambiente Lra Nível de pressão sonora equivalente, em db(a), no local e horário considerados, na ausência do ruído gerado por fonte sonora interferente. Fonte sonora interferente é a fonte de ocorrência alheia, ou temporária, em relação à finalidade mais característica de utilização do recinto em que se avalia o ruído ambiente. 8 Na NBR , norma relacionada à acústica avaliação do ruído em áreas habitadas, verifica-se que o nível de critério de avaliação (NCA) para AMBIENTES EXTERNOS encontra-se indicado na Tabela 1, do item 6, é de 55 dba para o período diurno e de 50 dba para o período noturno em áreas mistas, predominantemente residenciais. O item da NBR10151, a seguir apresentado, indica que, quando os níveis de ruído de fundo foram superiores aos encontrados na tabela passam a ser considerados como admissíveis justamente os ruídos de fundo. A razão para tal é física, uma vez que seria impossível a redução dos mesmos, ainda que a fonte 7 Código Civil Brasileiro 8 NBR da ABNT - Acústica - Avaliação do ruído em áreas habitadas, visando o conforto da comunidade e NBR da ABNT - Níveis de ruído para conforto acústico 7

8 sonora em questão fosse eliminada. Sendo assim os níveis admissíveis devem ser considerados como os de fundo. Tabela obtida na NBR Como período diurno define-se o horário entre 07:00 h e 22:00 h e, como período noturno, entre 22:00 h e 07:00 h. Dessa forma as medições noturnas se iniciaram às 22:00 h. A Norma estabelece para ambientes internos que o indicado na tabela I tenha a correção de 10dB(A), para janela aberta e de 15 db(a) para janela fechada, tal como item a seguir transcrito O nível de critério de avaliação NCA para ambientes internos é o nível indicado na tabela 1 com a correção de - 10 db(a) para janela aberta e - 15 db(a) para janela fechada. O problema de ruídos existe em casos onde há necessidade de instalação de aparelhos, principalmente em edificações e atividades comerciais, contíguos a áreas residenciais. As edificações comerciais só podem ser instaladas em zonas onde a atividade é permitida, porém nos zoneamentos dinâmicos dos grandes centros, a zona comercial se localiza em áreas limítrofes de zonas residenciais, gerando muitas vezes problemas de ruídos. Os impactos negativos se potencializam no horário noturno, quando a atividade comercial cessa e os apartamentos vizinhos percebem muito mais os ruídos dos equipamentos, que em muitos casos necessita ficar ligado 24 horas. Tal fato pode ser percebido em inúmeros casos periciais, onde há necessidade da verificação nos níveis sonoros, com medição dos ruídos diurnos e noturnos, com equipamentos ligados e desligados, além da identificação dos ruídos de fundo. 8

9 Edificação dos Autores Edificação da Ré Foto nº1: Vista aérea do local. No caso específico pericial os equipamentos que produziam os ruídos estavam instalados no pavimento de garagem elevado, na área de prisma de ventilação e no pavimento de cobertura. A edificação da Ré estava posicionada com frente para uma região de uso comercial, porém limítrofe encontrava-se a edificação dos autores, constituída de um prédio multifamiliar construído em centro de terreno em zona residencial, porém sujeito aos ruídos de fundo da região de alto movimento de automóveis. A sistemática adotada para a aferição do nivel de ruídos foi efetuar medições sonoras nos apartamentos tanto em período diurno quanto em período noturno, fazendo-se medições com todos os equipamentos da Ré ligados e com todos desligados. Em função das diversas ações judiciais dos moradores da edificação residencial, nas pericias pode-se verificar que as instalações da Ré apresentavam ruídos acima do permitido pelas Normas e havia interferências sonoras, principalmente no período noturno. A Ré necessitou instalar a torre de refrigeração no interior de um compartimento executado com painéis acústicos totalmente enclausurados, assim como os condensadores dos aparelhos de ar condicionado que estavam na fachada de fundos e foram identificados na perícia, geravam ruídos necessitando remoção e instalação num compartimento enclausurado, com painéis com revestimento acústico, no interior da garagem, para minimizar os ruídos que estavam fora do padrão da NBR

10 Fotos n os 2 e 3: Compartimento enclausurado com painéis acústicos onde estão instaladas torres de refrigeração e equipamentos confinados na garagem 10

11 No prisma da edificação e na área do pátio de afastamento de fundos localizada no pavimento de garagem foram instalados atenuadores de ruídos de descarga dos grupos geradores, para minimizar os impactos gerados nas edificações residenciais vizinhas. Fotos n os 4 e 5: Atenuadores de ruído instalado na fachada de fundos. Fotos n os 6 e 7: Atenuadores de ruído No pavimento de cobertura em função dos impactos negativos gerados pelos ruídos de equipamentos em funcionamento 24 horas, houve necessidade da instalação de torres contornadas por divisórias com proteção de ruídos e condensadores instalados em compartimento enclausurado. 11

12 Divisórias acústicas de proteção aos equipamentos Compartimento enclausurado Foto n o 8: Divisórias acústicas de proteção aos equipamentos e compartimento enclausurado Foto n o 9: Divisórias acústicas de proteção contornando os equipamentos. 12

13 Em relação a ruídos, outro problema constante em ações periciais é o impacto negativo sonoro nas unidades localizadas na cobertura, principalmente em edificações antigas, que normalmente estão posicionadas próximas a casa de máquinas dos elevadores. Num caso especifico ocorreu uma perícia onde a casa de máquinas dos elevadores estava posicionada acima das unidades de cobertura, junto ao telhado da edificação, imediatamente acima da parte central. A máquina do elevador social apresentava maquinário original da construção, antigo e ruidoso. Foram realizados testes com sonômetro digital e pode-se identificar que o mesmo estava provocando ruídos quando funcionava. Tais ruídos incidiam em valores no limite máximo estabelecido pela NBR/ABNT para ambientes internos. DA SEGURANÇA Foto n o 10: Maquina do elevador social antiga e ruidosa Ocorrem inúmeros casos relacionados à segurança dos imóveis lindeiros, principalmente quando são realizados acréscimos e modificações, tais como alteamento de muro, acréscimos de área, entre outros, como os exemplos a seguir narrados. Numa determinada perícia observou-se que um restaurante estava se instalando numa loja no pavimento térreo de uma edificação de uso misto, e as instalações para seu funcionamento estavam sendo executadas na área de afastamento de fundos, porém essa área era contígua a diversas outras edificações coladas nas divisas, dessa forma as edificações vizinhas e principalmente a unidade de fundos da própria edificação se tornaram vulneráveis e de fácil acesso. 13

14 Fotos n os 11 e 12: Ocupação da Área de afastamento de fundos facilitando o acesso às edificações vizinhas e ao apartamento do 2º andar As novas obras que vão sendo realizadas principalmente em áreas de cobertura e em áreas de prisma de ventilação em prédios colados nas divisas, devem identificar os impactos gerados nas unidades vizinhas analisando-se o mesmo e evitando assim que o espaço se torne vulnerável, violando o direito à moradia segura. Outro problema muitas vezes identificado em edificações de uso misto é a circulação de pessoas desconhecidas no prédio no pavimento térreo, quando o mesmo não possui a devida separação entre os usos comercial e residencial, podendo gerar sérios distúrbios na segurança. Tal fato deve ser estudado caso a caso, verificando-se a convenção condominial. Algumas perícias estão relacionadas a acréscimos em construções de coberturas com execução de novas lajes que permitem o fácil acesso as unidades de outras edificações, ou até do próprio edifício, deixando a segurança vulnerável. Em vários casos periciais verifica-se que os acréscimos nas unidades de cobertura estão regularizados perante a Secretaria Municipal de urbanismo, porém tal fato não justifica que não houve impacto de vizinhança, conceitos totalmente diferenciados e que devem ser bem analisados pelos perito nos seus laudos. Em Sentença no Processo: foi deferido o impacto de vizinhança, identificando-se que mesmo estando regular a legalização, os acréscimos estavam gerando impactos negativos. Versam os autos sobre direito de vizinhança, consubstanciado no dever recíproco de preservação da segurança e utilidade do prédio lindeiro. Tal dever previsto expressamente no Código Civil se alinha a dois princípios constitucionais. O primeiro diz respeito à função social da propriedade, pelo qual o exercício dos 14

15 poderes inerentes à propriedade sofre limitações necessárias a impedir o abuso do direito pelo uso anormal da propriedade. O segundo remete à dignidade da pessoa humana, na medida em que moradia digna, segurança e tranquilidade são direitos que integram a esfera existencial de qualquer pessoa. Não versam os autos sobre regularidade de licenças administrativas. A obra não autorizada administrativamente, por falta de licença e, portanto, dita irregular do ponto de vista administrativo, carrega a presunção de inadequação. Tal não induz que a obra regular, ou seja, aquela para a qual foi emitida licença da municipalidade, respeite os limites impostos pelo direito de vizinhança. Tanto assim que todas as licenças emitidas, contêm expressa ressalva de que a concessão se faz sem o exame da ofensa a direitos de terceiros que se lesados poderão buscar a tutela judicial (fls.17). E mais, nas licenças consta que a concessão desta não importa em reconhecimento da legalidade das obras, nem mesmo das metragens do lote. O que se examina nestes autos, portanto, é se a obra realizada pela ré, inobstante autorizada pela municipalidade, desrespeita os limites de distância entre janelas e acessos e expõe a residência do autor a riscos. A legislação edilícia muitas vezes permite acréscimos nas construções, visto que os parâmetros analisados são: área total edificavel, gabarito e taxa de ocupação, não há uma identificação dos impactos gerados nos imóveis vizinhos, fato que não deveria ocorrer, visto que o EIV já se encontra estabelecido no Plano Diretor, mas ainda não exigido nos processos administrativos de regularização de obras. Fotos n os 13 e 14: Mureta construída com 40 cm de altura criando piso de varanda a menos de 1,5m da janela do vizinho. 15

16 Foto n o 15: Mureta construída com 40 cm de altura criando piso de varanda a menos de 1,5m da janela do vizinho. DO ODOR Outro item que gera casos judiciais é o odor e emissão de gordura de chaminés de estabelecimentos comerciais alimentícios instalados na divisa com edificações residenciais coladas nas divisas. As chaminés devem ser instaladas de forma cuidadosa. Numa perícia especifica verificou-se que o odor de gordura e fritura estava sempre presente em função de uma chaminé indevidamente instalada no muro de divisa dos fundos, desobedecendo o que estabelece o Código Civil, artigo 1380, onde fica claro que NÃO É PERMITIDO INSTALAR CHAMINÉ EM PAREDE DIVISÓRIA. Art Não é licito encostar à parede divisória chaminés, fogões, fornos ou quaisquer aparelhos ou depósitos suscetíveis de produzir infiltrações ou interferências prejudiciais ao vizinho. 16

17 Fotos n os 16 e 17: Chaminé instalada no muro de divisa entre as edificações DA PERDA DE PAISAGEM O conceito de paisagem está relacionado ao visual imediatamente percebido. A paisagem pode ser natural ou construída. Quando se analisa a paisagem se percebe a transformação espacial sendo, portanto, uma ordem imposta ao ambiente. Ocorrem casos de acréscimos em construções no pavimento de cobertura que geram a perda da paisagem anteriormente existente. Essas novas construções, muitas vezes, geram perda da vista e consequentemente desvalorização imobiliária. Sendo o Rio de Janeiro uma cidade a beira mar, muitas das construções de acréscimos geram a perda da paisagem natural da orla, fato que conforme análises e comparações realizadas com elaboração de duas avaliações pelo método comparativo por inferência estatística para o local, sendo uma com elementos amostrais apenas de apartamentos com vista para Baia de Guanabara e outra com elementos amostrais constituídos de apartamentos sem vista, observou-se que há uma perda efetiva de 33% do valor do imóvel. Fotos n os 18 e 19: Chaminé instalada no muro de divisa entre as edificações 17

18 Foto n o 20: Chaminé instalada no muro de divisa entre as edificações IMPACTOS SANITÁRIOS A instalação de atividades com alimentos, tais como: supermercados, restaurantes e afins deverá ser bem fiscalizada para se evitar problemas de saúde aos moradores da edificação e da vizinhança. O depósito de mantimentos, que se deterioram facilmente, pode ocasionar a presença de roedores e baratas, que contaminam o local. O controle das pragas urbanas deverá ser intenso e rígido evitando-se problemas à população local. PERDA DA PRIVACIDADE Além de construções em divisas, com aberturas de vãos a menos de 1,50m, ocorrem muitos casos relacionados a muros de divisa, com interferências diretas, alteamentos e modificações. Essas modificações em construções vizinhas geram, muitas vezes, perda de privacidade, ou seja, impactos negativos de vizinhança. Outras questões de vizinhança estão relacionadas a edificações construídas em terrenos de encosta, onde o imóvel vizinho se encontra em nível mais elevado com esgotamento de águas servidas sendo realizado pelo terreno vizinho em nível mais baixo, fato indevido e que deve ser verificado na legislação de cada localidade e na convenção dos condomínios estudados. 18

19 Foto nº: Alteamento em muro de divisa por unidade vizinha Janela aberta em acréscimo realizado por vizinho Casa existente com ocupação antiga IMPACTOS DE TRÂNSITO O relatório de impacto no sistema viário, conhecidos como Relatório de Impacto de Trânsito (RIT) é um dos estudos apresentados no EIV (Estudo de Impacto de Vizinhança) Na construção de um novo empreendimento de médio e grande porte, sendo considerado um polo gerador de tráfego (PGT), será necessária a realização do RIT com a finalidade de compreender o impacto que ele poderá gerar no contexto urbano do local, tanto em relação aos automóveis quanto aos pedestres. Cada município possui uma legislação específica sobre a necessidade de se realizar um RIT, de acordo com o tamanho e tipo do empreendimento. De forma geral na elaboração do RIT há necessidade de se avaliar o tamanho do empreendimento que está sendo instalado, verificando as características das vias de acesso ao local, se há alguma previsão de melhora do sistema existente, verificação dos sistemas públicos de mobilidade urbana e a estimativa do número de pessoas que circularam no local. 19

20 IMPACTOS DE USO A instalação de atividades comerciais, tais como: supermercado, academias de ginástica, casas de festas, entre outros deverá passar por uma análise detalhada de vizinhança, identificando-se o zoneamento do local e os impactos gerados. Normalmente em zonas residenciais, os usos comerciais de edificações em uso exclusivo são tolerados mediante análises apuradas do contexto urbano. Inúmeros casos pericias estão relacionados ao posicionamento e a análise do zoneamento da região, porém deve-se considerar que a cidade possui uma dinâmica constante modificando-se rapidamente e gerando alterações nos cenários e paisagens urbanas e novas necessidades de seus moradores. Num determinado caso pericial um condomínio residencial entrou com uma ação contra um determinado empreendimento industrial que gerava desconforto aos moradores do entorno, visto que os caminhões iniciavam suas atividades às 5 horas da manhã, além da poluição atmosférica e dos corpos d água locais. Porém no decorrer da ação a indústria demonstrou que se instalou na região antes da mesma se transformar numa localidade residencial e ter seu zoneamento modificado. Ganhou o direito a permanecer no local, porém realizando atividades mitigadoras para reduzir os impactos negativos gerados a comunidade local. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES O Estatuto da Cidade Lei n /01 trouxe um novo instrumento de controle da Política Urbana: o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), relatório que analisa todos os impactos que o novo empreendimento irá ocasionar no local onde está sendo instalado, sendo impactos positivos e negativos. Encontra-se no Plano Diretor, a exigência da apresentação do Estudo do Impacto de Vizinhança para determinados tipos de empreendimentos. Este estudo prevê os ruídos que serão emitidos, os impactos ao trânsito do local, o adensamento populacional, a segurança, além de questões como: poluição visual e urbanística. O Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) pode ser definido como documento técnico a ser exigido, com base em lei municipal, para a concessão de licenças e autorizações de construção, ampliação ou funcionamento de empreendimentos ou atividades que possam afetar a qualidade de vida da população residente na área ou nas proximidades. Os casos periciais que contemplam situações de conflitos de vizinhança têm por finalidade analisar os impactos gerados quanto à qualidade de vida da população residente na área e suas proximidades, considerando principalmente, o sossego, a saúde e a segurança, como estabelecido na legislação brasileira. A aplicação desse instrumento não é automática, é necessária uma lei municipal que determine os critérios para a sua aplicação e os empreendimentos passíveis de sua aplicação. 20

21 BIBLIOGRAFIA Estatuto da Cidade - Lei n /01 Senado Federal Secretaria Especial de Editoração e Publicações Subsecretaria de edições técnicas Brasília Lucéia Martins Soares, In Dalari e Ferraz, Adilson Abreu e Sérgio, Coord. Estatuto da Cidade. Comentários à Lei Federal /2001, 1ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002 Dallari, Adilson Abreu e Ferraz, Sergio Estatuto da Cidade Comentários à Lei Federal /2001 São Paulo Malheiros, Macedo, Silvio Sorares Paisagismo e Paisagem. Paisagem e ambiente: ensaios:5. São Paulo, FAU/USP BRASIL, Lei n de 10 de julho de Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências, Disponível em: CARVALHO FILHO, José dos Santos. Comentários ao Estatuto da Cidade: Lei n , de e Medida Provisória n 2.220, de Rio de Janeiro: Lumen Juris, MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. São Paulo: Revista dos Tribunais, ROCCO, Rogério Estudo de Impacto de Vizinhança: Instrumento de Garantia do Direito às Cidades Sustentáveis. LEI Nº 6.938, DE 31 DE AGOSTO DE Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente Lei Complementar nº 111 de 2011 Avvad, Pedro Elias Direito Imobiliário Teoria Geral e Negócios Imobiliários 3ª edição. Editora Forense 2012 NBR da ABNT - Acústica - Avaliação do ruído em áreas habitadas, visando o conforto da comunidade NBR da ABNT - Níveis de ruído para conforto acústico 21